terça-feira, 26 de dezembro de 2023

As borras de café podem tornar o betão mais forte. E não é pouco, bastante.

Se a sua manhã não pode começar sem café, não é o único: em todo o
mundo, bebemos mais de 2 mil milhões de chávenas de café por dia, o que
dá origem a 60 milhões de toneladas de borras de café molhadas e gastas
todos os anos.

Apenas uma pequena parte é reutilizada - sobretudo como fertilizante
para o solo - sendo a grande maioria incinerada ou depositada em
aterros. Aí, tal como outros compostos orgânicos, as borras de café
decompõem-se e libertam metano, um gás com efeito de estufa 25 vezes
mais potente do que o dióxido de carbono para reter o calor.
Agora, os investigadores afirmam que as borras de café podem ser
utilizadas como ingrediente no betão, podendo mesmo torná-lo mais forte,
de acordo com um estudo recente.

"Tivemos esta ideia durante uma chávena de café", afirma Rajeev
Roychand, investigador da Faculdade de Engenharia da Universidade RMIT
em Melbourne, Austrália, que liderou o estudo. "Torrámos o café moído
usado na ausência de oxigénio e obtivemos algo chamado biochar. Quando o
adicionámos ao betão como substituto da areia, aumentou em 30% a
resistência do material."
...
Pequenos reservatórios
O betão é composto por quatro ingredientes básicos: água, gravilha,
areia e cimento. É o material de construção mais utilizado em todo o
mundo e gastamos 30 mil milhões de toneladas por ano, três vezes mais do
que há 40 anos.

Roychand e a sua equipa substituíram parcialmente a areia por biochar -
um material semelhante ao carvão vegetal - derivado de resíduos de café;
obtiveram o melhor resultado quando substituíram 15% da areia e cozeram
os grãos a 350 graus Celsius. O betão resultante era 30% mais forte do
que o betão normal em termos de resistência à compressão - a capacidade
do material para suportar uma carga.
No betão normal, a água, o seu segundo maior ingrediente em volume, é
absorvida pelo cimento ao longo do tempo, reduzindo a quantidade de
humidade que ainda se encontra no interior do betão, explica Roychand.
Este efeito de secagem, conhecido como dessecação, provoca retração e
fissuras em microescala, enfraquecendo o betão.
O biochar de resíduos de café pode reduzir este processo natural. Quando
o biochar é misturado com o betão, diz Roychand, as suas partículas
atuam como pequenos reservatórios de água, distribuídos por todo o
betão. À medida que o betão assenta e começa a endurecer, o biochar
liberta lentamente a água, essencialmente reidratando o material
circundante e reduzindo o impacto da retração e das fissuras.
"Estaríamos a desviar estes resíduos e a transformá-los num recurso
valioso", defende Roychand. "Existe também uma escassez de areia e,
mesmo que substituamos uma parte dela, estamos a melhorar o aspeto da
sustentabilidade e, lentamente, podemos chegar a uma fase em que uma
parte significativa da areia pode ser substituída por diferentes
materiais residuais."

"Subproduto de elevado valor"
De acordo com Kypros Pilakoutas, professor de inovação na construção na
Universidade de Sheffield, no Reino Unido, que não esteve envolvido na
investigação, o estudo é intrigante do ponto de vista tecnológico.

No entanto, considera improvável que o betão produzido desta forma venha
a ter uma utilização generalizada em aplicações de grande escala. "O
principal problema dos resíduos é sobretudo a recolha e o tratamento",
aponta. "Embora fosse ótimo recolher todas as borras de café de um país,
os custos associados seriam consideráveis e proibitivos."

Acrescenta ainda que a pirólise - o processo através do qual o biochar é
produzido - não é isento de custos e acredita que é improvável que altas
concentrações de carbono no betão aumentem a sua durabilidade a longo prazo.

Roychad salienta que a recolha de resíduos já é uma prática corrente e
que várias empresas na Austrália estão a concentrar-se na reciclagem de
resíduos de café. Acrescenta que o custo da pirólise está principalmente
relacionado com o investimento inicial em equipamento e que o biochar é
produzido a uma temperatura muito inferior à do cimento - 350 Celsius em
comparação com cerca de 1.450 Celsius. "Mas estamos a perder outros
benefícios", argumenta, "uma vez que o material residual que acaba em
aterros exige custos para a sua eliminação. Agora pode ser convertido
num subproduto de elevado valor."

O ingrediente do betão que mais contribui para as alterações climáticas
é o cimento - que foi responsável por 8% das emissões globais de CO2 em
2021, de acordo com o think tank Chatham House - e Roychand acredita que
o aumento da resistência do betão em 30% torna viável a diminuição do
teor de cimento em até 10%, reduzindo o seu impacto climático.

Segundo Roychand, a descoberta já atraiu o interesse tanto de empresas
de construção como de organizações que reciclam borras de café, e a sua
equipa está agora a trabalhar com autarquias locais na Austrália para
iniciar demonstrações no terreno.

"Uma das coisas que vamos fazer é monitorizar o betão ao longo do tempo,
durante seis meses a um ano", adianta. "Isto irá garantir que o biochar
mantém as suas propriedades ao longo do tempo."

https://www.msn.com/pt-pt/noticias/other/as-borras-de-caf%C3%A9-podem-tornar-o-bet%C3%A3o-mais-forte-e-n%C3%A3o-%C3%A9-pouco-bastante/ar-AA1lZ4LR?rc=1&ocid=winp1taskbar&cvid=fec5f95c809b4276aef1f1c349d7ed9f&ei=33

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