terça-feira, 28 de janeiro de 2020

Chicão conduzirá o CDS à unidade?

Cheira-me que Francisco Rodrigues dos Santos quer tornar o CDS num partido vintage. Para já, foi a uma loja de antiguidades e trouxe de lá um Manuel Monteiro em 2ª mão, para restaurar.

Ainda não percebi bem o que é Francisco Rodrigues dos Santos. Jornalistas e comentadores insistem em referir-se a ele como um jovem conservador, mas tenho dúvidas. Parece-me mais um hipster. O seu objectivo não parece ser tanto conservar, mas sim trazer de volta coisas datadas do antigamente, como os hipsters fazem com os gira-discos e os álbuns de vinil, ou com aquelas malas velhas sem rodinhas. Cheira-me que Francisco Rodrigues dos Santos quer tornar o CDS num partido vintage. Para já, foi a uma loja de antiguidades e trouxe de lá um Manuel Monteiro em 2ª mão, para restaurar. Agora é ir ao OLX à procura de peças. E às caixas de comentários à procura do discurso. Com uma pintura, Monteiro vai ficar como velho.

Também já se começam a ouvir zunzuns sobre os valores da família. No CDS, valores da família é o eufemismo para discutir o aborto e o casamento entre pessoas do mesmo sexo. (Já no PS, por exemplo, é o eufemismo para arranjar empregos aos parentes de Carlos César). Sinceramente, do pouco que conheço de Rodrigues dos Santos, acho que ele não se vai pôr já a questionar as diferentes concepções de família que há na sociedade portuguesa. Se há pessoa que tem um modelo de família incomum em que, tenho a certeza, mais ninguém se revê, é ele. Afinal, trata-se de alguém que pôs a mãe da noiva a trabalhar consigo na Comissão Política do CDS. Sim, leram bem: Francisco Rodrigues dos Santos vai ser chefe da própria sogra. Admito que haja quem ache isto normal, mas julgo que foi para modernices dessas que se inventou o conceito de “anti-natura”. A sogra é para tomar conta dos netos, não é para ter reuniões de trabalho. FRS está à vontade para ser colega da mãe da mulher, mas então não lhe chame sogra, chame-lhe outra coisa. A sociedade não está preparada para esta bandalheira.

Talvez a maior preocupação de FRS seja, para já, a de agregar as diversas tendências e sensibilidades do CDS.  Se o CDS tem abundância de alguma coisa, é de tendências e de sensibilidades. Num dia sente-se mais conservador, noutro mais liberal, às vezes acorda a pensar na lavoura, outras vezes é nos pensionistas, há alturas em que é europeísta, outras em que é eurocéptico. Enfim, são mesmo muitas tendências e sensibilidades. O que é um paradoxo para um partido que tem uma visão tão tradicional da sexualidade. Mas a verdade é que, neste momento, o CDS tem quase tantas facções como eleitores. Daí que o Congresso tenha acabado com o novo líder a apelar à unidade. Um apelo que é desnecessário, pois há algum tempo que o CDS caminha, paulatinamente, em direcção à unidade. Já faltou mais para ter apenas 1% dos votos.

José Diogo Quintela – Observador

segunda-feira, 27 de janeiro de 2020

As 100 perguntas do juiz Carlos Alexandre a António Costa. Encenação, memorando e Marcelo.

A segurança de Tancos, a recuperação das armas e a relação de Azeredo Lopes com a PJM. Carlos Alexandre quer que Costa explique quem, quando, onde e porquê. Mas também quer saber o que sabia Marcelo.

As perguntas chegaram ao gabinete de primeiro-ministro ao início da tarde de sexta-feira, 24 de Janeiro. A partir daí, começou a contar o prazo de 15 dias — excepcionalmente alargado, por causa do grande número de questões — para que as respostas sejam devolvidas ao Tribunal Central de Instrução Criminal. Todas escritas por Carlos Alexandre, as 100 questões resumem aquilo que o juiz de instrução considera ser o que de mais importante António Costa terá para contar ao tribunal.

Em quase todas elas, o magistrado pergunta ‘quando’ ou ‘quem’ ou ‘como’ ou ‘onde’. Em várias junta todas essas interrogações. Das fragilidades na segurança dos Paióis Nacionais de Tancos, à investigação ilegal feita pela Polícia Judiciária Militar, quando o caso já estava entregue à PJ civil, passando pelo conhecimento que o líder do governo tinha — ou não tinha — da forma como a recuperação do material militar estava a ser preparada, numa encenação que viria a ser revelada pela investigação, com o envolvimento do próprio director da PJM.

Mas o juiz Carlos Alexandre não quer saber apenas o que António Costa sabia. Ao primeiro-ministro também pergunta o que é que outros sabiam. Azeredo Lopes, naturalmente, mas também Marcelo Rebelo de Sousa. Na lista das perguntas há várias questões sobre que informações teriam chegado ao Presidente da República, directamente ou através da sua Casa Militar.

Quanto ao armamento desaparecido, o magistrado questiona mesmo se outros países fizeram perguntas sobre o material roubado e se o primeiro-ministro sabia que o mesmo tipo de armas tinha sido usado em atentados terroristas.

    1. Antes do Assalto aos Paióis Nacionais de Tancos (doravante PNT), tinha conhecimento das condições físicas e de segurança daquelas instalações militares?

    2. O arguido AZEREDO LOPES, enquanto Ministro da Defesa Nacional, tinha conhecimento das condições físicas e de segurança dos PNT?

    3. Quando soube do assalto aos PNT?

    4. Por quem soube?

    5. Quando falou pela primeira vez, com o arguido AZEREDO LOPES, ministro da Defesa Nacional, sobre o assalto aos PNT? Qual o conteúdo da conversa?

    6. E com o Chefe do Estado Maior General das Forças Armadas? Qual o conteúdo da conversa?

    7. E com o Chefe de Estado Maior do Exército? Qual foi o conteúdo da conversa?

    8. Falou sobre o assalto aos PNT com:

    • Arguido Luís VIEIRA, director da PJM (PJ Militar)?

    • Com sua Excelência o Ministro dos Negócios Estrangeiros?

    • Com sua Excelência a Senhora Secretária-Geral do Sistema de Segurança Interna?

    • Com sua Excelência a Senhora Secretária-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa

    • Com Sua Excelência o senhor Presidente da República?

    • Outros, mesmo não portugueses? Quem?

    • Quando? Em que moldes? Qual o conteúdo desses contactos/conversas? Que cenários lhe foram apresentados? Por quem?

      A pergunta 8

      Falou sobre o assalto aos PNT com: Arguido Luís VIEIRA, director da PJM (PJ Militar)?; Com sua Excelência o Ministro dos Negócios Estrangeiros?

      Com sua Excelência a Senhora Secretária-Geral do Sistema de Segurança Interna?; Com sua Excelência a Senhora Secretária-Geral do Sistema de Informações da República Portuguesa; Com Sua Excelência o senhor Presidente da República?

      9. Foi informado das conclusões da reunião extraordinária da UCAT que teve lugar no dia 30-06-2017?

      10. Teve conhecimento da lista de material de guerra subtraído? Quando? Por quem?

      11. Soube que nessa lista de material estava material de guerra idêntico a outro que já foi usado em ataques terroristas?

      12. Ponderou a adopção de algumas medidas, de âmbito nacional e internacional, em concreto? Quais?

      13. Teve conhecimento de que embaixadas de vários países, sobretudo de nações integradas na Comunidade de Países de Língua Portuguesa e na NATO, pediram informações ao Ministério dos Negócios Estrangeiros português sobre a localização do material militar e sobre os procedimentos que foram adoptados pelas autoridades portuguesas? Em caso afirmativo, em que altura? De que países?

      14. Teve conhecimento da Nota para a Comunicação Social da PGR, de 04/07/2017?

      15. Quando? De que forma?

      16. Em face disso, ficou ciente de que o processo-crime onde se investigava o assalto aos PNT passou a ser da titularidade do DCIAP?

      17. Ficou ciente de que o processo-crime onde se investigava o assalto aos PNT passou a ser investigado exclusivamente pela PJ?

      18. E que a PJM passaria, unicamente, a prestar colaboração institucional à PJ?

      19. Sabe qual a relação do arguido Azeredo Lopes, ministro da Defesa Nacional, com o arguido Luís Vieira, director da PJM?

      20. Sabe como o arguido Luís Vieira reagiu à decisão da PGR? Por quem? Quando?

      21. Falou com o arguido Azeredo Lopes, ministro da Defesa Nacional, sobre a reacção do arguido Luís Vieira, director da PJM, à Nota para a Comunicação Social, da PGR, e ao facto de a PJM ter sido afastada da investigação no processo-crime?

      22. Quando? Qual o conteúdo dessa conversa?

      23. Sabe se o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, manteve encontros no Ministério da Defesa Nacional e fora das instalações do Ministério da Defesa Nacional, com o arguido Luís VIEIRA, Director da PJM, para falarem sobre a evolução do processo de Tancos?

      24. Sabe se o arguido Azeredo Lopes e/ ou o arguido Vieira mantiveram contactos, com  o mesmo objectivo, com o Tenente-General João Luís Ramirez de Carvalho Cordeiro, Chefe da Casa Militar do Presidente da República?

      25. Por quem soube? Quando soube? Quando foram? Onde foram? Quem esteve presente?

      26. Qual o objectivo desses encontros e contactos?

      27. O que resultou dos mesmos?

      28. Sabe se o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, foi informado pelo arguido Luís VIEIRA, Director da PJM, de que este não iria cumprir a decisão da Procuradora-Geral da República e que tinha decidido que a PJM iria efectuar uma investigação paralela, à revelia da PJ e do Ministério Público?

      29. Em caso afirmativo, quando soube, como soube e por quem soube?

      30. Em caso afirmativo, que medidas adoptou?

      31. Sabe se o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, deu a concordância ao arguido Luís VIEIRA para este executar todas as diligências necessárias à recuperação do material militar, com total desconhecimento do Ministério Público e da PJ?

      32. Em caso afirmativo, quando, como e por quem soube?

      33. Em caso afirmativo, que medidas adoptou?

      34. Convocou uma reunião onde, para além do arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, estiveram presentes os Chefes de Estado Maior Generais, para a discussão da segurança em instalações militares? Quando? Quem esteve presente? Quais as conclusões da mesma?

      35. Sabe se o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, se comprometeu perante o arguido Luís VIEIRA, Director da PJM, a consultar um Professor de Direito para averiguar se estaria disponível para elaborar um parecer jurídico que pudesse fundamentar a alteração do despacho do Ministério Público quanto à competência para a investigação?

      36. Teve conhecimento de uma reunião que teve lugar no Ministério da Defesa Nacional, no dia 04.08.2017, entre o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional e o arguido Luís Vieira, Director da PJM, na presença do Chefe de Gabinete Tenente-General Martins Pereira? Quando? Por quem? Qual o conteúdo dessa reunião?

      37. Teve conhecimento da entrega pelo arguido Luís VIEIRA, Director da PJM, ao arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, de três documentos, os de fls. 11916 a 11918, 11.919 e 11920, cuja cópia se remete:

        • Um denominado Memorandum, com o timbre da PJM, assinado pelo arguido Luís VIEIRA;

        • Outro denominado FITA DO TEMPO;

        • E uma cópia do despacho do Ministério Público, datado de 07.07.2017, proferido no processo-crime com o NUIPC 48/17.6JBLSB, processo que se encontrava em segredo de justiça?

        38. Teve conhecimento de que o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, deu ordens, nessa reunião, ao Tenente-General Martins Pereira, seu Chefe de Gabinete, para enviar cópia desses documentos para sua Exª. o Senhor Primeiro-Ministro?

        39. Recebeu esses documentos? Quando?

        40. Em caso afirmativo, o que retirou e concluiu dos mesmos?

        41. Teve conhecimento de que, em data não determinada do fim de Setembro de 2017, o arguido Luís VIEIRA, Director da PJM, falou com o Tenente-General Martins Pereira, Chefe de Gabinete do arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, e pediu-lhe que alertasse o Exército, uma vez, que, de um momento para o outro, a PJM poderia ter necessidade do apoio de umas equipas de EOD (Explosive Ordnance Disposal), caso viessem a encontrar o material de guerra, que de um dia para o outro deveriam chegar ao mesmo e, ainda, que os militares deveriam estar preparados para essa situação? Quando? Por quem?

        42. Sabe se o Chefe de Gabinete transmitiu esse pedido ao arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional? Quando?

        43. O arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, deu-lhe conhecimento desse pedido? Quando?

        44. Sabe se, no dia 28.09.2017, em Belém, na cerimónia militar comemorativa do 100º aniversário da Aviação Naval, em conversa com o Vice-CEME Tenente-General Fernando Serafino, o Tenente-General Martins Pereira confidenciou que lhe parecia que a PJM andaria em cima dos suspeitos do furto e que era possível que o caso viesse a esclarecer-se, em breve, e o material furtado recuperado e que poderia haver necessidade do apoio do Exército?

        45. Foi informado desta conversa e do seu teor? Quando? Por quem?

        46. Sabe se o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, deu instruções ao seu Chefe de Gabinete para alertar o CEME da necessidade de as equipas EOD do Exército estarem preparadas para entrarem em acção em qualquer momento? Quando? Por quem?

        47. sabe se, na sequência dessas instruções, em data não apurada, mas antes de 18.10.2017, o Chefe de Gabinete do Ministro da Defesa Nacional, Tenente-General Martins Pereira, falou com o Chefe de Gabinete do CEME, Tenente-General José Fonseca e Costa? Quando soube? Por quem?

        48. Sabe se o Chefe de Gabinete do Ministro da Defesa Nacional, Tenente-General Martins Pereira, perguntou, então, ao Chefe de Gabinete do CEME e, qual o grau de prontidão das equipas EOD do Exército, informando-o da necessidade de as equipas EOD estarem prontas, porque poderia haver desenvolvimentos a curto prazo relacionados com o material militar subtraído dos PNT? Quando soube? Por quem?

        49. Sabe se o Chefe de Gabinete do CEME transmitiu o teor dessa pergunta ao CEME General Frederico Rovisco Duarte? Quando soube? Por quem?

        50. Sabe se o CEME lhe respondeu que as equipas EOD do Exército estavam sempre prontas, com grau de prontidão de duas horas, mas pediu-lhe que confirmasse junto do Comando das Forças Terrestres se, de facto, assim acontecia? Quando soube? Por quem?

        51. Sabe se o Chefe de Gabinete do CEME confirmou essa informação, através dos Adjuntos do CEME, junto do Comando das Forças Terrestres? Quando? Por quem?

        52. Sabe se depois transmitiu essa informação ao Chefe de Gabinete do arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional? Quando? Por quem?

        53. Sabe se depois, o Chefe de Gabinete do Ministro da Defesa Nacional, Tenente-General Martins Pereira, transmitiu essa informação ao arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, e ao arguido Luís Vieira, Director da PJM? Quando? Por quem?

        54. O arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, transmitiu, depois, essa informação a Sua Exa. o Senhor Primeiro Ministro? Quando? Tomou alguma medida?

        55. Quando tomou conhecimento da recuperação do material militar na Chamusca? De que forma? Por quem? A que horas?

        56. O que soube quanto à forma como ocorreu essa recuperação?

        57. Quando tomou conhecimento dessa recuperação foi logo informado de que se tratava do material roubado dos PNT?

        58. Foi informado de que tinha sido recuperado todo o material ou só parcialmente?

        59. Foi informado que o Núcleo de Investigação Criminal da GNR de Loulé tinha colaborado na recuperação do material militar? Estranhou esse facto face à Nota para a Comunicação Social da PGR, de dia 04.07.2017?

        60. Quando e por quem teve conhecimento do Comunicado da PJM do dia 18.10.2017?

        61. Sabe quem o mandou elaborar? Quem determinou o seu conteúdo? Quem o elaborou?

        62. O teor do Comunicado suscitou-lhe algumas perplexidades?

        63. Estranhou, no Comunicado, ser referido que a Polícia Judiciária Militar informa que, na prossecução das suas diligências de investigação no âmbito do combate ao tráfico e comércio ilícito de material de guerra (…) face ao teor da Nota para a Comunicação Social da PGR, de dia 04.07.2017, nomeadamente a referência ao afastamento da PJM da titularidade da investigação criminal, no processo de Tancos?

        64. Estranhou, no Comunicado, a PJM informar que tinha tido a colaboração do Núcleo de Investigação Criminal da GNR de Loulé, na recuperação do material?

        65. Estranhou, no Comunicado, ser referido que o DCIAP, titular da acção penal, foi informado das diligências em curso?

        66. É adequada a colaboração, do ponto de vista formal, do Assessor de Comunicação do Ministério da Defesa Nacional, na elaboração do comunicado da PJM, referente a diligências efectuadas num processo-crime?

        67. Teve conhecimento de que a Senhora Procuradora-Geral da República tentou, várias vezes, em vão, na manhã do dia 18.10.2017, falar telefonicamente com o arguido Luís Vieira, Director da PJM? Por quem? Quando?

        68. Teve conhecimento de que a Senhora Procuradora-Geral da República manteve um contacto telefónico com o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, na manhã do dia 18.10.2017?

        69. Como soube? A que horas soube? Por quem?

        70. Sabe de que constou esta conversa telefónica?

        71) Sabe que a Senhora Procuradora-Geral da República estava descontente? Quando soube? Com o quê? Que medidas tomou?

        72. Na sequência da recuperação do material do material de guerra, fez alguma declaração de que tinha recuperado todo o material?

        73. Em caso afirmativo, que informação tinha deste facto? Quem lhe prestou tal informação e quando? Quando soube que não correspondia à verdade?

        74. Falou com o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, sobre a recuperação do material de guerra,a propósito do Debate Quinzenal com o Primeiro Ministro, que teve lugar na Assembleia da República no próprio dia 18.10.2017 às 15.00 horas? O que conversaram?

        75. E no dia 21.10.2017, sábado, Às 10.30 horas, por ocasião do Conselho de Ministros Extraordinário, em São Bento, o que conversaram sobre a recuperação do material de guerra?

        76. Teve conhecimento de que o arguido Luís VIEIRA, Director da PJM, e o arguido VASCO BRAZÃO, Major, Investigador da PJM, foram recebidos no Ministério da Defesa Nacional, na manhã do dia 20.10.2017? Quando? Por quem soube? Quem os recebeu?

        77. A que se destinava tal reunião?

        78. O que foi tratado nessa reunião?

        79. Que documentos foram entregues no Ministério da Defesa Nacional, nesse dia? A quem? Por quem? Foi registada a sua entrega?

        80. Teve conhecimento de que foi entregue um documento não assinado, sem timbre, que consta de fls. 3636 a 3637 dos autos e cuja cópia se remete para conhecimento?

        81. Quem entregou esse documento?

        82. Quem recebeu esse documento?

        83. quando teve conhecimento da entrega desse documento? De que forma? Por quem?

        84. O arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, deu-lhe conhecimento de ter lido esse documento? Quando deu conhecimento? O que lhe explicou quanto ao momento e à forma em que tomou conhecimento do mesmo? Deu-lhe conhecimento do seu conteúdo? Em que moldes?

        85. Discutiu o conteúdo desse documento com o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa? Quando? Em que circunstâncias? Quando é que leu esse documento?

        86. Que perplexidades lhe suscitou a sua leitura, designadamente das passagens:

        O informador da PJM diz que vai dar a localização de umas granadas, como prova de que fala a verdade, mas a PJM tem de guardar essas granadas dois dias e nunca chamar a PJ e que depois ele dará a localização do resto material sempre com a condição do não envolvimento da PJ e que se o acordo for quebrado o material de Tancos desaparece e a família do Major Brazão não terá descanso.

        O Informador da PJM diz que terá de ser feita uma chamada anónima da margem sul de um local que possa ser identificado.

        Major Brazão dá ordem a militar seu para às 03 da manhã fazer uma chamada para o piquete, que nesse dia era o próprio Major Brazão.

        Major Brazão com receio que o Major Pinto da Costa comece a fazer diligências que colocassem as PJ no local informa o Director Geral da PJM e informa-o do “contracto” com o Informador. Que era preciso travar o Major Pinto da Costa e este sendo mais antigo que o Major Brazão era fundamental o Director-Geral ir para o terreno e fazer o material entrar em quartéis sem demora visto que assim que se apercebessem que podia ser de Tancos o Coronel Estalagem de imediato informaria o DIRETOR UNCT e a sua família correria risco e o material nunca apareceria.

        Quando o Major Brazão chega ao local acompanhado do Director Geral pensa que o que está ali são apenas granadas e as outras caixas estarão vazias e serão serão apenas uma prova para a PJM manter o acordo. É preciso a todo o custo manter o acordo.

        O que concluiu com a sua leitura?

        87. Concluiu que a recuperação do material de guerra, tal como foi divulgado pela PJM, tinha sido encenada?

        88. E que tinha havido uma investigação paralela da PJM, à revelia da PJ?

        89. Que medidas adoptou após o conhecimento do conteúdo do documento?

        90. Como explica que, após tal documento ter sido entregue no Ministério da Defesa Nacional, não tenha sido dado conhecimento do mesmo ao processo-crime que investigava o Assalto de Tancos ou à Procuradoria-Geral da República?

        91. Como explica que, após tal documento ter sido entregue no Ministério de Defesa Nacional, e por no mesmo estarem relatados factos susceptíveis de integrar a prática de ilícitos de natureza disciplinar, o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, não tenha participado os mesmos ao Inspector-Geral da Defesa Nacional?

        92. Sabe quais as regras relativas ao registo de entrada de documentos no Ministério da Defesa Nacional? Esse registo é arbitrário? Quem tem a obrigação de determinar esse registo?

        93. Teve conhecimento de que o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, teve conhecimento, directamente ou através do Seu Chefe de Gabinete, Tenente-General Martins Pereira, de que a recuperação do material de Tancos, ao contrário do difundido no Comunicado da PJM, tinha sido encenada, tinha sido efectuada através de uma investigação paralela à investigação da PJ e mediante um acordo com os detentores do material, no dia 18.10.2017?

        94. E após essa data, durante os restantes meses do ano de 2017 e até Outubro de 2018, teve conhecimento de que o arguido AZEREDO LOPES, Ministro da Defesa Nacional, sabia que se tratava de uma recuperação encenada, efectuada mediante um acordo com os detentores do material e mediante uma investigação paralela?

        95. E o Senhor Primeiro-Ministro? Teve em algum momento conhecimento de que se tratava de uma recuperação encenada, efectuada mediante um acordo com os detentores do material de guerra e mediante uma investigação paralela? Quando? De que forma?

        96. No dia 20.10.2017, numa Conferência de Imprensa, no final de uma Cimeira de Chefes de Estado da União Europeia, o Senhor Primeiro-Ministro felicitou o trabalho desenvolvido pela Polícia Judiciária Militar e pela Guarda Nacional Republicana, que permitiu recuperar o material furtado nos Paióis de Tancos?

        97. Em caso afirmativo, o Senhor Primeiro-Ministro o que sabia acerca desse trabalho, para o ter felicitado?

        98. Em algum momento, falou com o Senhor Presidente da República ou com algum elemento da Casa Militar da Presidência da República sobre a investigação de Tancos e sobre a recuperação do material? Quando? Em que moldes?

        99. Sabe se o arguido Luís VIEIRA, Director da PJM, enviou um e-mail ao arguido VASCO BRAZÃO, Investigador da PJM, no dia 19.10.2017, dizendo-lhe:

        “Atenção que eu ao chefe da casa militar do PR contei tudo o que sabia à data de 19 set. o Primeiro Ministro deve estar a receber inputs de vários lados.”

        100. Mesmo no caso de não ter conhecimento do mesmo, sabe esclarecer o conteúdo deste e-mail? Que inputs, no sentido de informações, recebeu nessa data sobre o caso de Tancos?

        Sónia Simões

        Observador

        Por que calças de yoga são ruins para mulheres

        Por Honor Jones

        É um ano novo e eu tenho uma nova academia. Fui na outra manhã. Estava 8 graus lá fora. E todas as mulheres lá estavam usando calças de ioga estanques, saran-wrap-thin. Muitos estavam vestidos da última forma - leggings com padrões de malha translúcida cortados deles, como doilies esportivos. "Finalmente", essas mulheres devem ter pensado, "calças que ventilam correctamente minhas panturrilhas externas sem deixar uma única molécula de ar chegar a qualquer outro lugar abaixo do meu umbigo."

        Não me engana. Eu tenho calças de ioga - três pares. Mas por alguma razão nenhum deles cobre meus tornozelos, e como eu disse, estava 8 graus lá fora. Então eu usava moletom.

        Eu entrei no elíptico. Algumas mulheres me deram olhares engraçados. Talvez eles sentissem pena de mim, ou talvez estivessem preocupados que minhas calças soltas fossem enroscadas nas engrenagens da máquina. Os homens não olharam para mim.

        Neste momento de crise cultural, quando as injustiças e indignidades da vida feminina de repente se tornaram notícia, uma pergunta importante me atingiu: o que aconteceu com calças de moletom?

        Lembra-se de moletom? As mulheres costumavam usá-las, não faz muito tempo. Você provavelmente ainda tem um par, em veludo ou tecido terry, com o nome de uma faculdade ou equipe de desportos estampado na perna.

        Ninguém fica bem de moletom. Mas essa não é a questão. São basicamente apenas toalhas com cinturas. Eles existem para duas actividades: descansar e se exercitar — duas actividades que você costumava ser capaz de fazer sem parecer um modelo em um infomercial P90X.

        Não é boas maneiras para as mulheres dizer a outras mulheres como se vestir; esse é o trabalho de fotógrafos de moda masculina. Mulheres que criticam outras mulheres por se vestirem quentes são vistas como criticando as próprias mulheres - uma triste confusão se você pensar sobre isso, enraizada na ideia de que quem somos é como olhamos. É impossível ter sido uma adolescente e não, em um nível muito profundo, sentir isso.

        Mas calças de ioga pioram as coisas. Sério, você não pode entrar em uma sala de 15 colegas mulheres contorcendo-se em posições ridículas às 7 da manhã sem primeiro vestir calças estanques? O que há sobre yoga em particular que parece exigir isso? Os praticantes estão realmente preocupados que uma perna de calça de largura normal vai estrangulá-los no meio da pose de lótus?

        Não estamos usando essas roupas de treino porque elas são mais legais ou confortáveis. (Você acha que o ponto de venda das calças Reveal Tight Precision da Lululemon é realmente a maneira como seu design comido por mariposas fornece uma "dose muito necessária de fluxo de ar"?) Estamos usando porque são sexy.

        Sentimos que tínhamos que ficar quentes em encontros - um dado. Sentimos que tínhamos que olhar quente para o escritório - problemático. Mas agora internalizamos a ideia de que temos que olhar quente para a academia? Dê-me um tempo. A academia é um dos poucos lugares onde devemos ser capazes de nos concentrar em como nossos corpos se sentem, não apenas na aparência deles. Precisamos lembrar disso. Calças de moletom podem ajudar.

        Leggings de exercícios de controle que seguram em seu estômago não vão ajudar. Nem será - e isso é uma coisa real - o sutiã esportivo push-up.

        Francamente, estou irritado com toda a indústria em expansão em torno do exercício feminino, o que talvez seja mais evidente na ascensão das aulas de estúdio. De acordo com a Association o Fitness Studios,os americanos gastaram cerca de US$ 24 bilhões em taxas de estúdio em 2015, ou cerca de US$ 4 bilhões a mais do que gastaram em academias tradicionais — e esse spread só aumentou desde então. Naturalmente, as mulheres estão gastando mais; eles superam os homens em classes de estúdio em mais de dois para um.

        Eles estão pagando por aulas como SoulCycle (bicicleta estacionária de alta intensidade recebe sua alma super tonificada!) e barre (parece uma bailarina sem nunca ter que dançar!). E se você já está gastando $30 em uma aula de fitness, por que não gastar $70 com a camisa para usar com ela? Em 2016, no que só podemos esperar ser o pico do mercado, os americanos caíram quase US$ 46 bilhões em "activewear".

        Tudo isso acontece de uma coisa saudável que você pode fazer duas vezes por semana em um Modo de Vida, onde leggings de US $ 120 são mais necessidade do que extravagância. Considere a maneira como essas roupas de exercício chiques se espalharam da academia para a rua, essencialmente superando as mulheres para cada actividade além do trabalho de colarinho branco. Considere a forma como a contagem de passos Fitbit transforma todas as tarefas em exercício. Quando as calças de yoga são a primeira coisa que as mulheres adultas colocam todas as manhãs, não podemos deixar de absorver a mensagem de que ficar em forma é nosso propósito nº 1 na vida.

        As mulheres podem, é claro, estar em forma e liberadas. Podemos ser capazes de conquistar o mundo usando spandex. Mas não seria mais fácil fazê-lo em calças que não ameaçam mostrar cada covinha e rolar em cada mulher com mais de 30 anos?

        Pantsuits teve um momento, em 2016. Acho que as mulheres estão prontas para lhes dar outra chance. E enquanto estamos nisso, vamos trazer de volta calças, também, e veludos e, por que não, mesmo cáqui. Mas o primeiro passo é trazer de volta calças de moletom.

        Mergulhadores em águas profundas precisam de calças de polímero estanques; assim como os patinadores olímpicos. O resto de nós poderia usar algum espaço para respirar. Então entre em algumas calças slouchy comigo. Não precisamos ficar tão bem quando estamos tentando parecer um pouco melhores.

        Honor Jones é editor sénior da Opinion.

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        Assalto em Tancos Seguir Juiz Carlos Alexandre faz 100 perguntas escritas a Costa, mas não afasta chamá-lo a tribunal.

        Perguntas chegaram a S. Bento na sexta-feira e Costa tem 15 dias para responder. Se esclarecimentos escritos não forem suficientes, o primeiro-ministro ainda pode ser chamado a tribunal.

        O juiz Carlos Alexandre aceitou que o depoimento de António Costa na fase de instrução do caso Tancos seja feito por escrito, mas não fechou a porta a chamar o primeiro-ministro a tribunal. Na sexta-feira, o magistrado enviou 100 perguntas ao Palácio de São Bento e deu a Costa 15 dias para devolver as respostas. O prazo é maior do que o previsto na lei — de apenas 10 dias — por causa do grande número de questões colocadas. Além da centena de perguntas sobre os factos do processo, número avançado pela Renascença e confirmado pelo Observador, há ainda uma sobre o período temporal em que Costa ocupou e ocupa as funções de chefe do governo.

        A decisão não põe, ainda assim, um ponto final no braço de ferro entre o magistrado, que entende que o depoimento presencial é essencial para apurar o factos em causa, e António Costa, que pediu ao Conselho de Estado para ser autorizado a depor apenas por escrito. No despacho que envia as perguntas a São Bento, Carlos Alexandre explica que, perante a decisão do Conselho de Estado, e tendo a defesa de Azeredo Lopes mantido a vontade de ouvir Costa como testemunha, envia primeiro as 101 questões a que o primeiro-ministro terá de responder, formuladas pelo próprio juiz.

        Esse “primeiro” terá uma explicação directamente relacionada com a lei que regula os depoimentos de entidades que têm direitos especiais, como os elementos do Conselho de Estado. Segundo o artigo 505º do Código de Processo Civil, quando é autorizado um depoimento por escrito, o tribunal envia primeiro as perguntas e espera pelas respostas. Depois, numa segunda fase, pode — “uma única vez” — pedir novos esclarecimentos, também por escrito. Se alguma dúvida se mantiver, de qualquer uma das partes do processo — nomeadamente entre as defesas dos outros arguidos —, a lei põe a decisão nas mãos do juiz sobre se a testemunha em causa deve mesmo ir a tribunal: “Decidindo o juiz que é necessária a sua presença, é a mesma testemunha notificada para depor”, diz o último ponto do artigo 505º.

        António Costa foi arrolado como testemunha pelo antigo ministro da Defesa, Azeredo Lopes, que é arguido no processo que investiga o assalto aos paióis de Tancos e o encobrimento da operação que levou à recuperação do material militar. Em Dezembro, o Conselho de Estado autorizou o governante a responder por escrito (um dos direitos dos conselheiros), depois de ter sido esse o pedido do líder do governo, apesar de Carlos Alexandre ter sublinhado a importância do depoimento presencial.

        Perante essa decisão, o juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal voltou a insistir na ideia de que ter António Costa em tribunal, para uma inquirição directa, seria essencial para apurar os factos que estão em causa. Ainda assim, como lhe cabia, colocou a decisão nas mãos da defesa de Azeredo Lopes, sobre se mantinha a intenção de ouvir Costa nestas condições.

        O prazo de 15 dias para as respostas começou a contar na sexta-feira. António Costa tem, por isso, as próximas duas semanas para responder.

        https://observador.pt/2020/01/27/juiz-carlos-alexandre-faz-100-perguntas-escritas-a-costa-mas-nao-afasta-chama-lo-a-tribunal/

        sábado, 25 de janeiro de 2020

        A offshore de Isabel dos Santos em Man e os advogados que tratam disto tudo.

        A lavagem de dinheiro no Eurobic. A offshore de Isabel dos Santos em Man e os advogados que tratam disto tudo.

        As notícias divulgadas ao longo da semana pelo Expresso, a SIC e o Consórcio Internacional de Jornalistas sobre o império de Isabel dos Santos causaram um terramoto sem precedentes. No espaço de poucos dias, a empresária anunciou a venda das suas participações no Eurobic e na Efacec, viu consultoras que até aqui trabalhavam de forma próxima delimitarem um cordão sanitário à sua volta, perdeu as suas pessoas de confiança na NOS e no BFA e provocou a queda de auditores e do advogado de sua eleição.

        Na edição deste fim de semana colocamos a lupa sobre o Eurobic, o banco que permitiu três transferências para o Dubai, no valor global de €58 milhões, aparentemente sem analisar devidamente a transação, como mandam as regras de prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo.

        Em 2015, quando esteve envolvido num outro escândalo de lavagem de dinheiro, com a Money One, o banco só tinha dois funcionários a fiscalizar estas matérias e Isabel dos Santos nem sequer era classificada como pessoa exposta politicamente (PEP).

        Cinco anos depois, o Eurobic ainda nem foi alvo de contra-ordenações por parte do Banco de Portugal, e ainda lhe falta aplicar 17% das recomendações que lhe foram prescritas na altura. Pelo meio, falta perceber como é que em novembro de 2017 três transações, assentes em faturas vagas e imprecisas, são autorizadas sem que, pelo menos tenha havido uma comunicação ao Ministério Público e à Unidade de Informação Financeira, como prescreve a lei. Tudo razões mais que suficientes para que Fernando Teixeira dos Santos, ex-ministro das Finanças e ainda presidente do banco, apareça a descer no nosso elevador semanal.

        Na área da consultoria e da auditoria, descrevemos a vasta rede de juristas e conselheiros em que Isabel dos Santos se apoiou em Portugal, com Uría, Vieira de Almeida, PLMJ e CMS Rui Pena e Arnaut à cabeça. Foi, aliás, a CMS que assessorou a criação de uma sociedade offshore na ilha de Man cuja beneficiária última era a empresária, um processo onde apareceram uns misteriosos 50 milhões de dólares.

        O regulador das empresas cotadas em bolsa e das sociedades de revisores, a CMVM, já se pôs em campo. Os advogados, por seu turno, continuam a não comunicar obrigações suspeitas de branqueamento e não são sancionados por isso pela Ordem dos Advogados.

        sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

        O cão comeu-me o Código Penal

        Talvez haja energúmenos que são eternos insatisfeitos, e fiquem desapontados com a dimensão dos hematomas que provocam. Nesse caso, talvez se possa dizer que, de facto, é difícil saber se um agressor, agredindo, cumpriu o propósito de agredir.

        Uma das características mais belas do machismo (eis uma observação que não se ouve todos os dias) é a sua profunda inclinação para o igualitarismo. O pensamento machista trata as mulheres como inferiores e os homens como idiotas. São demasiado idiotas para terem crianças a seu cargo, para fazerem o seu próprio almoço, para coserem um botão. Uma sentença de 2017, na ilha do Faial, absolveu um homem que pontapeou e asfixiou a mulher porque o juiz considerou que o réu não teve intenção de agredir. É desafiante tentar reconstituir o raciocínio do juiz. O acórdão diz: “Resultou provado que apertou o pescoço, puxou os cabelos e desferiu pontapés em Cátia, que lhe provocou traumatismos. Porém, não se apurou que esse tenha sido o seu intencional propósito, nem que o tenha conseguido.” Há aqui problemas filosóficos interessantes. Qual será a intenção de uma pessoa que agride? Assistir a um combate de boxe na companhia deste juiz deve ser uma experiência inesquecível. “Muhammad Ali acabou de deixar o seu adversário inconsciente com um soco, mas não sei qual seria a sua intenção. É curioso. Este homem é campeão do mundo sem querer. Que sorte.” Imagino que os pais, se usavam os mesmos métodos educativos da minha avó, tenham tido alguma dificuldade em fazer-se entender. Acredito que o juiz, em criança, pensasse para si: “A minha mãe deu-me umas chineladas no rabo na sequência de eu ter partido dois candeeiros com uma bola de futebol. Qual seria a intenção dela? Que progenitora tão misteriosa me havia de calhar.”

        Outro problema é o de saber – como o juiz pergunta, e bem – se uma pessoa, mesmo tendo intenção de agredir, consegue o seu propósito só porque aperta o pescoço, puxa cabelos, desfere pontapés e provoca traumatismos. Tinha a intenção de agredir e agrediu. Mas, se for um perfeccionista, talvez não tenha ficado satisfeito com as agressões perpetradas. Talvez haja energúmenos que são eternos insatisfeitos, e fiquem desapontados com a dimensão dos hematomas que provocam. Nesse caso, talvez se possa dizer que, de facto, é difícil saber se um agressor, agredindo, cumpriu o propósito de agredir. Até porque, de acordo com o ideário machista, um homem nem sempre é responsável pelas suas atitudes. Ou quase nunca. Acontece o mesmo com seres do tipo do homem, tais como orangotangos, por exemplo. Às vezes fazem umas asneiras, mas quem é que pode garantir qual era a intenção do símio?

        (Opinião publicada na VISÃO 1402 de 16 de Janeiro)


        Ricardo Araújo Pereira

        Boca do Inferno

        Wuhan, a cidade chinesa onde surgiu surto de coronavírus e que foi isolada.

        Ela pode não ser uma megalópole tão conhecida, como Pequim ou Xangai, mas é a sétima maior cidade da China e a número 42 do mundo. Mas agora, Wuhan ganhou fama: é a origem de um novo tipo de coronavírus, que já infectou mais de 830 pessoas no país e matou pelo menos 25.

        Vista aérea de Wuhuan durante o dia, onde se vê uma ponte, prédios e um portal tradicional chinês Wuhan, na região central da China, é a sétima maior cidade do país — e entrou definitivamente no mapa mundial por ter sido origem de novo coronavírus

        O vírus já se espalhou para outros oito países — Arábia Saudita, Singapura, Coreia do Sul, Estados Unidos, Japão, Tailândia, Taiwan e Vietnam. Não há registro de casos confirmados no Brasil.

        Suspeitas chegaram a ser informadas por quatro Estados (Minas Gerais, Santa Catarina, São Paulo e Rio Grande do Sul) e pelo Distrito Federal, mas o Ministério da Saúde descartou que sejam casos do novo coronavírus, porque os pacientes não atendiam aos critérios clínicos (febre e mais algum sintoma respiratório) e epidemiológicos (ter viajado para Wuhan, ter tido contacto com um paciente suspeito ou confirmado) estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde para a identificação de possíveis casos.

        Em Wuhan, capital da província de Hubei, autoridades locais admitem que estão em um "estágio crítico" de prevenção e controle. Na quarta-feira, foi anunciado que todo o transporte da cidade chinesa seria interrompido, e a cidade parcialmente "fechada", ou seja, pessoas "sem motivos especiais" não poderiam deixar a cidade, com o objectivo de barrar a propagação do vírus.

        As medidas drásticas vêm pouco antes do início das comemorações do Ano Novo Chinês, época de maior movimento de pessoas no país e no mundo.


        Ponto estratégico nacional

        Segundo dados das Nações Unidas para 2018, a população desta cidade é de 8,9 milhões de pessoas — mas outras fontes falam em até 11 milhões.

        Ela é conhecida coloquialmente como a "panela da China" por suas altas temperaturas, sobretudo no Verão.

        É também cenário para capítulos importantes na história do país. Resultado da união de três localidades, Wuchang, Hanyang e Hankou, foi ali que começou a revolução que deu fim à China imperial, a revolta de Wuchang, em 1911.

        O enclave é um importante ponto de conexão da rede de transporte do país: fica a poucas horas de trem das cidades mais importantes, o que o torna estratégico para a infra-estrutura ferroviária de alta velocidade.

        Família com máscaras e malas caminha em estação Autoridades locais admitem que estão em um "estágio crítico" de prevenção e controle em Wuhan

        Construída no curso intermediário do rio Yang Tsé — que, com quase 6,4 mil quilómetros, é o maior rio da Ásia e o terceiro do mundo — também tem um importante porto, com navios que se conectam a Xangai, no leste, ou à Chongqing, no oeste.

        Justamente o tamanho e a importância económica de Wuhan explicam em parte por que o vírus viajou tão rapidamente no sudeste da Ásia e até chegou aos Estados Unidos.

        Em resumo: o vírus se espalhou assim porque muitas pessoas entram e saem de Wuhan, carregando o vírus.

        As autoridades chinesas estão aconselhando as pessoas a não viajarem para lá; aos seus habitantes, recomendam que evitem multidões e minimizem reuniões com mais pessoas.

        "Basicamente, não vá para Wuhan. E para aqueles em Wuhan, por favor, não deixem a cidade", disse Li Bin, vice-ministro da Comissão Nacional de Saúde da China.

        Além disso, ele avisou que nesta quinta-feira as autoridades suspenderiam o "transporte público urbano — metrô, balsa e transporte de passageiros de longa distância".

        Mapa de Wuhan 

        O aeroporto e as estações de trem seriam "temporariamente fechados".

        O vírus já está em pelo menos 13 províncias chinesas, além das regiões administrativas especiais de Hong Kong e Macau, que confirmaram seus primeiros casos na quarta-feira, informou a agência EFE.


        Conexões internacionais

        Além disso, a cidade tem um aeroporto que a conecta com todas as regiões do mundo, directa ou indirectamente.

        O Aeroporto Internacional de Wuhan transportou 20 milhões de passageiros em 2016 e oferece voos directos para Londres, Paris, Dubai ou Nova York, entre outros.

        A cidade, de acordo com seu site, é "a base tanto das indústrias de alta tecnologia como as tradicionais".

        Wuhan tem várias zonas industriais, 52 instituições de ensino superior e mais de 700 mil estudantes.

        Cerca de 230 das 500 maiores empresas do mundo (classificadas pela lista da Fortune Global) já investiram ali.

        Os mais notáveis ​​são da França, que possuía uma "concessão estrangeira" (território arrendado) em Hankou, hoje Wuhan, entre 1886 e 1943. Há investimentos de mais de 100 empresas francesas, incluindo a Peugeot-Citroen, que tem ali um consórcio chinês.

        Wuhan também serve como porta de entrada para as Três Gargantas, uma região turística e sede da enorme hidroléctrica homónima.


        'Imagine fechar Londres antes do Natal'

        James Gallagher, repórter de assuntos de saúde da BBC

        Wuhan está começando a se parecer muito com uma cidade em quarentena.

        As autoridades já avisaram aos moradores para não deixarem a cidade e pediram aos visitantes em potencial que desistissem do plano.

        Agora, a interrupção do transporte público, incluindo voos, bloqueia muitas das conexões de e para a cidade.

        É uma tentativa notável de impedir a propagação deste novo vírus, que sabemos agora poder ser transmitido de pessoa para pessoa.

        A limitação do transporte reduzirá a possibilidade do vírus chegar a outras cidades da China e a outros países do mundo.

        Tudo isso ocorre quando milhões de pessoas estão viajando por todo o país para as festas do Ano Novo chinês.

        Para colocar em perspectiva: imagine fechar Londres na semana anterior ao Natal.

        A grande questão que resta agora são as estradas: será que alguns dos milhões de habitantes de Wuhan conseguirão deixar a cidade com seu veículo?

        Possível origem do vírus

        Pedestre com máscara passa ao lado de mercado popular com lojas fechadas

        Acredita-se que o novo tipo de vírus tenha se originado em um dos 'mercados molhados' de Wuhan, onde são vendidos animais vivos.

        Embora a China não tenha confirmado a origem exacta do vírus, agora conhecido como 2019-nCoV, as autoridades acreditam que o surto se originou em um mercado de Wuhan.

        "Este é um dos chamados 'mercados molhados', muito comuns na Ásia", explica Howard Zhang, editor do serviço chinês da BBC.

        "São mercados onde animais vivos são vendidos. Você pode ver galinhas vivas e peixes nadando em tanques de água."

        "Isso ocorre porque as pessoas querem produtos frescos. Então, por exemplo, diante de um comprador de frango, o vendedor sacrifica e corta o animal no estande. Todas as sobras ficam espalhadas, com pouca higiene e cuidado com a saúde, o que facilita a propagação de doenças", explica Zhang.

        "Suspeita-se que o vírus tenha se originado em um desses mercados", acrescenta.

        Como observado por Gao Fu, director do Centro de Controle e Prevenção de Doenças da China, é provável que o vírus tenha sido originalmente transmitido de um animal para um humano.

        As autoridades proibiram a venda de animais vivos em Wuhan, e há relatos de que a polícia está realizando inspecções para garantir que a determinação seja seguida.

        Propagação

        Segundo especialistas, embora o vírus tenha se originado em um mercado local, é o fluxo de pessoas que entra e sai de Wuhan que causou sua rápida disseminação.

        O paciente infectado identificado nos Estados Unidos, por exemplo, visitou Wuhan recentemente, assim como duas pessoas infectadas no Japão. Além disso, um paciente na Coreia morava lá e o caso na Tailândia é de um turista chinês de Wuhan.

        O que preocupa as autoridades agora é que esse fluxo pode aumentar à medida que o Ano Novo chinês se aproxima, e milhões de pessoas circulam para comemorar.

        As celebrações oficiais começam nesta sexta-feira, dia 25, embora as viagens já tenham começado e geralmente durem até o final das festas. Esse período é conhecido como a maior "migração interna" do mundo, na qual milhões de pessoas se deslocam anualmente.

        Portanto, protocolos de saúde já foram impostos em aeroportos e estações de trem com conexão com a cidade.

        Mas, embora o vírus possa continuar a se espalhar rapidamente, as autoridades chinesas estão melhor preparadas agora, opina Howard Zhang.

        "Após a emergência de saúde pública do vírus da Síndrome Respiratória Aguda Grave (conhecida pela sigla em inglês Sars) em 2002, que também era um coronavírus originado na China e que matou quase 800 pessoas no mundo, as autoridades de saúde chinesas aprenderam muito sobre esse tipo de situação", diz o editor.

        "Naquele tempo, as autoridades levaram semanas para identificar o problema e, quando era algo conhecido no resto do mundo, já havia milhares de pessoas infectadas".

        "Agora, pelo menos, já há uma infra-estrutura para enfrentar o problema e esta parece estar agindo rapidamente — tanto na identificação da infecção, na confirmação dos casos e no controle de acesso à cidade", acrescenta.

        Uso de máscaras pode conter disseminação de doenças?

          Estou convicto de que as autoridades chineses não dizem a verdade – toda – e/ou as autoridades mundiais da saude nos estão a esconder algo!


          Uma das imagens mais comuns no surgimento de surtos e epidemias é a de pessoas usando máscaras cirúrgicas.

          Woman wearing a surgical mask Cientistas mantêm ceticismo em relação à eficácia do uso de máscaras para evitar a propagação de vírus.

          A prática de usá-la a fim de prevenir infecções é popular em diversos países do mundo, mais recentemente na China em meio à actual disseminação de um novo tipo de coronavírus, além de visar a protecção contra altos níveis de poluição.

          Virologistas, entretanto, são céticos em relação à real eficácia dessas máscaras contra vírus e bactérias que circulam no ar.

          Mas há algumas evidências que sugerem que esse tipo de equipamento pode ajudar a prevenir as transmissões de micro-organismos das mãos para a boca.

          Das salas de cirurgia às ruas

          Máscaras cirúrgicas começaram a ser adotadas em hospitais no fim do século 18, mas só passaram a ser usadas pelo grande público na epidemia da gripe espanhola em 1919, que matou mais de 50 milhões de pessoas.

          David Carrington, professor da Universidade de Londres, afirmou à BBC News que esse tipo de máscara não é eficaz contra vírus e bactérias que circulam no ar porque elas são muito frouxas, não têm filtro de ar e deixam os olhos expostos.

          Elas, no entanto, podem ser úteis para minimizar o risco de contrair um vírus por meio de respingos de espirros ou tosses, além de evitar a contaminação mão-boca.

          Um estudo britânico de 2016 indica que as pessoas tocam seus rostos cerca de 23 vezes por hora.

          A crowd wearing surgical masks in China Máscaras do tipo cirúrgico ajudam a proteger de respingos de espirros e tosses, mas não evitam completamente a contaminação área.

          Jonathan Ball, professor de virologia molecular da Universidade de Nottingham, no Reino Unido, afirmou que "em um estudo bem controlado num hospital, as máscaras de rosto do tipo respirador são boas para prevenir infecções por influenza do tipo.

          Respiradores, que tendem a proporcionar uma filtragem acurada do ar, são desenhados para proteção contra partículas aéreas com potencial perigoso.

          "No entanto, quando você analisa os estudos que tratam da eficácia de máscaras na população em geral, os resultados são menos animadores. É um grande desafio, por exemplo, manter uma máscara no rosto por um tempo prolongado", disse Ball.

          Higiene das mãos é mais eficaz, dizem especialistas

          Connor Bamford, do Instituto Wellcome-Wolfson para Medicina Experimental, na Irlanda do Norte, afirmou que "a adoção de medidas simples de higiene são muito mais eficientes".

          "Cobrir a boca enquanto espirra, lavar as mãos e não colocar as mãos na boca antes de lavá-las podem ajudar a limitar o risco de contrair qualquer vírus respiratório."

          O NHS (serviço de saúde pública do Reino Unido) recomenda que a melhor maneira de contrair vírus como o da gripe é:

          • lavar as mãos regularmente com água morna e sabão

          • evitar tocar os olhos e o nariz sempre que possível

          • manter um estilo de vida saudável

            Jake Dunning, chefe de zoonoses e infecções do serviço público de saúde inglês, disse que o uso de máscaras cirúrgicas pelo grande público tende a reduzir o cuidado pessoal com higiene, por exemplo.

            "As pessoas mantêm mais o foco na higiene das mãos quanto estão preocupadas."

            O que se sabe sobre o novo surto que começou na China?

            Um vírus desconhecido pela ciência até há pouco vem causando uma doença pulmonar grave em centenas de pessoas na China, e já foi detectado nos Estados Unidos, Taiwan, Tailândia, Japão, Coreia do Sul e Macau.

            Ao menos 17 pessoas morreram em decorrência do vírus, que surgiu em dezembro passado na cidade chinesa de Wuhan. Ele infectou 440 pessoas, segundo registros oficiais.

            Amostras do 2019-nCoV, como é chamado, foram coletadas de pacientes e analisadas em laboratório, e autoridades da China e da OMS concluíram que a infecção é um coronavírus.

            O vírus causa febre, tosse, falta de ar e dificuldade em respirar.

            Em casos mais graves, pode evoluir para pneumonia e síndrome respiratória aguda grave ou causar insuficiência renal.

            Os casos têm sido associados ao mercado público de frutos do mar em Wuhan.

            Autoridades chinesas afirmam que há casos de transmissão do vírus de uma pessoa para outra, envolvendo inclusive profissionais de saúde que foram infectados durante o tratamento de pacientes com a mesma doença.

            Há uma grande preocupação em torno de novos vírus que infectam pulmões, já que tosses e espirros são meios altamente eficazes de alastramento de uma doença.

            https://www.bbc.com/portuguese/geral-51219194

            quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

            1984 - Orwell, George

            “No creo que la sociedad que he descrito en 1984 necesariamente llegue a ser una realidad, pero sí creo que puede llegar a existir algo parecido», escribía Orwell después de publicar su novela. Corría el año 1948, y la realidad se ha encargado de convertir esa pieza ?entonces de ciencia ficción? en un manifiesto de la realidad.

            En el año 1984 Londres es una ciudad lúgubre en la que la Policía del Pensamiento controla de forma asfixiante la vida de los ciudadanos. Winston Smith es un peón de este engranaje perverso y su cometido es reescribir la historia para adaptarla a lo que el Partido considera la versión oficial de los hechos. Hasta que decide replantearse la verdad del sistema que los gobierna y somete.”

            A origem do nome de Moçambique…

            A história de Moçambique encontra-se documentada pelo menos a partir do século X, quando um estudioso viajante árabe, Al-Masudi descreveu uma importante actividade comercial entre as nações da região do Golfo Pérsico e os “Zanj” (os negros) do “Bilad as Sofala”, que incluía grande parte da costa centro-norte do actual Moçambique.

            Um emir árabe muçulmano de nome Mussa ibn Bique foi o primeiro governante conhecido de Moçambique antes da invasão portuguesa da região, durante a década de 1550 e no período que antecedeu à conquista colonial de grande parte da África.

            Quando Vasco da Gama chegou pela primeira vez a Moçambique, em 1497, já existiam entrepostos comerciais árabes e uma grande parte da população tinha aderido ao Islão.

            Porém de onde veio o nome Moçambique? Conta-se que ao fazer o primeiro aportamento nas terras moçambicanas, os portugueses a chamaram de ” Terras de Mussa ibn Bique” em homenagem ao seu governante, mas ao passar dos anos, como aconteceram em outras regiões do mundo colonizadas por europeus lusitanos, o nome da terra começou a ser simplificado para facilitar a pronuncia, então de Terras de Mussa ibn Bique, o lugar passou a se chamar apenas de Moçambique.

            EUA: Salazar rejeitou mil milhões de dólares em troca da independência das colónias.

            As autoridades norte-americanas esbarraram na inflexibilidade de Salazar

            O Dr. António Oliveira Salazar rejeitou uma proposta dos Estados Unidos para a independência das Ex-colónias portuguesas a troco de mil milhões de dólares (782 milhões de euros), porque "Portugal não estava à venda", revela um Ex-responsável norte-americano no seu livro "Engaging Africa: Washington and the Fall o Portugal's Colonial Empire".

            Segundo o secretário de Estado adjunto para os Assuntos Africanos durante a administração Clinton, Witney Schneider, o Ex-presidente do Conselho rejeitou a proposta americana em 1963, durante um encontro com um enviado da Casa Branca.

            O livro detalha minuciosamente, com base em documentos oficiais e entrevistas com personalidades norte-americanas e portuguesas, as relações dos Estados Unidos com Portugal e com os movimentos independentistas das Ex-colónias portuguesas, em particular Angola e Moçambique, desde o início dos anos 60 até à independência de Angola, em 1975.

            De acordo com o autor, em 1962, o assistente do director adjunto de planeamento da CIA, Paul Sakwa, elaborou um plano denominado "Commonwealth Plan", que visava convencer as autoridades portuguesas a aceitar o que a CIA considerava ser a inevitabilidade da independência das colónias portuguesas.

            O plano previa que Portugal concedesse a auto-determinação a Angola e Moçambique após um período de transição de oito anos. Enquanto isso, seria organizado um referendo nas duas colónias para se determinar que tipo de relacionamento seria mantido entre os dois territórios e Portugal após a independência.

            Durante esse período, os dirigentes nacionalistas angolano Holden Roberto e moçambicano Eduardo Mondlane receberiam "o estatuto de consultores assalariados" e seriam preparados para a liderança dos novos países.

            "Para ajudar Salazar a engolir a pílula amarga da descolonização, Sakwa propôs [ainda em 1962] que a NATO oferecesse a Portugal 500 milhões de dólares [391 milhões de euros] para modernizar a sua economia", escreve Schneider.

            Um ano depois a proposta daquele funcionário da CIA foi ampliada pelo diplomata Chester Bowles, que duplicou a ajuda a oferecer a Portugal, propondo que os Estados Unidos concedessem mais 500 milhões de dólares durante um período de cinco anos, ou seja um total de mil milhões de dólares durante o período de transição.

            Documentos oficiais mostram que Bowles argumentou que seria "um bom negócio diplomático" se os esforços norte-americanos conseguissem resolver "o feio dilema" de Portugal a um custo de cem milhões de dólares (78 milhões de euros) por ano.

            O plano dos Estados Unidos esbarrou, contudo, na inflexibilidade de Salazar.

            "Portugal não está a venda", foi a resposta do ditador português quando a proposta lhe foi apresentada, em Agosto de 1963 – ainda durante a administração Kennedy - pelo secretário de Estado adjunto norte-americano, George Ball.

            Franco Nogueira considerou a proposta americana uma "idiotice.

            O autor diz ainda que o então ministro dos Negócios Estrangeiros português, Franco Nogueira, considerou a proposta americana uma "idiotice", porque revelava que Washington acreditava poder determinar ou garantir acontecimentos a longo prazo.

            Segundo Nogueira, o plano dos Estados Unidos seria o primeiro passo para a inevitabilidade do caos nas colónias portuguesas em África.

            Um dos aspectos mais curiosos do livro é a exactidão com que a CIA e vários diplomatas norte-americanos fazem, com muitos anos de antecedência e em documentos oficiais, a previsão da derrota militar portuguesa em África e o derrube da ditadura.

            "A derrota militar portuguesa é uma conclusão inevitável se se permitir que a revolta em Angola ganhe volume e continuidade", adverte o documento da CIA que acompanhava a proposta inicial elaborada por Paul Sakwa, pouco depois do começo da guerra em Angola.

            Sakwa questiona-se mesmo se os Estados Unidos poderiam permitir que Portugal "cometesse suicídio, arrastando os seus amigos na mesma via".

            O então embaixador dos Estados Unidos em Lisboa, Burke Elbrick, considerado em Washington como um simpatizante das autoridades portuguesas, enviou um telegrama às autoridades norte-americanas em 1963 em que dizia que Portugal estava "debaixo da espada de Dâmocles", pois não era "nem suficientemente grande nem suficientemente rico" para fazer frente a uma guerra de guerrilha em três frentes.

            As guerras em África poderiam significar "o fim do império lusitano" e do regime de Salazar, escreveu ainda o diplomata, advertindo que o fim do regime poderia resultar na subida ao poder de um Governo "consideravelmente mais esquerdista ou neutral".

            Em 1964 - dez anos antes da revolução do 25 de Abril -, a CIA advertiu que as guerras em África levariam ao aumento do descontentamento interno e que esse "aumento do descontentamento poderá convencer os militares da necessidade de substituírem Salazar".

            Nesse mesmo ano, o Conselho de Segurança Nacional advertiu o Presidente Lyndon B. Johnson - que sucedeu a John F. Kennedy - de que as perspectivas de Portugal em África eram péssimas.

            "Já não se trata de uma questão de saber se Angola se tornará independente ou não, pois a única questão é saber quando e como, tal como aconteceu na Argélia. Do mesmo modo, é uma certeza que quanto mais a luta durar, mais violenta, racista e infiltrada pelos comunistas se tornará, mais grave será a crise final a que os Estados Unidos terão de fazer face e mais caótica, radical e anti-ocidental será uma Angola independente", diz o documento.

            Durante os anos 60, e face a estes avisos, muitos funcionários norte-americanos deram conta em documentos do seu desespero face à inflexibilidade do Governo de Salazar em mudar a política colonial. Paul Sakwa, o funcionário da CIA que elaborou o "Commonwealth Plan", desesperado com a inflexibilidade de Salazar, terá chegado, ironicamente, a manifestar dúvidas de que o ditador português pudesse aceitar o plano americano "sem o benefício de uma lobotomia".

            Para o secretário de Estado adjunto de então, George Ball, Salazar elaborava a política externa de Portugal "como se o Infante D. Henrique, Vasco da Gama e Fernão de Magalhães fossem os seus conselheiros mais próximos".

            Review

            A saída de Portugal de África, e o papel que os Estados Unidos desempenharam neste processo, é um episódio extraordinariamente importante e trágico da era da Guerra Fria. Baseando-se em volumosos documentos oficiais desclassificados, combinados com entrevistas com praticamente todos os principais formuladores de políticas da época, Witney Schneidman escreveu uma excelente história diplomática sobre a elaboração da política dos EUA em relação à África. Ele também conta uma história fascinante. (Gerald J. Bender, Professor de Relações Internacionais da Universidade do Sul da Califórnia) Envolver a África é uma história convincente.

            Para aqueles interessados na história da política dos EUA em relação à África, este livro é uma leitura essencial. (Susan E. Rice, Ex-Secretária de Estado Adjunta para Assuntos Africanos).

            Esta é uma narrativa diplomática soberba dos interesses nacionais concorrentes que moldam a política dos EUA em relação a Portugal e ao seu império colonial em África, quando os "ventos de mudança" sopravam por todo o continente africano. Schneidman fornece uma descrição vívida das manobras por trás dos debates políticos e insights coloridos das personalidades envolvidas durante este importante, muitas vezes esquecido, momento na história. (Embaixador Paul Hare, Representante Especial dos EUA no Processo de Paz angolano, 1993-1998).

            Este é o melhor estudo das relações dos EUA com Portugal e a África Portuguesa de Kennedy através da Ford, os anos difíceis em que os decisores políticos dos EUA tiveram de decidir a melhor forma de responder aos esforços de Lisboa para manter o império português em África. (Piero Gleijeses, Professor de Política Externa Americana, Universidade Johns Hopkins, autor de Missões Conflitantes: Havana, Washington e África, 1).

            Este livro, uma leitura obrigatória para qualquer pessoa interessada em descolonização ou diplomacia da Guerra Fria, é a história diplomática definitiva das relações EUA-Portugal nas 1960 e 1970, no contexto da revolução de Portugal de 1974 e do fim do seu império africano. (Nicholas Van De Walle Relações Exteriores)

            África portuguesa e Portugal são uma história dramática, única nos anais da história. Witney Schneidman prestou um grande serviço, assumindo um conto negligenciado e dizendo-o muito bem. . . . A descrição de Portugal pós-revolucionário é tão precisa como qualquer outra que eu tenha visto. (Frank C. Carlucci, III, Ex-embaixador dos EUA em Portugal).

            O livro de Schneidman acrescenta seu peso ao argumento em desenvolvimento e desafia os historiadores a continuar a se aprofundar mais nos problemas na política de descolonização dos Estados Unidos que ajudaram a moldar o mundo pós-colonial em que vivemos hoje. (Daniel Byrne, Universidade de Evansville H-Net: Humanidades e Ciências Sociais Opiniões Online).

            Este excelente trabalho reflecte suas origens académicas através de extensa pesquisa de arquivo e uma visão privilegiada de mudanças políticas e confrontos de personalidade.

            Resumindo: RECOMENDADO. Graduados da divisão superior e acima. (C.W. Hartwig, Escolha da universidade de estado de Arkansas)

            About the Author

            Witney W. Schneidman is President, Schneidman and Associates International, an Africa-focused, Washington, D.C. trade and investment consulting firm. He also served as Deputy Assistant Secretary of State for African Affairs in the Clinton Administration.

            Detalhes do produto, na Amazon

            • Paperback: 312 páginas
            • Editora: University Press Of America (29 de janeiro de 2004)
            • Idioma: English
            • ISBN-10: 0761828125
            • ISBN-13: 978-0761828129

            terça-feira, 21 de janeiro de 2020

            Mário Centeno

            O ministro das Finanças disse ontem não estar “minimamente preocupado” com as injecções no Novo Banco, referindo-se ao seu impacto na estratégia orçamental do Governo, a propósito de uma notícia do PÚBLICO sobre o facto de o Governo ter em cima da mesa uma injecção final de 1400 milhões de euros no banco. Centeno não está preocupado, mas os portugueses estão e como é o dinheiro deles que alimenta o NB, o ministro devia estar preocupado. Não é de somenos.

            Ministro diz que os apoios “são injecções temporárias e não fazem parte da trajectória orçamental”  que o “país tem seguido”

            “Temos vindo  a cumprir  [os objectivos orçamentais] ao longo dos anos, não vai ser 2020 que vai ser novidade nesse aspecto”

            Mário Centeno  Ministro das Finanças

            Carole Cadwalladr. Facebook’s role in brexit - and the threat to democracy-

            No dia após o referendo do Brexit, em Junho de , quando o Reino Unido acordou com o choque ao descobrir que íamos sair da União Europeia, o meu editor do jornal "Observer" do Reino Unido pediu-me para eu voltar ao sul do País de Gales, — onde eu cresci — e para escrever um relatório. Então, eu fui a uma cidade chamada Ebbw Vale.

            Aqui está ela. Fica nos vales do sul do País de Gales, é um lugar muito especial que sempre teve uma espécie de cultura muito fértil da classe trabalhadora. e é famoso pelos seus coros masculinos gauleses, pelo râguebi e pelo carvão. Mas quando eu era adolescente, as minas de carvão e as siderúrgicas fecharam, e toda a área ficou devastada. Eu fui lá porque era uma das zonas do país com maior proporção de votos para "Sair". % das pessoas aqui votaram para sair da União Europeia.

            E eu queria saber porquê. Quando lá cheguei fiquei um bocado chocada, porque da última vez que estive em Ebbw Vale, era assim.

            E agora é assim. Esta é uma unidade de ensino contínuo de  milhões de libras, que foi financiada em grande parte pela União Europeia. E este é o novo centro desportivo, que está no centro de um projecto de recuperação de  milhões de libras que está a ser financiado pela União Europeia. Este é o novo projecto de melhoramento rodoviário de  milhões de libras, e há uma nova linha de comboios e uma nova estação, tudo financiado pela UE. Nada disto é exactamente um segredo, porque há placas enormes como esta, por toda a parte. [Financiado pela UE: Investimento no País de Gales]

            Eu tive uma sensação estranha de irrealidade ao andar pela cidade que culminou quando encontrei um jovem, em frente ao centro desportivo e ele me disse que tinha votado "Sair", porque a União Europeia não tinha feito nada por ele.

            Ele estava farto disso. E por toda a cidade, as pessoas diziam-me a mesma coisa. Diziam que queriam recuperar o controlo, o que é um dos "slogans" da campanha.

            Disseram-me que o que os saturava mais eram os imigrantes e os refugiados.

            Já estavam fartos. O que era estranho porque, ao andar pela cidade, não encontrei um só refugiado ou imigrante. Encontrei uma polaca que me disse ser praticamente a única estrangeira na cidade.

            Quando fui ver os dados, descobri que Ebbw Vale, na realidade, tem um dos índices mais baixos de imigração do país. Então, fiquei um bocado chocada, porque não conseguia perceber onde as pessoas iam buscar estas informações.

            Foram os jornais da extrema-direita que imprimiram as histórias sobre a imigração, e esta zona é praticamente um bastião da esquerda trabalhista. Mas mais tarde, depois de o artigo sair, uma mulher entrou em contacto comigo.

            Era de Ebbw Vale, e contou-me coisas que tinha visto no Facebook. E eu: "Que coisas?" Ela disse que eram coisas assustadoras sobre imigração, especialmente sobre a Turquia. Então, eu tentei encontrá-las, mas não havia lá nada. Porque não há nenhum arquivo para anúncios que as pessoas tenham visto ou que tenham sido publicadas na sua página do Facebook. Não há rasto de nada, tudo desapareceu por completo.

            E este referendo, que vai ter um profundo impacto para sempre na Grã-Bretanha:

            — aliás já teve um profundo impacto: as fábricas automóveis japonesas que vieram para a região para substituir os empregos nas minas já estão a sair por causa do Brexit.

            Todo este referendo ocorreu na escuridão, porque ocorreu no Facebook. E o que acontece no Facebook, fica no Facebook, porque só nós vemos a nossa página e depois ela desaparece. É impossível pesquisar o que quer que seja.

            Não fazemos ideia de quem viu tais anúncios nem que impacto tiveram. nem que informações foram usadas para escolher o público alvo. Nem sequer quem pôs esses anúncios, nem quanto dinheiro foi gasto, nem de que nacionalidade era. Mas o Facebook sabe.

            O Facebook tem as respostas e recusou-se a dar-nos essas informações. O nosso parlamento pediu a Mark Zuckerberg várias vezes para vir à Grã-Bretanha e dar-nos essas respostas. E de todas as vezes, ele recusou. Temos de perguntar porquê. Porque o que eu e outros jornalistas descobrimos é que foram praticados vários crimes durante o referendo.

            E ocorreram no Facebook. Porque na Grã-Bretanha, limitamos a quantidade de dinheiro que pode ser gasta nas eleições. Isto porque, no século XIX, as pessoas andavam, literalmente, com carrinhos de mão, cheios de dinheiro para comprar votos. Então, aprovámos leis para impedir que isso aconteça. Mas essas leis já não funcionam. Este referendo ocorreu, maioritariamente, "online". Pode-se gastar qualquer quantia de dinheiro em anúncios, no Facebook, no Google ou no Youtube e ninguém vai saber, porque são tudo caixas negras. Foi isto que aconteceu. Na realidade, não fazemos ideia da extensão disto. Mas sabemos que, nos últimos dias antes do voto no Brexit,, a campanha para "Sair" "lavou" quase  mil libras através de outra entidade da campanha. que a nossa comissão eleitoral já declarou ilegal e foi referenciado à polícia. Com este dinheiro ilegal, a campanha para votar "Sair" lançou uma montanha de informações falsas. Anúncios como este. [ milhões de turcos juntam-se à UE] Isto é completamente mentira. A Turquia não se vai juntar à União Europeia. Nem sequer há a discussão de a Turquia se juntar à UE. A maioria de nós nunca viu estes anúncios, porque não fomos alvo deles. A campanha "Sair" identificou uma pequena quantidade de pessoas como sendo influenciáveis e elas viram-nos.

            A única razão por que estamos a ver isto agora. é porque o parlamento obrigou o Facebook a entregar estes anúncios. Talvez vocês pensem: "Bem, foi só algum dinheiro mal gasto, "são umas pequenas mentiras."

            Mas isto foi a maior fraude eleitoral na Grã-Bretanha, em  anos. Numa eleição única para esta geração que se decidiu por apenas % dos votos. Este foi apenas um dos crimes que ocorreram durante o referendo. Houve outro grupo, que foi liderado por este homem, Nigel Farage, à direita de Trump.

            O grupo dele, "Leave.EU", também violou a lei. Violou as leis eleitorais britânicas e as leis de dados britânicas.

            E também está a ser referenciado à polícia. Este homem, Arron Banks, financiou esta campanha. E, num caso totalmente separado, foi referenciado à National Crime Agency — o equivalente britânico do FBI — porque a comissão eleitoral concluiu que não se sabe qual a origem do seu dinheiro. nem mesmo se é britânico. Nem sequer vou começar com as mentiras que Arron Banks contou sobre a sua relação encoberta com o governo russo. Ou com as estranhas reuniões entre Nigel Farage, Julian Assange e com o amigo do Trump, Roger Stone, agora indiciado, imediatamente antes da divulgação de duas grandes WikiLeaks, que, por coincidência, beneficiaram Trump. Mas vou contar-vos que o Brexit e Trump estão intimamente relacionados. Este homem disse-me que o Brexit foi uma experiência para Trump. Sabemos que são as mesmas pessoas, as mesmas empresas, a mesma informação, as mesmas técnicas, o mesmo uso do ódio e do medo.

            Publicaram isto no Facebook. Nem quero chamar a isto uma mentira, [Imigração sem assimilação é invasão] porque isto parece-me sobretudo um crime de ódio. [... a liberdade de trânsito dos turcos ["aumentará a mobilidade de criminosos e terroristas" na UE"]

            Não preciso de dizer que o ódio e o medo estão a ser espalhados "online", por todo o mundo. Não só nos EUA ou na Grã-Bretanha, mas em França, na Hungria no Brasil, em Myanmar e na Nova Zelândia. Nós sabemos que existe esta maré sombria que nos une globalmente e que se está a propagar lentamente pelas plataformas tecnológicas. Mas só vemos uma pequena parte do que se passa na superfície.

            Eu só descobri alguma coisa sobre isto porque comecei a investigar a relação de Trump com Farage, e com uma empresa chamada Cambridge Analytica.

            Passei meses à procura de um ex-funcionário, Christopher Wiley. Ele contou-me como esta empresa, que tinha trabalhado para Trump e para o Brexit, tinha feito um perfil político das pessoas de forma a compreender os seus medos individuais, para os atingir com anúncios no Facebook e fizeram isso, recolhendo ilegalmente informações do perfil do Facebook de  milhões de pessoas. Foi preciso um ano inteiro de trabalho para conseguir falar com Christpher. Tive de passar de escritora convidada a repórter de investigação para o fazer. Ele foi extraordinariamente corajoso, porque a empresa é de Robert Mercer, o multimilionário que financiou Trump. Ele ameaçou processar-nos várias vezes, para nos impedir de publicar. Mas finalmente chegámos lá, faltava um dia para a publicação.

            Recebemos outra ameaça legal. Desta vez, não era da Cambridge Analytica, mas do Facebook. Disseram que, se publicássemos, processar-nos-iam. Nós publicámos mesmo assim. (Aplausos) Facebook, vocês estavam do lado errado da história. Estavam do lado errado da história nisto, por se recusarem a dar-nos as respostas de que precisamos.

            É por isso que estou aqui, para me dirigir a vocês diretamente. os deuses do Silicon Valley. (Aplausos) Mark Zuckerberg e Sheryl Sandberg e Larry Page e Sergey Brin e Jack Dorsey e os vossos empregados e os vossos investidores também. Porque há  anos, o maior perigo nas minas no sul do País de Gales era o gás. Silencioso, mortal e invisível.

            Por isso mandavam os canários primeiro, para verificar o ar. E nesta enorme e global experiência "online" em que vivemos, nós na Grã-Bretanha nós somos os canários. Nós somos o que acontece a uma democracia ocidental quando uma centena de anos de leis eleitorais são violadas pela tecnologia. A nossa democracia está corrompida, as nossas leis já não funcionam.

            Não fui eu quem disse isto, foi o nosso parlamento, que publicou um relatório a dizer isto. A tecnologia que vocês criaram tem sido fantástica. Mas agora é a cena de um crime. E vocês têm as provas. Não basta dizer que vão fazer melhor no futuro.

            Porque para termos esperança de impedir que isto aconteça novamente, temos de saber a verdade. Talvez vocês pensem: "Foram só uns anúncios, "As pessoas são mais espertas que isso, certo?" Ao que responderia, "Boa sorte com isso."

            Porque o que o referendo do Brexit mostrou foi que a democracia liberal está viciada. Foram vocês que a viciaram. Isto não é democracia, espalhar mentiras na escuridão, cheias de ódio e financiadas com dinheiro ilegal, sabe Deus de onde. Isto é subversão, e vocês são cúmplices disso. (Aplausos) O nosso parlamento foi o primeiro no mundo a tentar responsabilizar-vos mas não conseguiu. Vocês estão literalmente, fora do alcance da lei britância. Não só da lei britânica. Há nove parlamentos. Nove países representados aqui, a quem Mark Zuckerberg recusou receber e fornecer provas.

            O que parece que não percebem é que isto é maior que vocês.

            É maior que qualquer um de nós. Não se trata de esquerda ou de direita, sobre "Sair" ou "Ficar", sobre Trump ou não. Trata-se se, de facto, é possível voltarmos a ter eleições livres e justas. Porque como as coisas estão agora, acho que não é possível. Então, a minha pergunta para vocês é: É isto que vocês querem? É assim que querem ficar na história? Como os lacaios do autoritarismo que está a crescer por todo o mundo? Porque vocês surgiram para interligar as pessoas e recusam-se a reconhecer que essa tecnologia nos está a dividir. A minha pergunta para toda a gente é:

            É isto que queremos? Deixá-los sair impunes?

            Sentarmo-nos a brincar com os nosso telemóveis à medida que a escuridão aumenta? A história dos vales do sul do País de Gales é de luta pelos direitos. Isto não é uma simulação, é um ponto de inflexão. A democracia não está garantida, e não é inevitável. Nós temos de lutar e temos de ganhar. Não podemos deixar estas empresas terem este poder incontrolável.. Depende de nós, de você, de mim e de todos nós.

            Somos nós que temos de recuperar o controlo.

            (Aplausos)

            https://www.ted.com/talks/carole_cadwalladr_facebook_s_role_in_brexit_and_the_threat_to_democracy/transcript