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sexta-feira, 24 de março de 2023

O que é compostagem e como fazer?

Fazer compostagem doméstica reduz gases do efeito estufa, lixo orgânico e faz bem para saúde

1. Como se faz a compostagem?

2. Quais são as 3 fases da compostagem?

2.1. 1ª) Fase mesofílica

2.2. 2ª) Fase termofílica

2.3. 3ª) Fase da maturação

3. História da compostagem

4. O que é uma composteira?

5. Minhocas na compostagem

6. Composteira automática

7. Factores que influenciam na geração e na qualidade do composto

7.1. Organismos

7.2. Temperatura

7.3. Umidade

7.4. Aeração

8. Cuidados

9. Para que serve a compostagem

10. Chorume

Compostagem é o processo biológico de valorização da matéria orgânica, seja ela de origem urbana, doméstica, industrial, agrícola ou florestal, e pode ser considerada como um tipo de reciclagem do lixo orgânico. Trata-se de um processo natural em que os micro-organismos, como fungos e bactérias, são responsáveis pela degradação de certos tipos de resíduos, transformando-a em húmus, um material muito rico em nutrientes e fértil.

A prática feita em casa ainda faz bem para a saúde. De acordo com um estudo, o contacto com uma bactéria presente no húmus pode ser usado como antidepressivo e diminui alergias, dores e náuseas.

A compostagem ajuda na redução das sobras de alimentos, tornando-se uma solução fácil para reciclar os resíduos gerados em nossa residência. Confira o vídeo acima, do Canal do Portal eCycle do YouTube, para entender, de forma bem resumida, o que é compostagem. Se curtir, inscreva-se no canal! Confira abaixo mais detalhes de como ela ocorre e como realizá-la.

Como se faz a compostagem?

A compostagem do lixo acontece em fases, sendo elas muito distintas umas das outras.

Quais são as 3 fases da compostagem?

1ª) Fase mesofílica

Nessa fase da compostagem, os fungos e as bactérias mesófilas (activas a temperaturas próximas da temperatura ambiente) começam a se proliferar na matéria orgânica aglomerada na composteira, fazendo a decomposição do lixo orgânico. Primeiro são metabolizadas as moléculas mais simples. Nessa fase, as temperaturas são moderadas (cerca de 40°C) e dura em torno de 15 dias.

2ª) Fase termofílica

É a fase mais longa, podendo se estender por até dois meses, dependendo das características do material que está sendo compostado. Nessa fase, entram em cena os fungos e as bactérias denominados de termófilos, que são capazes de sobreviver a temperaturas entre 65°C e 70°C, à influência da maior disponibilidade de oxigénio – promovida pelo revolvimento da pilha inicial. A degradação das moléculas mais complexas e a alta temperatura ajudam na eliminação de agentes patógenos.

3ª) Fase da maturação

É a última fase do processo de compostagem, podendo durar até dois meses. Nessa fase, há a diminuição da actividade microbiana, da temperatura (até se aproximar da temperatura ambiente) e da acidez. É um período de estabilização que produz um composto maturado. A maturidade do composto ocorre quando a decomposição microbiológica se completa e a matéria orgânica é transformada em húmus, livre de toxicidade, metais pesados e patógenos.

O húmus é um material estável, rico em nutrientes e minerais, que pode ser utilizado em hortas, jardins e para fins agrícolas, como adubo orgânico, devolvendo à terra os nutrientes de que necessita e evitando o uso de fertilizantes sintéticos.

História da compostagem

A compostagem orgânica não é uma prática nova, mas está ganhando popularidade ao passo que há uma tendência maior de preocupação com a sustentabilidade. Há muito tempo agricultores já utilizavam o método de reciclagem do lixo doméstico para obtenção de adubo orgânico.

No oriente médio, principalmente na China, a compostagem vem sendo aplicada há séculos. Já no ocidente, ficou conhecida em 1920, a partir dos primeiros experimentos de Sir Albert Howard. O Inglês Howard era considerado um dos propulsores da compostagem doméstica na província Indiana de Indore, onde tentou efectuar o processo com resíduos de uma só natureza e concluiu que era necessário misturar diversos tipos.

Também na Europa, a técnica era usada durante os séculos XVIII e XIX pelos agricultores que transportavam os seus produtos para as cidades em crescimento e, em troca, regressavam às suas terras com os resíduos sólidos urbanos das cidades para utilizá-los como corretivos orgânicos gerados do solo. Assim, os resíduos eram quase que completamente reciclados por meio da compostagem e da agricultura.

Com a expansão das áreas urbanas e o aumento populacional e do consumo, houve mudanças na qualidade dos resíduos sólidos, que acabaram tornando-se cada vez mais inadequados para o processo de compostagem de lixo. Logo, a técnica perdeu popularidade.

Entretanto, nos dias de hoje, com a pressão para a utilização de métodos direccionados para a preservação do meio ambiente, há um novo interesse em compostagem de restos de comida em casa como uma solução para a redução do volume de lixo que é encaminhado para aterros e lixões todos os dias.

Esse hábito ainda pode fornecer uma opção saudável de adubo orgânico para plantas e hortas. Com isso, cada vez mais pessoas querem colocar a mão na massa e fazer a sua própria compostagem, mas muitas não sabem por onde começar.

O que é uma composteira?

A composteira nada mais é do que o lugar (ou a estrutura) próprio para o depósito e a compostagem do material orgânico, onde o lixo orgânico será transformado em húmus.

A composteira pode assumir diversos formatos e tamanhos – isso depende do volume de matéria orgânica que é produzida e também do espaço livre disponível para sua alocação, mas todas têm a mesma finalidade.

As composteiras podem ser instaladas em casas ou apartamentos e possuir tamanhos e preços variados. Para além disso, o processo também pode ser realizado directamente no solo.

Minhocas na compostagem

Uma forma de acelerar a compostagem orgânica é por meio do uso de minhocas californianas (espécie Eisenia foetida mais indicada para o processo). Isso porque as minhocas digerem a matéria orgânica, facilitando o trabalho dos micro-organismos.

Esse tipo de compostagem recebe o nome de vermicompostagem ou compostagem com minhocas. Para saber mais sobre esse tema, dê uma olhada na matéria: “Vermicompostagem: conheça as vantagens dessa técnica que reduz o lixo orgânico“. Para conhecer mais de perto as minhocas dê uma olhada na matéria: “Minhoca: importância ambiental na natureza e em casa“.

Composteira automática

A compostagem também pode ser feita por meio da composteira automática, que envolve maior praticidade, pois a decomposição é mais rápida e, ao em vez de minhocas, utiliza-se poderosos micro-organismos patenteados (dentre eles, o Acidulo TM), capazes de se multiplicarem em altas temperaturas, salinidade e acidez, saiba mais sobre esse tema lendo a matéria “Composteiras automáticas trazem agilidade e eficiência no reaproveitamento de resíduos domésticos“. Com isso, é possível inserir alimentos ácidos, carne, ossos, espinhas de peixe, frutos do mar, ao contrário da compostagem com minhocas, ou vermicompostagem.

Nessa última, também não se recomenda a deposição em excesso de gorduras e lacticínios, pois retardam a decomposição. Também existem resíduos que não vão para nenhum dos tipos de composteira, porém devemos destinar correctamente. Para saber mais a respeito, dê uma olhada na matéria: “O que pode colocar na composteira?“.

Ao identificar o melhor tipo de processo (compostagem ou vermicompostagem) e de composteira para a casa, família e orçamento, muitas pessoas ainda têm uma dúvida: se a composteira caseira é higiénica. Essa dúvida é recorrente devido a existência de chorume e pela necessidade de lidar com restos de alimentos que podem exalar mau odor e atrair animais.

O fato de haver minhocas nas composteiras também assusta. Mas esse receio não tem muito fundamento como mostra a matéria “Entrevista: composteira caseira é higiénica” com Cesar Danna, do site de soluções para resíduos orgânicos Minhocasa.

Factores que influenciam na geração e na qualidade do composto

São muitos os factores que podem influenciar na quantidade e qualidade dos compostos gerados durante esse processo, os principais são os seguintes:

Organismos

A transformação da matéria orgânica bruta para húmus é um processo, basicamente, microbiológico, operado principalmente por fungos e bactérias, que, durante as fases da compostagem, alternam espécies de micro-organismos envolvidos. Também há a colaboração da macro e mesofauna, como minhocas, formigas, besouros e ácaros, durante o processo de decomposição;

Temperatura

Um dos factores de grande importância no processo de compostagem. Esse processo de decomposição da matéria orgânica por micro-organismos se relaciona directamente à temperatura, por meio de micro-organismos que produzem o calor, pela metabolização da matéria orgânica, estando a temperatura relacionada a vários factores, como materiais ricos em proteínas, baixa relação carbono/nitrogénio, umidade e outros.

Materiais moídos e peneirados, com granulometria mais fina e maior homogeneidade, originam uma melhor distribuição de temperatura e menor perda de calor. Veja mais detalhes na matéria “Condições básicas para manutenção da composteira: temperatura e umidade“.

Umidade

A presença de água é fundamental para o bom desenvolvimento do processo, pois a umidade garante a actividade microbiológica, isso se deve porque, entre outros factores, a estrutura dos micro-organismos consiste de aproximadamente 90% de água e, na produção de novas células, a água precisa ser obtida do meio, ou seja, neste caso, da massa de compostagem.

Porém, a escassez ou o excesso do líquido pode desacelerar a compostagem – se houver excesso, é necessário acrescentar matéria seca, como serragem, ou folhas secas.

A faixa de umidade óptima recomendada para se obter um máximo de decomposição está próxima de 50%, devendo haver uma maior atenção ao teor de umidade durante a fase inicial, pois esta precisa de uma adequação do suprimento de água para promoção do crescimento dos organismos biológicos envolvidos no processo e para que as reacções bioquímicas ocorram no tempo certo, durante o processo de compostagem. Saiba mais detalhes na matéria “Umidade dentro da composteira: factor muito importante“.

Aeração

No processo de compostagem, é possível dizer que a aeração é o factor mais importante a ser considerado, isso porque o arejamento evita a formação de maus odores e a presença de insectos, como as moscas de frutas, por exemplo, o que é importante tanto para o processo como para o meio ambiente.

Também deve-se levar em conta que, quanto mais húmida está a massa orgânica, mais deficiente será sua oxigenação. É recomendado que o primeiro revolvimento seja feito em duas ou três semanas após o início do processo, pois esse é o período em que se exige a maior aeração possível. Em seguida, o segundo revolvimento deve ser feito aproximadamente três semanas após o primeiro, e dez semanas após o inicio de processo de compostagem deve ser feito o terceiro revolvimento para uma incorporação final de oxigénio.

Uma massa orgânica com uma dose apropriada de nitrogénio e carbono ajuda no crescimento e na actividade das colónias de micro-organismos envolvidos no processo de decomposição, possibilitando a produção do composto em menos tempo.

Sabendo que os micro-organismos absorvem o carbono e o nitrogénio numa proporção de 30 partes de carbono para uma parte de nitrogénio, ou seja, uma razão de 30/1, essa é a proporção ideal para o material orgânico depositado na composteira, mas também são recomendados valores entre 26/1 e 35/1, como sendo as relações C/N mais propícias para uma rápida e eficiente compostagem.

Cuidados

Resíduos com relação C/N baixa (C/N<26/1) são pobres em carbono e perdem nitrogénio na forma amoniacal durante o processo de compostagem. Nesse caso, recomenda-se juntar restos vegetais celulósicos, como serragem de madeira, sabugo e palha de milho e talos e cachos de banana, ricos em carbono, para elevar a relação a um valor próximo do ideal.

No caso contrário, ou seja, quando a matéria-prima possui relação C/N alta (C/N>35/1), o processo de compostagem torna-se mais demorado e o produto final apresentará baixos teores de matéria orgânica. Para corrigir esse erro, deve-se acrescentar materiais ricos em nitrogénio, como folhas de árvores, gramíneas e e legumes frescos.

Além do que até aqui mencionado, outros cuidados recomendados estão relacionados ao local onde a composteira estará alocada: o preparo prévio do material orgânico, a quantidade de material a ser compostado e as dimensões das leiras (quando a compostagem é feita em leiras, pilhas de resíduos em linha).

Você também deve tomar cuidado com quais materiais orgânicos colocar na sua composteira, como, por exemplo, no caso da vermicompostagem, onde há restrições a alguns tipos de alimentos já mencionados, como excesso de frutas cítricas, cebola ou alho, pois alteram o pH do composto.

Para que serve a compostagem

Segundo dados do IPEA, Instituto de Pesquisa Económica Aplicada, o material orgânico corresponde a cerca de 52% do volume total de resíduos produzidos no Brasil e tudo isso vai parar em aterros sanitários, onde são depositados com os demais e não recebem nenhum tipo de tratamento específico.

A compostagem traz muitas vantagens para o meio ambiente e para a saúde pública, seja aplicada no ambiente urbano (domésticos ou industriais) ou rural. A maior vantagem que pode ser citada da compostagem é que, no processo de decomposição, ocorre somente a formação de dióxido de carbono ou gás carbónico (CO2), água (H2O) e biomassa (húmus).

Por se tratar de um processo de fermentação que ocorre na presença de oxigénio (aeróbico), permite que não ocorra a formação de gás metano (CH4), gerado nos aterros por ocasião da decomposição destes resíduos, que é altamente nocivo ao meio ambiente e muito mais agressivo, pois é um gás de efeito estufa cerca de 21 vezes mais potente que o gás carbónico.

Ao reciclarmos o lixo destinado aos aterros por meio da compostagem, haverá, por consequência, uma economia nos custos de transporte e de uso do próprio aterro, ocasionando o aumento de sua vida útil (veja sobre o uso da compostagem em grandes cidades).

Chorume

Além de tudo que percorremos até aqui, a compostagem promove a valorização de um insumo natural e ambientalmente seguro, adubo orgânico, actuante sobre a reciclagem dos nutrientes do solo e no reaproveitamento agrícola da matéria orgânica, assim evitando o uso de fertilizantes inorgânicos, formados por compostos químicos não naturais, cujos mais comuns levam em sua composição substâncias como nitrogénio, fosfatos, potássio, magnésio ou enxofre (veja mais informações na matéria “O que são fertilizantes?”).

Os efeitos desses compostos, sobretudo os fertilizantes nitrogenados, se apresentam igualmente nocivos ao desequilíbrio do efeito estufa. Também é possível mencionar os riscos que esses fertilizantes podem trazer devido à presença de metais pesados em sua composição.

O chorume produzido no processo da compostagem com minhocas pode ser utilizado como adubo líquido (na proporção de dez partes de água para uma de chorume) e como pesticida (na proporção de meia parte de chorume e meia de água borrifada nas plantas).

Se suas dúvidas sobre compostagem foram solucionadas com essa matéria e você está querendo praticar a sua em casa, você pode comprar uma composteira doméstica em nossa loja. Encontre o melhor tipo para sua casa e sua família. Você também pode conferir como fazer uma composteira em casa na matéria: “Aprenda como fazer uma composteira doméstica com minhocas“.

Curta o vídeo (em inglês) sobre como é o processo de compostagem.

https://www.ecycle.com.br/compostagem/

Aprenda a fazer um medidor de pH caseiro

Saiba como fazer um medidor de pH caseiro utilizando repolho roxo



1. O que é pH?

2. Medidor de pH caseiro

3. Como fazer

4. Como usar

5. Mudanças de Cores

Se você já precisou medir o pH da água ou de outra substância, talvez fique surpreso ao saber que é possível fazer um medidor de pH caseiro utilizando repolho. Um simples repolho e alguns ingredientes que você provavelmente tem em casa poderia ter resolvido seu problema com o pH da água.

  • O que é pH?

A sigla pH significa Potencial Hidrogeniónico. Isso nada mais é do que uma escala que mede se uma substância é ácida, alcalina (básica) ou neutra. O pH está relacionado com a concentração de íons de Hidrogénio (H+) e íons OH-. Quanto menor o pH de uma substância, maior a concentração de íons H+ e menor a concentração de íons OH-.

A faixa de pH varia de 0 a 14, sendo que quanto mais próximo de zero mais ácida é a substância e quanto mais próximo de 14 mais alcalina ela fica. Por exemplo, o limão, que é uma fruta cítrica, chega a 3 na escala de pH. Já um sabão em barra no mercado possui um pH em torno de 10, portanto é alcalino.

Para medirmos o pH de uma substância com precisão, utilizamos o peagâmetro, constituído basicamente por um eléctrodo e um potenciómetro. O potenciómetro é utilizado na calibração do aparelho com soluções de referência – a medida do pH é feita com a imersão do eléctrodo na solução a ser analisada.

Outra forma é com a utilização de papel tornassol e a fenolftaleína. Na presença de ácidos, o papel de tornassol fica com a coloração vermelha e a solução de fenolftaleína muda da coloração vermelha para a incolor na presença de um ácido.

  • Medidor de pH caseiro

O repolho é rico em antocianinas, pigmentos responsáveis por uma variedade de cores atractivas de frutas, flores e folhas que variam do vermelho ao azul.

Quando usamos o extracto de uma verdura, como o repolho roxo, obtemos um medidor de pH de largo espectro, isto é, ele pode medir do pH = 1 até o pH = 12, alterando sua cor desde o vermelho até o verde. A variação de cor é muito pequena, portanto, esse não é um método muito preciso, mas serve muito bem para o uso caseiro.

  • Como fazer

Pegue algumas folhas de repolho roxo (30 g) e corte em fatias bem pequenas, coloque para cozinhar com uma quantidade de água igual ao de folhas picadas (aproximadamente 150 ml). Deixe ferver por 15 minutos e espere esfriar. Agora, use uma peneira e tente extrair toda água que ainda restou em um recipiente limpo. Para aumentar o tempo de conservação, adicione um pouco de álcool e mantenha na geladeira.

  • Como usar

Para utilizar o medidor de pH em alguma substância é só adicionar algumas gotas do extracto de repolho roxo em cerca de 5 ml da solução que se deseja medir. A partir da cor que a mistura tiver, você saberá se ela é básica ou ácida. Para visualizar melhor as cores, coloque na frente de uma folha ou parede branca. Confira qual é a cor que resultante e o seu respectivo pH:

  • Mudanças de Cores

Cor             pH

Vermelho 2

Vermelho violáceo 4

Violeta 6

Azul violáceo 7

Azul 7,5

Azul esverdeado 9

Verde azulado 10

Verde 12

Como se trata de uma substância natural, ela não dura muito tempo. Sendo assim, utilize o  seu medidor de pH caseiro no máximo por uma semana.


https://www.ecycle.com.br/medidor-de-ph/

Como fazer sabão caseiro sustentável.

Veja o passo a passo de como fazer um sabão caseiro sustentável.

Saber como fazer sabão caseiro com óleo usado é uma óptima forma de economizar e ainda diminuir a geração de resíduo, evitando o uso de produtos como sabão em pó. A receita de sabão caseiro descrita a seguir é de alta qualidade e criada a partir de uma fórmula mais amigável ao meio ambiente, pois reutiliza óleo de cozinha usado.

Assim, é uma óptima forma de praticar o consumo consciente e a Economia Circular, já que você não perde os recursos gastos na produção do óleo e ainda gera um novo produto. Você já deve saber que o óleo de cozinha usado não pode ser despejado na pia (pois causa entupimento) e nem descartado de forma incorrecta.

É bem provável que já tenham te contado alguma história sobre a possibilidade de fazer sabão caseiro com óleo de cozinha usado. Você já tentou realizar a experiência?

Existem inúmeras receitas de sabão caseiro com óleo de cozinha espalhadas pela internet, mas estudos realizados comprovaram que a maioria utiliza soda cáustica em excesso e isso é extremamente perigoso devido a alguns motivos:

  • A substância é prejudicial à saúde por conta de suas propriedades corrosivas e desidratantes, sendo muito agressiva à pele, que fica ressecada, pode apresentar rachaduras e até hipersensibilidade e inflamações;
  • Ela prejudica também o meio ambiente, pois aumenta muito o pH do esgoto doméstico que, dependendo da sua destinação, vai desequilibrar o pH dos rios e lagos, interferindo em todo o ecossistema;
  • O excesso de soda pode destruir os tecidos e roupas durante a lavagem, diminuindo sua vida útil.

Mas se a soda é tão nociva, por que a utilizamos para fazer sabão caseiro?

O carácter prejudicial da soda cáustica está no contacto com a pele e os olhos, e no uso ou descarte directo no meio ambiente ou esgoto. Porém, ao utilizá-la para fazer sabão caseiro, sua reacção com o óleo de cozinha vai transformar esses dois ingredientes em outros produtos, que são o próprio sabão caseiro e a glicerina. Se você tiver o cuidado de usar as quantidades necessárias descritas na receita a seguir, não haverá excesso de nenhum ingrediente no produto final.

Dessa forma, o seu sabão caseiro produzirá o menor impacto ambiental possível, porque embora o sabão seja biodegradável, ou seja, é decomposto por micro-organismos presentes na natureza, não significa que ele não tenha impacto ambiental. Logo, o que buscamos aqui é ter uma pegada mais leve, com o menor impacto possível ao meio ambiente, já que precisamos do produto de higiene para as nossas necessidades diárias de limpeza.

A equipe do Portal eCycle pesquisou e testou algumas receitas de sabão caseiro, tomando todo o cuidado para chegar em uma fórmula final que contivesse somente as quantidades estritamente necessárias de cada componente. Assim, seria possível atingir um produto final com boa qualidade e com o pH mais próximo possível da neutralidade. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determina que o pH máximo dos sabões deve ser até 11,5, mas muitas das receitas estudadas apresentaram pH bem superior a esse.

A fórmula apresentada abaixo foi a que apresentou melhor resultado. É extremamente importante usar as proporções descritas a seguir. Confira o vídeo exclusivo do canal do Portal eCycle no YouTube para visualizar o procedimento completo.

  1. O que precisa para fazer sabão caseiro?
      • 1 quilo de óleo de cozinha usado;
      • 140 mililitros de água;
      • 135 gramas de soda cáustica em escamas (concentração superior a 95%);
      • 25 mililitros de álcool (opcional);
      • 30 gramas de aromatizantes/essências (opcional).;
      • 10 gramas de alecrim em pó (conservante natural) (opcional);
      • Recipientes para o molde do sabão caseiro (formas específicas, bandejas de plástico ou embalagens longa vida – jamais utilize recipientes de alumínio);
      • Colher de sopa de pau;
      • Par de luvas para lavar louças;
      • 1 máscara descartável;
      • Óculos de protecção;
      • Balde grande;
      • Recipiente pequeno.
  2. Modo de preparo
    1. Em primeiro lugar, coloque os óculos de protecção, as luvas e a máscara. A soda cáustica é altamente corrosiva e deve ser manuseada com muito cuidado. Vamos ao passo a passo de como fazer sabão caseiro
  3.  Passo 1
      1. Coloque a água para esquentar até que ela fique morna (em torno de 40°C). Desligue o fogo. Feito isso, coloque os 140 mililitros de água morna no recipiente pequeno e despeje o conteúdo da soda cáustica lentamente e em pequenas porções no mesmo recipiente, misturando sempre a cada adição. Nunca adicione água fria sobre a soda! A ordem dos ingredientes também deve ser respeitada: colocar soda sobre a água, e nunca a água sobre a soda (isso pode provocar uma reacção forte e causar acidentes). É muito importante utilizar um balde ou recipiente plástico de material grosso e resistente, e nunca utilizar garrafas PET para fazer a diluição da soda, pois elas não suportam a temperatura que a reacção atinge, podendo romper e vazar esse material extremamente corrosivo. Mexa com a colher de pau até diluir completamente a soda, de modo que não haja mais escamas. Atenção: não utilize recipientes de alumínio descartável em conjunto com a soda cáustica e certifique-se de que eles sejam suficientemente altos, pois essa dissolução pode efervescer e causar espuma.

  4. Passo 2
    1. Depois de retirar as impurezas (é possível fazer isso com uma peneira), acrescente o óleo aos poucos (a uma temperatura de 40°C) e adicione-o ao balde que será utilizado para colocar todos os demais ingredientes. Em seguida, insira a soda bem lentamente, em pequenas porções e misturando continuamente. Esse cuidado aumenta a sua segurança, pois a reacção com a soda cáustica libera muito calor, além de produzir um sabão de boa qualidade – se você colocar a soda de uma única vez ou muito rápido sem a agitação adequada, o sabão pode empelotar e ficará difícil reverter isso.
  5. Passo 3
    1. Misture somente o óleo e a soda por cerca de 30 minutos. A consistência final ideal deve ser parecida com a do leite condensado. É necessário respeitar esse tempo de mistura para que haja a reacção entre o óleo e a soda.
  6. Passo 4
      1. Após esse tempo de mistura, tem início o momento ideal para adicionar os demais ingredientes. Coloque a essência de sua preferência e conservante (caso queira). Mexa bastante até que todos os ingredientes se incorporem plenamente à mistura.

  7. Passo 5
      1. Caso a massa final de sabão esteja muito líquida, insira o álcool lentamente e mexa bem por dez minutos para que a mistura não empelote. Nessa etapa, a massa do sabão caseiro ganhará consistência rapidamente. É recomendável que a forma em que será colocado o sabão já esteja preparada e próxima.

  8. A pasta
    1. A “pasta” do seu sabão caseiro vai ficar desse jeito:
  9. Recipiente
      1. Agora é só despejar o sabão no recipiente que você separou…

  10. Cura
      1. Por último, basta aguardar o processo de cura do sabão caseiro (que leva de 20 a 45 dias)

O Seu sabão caseiro está pronto!

      Pronto! Depois de esperar o tempo de curso, é só desenformar e cortar e você terá um excelente sabão caseiro em barra para usar no seu dia a dia. Recomenda-se, ainda, deixar em processo de cura (de 20 a 45 dias), de preferência n um recipiente opaco, que fique num lugar fresco e sob abrigo do Sol.

Esse processo visa garantir a reacção completa da soda cáustica, além de permitir ao sabão perder a umidade excessiva. O tempo poderá variar de acordo com as condições climáticas locais. Exemplo: se o clima estiver mais chuvoso, pode ser que sejam necessários mais dias; ocorre o contrário caso o tempo esteja mais seco.

Entenda os ingredientes dessa receita de sabão caseiro

Soda cáustica

Na fabricação do sabão, há uma preocupação acerca da soda cáustica, pois ela é muito corrosiva e teme-se que ela possa ser prejudicial à saúde e ao meio ambiente. Realmente seu uso requer muita atenção e alguns cuidados, já que seu contacto com pele e mucosas (inalação) pode causar queimaduras. Caso algum acidente ocorra, é importante lavar a região com água corrente fria por 15 minutos.

Após a reacção de saponificação com os óleos, durante o chamado tempo de cura, a soda vai perdendo a alcalinidade, ou seja, seu pH vai baixando. Isso porque os álcalis reagem com os óleos e se transformam no sabão caseiro (entenda mais sobre o sabão em barra).

Fique atento às quantidades

Portanto, é preciso ficar atento e utilizar exactamente as quantidades recomendadas de soda para que a substância não sobre na mistura e falte óleo para ela reagir, deixando o seu produto final excessivamente alcalino. Isso pode torná-lo mais agressivo às suas mãos, além de modificar o pH do esgoto, o que pode ser prejudicial ao meio ambiente, como já dito anteriormente.

Em muitos relatos de receitas de sabão caseiro que usam excesso de soda, percebe-se que, com o passar dos dias, o sabão vai branqueando. Isso se deve ao acúmulo da soda que não reagiu e que, ao reagir com o ar, forma carbonato de sódio, que é branco, e pode causar desidratação e reacções alérgicas em contacto com a pele.

Por isso, muitas pessoas reclamam do sabão caseiro, dizendo que é agressivo à pele. Mas, como visto, o problema não está no sabão, e sim na quantidade de soda usada.

Um clareamento gradual da massa durante o processo de cura é normal, mas sua cor final não será branca. E lembre-se: esta receita de sabão não deve ser utilizada para fins cosméticos. Para limpeza geral, é recomendado o uso de luvas devido à sua alcalinidade intrínseca.

Álcool

A sua adição ocorre porque a solubilização do óleo é melhor no álcool do que em água e assim o endurecimento do sabão caseiro se torna mais rápido. Esse ingrediente pode ser dispensável caso você note que, ao fim dos 20 minutos de agitação, a massa de sabão já tem uma consistência adequada para ser colocada na forma.

Conservantes

Existem dois problemas a serem considerados na deterioração de óleo e gordura: a rancificação e a contaminação por bactérias e outros micro-organismos.

Os óleos, em geral, sofrem de um problema que se chama rancificação. Em outras palavras, a deterioração da gordura, evidenciada pelo seu cheiro característico de óleo/gordura estragado. Esse problema aumenta com o tempo de estocarem, pela presença de luz e pelo seu contacto com o ar, mais especificamente com o oxigénio, que causa a auto-oxidação das gorduras, responsável por esses defeitos.

Para minimizar esse problema, você pode:
  • Fazer seu sabão caseiro em pequenas quantidades: produtos naturais feitos em casa não terão a mesma durabilidade dos comercializados pela indústria. Armazená-lo por longos períodos aumentará as chances de problemas como os citados ocorrerem;
  • Armazenar seu sabão em embalagens a vácuo ou em potes hermeticamente fechados: isso diminui a exposição do produto ao oxigénio;
  • Armazenar em recipientes escuros ou em embalagens opacas para mantê-los longe dos efeitos nocivos dos raios solares;
  • Armazenar na geladeira, diminuindo a velocidade de deterioração;
  • Adicionar conservantes naturais ao seu sabão, tais como o pó de alecrim (caso queira, você pode misturar pó de alecrim na água de diluição da soda para que haja efeito conservante. Mas é preciso verificar se o volume final vai ser de 140 ml mesmo, já que a água evapora no preparo).
Corantes e essências

A adição de corantes e essências depende do seu uso:

1. Corantes
  • A adição de corantes não é primordial, já que não traz nenhum benefício para a performance do produto. Trata-se de uma questão estética;
  • Caso você realmente deseje adicionar cor ao seu sabão, prefira os corantes naturais;
  • Os corantes alimentícios não são uma boa opção, mesmo os naturais, já que não possuem uma boa estabilidade no meio alcalino do sabão e, portanto, a cor final não será a mesma da desejada;
  • As argilas são uma óptima opção para colorir os sabões, proporcionando uma cor opaca e permanente, com a opção de grande variedade, além de serem naturais. Saiba onde comprar;
  • Se for usar o sabão caseiro para lavar roupas, não adicione os corantes, pois podem manchar as peças brancas.
2. Aromatizantes
  • O uso é oportuno para neutralizar o cheiro do óleo já usado;
  • Evite o uso de essências sintéticas que contêm parabenos e ftalatos, prejudiciais à saúde e ao meio ambiente;
  • Uma alternativa é o uso de fragrâncias isentas de ftalatos;
  • Pode-se também usar as essências aromáticas na água de diluição da soda, lembrando sempre de respeitar a quantidade indicada de 140 ml de água e 135 ml de soda cáustica. Porém, elas não produzirão aroma intenso, seu efeito é mais para neutralizar o cheiro característico do óleo de cozinha. Saiba como fazer sua essência aromática;
  • Outra opção é a adição do amaciante de roupas, porém fará com que seu sabão perca sustentabilidade;
  • Para lavar pratos, não são necessários os aromatizantes;
  • Uma boa opção é fazer uso do pó de alecrim – além de aromatizar, ele possui acção conservante sobre o sabão.

Obs: Como todo e qualquer produto de limpeza, mantenha o sabão caseiro fora do alcance de crianças.

Se você não quiser ou puder fazer o seu próprio sabão caseiro, procure postos que recebem óleo usado na seção postos de reciclagem do Portal eCycle.

Se você prefere sabão líquido, saiba como transformar seu sabão em barra na versão líquida na matéria:


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      https://www.ecycle.com.br/sabao-caseiro/

     

quinta-feira, 23 de março de 2023

INCITAMENTO À ‘GUERRA CIVIL EMOCIONAL’ (e à desobediência cívica, civil e ‘não-civil’)

Este GOVERNO PS – a continuar o trajecto que já iniciou – vai deixar-nos um legado que poderá levar gerações a desaparecer (ou destruirá para sempre a proverbial e extraordinária bonomia cultural e civil da sociedade portuguesa).

A estratégia defensiva deste governo – quando criticado e ao ver colocada em evidência a sua incompetência – tem sido sempre a mesma:

Colocar portugueses contra portugueses, apontando ‘inimigos’.

É – na minha opinião – uma atitude ‘criminosa’ e só possível devido à extrema mediocridade, incompetência e falta de sentido de estado dos ‘pulhíticos’ que estão no poder (se ‘eles e elas’ tivessem estado no poder em 1975, teríamos certamente tido centenas de milhares de mortos durante esse período revolucionário e colocado famílias contra famílias e classes contra classes, eventualmente para todo o sempre).

O ‘terrorista e criminoso’ Otelo e os seus comparsas das ‘FP 25 de Abril’ bem podem ser considerados uns ‘meninos bem-comportados’ pois só aterrorizaram, roubaram e cometeram ‘uma dúzia’ de assassinatos.

Este governo pode conseguir destruir para sempre uma das sociedades mais pacíficas e amigáveis que há neste planeta.

Eis alguns exemplos actuais (mas poderão adicionar mais…eu não o faço para não me alongar):

· A culpa é dos não vacinados! (lembram-se?)

· A culpa é dos médicos (e dos enfermeiros)!

· A culpa é dos professores!

· A culpa é dos pilotos!

· A culpa é dos proprietários de apartamentos!

· A culpa é dos estrangeiros, que não investem cá!

· A culpa é dos outros!

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PS:

Um amigo meu perguntou-me se o meu texto era um apelo à desobediência.

Eis o meu esclarecimento:

Não, na realidade o meu texto não é um apelo à desobediência.

Quem está com as suas acções a incitar a uma 'guerra civil emocional' pondo 'portugueses contra portugueses', apontando sempre culpados por problemas que a sua incompetência vai criando quase diariamente, é o governo.

…Tudo começou com 'Diga o que a Constituição diga', essa extraordinária 'máxima' do nosso primeiro-ministro.

A desobediência (uma vez que o sentimento de 'ódio' é incentivado pelo governo contra os 'culpados' ) poderá ser uma consequência vulgar e eventualmente, atraente o suficiente, para podermos ter o 'caldo entornado'.

Pergunta sem resposta:

Será que os '13 marinheiros' teriam feito o que fizeram se não tivesse havido o 'Diga o que a Constituição diga'  e todo um conjunto de acções ao longo dos últimos anos, que os incentivaram a pensar que 'Why not me too'?

Repito: o meu texto não é um apelo à desobediência (é 'simplesmente' a expressão do meu receio de que o governo - com as suas acções - esteja a incentivar ao ódio contra os apontados pelo governo, como 'culpados' e à desobediência, pondo portugueses contra portugueses e destruindo a nossa sociedade).

E peço desculpa pelas minhas limitações no uso da nossa língua, escrevendo textos que permitem mais que uma interpretação. MEA CULPA.

Um abraço

AFP

quarta-feira, 22 de março de 2023

Cerca de dois mil professores apresentaram baixa médica desde o início do mês.

O Ministério da Educação já tinha anunciado há cerca de um mês que seriam constituídas 7.500 juntas médicas para verificar situações de professores em baixa médica que "suscitam dúvidas".

Desde o início do mês de Setembro, já apresentaram baixa médica cerca de dois mil docentes, afirmou hoje o ministro da Educação, indicando que as 7.500 juntas médicas anunciadas para avaliar essas situações estão em fase de adjudicação.

Num balanço feito hoje em conferência de imprensa sobre a contratação de professores, o ministro João Costa na segunda reserva de recrutamento, cujas listas foram divulgadas hoje, estiveram a concurso 4.416 horários, dos quais cerca de dois mil decorrem de pedidos de substituição por baixa médica.
Em vésperas do início do ano lectivo, que arranca entre terça-feira e sexta-feira, essas duas mil baixas médicas foram apresentadas desde o início do mês de Setembro.
A propósito desse tema, o Ministério da Educação já tinha anunciado há cerca de um mês que seriam constituídas 7.500 juntas médicas para verificar situações de professores em baixa médica que "suscitam dúvidas".
"Estamos na fase de adjudicação", disse hoje João Costa, que esclareceu que o objectivo é avaliar padrões irregulares nos pedidos de baixa, casos que, segundo o ministro, criam "muita instabilidade na escola" e prejudicam os professores em regime de substituição.
São, no entanto, situações minoritárias, assegurou o responsável, sublinhando também que "não há um absentismo na profissão docente estatisticamente muito superior ao resto da administração pública".
Recentemente, estruturas sindicais e representantes dos directores escolares têm alertado para um possível aumento do número de baixas médicas no próximo ano lectivo, devido ao novo regime de mobilidade por doença.
A partir de Junho, esse regime, que permite aos professores mudar de escola por motivo de doença, passou a reger-se por um conjunto de novos critérios que, por exemplo, limitam a colocação dos docentes à capacidade de acolhimento das escolas.
Por outro lado, tornam obrigatória a componente lectiva, e definem uma distância mínima entre a escola de origem, a residência ou prestador de cuidados médicos e a escola para a qual o docente pede transferência. O objectivo, justificou na altura a tutela, era evitar situações de recurso abusivo à mobilidade por doença.
No entanto, perante as novas regras, os sindicatos do sector alertaram que muitos professores ficariam de fora e, de facto, segundo os resultados para o ano lectivo 2022/2023, só 4.268 dos 7.547 pedidos de transferência no âmbito desse regime foram aceites, o equivalente a 56%.
Comparativamente ao ano lectivo passado, quando cerca de 8.800 doentes tinham mudado de escola por motivo de doença, o número de professores em mobilidade caiu para menos de metade.
O Ministério da Educação comprometeu-se, entretanto, a analisar caso a caso os pedidos recusados, mas o processo ainda não arrancou, uma vez que a tutela solicitou um parecer jurídico depois de a Federação Nacional dos Professores ter questionado a legalidade desse procedimento.

09 de Setembro de 2022

https://www.sabado.pt/portugal/detalhe/cerca-de-dois-mil-professores-apresentaram-baixa-medica-desde-o-inicio-do-mes

segunda-feira, 20 de março de 2023

Programa vistos gold aumenta riscos de corrupção

É a quarta vez em 11 anos que Portugal ocupa a 33.ª posição no ranking do Índice de Percepção da Corrupção. Neste período de tempo esta é a pior marca. Vistos gold são uma das causas.

Marta Moitinho Oliveira e Infografia | PÚBLICO

A percepção sobre a corrupção que existe em Portugal manteve-se em 2022 ao mesmo nível que existia no ano anterior, mas no ranking mundial que compara 180 países Portugal perdeu um lugar quando se olha para a tabela que classifica os países e os ordena desde os mais transparentes aos mais corruptos. Esta trajectória colocou Portugal na 33.ª posição pela quarta vez em 11 anos, naquele que é a pior marca nesse conjunto de tempo. O programa vistos gold, cuja avaliação foi anunciada por António Costa há quase três meses, contribui para o aumento dos riscos de corrupção, considera a Transparência Internacional.

A conclusão pode ser retirada do Índice de Percepção da Corrupção para 2022, publicado esta terça-feira pela Transparência Internacional, uma coligação mundial de Organizações Não Governamentais (ONG) anticorrupção. De acordo com o relatório, Portugal obteve 62 pontos em 2022, o que corresponde à 33.ª posição no ranking mundial. Este registo permite concluir que a percepção sobre a corrupção no ano passado manteve-se estável em relação ao ano imediatamente anterior, quando o índice também tinha alcançado 62 pontos, mas a posição no ranking baixou um lugar quando comparada com a 32.ª posição conseguida em 2021.

A análise de uma série mais longa - a começar em 2012, o que permite juntar 11 anos de registo, mostra que o índice para Portugal se tem mantido estável. O ponto mais baixo aconteceu em 2020 quando somou 61 pontos e o mais alto em 2015 e 2018 quando registou 64 pontos.

Porém, a classificação na tabela, que depende também das movimentações dos outros países, variou mais. Em 2022, tal como em 2020, 2013 e 2012, Portugal ficou na 33.ª posição na tabela - a pior marca em 11 anos. O melhor resultado no ranking aconteceu em 2015 quando Portugal obteve a 28.ª posição.

Face à União Europeia, Portugal encontra-se com uma pontuação abaixo, já que este conjunto de países consegue 66 pontos, contra os 62 de Portugal.

A Transparência Internacional considera que "a escala do problema é enorme", já que a média global não se altera há 11 anos "e mais de dois terços dos países (122, no total) têm um sério problema de corrupção, com uma pontuação abaixo de 50".

A Dinamarca volta a encabeçar o índice deste ano, com 90 pontos, mais dois do que no ano passado, seguida da Nova Zelândia e Finlândia, com a mesma pontuação (87). Síria, Sudão do Sul (13) e Somália (12) continuam nos últimos lugares.

Entre os restantes países de língua portuguesa, Angola obteve 33 pontos, mais quatro do que em 2021, mas ainda longe do meio da tabela, ocupando a posição 116. No caso do Brasil, o índice marcou 38 pontos, sem alteração face a 2021, colocando este país no lugar 94 da tabela.

Estratégia e vistos gold

No relatório produzido para 2022, a Transparência Internacional assinala que, em Portugal, "a Estratégia Nacional Anticorrupção (ENAC) foi lançada sem directrizes ou plano de monitorização, resultando em fraca aplicação e implementação lenta de medidas dirigidas à prevenção da corrupção no sector público".

A ENAC, criada durante o segundo Governo de António Costa, tem como objectivos melhorar o conhecimento, a formação e as práticas institucionais em matéria de transparência e integridade; prevenir e detectar os riscos de corrupção na acção pública; comprometer o sector privado na prevenção, detecção e repressão da corrupção; reforçar a articulação entre instituições públicas e privadas; e garantir uma aplicação mais eficaz e uniforme dos mecanismos legais em matéria de repressão da corrupção, melhorar os tempos de resposta do sistema judicial e assegurar a adequação e efectividade da punição.

Nuno Cunha Rolo, presidente da Transparência Internacional Portugal e responsável pelo capítulo para Portugal, considera que os resultados deste índice para Portugal "decorrem da continuada incapacidade de sucessivos governos e governantes perceberem a imensa riqueza das lideranças e políticas anticorrupção, abertas, transparentes, participadas e íntegras, tanto no sistema político e administrativo, quanto nos sectores da economia e sociedade".

Este responsável acrescenta que "os casos recentes que se vão sucedendo nos media a ritmo vertiginoso, muito se devem à falta de vontade e visão políticas – no Governo e no Parlamento - em matéria de anticorrupção, transparência e integridade”.

A Transparência Internacional Portugal salienta que já antes "havia alertado para as deficiências da Estratégia Nacional Anticorrupção, nomeadamente por ignorar praticamente por inteiro a questão da corrupção política".

Outro dos problemas apontados pelo relatório com implicações na percepção da corrupção em Portugal prende-se com o regime dos vistos gold, devido ao aumento dos riscos de corrupção e ao facto de colocar pressão no mercado imobiliário. Segundo Karina Carvalho, directora executiva da Transparência Internacional Portugal, “o exemplo vistos gold é paradigmático das falhas identificadas porque coloca a nu não apenas a crónica falta de diligência devida, de controlo e de avaliação, suportada por sucessivos governos, mas sobretudo a enorme resistência em instituir a prevenção da corrupção, da fraude e do branqueamento de capitais enquanto política pública”.

A responsável acrescenta que “em muitas outras áreas, desde logo a da contratação, fundamental para o crescimento do país, mas também para a sua defesa e segurança, vemos uma atitude displicente por parte dos principais responsáveis políticos ante o comportamento escandaloso, e até mesmo criminoso, de quem foi mandatado para proteger o interesse público e o dinheiro" dos contribuintes.

Há quase três meses, o primeiro-ministro, António Costa, anunciou que o Governo estava a avaliar o regime que concede autorizações de residência a estrangeiros em troca de investimento no país em capitais, imobiliário ou criação de emprego. O chefe do executivo considerou que o regime de vistos gold "provavelmente já cumpriu a função que tinha a cumprir e que neste momento não se justifica mais manter".

Sobre Portugal, o relatório refere ainda que o sector da defesa precisa de "maior transparência e supervisão, fazendo notar que processos de contratação envoltos em secretismo e práticas de transparência financeira deficientes enfraquecem as salvaguardas contra a corrupção nas instituições de defesa" em Portugal.

sexta-feira, 17 de março de 2023

As grandes fortunas das antigas colónias

Tiveram os maiores barcos de Angola, fizeram corridas de carros em Jaguares, mandaram erguer igrejas com santos e bispos vindos da metrópole, a mesma metrópole de onde chegaram a enviar governantas para casas com ares condicionados instalados por portugueses. Na África de todas as oportunidades, alguns montaram negócios nunca vistos – como os pioneiros da cerveja e do whisky local –, outros enriqueceram com algodão, fazendas de gado e abacaxi ou conservas de atum.


Índice
1 O império de Manuel Vinhas
2 Whisky made in Angola
3 O prédio mais alto do Império
4 Uma missa para 3 mil pessoas
5 Os quatro irmãos Quintas
6 Angola, “querida Angola”

Nos anos 60, quando a Baía Farta ainda não tinha sequer banco, José Domingues Antunes já pagava milhares de contos em salários aos funcionários da fábrica de conservas Atlântico. O dinheiro vinha de Benguela, a 35 quilómetros de distância, em duas camionetas que faziam vários serviços para a empresa angolana.
Um dia, além do habitual pacote de notas, as famosas Austin e Scania trouxeram uma segunda embalagem, aparentemente igual mas recheada de carne – em vez de dinheiro. “Só que houve um engano e puseram o dinheiro no frigorífico e a carne no cofre. Isto aconteceu numa sexta-feira e na segunda toda a gente comentava o cheiro horrível que andava pelo edifício”, lembra divertido Armando Cardoso, de 75 anos, antigo funcionário da companhia.
O patrão, um português de Proença-a-Nova, era “um pioneiro que vivia numa das melhores (e poucas) casas de primeiro andar de Benguela”. Um reclame da época anuncia que mandou construir aquele que chegou a ser o maior barco de Angola, o primeiro a congelar peixe em alto mar quando nas antigas colónias ainda ninguém o fazia.
Foi também ele que, depois de uma viagem à Europa, decidiu importar uma caixa frigorífica de Itália para fazer igual na Baía Farta. “Levou-a para a carpintaria, mandou desmanchar e copiar. A primeira desfez-se toda na estrada. ‘Bem, vamos lá ver onde é que erramos e tentar de novo’, disse aos funcionários. E foi assim que começaram a circular camionetas com caixas frigoríficas na Baía Farta”, acrescenta Armando Cardoso.


A família de José Domingues Antunes (o primeiro da esquerda) no Sobrainho, em 1939.Arquivo pessoal

Quando o Presidente da República Américo Tomás visitou Angola, em 1963, desembarcou no cais da empresa. “A Atlântico era, na altura, uma das maiores fábricas de conservas da África Austral”, garante à SÁBADO Alexandre Soares, sobrinho-neto de José Domingues Antunes.
A primeira pescaria tinha sido inaugurada em 1940, nessa altura com barcos feitos de madeira portuguesa. “O meu avô cortava a madeira em Proença-a-Nova, a madeira ia de barco para Lisboa no rio Tejo e daí seguia para Angola. Foi assim que começaram a construir barcos de pesca. Mais tarde o meu avô, a minha avó e os filhos também foram para lá.
No início viviam numa praia desabitada, a 20 quilómetros de Benguela, numa barraca de madeira. Depois começaram a pescar cada vez mais, a fazer barcos maiores e a madeira já não ia daqui. A dada altura separaram os negócios: o meu avô ficou com uma pecuária e o meu tio-avô com a pescaria” que transformou nas conservas Atlântico.
“Quando cheguei, em 1963, já era uma fábrica muito grande, com seis ou sete barcos de pesca de atum, duas traineiras e esse arrastão, a jóia da coroa, que estava certificado para navegar no mar do Norte”, recorda Armando Cardoso. Ao lado da conserveira nasceu um estaleiro naval, depois uma carpintaria, várias oficinas e fábricas, salinas próprias e um bairro onde os trabalhadores viviam – os solteiros em quartos, os casados em casas com mobília, portas e janelas também elas fabricadas na Baía Farta.

O Pioneiro, da Fábrica de Conservas Atlântico, chegou a ser o maior barco de Angola

arquivo pessoal
Uma economia a crescer
Em 1967, quando adoeceu com papeira durante o serviço militar, Armando Cardoso pediu para ser retirado de Nova Lisboa para o hospital da Atlântico. “Estive lá um mês internado. Antes de fazer o hospital, o Sr. José Domingues Antunes já tinha oferecido um posto médico com condições para fazer pequenas cirurgias, como uma operação à apendicite, a Sobrainho dos Gaios, a terra onde nasceu. Pagava o médico, a enfermeira e a maior parte dos medicamentos.”
Anos mais tarde, além de Angola, a Atlântico passou a exportar para Itália e para os Estados Unidos e teve um representante na Beira, em Moçambique, onde a mulher do famoso jogador de futebol Eusébio, Flora, chegou a trabalhar, assegura Armando Cardoso.
E em 1973, pouco antes da revolução, Domingues Antunes estava a negociar a compra de pelo menos dois helicópteros para fazer o balizamento dos cardumes de atum. “Em vez de os barcos andarem no mar a fazer isso, podia-se fazer uma busca por avião e depois transmitir aos navios. A compra não avançou por causa do 25 de Abril”, explica o antigo funcionário.

Até 1974, nada fazia prever que José Domingues Antunes – e muitos outros portugueses – abandonassem Angola e Moçambique, terras onde tinham feito negócios e fortuna. Como os muitos portugueses que para lá emigraram – entre 1940 e 1960 só a população de Luanda passou de 60 mil para mais de 220 mil pessoas – o dono das conservas Atlântico foi à procura de oportunidades que não encontrava em Portugal.
E eram muitas: entre 1960 e 1970 a indústria cresceu sempre a dois dígitos e em alguns casos, como aconteceu com a extracção de diamantes e de ferro, acima dos 170%. Foram tempos de criação de novas empresas, com muito mais capital investido (mais 600% entre 1960 e 1972). Uma época em que o PIB disparou – entre 1970 e 1974 Angola cresceu em média 7,8% por ano – e em que se assistiu ao nascimento de vários novos empresários. E de muitas histórias, como as que vai continuar a ler aqui.


O emblemático hotel Presidente, em Luanda. Em 1971, Angola tinha 927 hotéis e 239 pensões. Os maiores em Luanda, Nova Lisboa e Sá da BandeiraJean-Charles Pinheira
O dono do Jaguar amarelo


Apesar de se ter feito rico, José Domingues Antunes não era dado a extravagâncias. Gostava de ir às termas ao fim de semana, mas não frequentava o Lobito Sports Club ou outros clubes onde os portugueses se juntavam, e continuou sempre a conduzir um Volkswagen Carocha.
Já o pai de Francisco Guedes, que em Angola todos conheciam como Farrobilha Guedes, apaixonou-se pelas corridas de carros e pelo autódromo de Luanda. “Foi durante vários anos corredor de automóveis. Começou com um Triumph TR4, muito famoso na altura e depois teve um Jaguar amarelo. O meu pai e o Manuel Vinhas [o milionário dono das cervejas Cuca] tinham dos melhores carros de Angola”, conta o seu único filho.
Luís Farrobilha Guedes chegou a Luanda em 1961, numa altura em que ninguém sabia o que eram frigoríficos. “Nem havia rede eléctrica, era preciso trabalhar a petróleo”, conta o filho. Ao fim de um ano, decidiu lançar-se por conta própria e abriu a Frigoríficos Polo Norte.
“Um dos nossos maiores clientes foi o Estado português, através das Forças Armadas. Vendemos milhões de frigoríficos e de arcas congeladoras para o exército português em Angola. Para as messes, quartéis, para todo o lado. Em 1967 já tínhamos 95 empregados e em 1970 abrimos uma filial em Moçambique.”
Dois anos depois, voltaram a inovar: “Fizemos a primeira linha de montagem de ares condicionados totalmente angolana em Angola”, acrescenta o filho, que ainda se ri quando recorda um dos slogans da marca – “Durma com a Amana e durma melhor.” A mãe, Albertina, foi essencial para o sucesso da empresa. “Não pode falar do meu pai sem falar da minha mãe”, garante o filho. “Era ela que comandava as oficinas. O meu pai liderava a parte comercial.”
Juntos construíram uma “fortuna considerável”, que além da casa no bairro de Alvalade, um dos melhores de Luanda, incluía um prédio de 16 andares que sempre arrendaram. “Todos os frigoríficos e ares condicionados que o primeiro Presidente de Angola [Agostinho Neto] tinha, era o meu pai que lhos oferecia. Eram amigos pessoais”, acrescenta.

O império de Manuel Vinhas

O apartamento que o empresário Manuel Vinhas mandou fazer em Luanda, no segundo piso da fábrica da Cuca, era um dos que à época já tinha ar condicionado. Quase de certeza fornecido por Farrobilha Guedes, adianta o filho. “Eram muito amigos”.
Ao contrário de Farrobilha Guedes, Manuel Vinhas não vivia em Luanda, mas passava cerca de seis meses por ano em Angola. Tempo suficiente para lá ter não só motorista, mas também governanta. Era a Dona Gracinda, que se mudou de Lisboa para Angola, quem se ocupava da casa com seis suítes, casa de jantar e uma sala envidraçada com ligação ao terraço.
Apesar de ser um dos homens mais ricos de Portugal, e herdeiro da fábrica de cervejas Portugália, foi em Angola que Vinhas mais fez crescer o seu império. Em 1972, no auge do império que construiu, tinha 53 empresas no País. Só a Companhia União de Cervejas de Angola (Cuca) dava emprego a 3.500 funcionários e faturava um 1,2 milhões de contos por ano (hoje mais de 300 milhões de euros).

Manuel Vinhas (ao centro) com a filha Rita e um amigo na Herdade do Zambujal, onde organizou grandes caçadasarquivo pessoal

“Em 1952 iniciámos em Angola a actividade cervejeira e por isso legitimamente reivindicamos para nós o título de pioneiros de uma indústria que, passados 20 anos, ainda é a primeira indústria transformadora de Angola”, disse Manuel Vinhas na assembleia-geral anual da Cuca desse mesmo ano.
Cerveja era Cuca”, garante à SÁBADO José Marques Leandro, 93 anos, que chegou a ser presidente da câmara de Nova Lisboa (hoje Huambo). “Havia três cervejeiras grandes em Angola: a Cuca, a Cristal e a Nocal. Mas só a Cuca era sinónimo de cerveja. Dizia-se muito: ‘Traz-me uma Cuca, mas de preferência Nocal ou Loira Tropical.” Não é que não se bebesse cerveja antes de Manuel Vinhas chegar a Angola – bebia-se, e muito – mas era importada e, por isso, mais cara.
Com o sucesso na cerveja, Manuel Vinhas foi abrindo novos negócios. Em 1965, para aproveitarem as borras que sobravam da produção de cerveja, começaram a produzir rações. Mais tarde tiveram participações em fábricas de caixas de cartão, de caricas e de vidro; produziram sumo de maracujá e vegetais, aventuraram-se na pecuária e na avicultura (com, em tempos, um milhão de galinhas); entraram nos meios de comunicação social de Angola.
Além de casas e de um grupo cultural e desportivo, os filhos dos funcionários tinham direito a creche – um dos brinquedos era a primeira camioneta de distribuição de cerveja que o empresário teve em Angola.
Vigiado pela PIDE desde que, em 1962 escreveu o livro Para um Diálogo sobre Angola, Vinhas nunca discriminou funcionários. Pelo contrário, conta-se ainda hoje em Luanda: quando percebeu que o bar América não aceitava negros ou mestiços, abriu outro, na mesma rua, com o cartaz “Servimos todas as raças”. Ali, só não se vendia vinho, a bebida preferida do maior industrial de cervejas de Angola, que já antes do 25 de Abril tinha uma das mais importantes fortunas portuguesas e uma das principais colecções de arte.
Nas 999 verbas listadas no inventário da sua herança, a que a SÁBADO teve acesso, cerca de 600 são quadros. Há duas colagens de Paula Rego, dezenas de quadros de Júlio Pomar (que fez o retracto do próprio Manuel Vinhas), Almada Negreiros, Cruzeiro Seixas, entre muitos outros pintores portugueses e estrangeiros.
Outra das suas grandes paixões eram as caçadas, que fazia em Angola, mas também em Moçambique. Chegou a viajar milhares de quilómetros de carro para perseguir elefantes, leões e muitos outros animais. Na época, os safáris liderados por portugueses duravam vários dias e tinham uma logística complexa. Numa das vezes em que foi a Moçambique com a mulher, Maria Alice Bustorff, que tratava por Concha, e os oito filhos, o camião que levava o material de apoio viajou 24 horas antes da família Vinhas.

Whisky made in Angola

Em Luanda, os fins de tarde eram muitas vezes passados nas esplanadas da Portugália e do Calhambeque, no bar do hotel Continental ou no Baleizão, famoso sobretudo pelos gelados. Além de imperiais e cervejas bebia-se muito gin tónico e whisky. Whisky que, a dada altura, também podia ser nacional.
“O primeiro whisky de Angola foi feito por um português e chegou a ser exportado para a África do Sul”, lembra Marques Leandro. “Era o whisky mais barato que havia, mas era uma mixórdia. Bebia-se muito com Seven Up”, recorda Floripo Salvador, responsável pela publicação virtual Recordações de Luanda. Marques Leandro concorda.
“Era uma aguardente wiskada, mas não era grande coisa. A empresa chamava-se Sociedade de Bebidas Espirituosas do Lobito (SBELL), mas depois inventaram-se outros nomes a brincar com as iniciais [e com a qualidade da bebida]. Os mais famosos eram: Se Beberes Este Líquido Lixas-te e Salazar Bebeu Este Líquido e Lerpou”, lembra divertido.


O whisky Sbell era produzido na cidade do Lobito, a 500 quilómetros de Luanda.

Além de uma moradia na fazenda do Lubango, Mário Ventura mandara arranjar uma casa no centro do Lobito. “Era um casarão enorme. Ele vivia no primeiro andar e o rés do chão estava alugado ao Banco Pinto & Sotto Mayor”, controlado por António Champalimaud, acrescenta Jorge Briosa.

O prédio mais alto do Império

O crescimento da banca foi, aliás, um dos reflexos da aposta de Portugal em Angola e Moçambique. “O número de dependências e agências bancárias em todo o território angolano, que era de 17 em 1960 (pertencentes a dois bancos), foi acrescido, entre 1961 e 1968, de 91 estabelecimentos suplementares pertencentes agora a cinco bancos”, escreveu Adelino Torres em Estratégia Colonial Portuguesa e Estruturas Económicas de Angola nos Anos 1960 e 1970.
Além do Pinto & Sotto Mayor, de António Champalimaud, estavam em Angola instituições financeiras como o Banco de Crédito Comercial e Industrial (BCCI), de Miguel Quina, que controlava um dos sete maiores grupos empresariais portugueses da época.
Tal como Miguel Quinta, também Artur Cupertino de Miranda já era rico antes de investir nas antigas colónias. “Foi pioneiro da banca em Angola e em Moçambique. O banco de Moçambique foi uma derivação do Banco Comercial de Angola (BCA), o primeiro banco privado de Angola, criado em 1956.”
A 28 de Janeiro de 1967, o BCA inaugurou uma nova sede naquele que seria, durante anos, o maior arranha-céus do império, com 87 metros de altura e 26 pisos. Para o evento, a administração encomendou um bolo à pastelaria mais famosa da cidade, a Paris-Versailles, que tinha fama de fazer bolos em forma de edifícios, conta Rita Garcia no livro Luanda como Ela Era.
“O bolo era tão grande que não cabia nas portas nem nos elevadores do BCA. Foi preciso descobrir uma forma de o içar para o terraço”, descreve. Para isso, teve de se pedir uma grua aos Serviços Municipalizados de Água e Electricidade. Na inauguração, que contou com um discurso de Cupertino de Miranda estava, claro, a elite de Luanda, que subiu ao 21º piso para beber champanhe.

António Champalimaud, com o Pinto & Sotto Mayor, foi um dos milionários portugueses que investiu na banca em Angola


De acordo com o livro Angola: Estrutura Económica e Classes Sociais, de Henrique Guerra, a “camada de colonos ricos” teria, então, “entre uma e duas centenas de famílias”. Juntos, os influentes empresários controlavam as maiores empresas agrícolas e pecuárias de Angola, mas também “a maior parte das indústrias de pesca e grande parte das indústrias transformadoras”, empresas de transportes, diversões e muitas outras. “As primeiras companhias de seguros foram criadas por esta camada.”
Venâncio Guimarães Sobrinho, sogro de Cardoso e Cunha, ministro da Agricultura e Pescas dos governos de Sá Carneiro e de Pinto Balsemão, foi outro dos empresários que teve uma grande influência na economia de toda a Angola. Antes do 25 de Abril as suas empresas já tinham um avião bimotor Piper, usado para deslocações mais longas.
O maior produtor de gado do Sul de Angola teve uma influência decisiva sobretudo no desenvolvimento dos distritos da Huíla e Cunene (Moçâmedes). “O Grupo Venâncio Guimarães estendia a sua actividade do comércio [incluindo o Jornal da Huíla], à indústria, agricultura e pecuária, passando pela pesca e pela exploração de carreiras rodoviárias. Esta última actividade teve um papel fundamental no desenvolvimento do Sul e Centro de Angola, porque [anos depois deu origem à EVA (Empresa de Viação de Angola) que durante muito tempo foi o único meio de transporte do comum das pessoas e de grande parte das mercadorias em trânsito, de e para o Huambo, Benguela e Cunene”, escreveu Fernando Cerviño Padrão, em A Colonização do Sul de Angola: 1485 a 1974.
Nascido em São Pedro do Sul em 1933, Venâncio Guimarães Sobrinho foi para Angola depois de sair da Escola Naval. Começou por trabalhar para a Venâncio Guimarães & Companhia, no Lubango, detida por um tio com quem partilhava o nome. Quando a parceria terminou, fez uma empresa concorrente, com o mesmo nome, que se tornou ainda maior e mais famosa.
Para o genro, Cardoso e Cunha, que se juntou a ele nos anos 60, Venâncio Guimarães sempre foi “o comandante”. Tal como acontecia com Manuel Vinhas, as chefias da empresa tinham casa no mesmo edifício onde funcionavam os escritórios. Alguns, como acontecia por vezes com Cardoso e Cunha, chegavam a descer de pijama para ir resolver assuntos de trabalho – e logo a seguir regressar a casa.

António Cardoso e Cunha trabalhou muito tempo com o sogro, Venâncio Guimarães Sobrinho, em Angolad.r.
Leston Bandeira foi trabalhar para Venâncio Guimarães Sobrinho pouco antes da independência de Angola, como director da Rádio Comercial. E acabou a ser despedido – tal como a restante direcção – pelo empresário português. “Fomos os 4 despedidos porque o Venâncio Guimarães Sobrinho disse uma frase muito engraçada: ‘Eu não pago para que digam bem de mim, mas seguramente também não lhes pago para que digam mal.’”
E a Rádio, admite Leston Bandeira, “dizia mal de toda a gente”, incluindo do partido no poder, o MPLA. “Foi a primeira rádio livre em que trabalhei. Nós éramos todos marxistas, só mais tarde percebemos que o marxismo era uma coisa do século XIX. E acabámos obviamente por ser demitidos.” Venâncio Guimarães Sobrinho era, diz, “um homem soft e sóbrio, que investia muito em Angola e era membro do conselho legislativo do País”. A dada altura entrou, também, no negócio das cervejas. “Criou, com capitais sul-africanos, a fábrica da N’gola.”
Leston Bandeira voltaria a trabalhar para ele depois da Independência de Angola, quando o MPLA o colocou como administrador de uma fábrica de farinha do empresário. “Nessa altura eu ainda fazia parte da direção política do Sul do MPLA e os meus colegas pediram-me que fosse para lá.” Quando chegou ao Lubango começou logo a ter problemas com um dos cinco administradores colocados pelo MPLA.
Estávamos numa reunião, eu distribui um documento e vi que ele estava a lê-lo de pernas para o ar. Chamei o Santos, que me tinha convidado e disse-lhe: ‘Olha, aquele fulano, mandei-o para a escola, porque ele é analfabeto. E para administrar uma fábrica como esta é preciso gente competente, senão não estou aqui a fazer nada.”

Uma missa para 3 mil pessoas


Quando as havia, as excentricidades dos colonos não se limitavam a Jaguares ou a caçadas longínquas. Podiam, também, ser religiosas. Quando o telegrama chegou a Sisal do Bocoio, a 80 quilómetros do Lobito, em Angola, o gerente da enorme herdade onde José Lopes Ferreira dava emprego a 2 mil pessoas, a maior parte delas em plantações de abacaxi, entrou em pânico.
A ordem do patrão, um velho colono que indiferente ao calor vestia sempre fato de linho branco e gravata, era muito clara: “acaba a capela rapidamente porque eu vou no barco e levo uma imagem igual à da Nossa Senhora do Mont’Alto para pôr aí”, lembra José Marques Leandro, que na altura trabalhava na câmara do Lobito. “O gerente ficou muito aflito e chegou a pedir ajuda ao empreiteiro da câmara. ‘Eu pago, eu pago’”, acrescenta.

A inauguração do santuário do Mont'Alto, num artigo de três páginas d'A Comarca de Arganil


Apesar de todos os esforços, quando o comendador chegou – acompanhado pelo Bispo de Coimbra e pela imagem – a capela que mandara construir à semelhança da que havia na terra onde nascera, no concelho de Arganil, ainda não estava pronta.
Nem por isso a inauguração foi adiada: no dia 15 de agosto de 1964, pela primeira vez na história, celebrou-se missa na colina que viria a ser conhecida por Mont’Alto. A imagem que chegara de Portugal foi colocada num andor construído propositadamente para a ocasião no Lobito. Para o carregar, organizaram-se três turnos, de quatro pessoas cada (Marques Leandro integrou o primeiro).
Depois da procissão, a que assistiram mais de 3 mil pessoas e seis sacerdotes, seguiu-se um enorme banquete. “Qualquer pessoa vulgar desistiria de dar almoço a todos os que naquela hora se encontravam no Mont’Alto de Angola. Mas o comendador José Lopes Ferreira não é uma pessoa vulgar. E, assim, deu ordens para que fossem mortos bois, porcos, galinhas, sem calculismo de quem tem medo de desperdícios. Fez transportar para o local camionetas carregadas com pipas de vinho, cerveja, whisky e muitas outras bebidas. De véspera, pedira a pessoas da Sarnadela [a terra onde nasceu] que fossem para o Mont’Alto a tempo de prepararem torresmos à maneira de Santa Quitéria, em Pombeiro da Beira”, escreveu o jornal Comarca de Arganil a 22 de agosto de 1964.
“Agora entronizada entre nós, rogamos-vos, Nossa Senhora do Mont’Alto: amparo, proteção, bênção e paz para todos os habitantes de Angola”, rezou o comendador José Lopes Ferreira.
Nos dias seguintes, as obras continuaram. Não apenas da igreja: ao lado da capela foi construída uma escola destinada não só aos quase 2 mil operários que trabalhavam naquela fazenda, como a outras pessoas que vivessem nas redondezas. Ao lado do Santuário, onde passou a haver missa todos os domingos, ficou também a casa do chamado “ermitão”, o homem que dia e noite velaria por aquele local sagrado.
José Lopes Ferreira era tão católico que costumava dizer que as mulheres mais caras que tivera na vida eram freiras. “As freiras de um colégio que ele ajudava”, conta divertido Marques Leandro. Quando chegou a Angola, vindo da Sarnadela, dificilmente imaginaria que ia fazer fortuna com plantações de abacaxi.
“À noite, quando regressei ao Lobito com o filho [tinha, além deste, duas filhas], parámos no meio do caminho na casa comercial onde o pai tinha começado a trabalhar. O velho soba disse-lhe: ‘Quando vieste para cá tinhas as meias rotas e agora tens muito dinheiro.’”
Outra empresa muito grande, acrescenta Marques Leandro, era a Jomba. “Tinha a concessão de uma água mineral que exportava com grande êxito principalmente para a África do Sul, que tem muita água, mas não tem minerais. Mas a maior atividade era uma fábrica de bombons e rebuçados.”
O dono da Jomba e da Ossi, Lisboa Fernandes, chegou a ser vice-presidente da câmara do Lobito. “Dizia que em Angola tinha açúcar, coisa que em Portugal não havia, e mão de obra. Só faltavam os técnicos, que levou para lá. O grande importador era a Favorita, que a dada altura quis comprar a empresa. Mas ele não vendia, era muito empreendedor”, acrescenta.



Em casa de Marques Leandro, os bombons da Jomba eram uma das guloseimas mais procuradas. “De vez em quando levava-me umas caixas de muitas variedades. Os meus filhos eram miúdos e andavam sempre à procura dos chocolates.”

Os quatro irmãos Quintas


Quando os portugueses começaram a investir em Angola, o petróleo da época era o café, que entre 1946 e 1972 foi a principal exportação do País, recorda Onofre dos Santos. “Grandes exportadores de café portugueses, como os Mota, eram uns cinco ou seis. Depois havia importantes empresários agrícolas, como o Venâncio Guimarães Sobrinho, e outros que diversificaram muito os negócios, como o Manuel Vinhas e o Mabílio de Albuquerque. No comércio, por exemplo, os Armazéns do Minho, que ainda lá estão, até tinham uma peça feita pelo famoso artista português Querubim Lapa numa das fachadas. E os Quintas & Irmão tinham lá um grande e muito emblemático estabelecimento comercial”, o maior de Luanda.
A Quintas & Irmão era uma das lojas mais concorridas da baixa da capital. Pertencia não a um, mas a quatro irmãos, que além de um estabelecimento comercial multiproduto tinham uma grande distribuidora de gás (Gás Quintas), uma fábrica de tintas e metade do capital da cervejeira Eka.
“Dois viviam em Luanda, o António e o Júlio, os outros dois [Joaquim e Armando] mais em Portugal”, confirma à SÁBADO uma pessoa próxima da família. Vendiam de tudo: de frigoríficos a muitos outros eletrodomésticos, passando por talheres, porcelanas, cristais ou canetas Dupont e Parker. No Natal, era ali que os portugueses iam comprar brinquedos – alguns feitos em Angola, outros importados. Como também se importava o bacalhau que os portugueses continuaram sempre a comer (tal como a feijoada e o cozido à portuguesa) e a roupa.

Porque só “após 1966 foi permitida a instalação nas colónias do setor têxtil, até então interdito com receio de forte concorrência à indústria da metrópole”, escreve-se em A Evolução Económica de Angola Durante o Segundo Período Colonial, de Nuno Valério e Maria Paula Fontoura. Quatro anos depois, em 1970, o têxtil era já a segunda maior indústria de Angola.

Um dos maiores empresários do setor era Manuel Lagos, tio da jurista Rita Amaral Cabral, a mais famosa namorada de Marcelo Rebelo de Sousa. “Tinha, além de algodão, várias fazendas em Angola”, diz uma fonte próxima.


O interior do Pão de Açúcar, em Luanda, o primeiro hipermercado em todo o território português.DR


Foi a negociar algodão que o Entreposto, à época a maior companhia de Moçambique, começou a fazer-se grande. A mais antiga empresa do grupo, a Companhia Nacional Algodoeira, foi criada em 1926 numa sociedade entre José Dias da Cunha, pai de António Dias da Cunha, antigo presidente do Sporting, e o seu companheiro de caça, Joaquim Palhinha.

Mais tarde, com a semente do algodão, começaram a fazer óleos comestíveis. Depois vieram os carros, (primeiro com a representação da Mercedes, Peugeot e Massey-Ferguson) e a importação e exportação de vários produtos, incluindo petróleo. Só em 1967 o Grupo Entreposto, que nasceu em Moçambique, expandiu a sua atividade para Portugal, onde começou por vender carros Nissan (na altura Datsun).

Outra empresa muito grande, que ainda hoje se mantém em Moçambique, surgiu com João Ferreira dos Santos, que nasceu em Baraçais, no Bombarral, em 1878, e veio para Lisboa ainda miúdo. Foi na capital, onde começou por trabalhar numa farmácia, que ouviu pela primeira vez falar das potencialidades de África. A 24 de janeiro de 1897, na altura com 19 anos, embarcou no cargueiro Zaire com destino à Ilha de Moçambique.

Ainda estava no barco quando conheceu José António dos Santos, também do Oeste, que lhe deu emprego numa pequena loja da Ilha de Moçambique. Ao fim de oito meses, lançou-se por conta própria. E foi assim que começou a construiu um império com várias áreas de negócio – além do algodão há chá, castanhas e amêndoas de caju, investimentos na pecuária e na indústria, projetos imobiliários, de energia, metalomecânica, automóvel e até fábricas de bicicletas.
Quando o neto – com o mesmo nome – morreu, em 2015, a João Ferreira dos Santos era uma das 10 maiores empresas portuguesas em Moçambique. Continua, até hoje, nas mãos da mesma família.

Angola, “querida Angola”

Tal como os Ferreira dos Santos, também Francisco Guedes mantém a Frigoríficos Polo Norte. “Com o 25 de Abril, os meus pais venderam a atividade em Moçambique e ficaram só com a de Angola, da qual sou herdeiro. Os frigoríficos Polo Norte têm, agora, cerca de 15 funcionários. Nas outras empresas somos uns 140”, diz à SÁBADO. Outros, como Manuel Vinhas, tiveram que abandonar o país depois das independências.

Antes da Revolução, os cinemas de Luanda já passavam os grandes êxitos de HollywoodJean-Charles Pinheira
A 19 de agosto de 1975, já exilado no Rio de Janeiro, e depois de uma ida ao estádio do Maracanã, o empresário escreveu (no livro Profissão Exilado) um relato emotivo sobre Angola. E sobre um regresso que não chegou a acontecer.
“Nas bancadas, um gigantesco batuque africano que me transporta à outra margem do Atlântico. Onde jogadores também morenos fazem as mesmas imaginosas, astuciosas, diabólicas piruetas; onde acontecem as mesmas imprevistas e desconcertantes mudanças de ritmo; onde, sem comunicação telepática e só por obediência às raízes, se desenham os mesmos gestos dos passistas de samba. Onde é Angola. Onde voltarei um dia, quando for governada por angolanos, livre, como espero, das proibições, dificuldades e ameaças a que fui sujeito antes por extremistas da direita, e agora por extremistas da esquerda. Onde continua a ser terra de esperança, e me recuso a aceitar que seja de desilusão. Onde pedi para ser enterrado, quando há alguns anos a minha vida perigou, mas, sobretudo, onde desejaria viver. Querida Angola.”

António Champalimaud com a família e amigos numa caçada em Moçambique. Em cima, João F. Mayer, Cristina Lino, João Champalimaud, Isabel L. Marques; em baixo: Luís e António Champalimaud e Maria da Luz Abreuarquivo pessoal


Champalimaud, o colosso dos cimentos
O milionário António Champalimaud ainda não tinha 27 anos quando embarcou para Moçambique para reconstruir os Cimentos da Matola. Antes de lá chegar, fez escala em Angola e começou a cimenteira do Lobito.
“A Companhia dos Cimentos de Angola tinha uma grande fábrica no morro fronteiro à cidade do Lobito”, recorda Marques Leandro. “Também tinham fábricas em Luanda e na Beira [em Moçambique] e controlava a Siderurgia Nacional de Angola. Exportavam cimento para todo o lado”, acrescenta o antigo presidente da câmara de Nova Lisboa.
Além da indústria, o grupo português estava nos seguros (com a Companhia de Seguros Fidelidade Atlântica), era acionista da Nocal (Empresa de Cervejas de Angola) e do jornal O Comércio, e controlava o Banco Pinto & Sotto Mayor, uma das instituições financeiras que mais crédito concedia em Angola e que estava, também, em Moçambique. António Champalimaud era um apaixonado por África.


Espírito Santo, os donos do açúcar
Em 1970, o Grupo Espírito Santo (GES) era dono da maior fazenda de café do mundo, na Gabela, responsável por cerca de 10% do café produzido em Angola. Também era do GES o monopólio da produção de açúcar, através da Companhia Agrícola do Cassequel e da Companhia do Açúcar de Angola, que controlavam muitas outras empresas de menor dimensão, nomeadamente fazendas de sisal e de bananas.
Tinham, além disso, uma empresa na área da construção, a Cimianto de Angola. Em 1973, participaram na fundação, em Luanda, do Banco Interunido, uma filial comum do Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa (BESCL) e do First National City Bank, do milionário americano John D. Rockefeller.
Foi também com Rockefeller e com o grupo colonial Motta Veiga que criou a Companhia de Fosfatos de Angola (COFAN). José Maria do Espírito Santo, Manuel Ribeiro e António Espírito Santo foram os maiores impulsionadores dos negócios em África.




CUF, o monopólio da navegação
A CUF, o maior grupo industrial português, dominava o negócio da navegação em Angola, através da Companhia Nacional de Navegação. Tinha, além disso, vários outros negócios no País: o milionário Alfredo da Silva era dono de fábricas de sabões e de óleos, de empresas de pesca e de roças de palmares, mas também de participações em produções de gado e de tabaco.
No comércio, era acionista dos supermercados Pão de Açúcar, uma parceria com investidores brasileiros. Desde 1966 estava também na banca, com o Banco Totta Standard de Angola e na fábrica de sacaria (de sacos, portanto) SIGA. Em Moçambique estava igualmente no negócio da navegação e na indústria. No fim dos anos 60, começou a investir no turismo dos dois países, com a Navetur.


Cupertino de Miranda, pioneiro da banca
Era acionista fundador do Banco Comercial de Angola, o primeiro banco privado do País, com 50% do capital. Em 1970, o BCA internacionalizou-se para Moçambique, com agências em Lourenço Marques, Beira e Nampula.
Era através desta instituição financeira que Cupertino de Miranda controlava participações maioritárias numa dezena de empresas, como a Algodoeira de Fomento Colonial, a Alumínio Português (Angola) e a Vidrul. Era, também, o principal acionista privado de uma das maiores têxteis de Moçambique, a Text’África, que tinha aeroporto, avião, 350 casas para os trabalhadores e até um caçador.
“A equipa de futebol da Text’África foi a primeira campeã nacional de Moçambique e a equipa de tiro aos pratos campeã de Portugal”, conta Frederico Magalhães, filho de Manuel Magalhães, que geriu a empresa.


O famoso prédio azul da Cuca, em Luanda, com 12 pisos, onde o empresário Manuel Vinhas fez um apartamentoJean-Charles Pinheira
Uma saída atribulada
José Domingos Antunes pegou em quatro barcos com os trabalhadores e famílias que quiseram embarcar, e rumou à África do Sul . “Um dos navios foi vendido lá, para pagar as despesas da viagem”, diz à SÁBADO o antigo funcionário Armando Cardoso.
A ideia era ficar em Lisboa mas, como não os deixaram atracar, seguiram para o Brasil.” Do outro lado do Atlântico, e sem autorização para trabalhar em águas territoriais brasileiras, pescavam ao largo e vendiam em alto mar, o que não era rentável – os navios acabaram por ser vendidos.

Ana Taborda

https://www.sabado.pt/vida/detalhe/as-grandes-fortunas-das-antigas-colonias