segunda-feira, 2 de novembro de 2020

"Decidi preparar a invasão de Portugal"


Por Maria José Oliveira  (in 'Público')


Em 1940, o Alto Estado-Maior espanhol elaborou, a pedido de Franco, um plano de ataque a Portugal, com a ocupação de Lisboa e a tomada de toda a costa nacional.

O documento foi descoberto pelo historiador espanhol Manuel Ros Agudo, que estará em Lisboa, na terça-feira, para dar uma palestra sobre o tema.

O plano não permitia qualquer falha.

Tudo começaria com um ultimato (impossível de cumprir) e um prazo limite de 24 horas ou 48 horas, findas as quais teria início a invasão de Portugal.

A operação incluía intervenções por terra, ar e mar e as primeiras incursões terrestres, realizadas por um contingente de 250 mil combatentes espanhóis, avançariam em direcção a Ciudad-Rodrigo, Guarda, Celorico da Beira, Coimbra, Lisboa, Elvas, Évora e Setúbal - a ocupação da capital e a divisão do país em três parcelas constituíam os passos fundamentais para a conquista de Portugal.

Ao longo de quase 70 anos, o Plano de Campanha nº 1 (34), o grande projecto de Franco para invadir Portugal, delineado em plena II Guerra Mundial (1940), esteve "adormecido" nos arquivos da Fundação Francisco Franco.

Os rumores da tentação franquista de conquistar Portugal há muito que circulam no meio historiográfico - até porque uma das grandes orientações da política externa de António de Oliveira Salazar, durante o conflito mundial, consistia na independência nacional face à ameaça da anexação espanhola.

Mas só recentemente foi possível confirmar que os temores de Salazar tinham justificação.

Em 2005, o historiador espanhol Manuel Ros Agudo foi o primeiro investigador a aceder às cem páginas que compõem o plano de ataque contra Portugal, elaborado pela 1ª secção do Alto Estado-Maior (AEM) espanhol no segundo semestre de 1940.

O ineditismo da descoberta levou o investigador, de 47 anos, a dedicar-lhe um capítulo na sua obra A Grande Tentação - Franco, o Império Colonial e o projecto de intervenção espanhola na Segunda Guerra Mundial, recém-editada em Portugal pela Casa das Letras.

Na próxima terça-feira, Ros Agudo é um dos oradores da conferência A Península Ibérica na II Guerra Mundial - Os planos de invasão e defesa de Portugal, a realizar no Instituto de Defesa Nacional, a partir das 14h30, numa iniciativa conjunta com o Instituto de História Contemporânea.

Devastador e célere

O projecto de invadir Portugal não configurava uma "acção isolada", como se pode ler numa das alíneas dos documentos analisados por Ros Agudo.

Tratava-se de uma operação preventiva, no âmbito da ambição franquista de declarar guerra à Inglaterra.

Numa altura em que França já caíra sob o domínio da Alemanha nazi, a Espanha, então com o estatuto de país não-beligerante, acalentava o sonho de um império norte-africano.

Nem Hitler nem Mussolini podiam, em 1940, garantir a Franco a concretização deste desejo.

Mas isso não fez esmorecer as ideias expansionistas e bélicas do "Caudilho".

A guerra contra a Inglaterra teria início com a tomada de Gibraltar.

Porém, os estrategas do AEM prenunciavam que a primeira resposta britânica a este ataque fosse "um desembarque em Portugal com a ideia de montar uma cabeça-de-ponte para a invasão da península".

Por isso, no plano ofensivo, determinava-se o emprego dos "meios necessários para bater o Exército português e o seu Aliado, pela ocupação do país e defesa das suas costas".

Tudo isto seria realizado sem o conhecimento prévio de Hitler e Mussolini, porque Franco "queria manter o carácter secreto das operações, ter liberdade de manobra e também por questões de orgulho", explicou Ros Agudo ao P2.

Contudo, após iniciados os ataques a Gibraltar e a Portugal, Espanha previa o apoio da aviação alemã, "nomeadamente com o reforço de bombardeiros e caças".

A participação da aviação espanhola estava também definida no plano de ataque (com as missões de "destruir a aviação inimiga e as suas bases" e de "atacar os núcleos de comunicação, especialmente nas direcções da invasão, e os transportes de tropas").

Mas a Espanha receava que o vasto contingente de homens em terra se confrontasse com a superioridade luso-britânica no ar.

Neste âmbito, o reforço alemão seria indispensável.

Assim como se afigurava prioritário um ataque terrestre devastador e célere.

Para a Marinha, o AEM planeara um conjunto de acções de defesa ("exercer acções com os submarinos sobre as comunicações inimigas", "proteger as comunicações com o Protectorado de Marrocos e Baleares" e "efectuar acções de minagem nos próprios portos") que pressupunham uma reacção rápida da Marinha britânica.

E Salazar?

Em Dezembro de 1940, quando Franco escreveu, assessorado pelo AEM, que decidira atacar Portugal - "Decidi [...] preparar a invasão de Portugal, com o objectivo de ocupar Lisboa e o resto da costa portuguesa", o “Tratado de Amizade e Não-Agressão”, firmado pelos dois países em Março de 1939, não passava de um documento sem importância para o "Caudilho".

Mas foi a partir desse acordo que os franquistas intensificaram as pressões diplomáticas para Portugal deixar de respeitar os compromissos da aliança luso-britânica: fizeram-no através de Nicolau Franco, irmão do ditador espanhol e embaixador em Lisboa e também "aconselharam" o então embaixador português em Madrid, Pedro Teotónio Pereira.

Perante os planos de anexação, Espanha não desprezava apenas o pacto de não-agressão, mas também a intervenção activa e material do Governo de Salazar no apoio aos franquistas durante a Guerra Civil de Espanha, onde três a cinco mil "viriatos" combateram nas fileiras das milícias da Falange, do Exército e da Legião espanhola, muitos deles recrutados através de anúncios nos jornais pagos pelo Estado, em que a rádio emitia propaganda franquista e Salazar tinha promovido a mobilização anticomunista (recolhendo benefícios para a sustentação do Estado Novo).

Atentando no rigor e na determinação plasmadas no Plano de Campanha nº 1 (34), urge questionar qual o destino que reservava Franco para o ditador português, na eventualidade de a ocupação ter avançado.

A documentação descoberta por Ros Agudo cinge-se aos aspectos puramente militares e não contempla a "sorte pessoal" do presidente do Conselho.

Mas o historiador, professor de História Contemporânea na Universidade San Pablo, em Madrid, avançou ao P2 duas hipóteses: "O destino de Salazar e do seu Governo, no caso de Portugal não conseguir resistir à invasão, seria estabelecerem-se nas colónias (Angola ou Moçambique); ou podiam exilar o Governo para Londres, como aconteceu com alguns países europeus ocupados pelo Eixo".

Palavras encomendadas

Quanto ao futuro de Portugal, não há qualquer referência nos documentos, ficando sem resposta a pergunta sobre se a ocupação seria ou não temporária.

No entanto, Ros Agudo cita no seu livro as "inquietantes" palavras de Serrano Suñer, ministro dos Assuntos Exteriores espanhol, ao seu homólogo alemão, Joachim von Ribbentrop, datadas de Setembro de 1940: "(...) ninguém pode deixar de se dar conta, ao olhar para o mapa da Europa, que, geograficamente falando, Portugal na realidade não tinha o direito de existir. Tinha apenas uma justificação moral e política para a sua independência pelo facto dos seus quase 800 anos de existência".

Ros Agudo acredita que estas palavras, proferidas em Berlim, foram "encomendadas" a Suñer por Franco, com a intenção de averiguar "a reacção de Hitler perante a ideia de um Portugal integrado num futuro grande Estado ibérico".

Mas "o Führer não quis fazer qualquer compromisso sobre este assunto", nota o historiador.

Apesar das declarações de Serrano Suñer, Manuel Ros Agudo não crê que Franco pretendesse "uma integração pura e dura num Estado ibérico", porque isso arrastaria "muitos problemas".

"É possível que, sob uma Nova Ordem europeia, na eventualidade da vitória fascista e da derrota da Grã-Bretanha, Franco tivesse permitido a existência de um Portugal marioneta, fascista e inofensivo", diz.

E, continuando num exercício de História virtual, acrescenta: "Se a Rússia tivesse sido eliminada por Hitler, o grande confronto, ou a Guerra Fria dos anos 50 e décadas posteriores, teria acontecido entre os EUA, por um lado, o grande bloco euro-africano fascista, pelo outro, assumindo este último um papel semelhante ao bloco soviético que conhecemos.

Tanto a Espanha como Portugal teriam feito parte desse bloco constituído pelas potências do Eixo".

Nos últimos meses de 1940, o Plano de Campanha nº 1 (34) esteve prestes a ser realizado.

Franco ordenara a prontidão militar para o ataque.

Mas o que lhe sobrava em meios operacionais faltava-lhe em condições políticas, nomeadamente a garantia dos apoios alemão e italiano e a concretização das ideias imperialistas.

"Os requisitos políticos para dar esse passo - as garantias de obtenção de um império em África - acabaram por não ser dados", explica Ros Agudo.

O plano foi então depositado em arquivo e tornado inacessível durante quase sete décadas...

domingo, 1 de novembro de 2020

O que há numa votação?

https://harpers.org/

Por Danielle Allen, Jamelle Bouie, Jason Brennan, Sarah Smarsh, Astra Taylor


Política eleitoral numa democracia doente

Na terça-feira, 3 de Novembro, os americanos votarão para presidente pela 59ª vez na história da nossa nação. Os esforços republicanos na supressão dos eleitores há muito minaram a noção de eleições livres e justas, mas Donald Trump diminuiu ainda mais a integridade do nosso sistema eleitoral — sabotando o Serviço Postal, desrespeitando a Lei Hatch e nivelando falsas acusações de fraude eleitoral, sem fazer nada para evitar interferências de governos estrangeiros. Essas ameaças exigem acções urgentes por parte dos líderes políticos, mas também levantam questões difíceis sobre o que significa ser um cidadão numa democracia, particularmente uma que não está conseguindo cumprir os seus ideais. Temos a obrigação moral de votar mesmo que o sistema eleitoral seja corrupto ou injusto? Quem deve poder votar, e por quais métodos? O que significa para um governo ser representativo?

Em Julho, a Harper's Magazine reuniu um grupo diversificado de estudiosos e jornalistas no Zoom para discutir a ética, a mecânica e as implicações do voto, e pensar através do papel dos cidadãos numa democracia em risco. A conversa foi moderada pelo editor de Harper, Christopher Beha.

participantes:

- Danielle Allen é professora da Universidade James Bryant Conant na Universidade de Harvard, directora do Centro de Ética Edmond J. Safra de Harvard e autora de Nossa Declaração.

- Jamelle Bouie é colunista do New York Times e analista política da CBS News.

- Jason Brennan é professor de Estratégia, Economia, Ética e Políticas Públicas da Família Flanagan na Universidade de Georgetown e autor de Against Democracy.

- Sarah Smarsh é uma jornalista, uma recente Joan Shorenstein Fellow na Kennedy School o Government da Universidade de Harvard, e autora de Heartland.

- Astra Taylor é um documentarista, escritor e organizador político. Ela é a directora do What Is Democracy?


i. the voting imperative

Christopher Beha: Eu quero falar sobre as especificidades da situação democrática da América, mas eu também quero abordar algumas questões abstratas e filosóficas sobre o voto. Vamos começar nesse nível: Como uma questão geral, todos vocês pensam que os cidadãos numa democracia têm um imperativo de votar?

Jason Brennan: Eu não acho que sim, mas a maioria dos americanos fazem. Embora nem todos votem, pesquisas mostram que cerca de 96% dos americanos dizem que acham que há o dever de votar. Agora, se eles realmente acreditam que isso ou não é uma boa pergunta. Mas quando você olha para os argumentos específicos que as pessoas dão a favor da obrigação de votar, eles geralmente são muito gerais: você deve fazer algo que exibe virtude cívica. Você deve fazer algo que contribua para o bem-estar de seus concidadãos. Você deve fazer algo que pague qualquer dívida com a sociedade que você possa ter.

Esses argumentos sofrem do que você pode chamar de um problema de particularidade. Tudo o que eles mostram é que a votação pode ser uma das muitas maneiras diferentes — algumas delas muito mais eficazes — de cumprir a obrigação subjacente em questão. Um típico mecânico de automóveis faz muito mais pela sociedade consertando carros do que votando. Isso não é para denegrir necessariamente o voto; são apenas contribuições fundamentalmente diferentes. Quando votamos, temos uma pequena chance de fazer a diferença. Poderíamos gastar o tempo necessário para votar fazendo outra coisa que contribua para o bem-estar dos outros, ou cumpra um dever, ou pague uma dívida com a sociedade.

Eu costumo pensar em votar como semelhante à agricultura. É importante que pessoas suficientes plantem trigo. Não é que todos nós temos que ser agricultores de trigo. É importante que muitas pessoas, e uma variedade de pessoas, votem. Não segue que cada pessoa tem que votar.

Danielle Allen: O que Jason sente falta é o valor informativo incrivelmente importante da votação. O que quero dizer é que até que as pessoas votem, não sabemos qual é a opinião da população. Pesquisas de opinião pública não substituem essas informações, o que é algo que você pode determinar apenas com a participação máxima dos eleitores. Esta é uma questão completamente diferente de se uma votação faz ou não uma diferença decisiva em qualquer eleição em particular, e é uma das quais eu acho que você pode obter a obrigação de votar.

Astra Taylor: Quando eu estava fazendo Perguntas e Respostas para o meu filme O Que É Democracia?, eu encontrei muita santidade sobre votar. Inevitavelmente haveria um senhor branco mais velho que se levantaria e diria: "Não acredito que as pessoas neste país nem votam." Ele nunca pareceu se perguntar, por que não? Por que eles se sentem desconectados? Por que eles se sentem cínicos? Quando eu perguntava às pessoas sobre isso em entrevistas, as pessoas me diziam que era muito difícil votar, ou que seu voto não contava — o que muitas vezes é objectivamente verdade, dependendo de onde você mora e em qual eleição você está votando. As pessoas não estão optimistas de que algo realmente mudará, uma intuição apoiada por pesquisas que mostram que os eleitores regulares têm muito pouca influência sobre a política. Na minha opinião, dizendo: "Oh, há um imperativo moral. As pessoas morreram por esse direito e, portanto, você tem que votar" não faz justiça a todas as coisas que estão pesando sobre os politicamente desengajados.

Sarah Smash: Eu fui criada em torno de pessoas que não votaram. Eu era uma criança nos anos 80 e uma adolescente nos anos 90 - Reagan através de Clinton. Minha mãe sempre votou nas eleições presidenciais, mas a maioria da minha comunidade rural, da classe trabalhadora, não estava envolvida politicamente. Não foi bem apatia, não é a palavra certa para isso. Eles não negligenciam votar porque não se importavam, ou porque eram preguiçosos, ou porque não eram pessoas inteligentes e brilhantes com ideias e o desejo por um país melhor. Em vez disso, viviam longe de um local de votação e não tinham o tempo e a energia necessários para serem informados politicamente. Estávamos trabalhando na colheita de trigo de Verão, do amanhecer ao anoitecer, quando outros americanos estavam participando de eventos de campanha ou reuniões cívicas. Enquanto outros votavam, estávamos trabalhando. Da mesma forma, milhões de trabalhadores americanos estão movendo as engrenagens da sociedade enquanto as classes tagarelas debatem política no Twitter.

Não há desculpa para não prestar atenção. Mas quero ecoar o ponto de Astra de que há muitas pessoas para quem não votar não é nem uma posição política nem um sintoma de falha moral. É o único resultado plausível das limitações de suas vidas.

O verdadeiro imperativo moral — um que certamente todos concordamos — é que aqueles que têm o poder e o privilégio de construir sistemas eleitorais devem fazê-lo de uma maneira que os torne acessíveis, equitativos, justos e democráticos. Certamente não temos isso no momento.

Jamelle Bouie: Eu não sei se há uma obrigação de votar. Mas, para ecoar o ponto de Sarah, a questão em si pode afastar outras questões mais críticas: as pessoas têm a segurança material ou o acesso para sentir que podem realmente participar? As pessoas são capacitadas em suas vidas de tal forma que podem fazer uma conexão entre política e voto?

O impulso dos "framers" - não um termo que eu amo, mas um que eu vou usar - para restringir o voto a homens brancos proprietários refletiam seu preconceito, mas também refletia seu senso de que você só poderia participar da sociedade republicana se você tivesse algum tipo de participação material. Uma vez que você tinha algum tipo de segurança e responsabilidade para com os outros, então você tinha uma base da qual você poderia participar do governo republicano.

Na verdade, não acho que essa percepção esteja errada. Se vivemos em uma sociedade de sufrágio universal, onde todos são iguais políticos — pelo menos no papel — então isso impõe obrigações àqueles que controlam o sistema para permitir que as pessoas que querem participar o façam. Não sei se há uma obrigação moral de votar, mas acho que há uma obrigação moral de construir uma sociedade na qual as pessoas se sintam empoderadas para participar da política.

Allen: Em certo sentido, Sarah e Jamelle estão chegando à questão difícil — se temos um sistema funcional. Se é um sistema não funcional e fraudulento, então não há sentido em votar, e a coisa eticamente correcta a fazer seria não votar.

Beha: Alguém aqui acha que os problemas da nossa democracia são tão profundos que temos a obrigação de não votar?

Bouie: Eu costumo pensar na saúde da nossa democracia e na saúde do nosso sistema de votação como coisas relacionadas, mas separadas. Há maneiras pelas quais nossa democracia ainda é muito saudável. Temos uma esfera pública vibrante. A sociedade civil ainda é bastante robusta. Há muitos caminhos para as pessoas comuns se envolverem na política. Ainda há amplo espaço para protestos públicos, como vimos.

Mesmo o sistema bipartidário permanece extraordinariamente poroso — há pontos de entrada para pessoas que querem mudar seriamente a direcção de qualquer das partes, para o bem ou para o mal. A esse respeito, não acho que a democracia americana esteja necessariamente em má forma. Na verdade, acho que se mantém bem comparado com outras democracias avançadas.

Mas há muitos problemas quando se trata de votação, a maioria dos quais decorrem do fato de que a Constituição não tem direito afirmativo de voto. Essa ausência acaba abrindo a porta para os tipos de fardos que vemos hoje: a falta de um sistema de votação uniforme, a falta de regras uniformes de votação, todos os tipos de chicanary eleitoral. Portanto, ainda há muito que poderíamos fazer para tornar o sistema de votação e eleições da América mais justo, mais competitivo e mais igual, mesmo que nossa democracia seja relativamente forte no geral.

Brennan: Os Estados Unidos têm o problema de ter chegado em primeiro lugar, e grande parte da Constituição é o resultado da especulação de filósofos primitivos que não tinham experiência com a democracia. Por exemplo, eles pensaram que ter um sistema de duas casas funcionaria melhor do que um unicameral. Eles achavam que o federalismo teria um desempenho diferente. Eles pensaram que o sistema de votação do primeiro após o pós-votação funcionaria de forma diferente. Somos uma democracia medíocre, ponderada por regras arcaicas de uma velha constituição.

allen: Concordo com Jason; realmente importa que nossas instituições foram inventadas no século XVIII. É impressionante que as jovens democracias pareçam ter sido capazes de lidar com a pandemia coronavírus muito melhor do que as democracias mais antigas. Você poderia enquadrar a questão como uma das democracias populistas versus democracias institucionalistas, ou de outra forma, mas "jovem versus velho" também funciona. Os direitos sociais foram assados na estrutura fundamental dessas democracias mais novas do século XX. Mas, no nosso caso, os direitos sociais foram enxertados em uma estrutura que originalmente se concentrava em direitos políticos e civis. Este sistema tem muitos problemas e requer correcção, mas eu não diria que é tão disfuncional que seríamos obrigados a abster-se de votar.

ii. the moral obligation to be informed

Beha: Se concordarmos em participar no sistema eleitoral dos EUA, quaisquer que sejam nossos escrúpulos com ele, me pergunto se há então a obrigação de ser informado antes da votação? Para ter certeza de que o voto vem de uma compreensão sofisticada das apostas?

Allen: O modelo do "bom cidadão" tem variado ao longo da história do país, e o do "eleitor informado" em particular data da Era Progressista. As mulheres prometeram se informar ao fazer o caso que mereciam o direito de voto, e tivemos esse modelo de eleitor informado desde então.

Mas há também o modelo do cidadão virtuoso baseado em carácter. E o partidário, o legalista. E há o activista que defende os direitos. Todos esses modelos de cidadania são importantes e relevantes.

Para mim, a questão não é tanto, existe o dever de se tornar um cidadão informado? mas, Como oferecemos oportunidades para as pessoas adquirirem informações através de experiências positivas?

Smarsh: A falta de informação foi, eu acho, uma das razões pelas quais minha comunidade não estava altamente engajada na política a nível local, estadual ou nacional. Como mencionei, ser informado muitas vezes requer tempo e recursos que milhões de americanos não têm. Mesmo que você possa encontrar o tempo, o tom académico, a linguagem erudita e os quadros abstratos do discurso político podem parecer um planeta distante e inóspito. Se você foi criado em um ambiente que, por razões compreensíveis, não valorizava a votação — muito menos o voto informado — por onde você começa?

Allen: Além dos desertos alimentares, que estamos acostumados a ouvir, também temos uma série de lugares que são desertos de notícias. E o ambiente para o consumo de Allen e informação onde as notícias são acessíveis tende a ser bastante horrível. Ambas as coisas requerem correcção para que os eleitores tenham um ambiente saudável para o consumo e processamento de informações.

brennan: Um nível muito baixo de informação geral entre os eleitores tem sido um achado persistente entre os cientistas políticos desde que começaram a estudar o comportamento dos eleitores. E não apenas um baixo nível de informação, mas um baixo nível de ideologia política. A maioria das pessoas está votando por razões que têm a ver com identidade, não ideologia.

Eu acho - e esta é a visão comumente aceita na ciência política e na economia - que isso é resultado de incentivos perversos. Não vale a pena o tempo dos eleitores saberem das coisas, a menos que estejam interessados em política — a menos que seja seu hobby ou trabalho.

Esta é uma questão embutida com a democracia em massa. A probabilidade de uma votação ser decisiva é muito pequena — votar é como jogar na loteria. Assim, a democracia incentiva as pessoas a votar por outras razões além de informações, ou preferências políticas — para formar alianças com pessoas, para conseguir parceiros e amigos de namoro, ou apenas para emote. Então, antes de considerarmos se é preciso ser um eleitor informado, temos que perguntar, por que criamos essa barreira estrutural para nos informarmos?

Bouie: Sempre tive curiosidade sobre o que significa ser informado em primeiro lugar, porque muitas vezes estamos pensando se alguém pode descrever plataformas políticas, ou pode dizer o que os partidos representam — o tipo de informação que imaginamos ser a substância da política eleitoral.

Mas há uma maneira diferente de imaginar conhecimento político. Durante a Reconstrução, os Estados do Sul aprovaram novas constituições para voltarem à União. E em estados como Carolina do Sul e Mississippi e Louisiana, muitas das pessoas que criavam essas constituições eram pessoas anteriormente escravizadas — pessoas que tinham apenas quatro ou cinco anos de escravidão. Muitos deles não sabiam ler nem escrever, e aqueles que tinham educação não necessariamente tinham os profundos. No entanto, eles foram capazes de criar constituições que, pelo menos na Carolina do Sul, acabaram durando até o início de Jim Crow.

Para a maioria dos padrões, eu não acho que você diria que essas pessoas foram informadas. Mas eles tinham conhecimento de si mesmos como sujeitos políticos. Eles se entendiam como cidadãos cujas vidas eram moldadas pela política, um entendimento que exigia que fossem participantes políticos. Na medida em que as pessoas precisam ser informadas, elas podem precisar ser informadas dessa forma — não necessariamente para ter conhecimento rote particular, mas para se entenderem como sujeitos democráticos.

Taylor: Sim, pensamos no "eleitor informado" como alguém que entende o governo, que sabe sobre candidatos e suas plataformas. Quer dizer, eu nasci no Canadá, e acabei de reivindicar minha cidadania americana. Esta eleição é a primeira vez que posso votar neste país. Então, eu sou um eleitor informado? Não conheço todas as pessoas que concorrem ao cargo. No entanto, esse é o tipo de conhecimento político que especialistas tendem a julgar as pessoas.

Mas há outras maneiras de as pessoas serem informadas, como sugeriu Jamelle — alguém pode ter experimentado em primeira mão o quão injusto e irresponsável o sistema americano pode ser. Esta é uma perspectiva crítica que muitas pessoas no poder, ou que são hiperpartidárias ou hiperpolíticas, não têm.

Bouie: E esse tipo de experiência vivida é algo que você não pode obter da educação tradicional. É algo que você recebe dos tipos de instituições mediadores que têm estado em grande parte em declínio em nossa sociedade: igrejas, sindicatos, várias associações cívicas.

Aqueles que anteriormente escravizaram pessoas que desempenharam um papel na elaboração de constituições de reconstrução eram frequentemente veteranos do Exército da União, membros de ligas sindicais; eles estavam muito envolvidos nos tipos exactos de instituições que ajudam as pessoas a preencher a lacuna entre a política e a vida cotidiana, e ajudá-las a ver a conexão.

Taylor: Se queremos um público mais esclarecido — e essa é uma palavra incrivelmente problemática — então temos que priorizar e investir em todos os tipos de coisas que vão além da votação. Precisamos investir em educação pública em todos os níveis, precisamos fortalecer a imprensa livre, precisamos mediar as instituições, especialmente os sindicatos, para serem mais difundidas e robustas. Mas na última hora, estou muito mais preocupado com a ignorância dos poderosos do que com a ignorância do povo. Seria interessante imaginar uma esfera pública onde passamos tanto tempo nos preocupando com isso quanto com as capacidades e capacidades dos eleitores comuns.

brennan: Uma maneira de remediar alguns dos problemas que estamos descrevendo aqui pode ser algo chamado "voto de preferência iluminado". É baseado em um sistema estatístico que cientistas políticos têm usado por trinta anos ou mais para estudar o que determina o comportamento dos eleitores. O que eles descobriram é que se você coletar dados sobre o que os eleitores querem, quais são suas categorias demográficas e qual é o seu nível de conhecimento político, você pode determinar o que um público demograficamente idêntico teria apoiado se fosse totalmente informado.

Minha sugestão é que experimentemos usar isso como um sistema político real. Deixe todo mundo votar. Mas quando você vota, você nos diz o que você quer, quem você é, e o que você sabe. Com base nos dados, você calcula o que o público gostaria se tivesse sido totalmente informado. Na verdade, você estaria desafiando a democracia, corrigindo estatisticamente o fato de que a participação não reflecte a população como um todo.

Não estou dizendo que isso é perfeito. Não estou dizendo que é uma panaceia. Mas é um método que temos usado para pesquisas que podem estimar de forma confiável como um público desbiased pode votar. E isso é pelo menos uma evidência a favor de pensar que é uma escolha melhor do que o nosso sistema actual.

Beha: Alguém tem pensamentos sobre isso?

Smarsh: Eu entendo a validade do que você está descrevendo para fins de pesquisa, mas quem pode decidir o que significa ser "totalmente informado"? Além disso, se fôssemos aplicar esse modelo ao mundo real, estaríamos colocando nossa energia na direcção errada — tentando corrigir a ignorância, adulterando números em vez de procurar aumentar o conhecimento de um eleitorado expansivo através da educação e da divulgação.

allen: Outra maneira de colocar o ponto de Sarah é que este sistema proposto assume erroneamente que o processo de conversão da opinião pública em decisões políticas é estático. Não é nada. é dinâmico. Essa é a justificativa construtiva para a democracia, que os processos democráticos geram conhecimento e mudam opiniões. Os valores que enquadram nossa tomada de decisão são contestados e disputados. É esse elemento dinâmico que precisamos, não o elemento estático e descritivo que a pesquisa nos dá.

Bouie: Certo, democracia é tanto sobre o fazer como é sobre reunir preferências. Deve ser dinâmico, como disse Danielle, e deve ser uma maneira de uma população expressar e aproveitar suas energias criativas em direcção à política. Estou instintivamente desconfiado de qualquer coisa que pareça contornar isso, mesmo que a ideia de Jason faça sentido conceitual. O que faz.

É como preferir filmar contra digitalmente. Eu sei que um sensor digital vai capturar mais detalhes e alcance dinâmico do que um pedaço de tira de filme. Mas, sem dúvida, a fotografia é sobre os processos analógicos de desenvolvimento e impressão de filmes tanto quanto sobre o produto final.

iii. the myth o the popular vote

Beha: Parece claro que muitos americanos não se sentem encorajados a votar, e que sua experiência política tem sido muitas vezes de falta de resposta ou injustiça. Uma instituição exclusivamente americana que contribui para esse sentido é o Colégio Eleitoral. Por muito tempo, a ideia de que alguém poderia perder o voto popular e ganhar a eleição parecia um ponto abstracto, quase técnico. Agora já aconteceu duas vezes em uma geração. Quando você entra na cabine de votação, você faz isso sabendo que a pessoa em quem você vota poderia ganhar o voto popular e ainda perder a eleição.

Se você está disposto a participar de um sistema como o Colégio Eleitoral, você é então obrigado a aceitar o resultado da eleição? Ou ainda pode-se dizer que o fato de que a pessoa que obteve mais votos não ganhou é fundamentalmente injusto?

Taylor: Há uma crescente consciência entre os liberais de que o Colégio Eleitoral tem esse incrível potencial para frustrar os candidatos que a maioria dos eleitores votaram. Mas há uma consciência igual e oposta entre os jovens conservadores de que ter estruturas de controle minoritário é o seu caminho para a vitória.

Um dia depois que Donald Trump foi eleito, eu estava na Carolina do Norte entrevistando um grupo de republicanos universitários. E fiquei impressionado com o quão conscientes esses jovens de 21 e 22 anos estavam no fato de que seu candidato tinha perdido o voto popular, e o quão comprometidos eles estavam em defender o Colégio Eleitoral. Havia um apego real a ele, e à ideia de que a opinião popular ou o voto popular é realmente uma coisa ruim. Quero dizer, eles falavam na linguagem clássica de "evitar o domínio da máfia" e descreveram as cidades como fossas liberais. Eles não falavam a língua da democracia como Ronald Reagan poderia ter quando ele invocou a Maioria Moral, por exemplo.

Brennan: Temos que ter cuidado em falar sobre essa coisa chamada voto popular. Quando nos referimos ao voto popular, estamos imaginando que os políticos fizeram campanha pelo voto popular, os votos foram votados, e então o Colégio Eleitoral entrou e magicamente frustrou os resultados. Mas não é assim que os políticos fazem campanha nos Estados Unidos. Uma descoberta básica na ciência política é que a forma como os partidos executam campanhas, as pessoas que escolhem como candidatos e as plataformas sob as quais eles dirigem dependem do tipo de sistema de votação em vigor. Se não tivéssemos um Colégio Eleitoral, teríamos campanhas diferentes, partidos diferentes e possivelmente candidatos diferentes com plataformas diferentes. Não é que Clinton necessariamente teria vencido e Trump teria perdido — em vez disso, provavelmente teríamos dois candidatos completamente diferentes. Nesse sentido, o Colégio Eleitoral não está simplesmente frustrando o voto popular; é garantir que não há nada que possamos chamar significativamente de voto popular em primeiro lugar.

Bouie: Esse é um ponto importante. Mas também é importante notar que, mesmo reconhecendo que não há realmente algo chamado voto popular que reflicta com precisão as preferências do eleitorado americano, houve também, pelo menos desde a década de 1820, um entendimento amplamente defendido de que o candidato que ganha mais votos deve se tornar presidente.

Em 1824, John Quincy Adams ganhou a presidência apesar de ganhar menos votos do que Andrew Jackson. Isso criou um escândalo legítimo; na verdade, é daí que vem o termo "barganha corrupta". Portanto, mesmo que reconheçamos e aceitemos que um dos possíveis resultados sob o sistema actual é um presidente minoritário, acho que as pessoas ainda se justificam em se sentirem muito perturbadas com essa perspectiva.

Sob condições de menor polarização política, um candidato vencedor que ganhou uma minoria de votos pode reconhecer esse fato formando uma espécie de governo de unidade. Mas, como vimos nos últimos quatro anos, e como certamente vimos de 2000 a 2004 — estamos vivendo em uma situação de alta polarização onde um presidente que ganha uma minoria dos votos vai governar como se tivesse conquistado uma maioria decisiva de qualquer maneira. Isso também leva as pessoas a serem altamente perturbadas pela perspectiva de um presidente minoritário.

allen: O ponto de Jamelle é bom, mas eu mencionaria ao lado de sua intuição que o presidente deveria ganhar a maioria dos votos uma intuição igualmente convincente - que você não pode ter uma democracia constitucional viável se, desde o primeiro dia, algumas pessoas sabem que sempre vão perder. Então, além de ter mecanismos de protecção da maioria, você também tem que ter os que protegem minorias. A questão é realmente sobre equilíbrios. Quantas vezes você depende da intuição majoritária? Com que frequência depende da intuição protectora de minorias?

Sabe, se o Colégio Eleitoral funcionasse de tal forma que você soubesse que as chances eram de que você teria um resultado minoritário apenas uma vez a cada quarenta anos, então toleraríamos o momento em que a intuição majoritária se sentisse frustrada. Reconhecemos que havia outra intuição que precisava de uma certa quantidade de espaço para que todo o sistema permanecesse válido e viável. Mas o tipo de mudança demográfica que sofremos mudou a frequência com que cada intuição será activada em qualquer momento.

Para mim, isso significa que temos que reorganizar certos mecanismos. Uma solução seria a expansão da Assembleia, que não se livraria totalmente dos resultados minoritários, mas mudaria a frequência desses resultados de volta em uma direcção sustentável em oposição a uma que, sem dúvida, desfaça a legitimidade de uma democracia constitucional.

Smarsh: Como um progressista que reside em um estado chamado rubi-vermelho onde meu voto nas eleições nacionais nunca contou, eu acho que uma das consequências mais negligenciadas e perigosas do Colégio Eleitoral não diz respeito aos resultados eleitorais, mas à visão distorcida que apresenta do nosso país.

O mapa dos estados vermelhos e azuis que reinou nas notícias a cabo nos últimos vinte anos é incrivelmente enganoso. Não sou estatístico, mas baseado nas margens de vitória em todo o país, cerca de dois dos cinco eleitores dos EUA votam no partido que perde nas eleições estaduais e nacionais. São milhões de pessoas cuja perspectiva ficou invisível. A ideia de áreas vermelhas e azuis pode ajudar os políticos a determinar onde gastar seus recursos, ou ajudar os especialistas a prever resultados, mas é uma maneira redutiva, até mesmo boba, de entender nosso verdadeiro tecido político.

Brennan: Os votos das pessoas contam de forma diferente. Meu voto conta mais agora que moro na Virgínia do que quando morava em Massachusetts. Contaria menos se eu me mudasse para a Califórnia.

Smarsh: Certo, e essa distorção se torna uma espécie de profecia autorrealizável. Sim, há cálculos políticos que distorcem o processo de campanha e os resultados eleitorais, mas também há distorções mediáticas que prejudicam a precisão de nossa auto-estima como povo. E esse sentido equivocado é perpetuado, em parte, pelas decisões cínicas que determinam quem vale a pena visitar durante uma campanha.

iv. achieving our democracy

Beha: Estabelecemos que nosso sistema distorce muito a forma como os políticos executam campanhas e não reflecte com precisão a vontade popular do eleitorado. Supondo que não desistamos totalmente do nosso sistema, que soluções práticas consideraríamos para remediar esses problemas?

Allen: Para mim, o mecanismo eleitoral que pode quebrar o cenário em que cada estado é todo vermelho ou todo azul é voto de escolha classificada. Essa pode ser uma maneira de equilibrar as intuições majoritárias e minoritárias em uma espécie de tensão viável, sustentável, interactiva e dinâmica.

Smarsh: Na verdade, eu lancei minha primeira votação de escolha este ano. Kansas foi um dos cinco estados em que o Partido Democrata decidiu usar a escolha classificada nas primárias. E mesmo sabendo que Biden seria o candidato quando votei, ainda sentia-se validante fazer um gesto ou declaração com a minha ordem de preferência por outros candidatos. Mais uma vez, muito do problema com os sistemas que estamos discutindo não é apenas sobre estruturas defeituosas, mas sobre os danos que tem sido causados à nossa moral nacional após décadas, ou mesmo séculos, de falhar na verdadeira democracia. Sou a favor da escolha do ranking. Eu cavei.

Allen: A escolha classificada faz um trabalho muito melhor de fazer votos significativos. Se você imaginar um voto igualmente significativo para cada pessoa, você fica muito mais perto disso com escolha branqueada. Você não pode eleger alguém quando a maioria das pessoas se opõe a ela. Essa é a coisa chave. Mas há outras vantagens também. As pessoas têm a oportunidade de expressar plenamente suas preferências, de modo que o valor da informação é muito maior. As evidências indicam que a escolha classificada traz um grupo mais diversificado de candidatos em jogo: mais mulheres, mais pessoas de cor, mais minorias. E outras pesquisas sugerem que ele tende a tornar as campanhas mais moderadas.

Taylor: Mesmo que eu também gostaria de ver a votação classificada, vou tentar oferecer uma pequena defesa do sistema actual, e isso realmente tem a ver com o que Danielle estava dizendo sobre moderação. Há um livro interessante de Amel Ahmed chamado Democracia e a Escolha do Sistema Eleitoral sobre como sistemas de representação mais proporcionais surgiram na Europa. O argumento é que isso normalmente só acontecia quando um dos dois principais partidos estava sob ameaça de ser capturado, seja pela esquerda radical ou pela direita radical. Ter um sistema mais proporcional era uma forma de manter um grau de controle, porque você não precisava se preocupar em perder o partido.

A fraqueza de um sistema bipartidário também é sua possibilidade — se você conseguir capturar um dos dois principais partidos como um grupo fringe, então o vencedor-take-all é a seu favor. Se a coalizão de Sanders tivesse conseguido vencer as primárias, então a coalizão de Sanders estaria à frente do Partido Democrata. E então você tem muito poder.

Beha: Foi o que Trump conseguiu fazer.

Taylor: Exactamente, foi isso que o direito fez. Podemos imaginar um cenário americano onde há um sistema mais proporcional, e seja por causa do voto de escolha classificada, ou de um sistema multipartidário, a coalizão de Trump foi marginalizada como parte de um partido marginal. Mas com uma dinâmica de duas partes, vencedora-take-all, há um enorme potencial de vantagem para tentar capturar uma das partes. Infelizmente, a esquerda não conseguiu isso.

Beha: Outra ideia frequentemente citada para melhorar nossas eleições e aumentar a capacidade de resposta institucional é o voto obrigatório. Seria uma boa ideia nos Estados Unidos?

Brennan: Não fiquei super impressionado com a ideia — a maioria dos trabalhos empíricos existentes sobre votação obrigatória descobriu que os efeitos são surpreendentemente limitados. Parece aumentar a satisfação com a democracia, mas não parece exercer uma influência moderada, e certamente não mostra que, "Oh, os democratas ganhariam todas as eleições se todos tivessem que votar."

Também é importante notar que a maioria dos argumentos a favor do voto obrigatório não são a favor do voto compulsório universal. Aqui está uma experiência de pensamento. Suponha que eu force com sucesso 210 milhões de americanos a votar. Haveria, como sempre, um erro de contagem estatística, porque temos dificuldade em contar votos Brennane. Se eu escolher aleatoriamente vinte mil americanos e decidir que só eles podem votar, e ou forçá-los ou incentivá-los fortemente a votar, obteríamos uma amostra melhor e mais representativa do que seçássemos todos a votar, em parte porque o erro estatístico de vinte mil pessoas seria menor do que o erro de contagem é para o eleitorado total. Este sistema de classificação lhe daria uma amostra mais precisa e representativa do que o público realmente quer do que um sistema de votação compulsória universal. Assim, se o objectivo da votação obrigatória é garantir que o público votante representa o público elegível, você deve preferir a classificação ou as loterias de votação à votação obrigatória.

Allen: Recentemente co-presidi um relatório da Comissão Interpartidária da Academia Americana de Artes e Ciências chamado "Nosso Propósito Comum" no qual, entre outras sugestões para o fortalecimento da nossa democracia, recomendamos o voto obrigatório para todos. Se você mudar para um modelo de classificação como Jason sugere, você não está recebendo o tipo de desempenho cultural ritualizado de um compromisso normativo que é necessário para sustentar a democracia constitucional. Para mim, a questão do voto obrigatório não é estatística — trata-se de ter ou não uma cultura que aceita amplamente a noção de que todos nós contribuímos para tornar nossas instituições funcionais. É sobre o simbolismo, o significado cultural, a compreensão compartilhada de que podemos realizar um compromisso uns com os outros através do acto de voto.

Taylor: Também sou a favor de um sistema obrigatório, pelas razões que Danielle expôs. Mas eu enfatizaria especificamente a quantidade de energia progressiva e dinheiro que é gasto em iniciativas de sair do voto a cada ciclo eleitoral. São recursos que poderiam ser melhor gastos investindo em infra-estrutura e organizando esforços que educam e engajam as pessoas a longo prazo, em vez de apenas tentar reunir uma participação mínima. A pandemia piorou as coisas. Estou pensando em todos os candidatos vitoriosos e insurgentes apoiados por pequenos doadores que entrevistei nos últimos meses: Nikil Saval, Jamaal Bowman, Jabari Brisport, Cori Bush, entre outros. Todos eles tiveram que gastar tanto tempo educando as pessoas não só sobre em quem votar, mas como votar.

Beha: Mesmo se fôssemos adoptar algum tipo de sistema obrigatório, ainda teríamos a questão de quão expansivo esse eleitorado deveria ser. Estamos felizes excluindo não cidadãos e criminosos de votar, por exemplo?

Bouie: Meu senso sempre foi que a elegibilidade do voto deve ser extremamente expansiva, e que se você vai restringir o voto para um grupo de pessoas, você precisa de uma boa razão para fazê-lo. Parte disso apenas Bouiee a crença reconhecidamente tautológica de que o sufrágio universal significa sufrágio universal — que não há nada sobre cumprir pena por um crime, por exemplo, que automaticamente torna você incapaz de pesar sobre a comunidade política em que você vive, uma comunidade na qual você certamente tem uma participação. As prisões são um dos lugares onde a mão do Estado é a mais pesada, por isso é particularmente importante que as pessoas dentro delas tenham uma maneira de registrar suas opiniões sobre como o poder do Estado está sendo implantado.

brennan: A maioria das democracias usa o direito de votar não apenas como uma forma de deixar as pessoas terem sua opinião, mas como uma maneira de a sociedade dizer: "Você conta como um membro pleno. Nós aprovamos você. Desonrar prisioneiros e criminosos é a maneira da sociedade dar a essas pessoas o dedo do meio.

Bouie: Direita. Estar na prisão é a punição por cometer um crime. Tirar o direito de alguém votar em cima disso parece gratuito. Eu não acho que as pessoas que apoiam a desoneração de criminosos levam a sério o suficiente o que significa ser privado de sua liberdade por estar confinado à prisão ou prisão. Qualquer um que tenha tido essa experiência não aceitaria a ideia de tirar direitos adicionais tão levemente.

Allen: Quando a Constituição foi projectada, houve um entendimento generalizado de que em uma democracia a punição começou com a desoneração. Desde as primeiras democracias deste planeta, violar a lei tem sido punido pela perda de direitos políticos. Em outras palavras, o fato de você ser um infractor significava que você tinha quebrado seu contracto com sua comunidade, e a primeira coisa que você perdeu foram seus direitos políticos. Isso era verdade na Grécia antiga. Era verdade na Roma antiga. Era verdade nas primeiras repúblicas modernas. Assim, para os Fundadores, e para alguns defensores do sistema actual, a desoneração não é uma punição extra — é o ponto de partida.

Taylor: Com base nisso, é interessante pensar na medida de votação de 2018 na Flórida que restaurou os direitos de voto para a maioria dos criminosos após o término de suas sentenças, afectando cerca de 1,4 milhão de pessoas. Em seguida, os republicanos aprovaram uma lei que dizia, em essência, que as pessoas que ainda tinham dívidas de encarceramento não seriam autorizadas a votar. Não é surpresa: dívidas relacionadas ao tribunal são extremamente comuns. Isso remonta a outra ideia americana profundamente enraizada, que sustenta que pessoas pobres e devedores são menos capazes de auto-governar. A ideia básica é, se você é um devedor, se você é alguém que não tem propriedade e que deve dinheiro, então você não é capaz de ser um cidadão pleno e auto-governante e você pode ser desprivilegiado. Seja qual for o resultado final, foi animador ver o público votar dessa forma, tentar ré-conceder seus concidadãos.

Allen: Aceito. Essa foi uma das votações mais importantes que qualquer estado fez na última década. E é uma boa ilustração de outro tipo de história que muitas vezes esquecemos. Votar não é uma coisa monolítica — foi fragmentada e contestada ao longo da história americana. Não é realmente o caso, por exemplo, que a Constituição estabeleceu que apenas homens brancos com propriedade poderiam votar. Na verdade, havia mulheres que podiam votar até cerca de 1806.

Taylor: E os não cidadãos poderiam votar nas eleições locais, estaduais e federais e até mesmo exercer cargos até 1926. Hoje tomamos como certa a conexão entre cidadania e direito de voto, mas eles podem ser dissociados e foram dissociados no passado.

Allen: Exactamente. Houve momentos de inclusão igualitária, se não total inclusão igualitária. Mas nenhum momento de inclusão é qualquer tipo de garantia de sua durabilidade. Continua contestado.

Beha: E a questão da idade de votação? Dezoito é um corte apropriado?

brennan: Poucos países deixam as pessoas votarem antes dos dezoito anos, e não sei se alguém os deixa votar antes das dezasseis. O argumento é que crianças de 12 anos são ignorantes, 12 anos de idade não são informadas. E eles estão certos. Temos estatísticas sobre o quanto eles sabem. Mas há um problema aqui se você disser: "Este garoto de 14 anos não pode votar porque eles são tão ignorantes." Eu posso encontrar 40 por cento da população dos EUA que também é tão ignorante. O que há de tão especial nisso?

Então, a maioria dos argumentos que você vê a favor de privar os jovens também se aplicam a grande parte do resto da população, mas eles podem votar porque são mais velhos. O argumento sobre a ignorância não está realmente fazendo o trabalho em explicar por que as pessoas mais velhas podem votar, mas as pessoas mais jovens não podem.

Bouie: Para mim, não há razão para que um garoto de 14 ou 15 anos não possa votar. Muitos dos argumentos contra deixar os mais jovens votarem — eles são muito dependentes, ou não têm capacidade mental — são idênticos ao que você diria se estivesse tentando proibir uma criança de 85 anos de votar, certo? Em um certo ponto, deixe as pessoas votarem!

Bouie: Acho que há um forte argumento a ser feito para deixar os mais jovens votarem. Eu diria que tem 12 anos, talvez mais jovem. Estamos efectivamente vivendo sob uma gerontocracia — nosso sistema eleitoral está massivamente inclinado para os americanos mais velhos, que tendem a ser mais brancos, mais conservadores e mais ricos do que as gerações crescentes. Isso é profundamente injusto, especialmente quando você considera a mudança climática, algo pelo qual milhões de jovens estão bem informados e apaixonados. Os resultados falam por si só. Duvido que teríamos um presidente pior se as crianças pudessem votar. Embora, dada a afeição dos jovens por figuras progressistas como Bernie Sanders e Ed Markey, ainda podemos ter um antigo.

v. what’s in a vote?

Beha: Estamos circulando por algumas ideias diferentes do que votar realmente significa ou faz. Alguns de vocês enfatizaram seu valor informativo, ou sua utilidade como um modo de expressão, ou seu papel como um dever essencial para o funcionamento de uma democracia robusta. O que, eu me pergunto, é votar realmente em, então, e como esse entendimento pode guiar nossas decisões na cabine de votação?

Brennan: Para mim, depende do que está acontecendo quando eu votar. Agora, quando eu acenar minha mão, nada acontece. Mas se isso me acenasse com a mão poderia impedir a eleição de um ditador terrível, então isso mudaria minhas obrigações. Mas se nada vai acontecer, então é apenas algo que estou fazendo para me expressar.

Acho que algo semelhante vale para os eleitores. Por um lado, se , como será o caso da maioria das pessoas - você está em um estado onde a probabilidade de seu voto decidir a eleição é muito pequena, você deve se sentir liberado para votar expressivamente. Mas se você está em um estado onde parece que há uma boa chance de que a eleição será apertada, e assim seu voto tem uma chance significativa de decidir a eleição, então você deve ser estratégico. Nesse caso, se você quiser expressar seu apoio a terceiros, ou votar em um voto de protesto, você pode escrever um poema, ou escrever uma carta para o editor, mas você deve votar no melhor candidato.

Bouie: O problema com essa ideia é que não é imediatamente óbvio se seu voto vai importar ou não, certo? Se você fosse um eleitor em Michigan em 2016, a história e a votação teriam sugerido que seu voto provavelmente não iria importar muito e que Hillary Clinton provavelmente ganharia o estado. Mas isso não aconteceu.

Precisamente porque não podemos saber o que o futuro vai segurar, estou sempre inclinado a encorajar as pessoas a fazer a coisa mais prudente naquele momento. Se você se opõe a Donald Trump, e a eleição é entre ele e outra pessoa, então vote na pessoa que não é Donald Trump.

Smarsh: Embora eu não fosse um deles, conheci algumas pessoas muito atenciosas que votaram em terceiros em 2016. E embora eu não concordasse com suas tácticas, eu também não apreciava sua vilificação subsequente, como se sua postura fosse de alguma forma inteiramente culpada pelo resultado.

Concordo com Jamelle que quando há uma crise em andamento devemos cuidar da crise, e não podemos nos dar ao luxo de ser expressivos da maneira que Jason descreveu. Não quero sugerir que uma distinção entre moderados e progressistas não seja importante ou apenas uma questão de nuance, mas não é a diferença entre ditadura e democracia.

Taylor: Sim, neste momento, como um organizador à esquerda, eu estou lançando uma cédula para a pessoa que eu quero ser meu adversário. Nesse sentido, acho que as pessoas se enganam quando pensam em votar na presidência como uma coisa afirmativa: "Estou votando na pessoa que gosto". Esse não é o caso para mim. Estou votando na pessoa com quem quero estar em uma relação antagónica como activista, e isso não é Donald Trump, porque passei os últimos quatro anos segurando a linha sobre as pequenas vitórias que temos sob Obama.

Havia algo poderoso sobre a margem pela qual Donald Trump perdeu o voto popular. Em um nível fundamental, isso prejudicou sua legitimidade. Nesse sentido, mesmo que você não esteja em um estado de oscilação — se você está em um estado azul seguro — esse número tem importado nos últimos quatro anos. Então esse é um argumento para lançar uma cédula mesmo quando a direcção em que seu estado está indo parece estar predestinada. Embora eu me preocupe que certas apostas estão fora com a pandemia, e que alguns estados podem não ser tão "seguros" como normalmente parecem.

Eu ainda estou muito com Sarah, no entanto, e eu não acho que as pessoas precisam ser vilipendiadas para votos de terceiros. Mas se eu vou me expressar, votar em terceiros não será minha melhor forma de auto-expressão. Há muitas outras coisas mais expressivas para fazer. Sou a favor do poema que Jason mencionou. Não é apenas que a votação de terceiros ou "protesto" não é estratégica; não é mesmo uma forma satisfatória ou catártica de auto-expressão.

Bouie: Aqui estão as perguntas que estou me fazendo na cabine de votação: Que tipo de político eu quero ter que peticionar no futuro? Contra quem eu quero desafiar ou argumentar? Quem eu quero para trabalhar na burocracia federal? Estas são as questões concretas que a votação em termos expressivos muitas vezes obscurece. Quando votar se torna uma questão de sua alma imortal, torna-se difícil ver as coisas muito práticas que estão em jogo.

Allen: Eu sugeriria que o tipo de voto que Jamelle acabou de descrever é, de fato, expressivo. É expressivo de uma abordagem política. A esse respeito, qualquer voto é expressivo. Qualquer voto transmite um conjunto de compromissos, bem como informações sobre a disseminação desses compromissos em todo o eleitorado.

Brennan: Para a maioria das pessoas, acrescentou, os compromissos que os eleitores estão expressando não são fundamentalmente sobre política ou ideologia. Uma boa analogia é o fandom esportivo. Sou fã do Boston Red Sox e do New England Patriots, não porque quando eu tinha oito anos olhei em volta e tentei descobrir quais eram os melhores times, ou porque determinei que esses times representavam melhor meus valores, mas porque eu cresci na Nova Inglaterra, e é isso que você faz para ser um bom New Englander.

Há evidências muito fortes de que, para a maioria das pessoas, o voto é fundamentalmente uma acção expressiva sobre a construção de coalizões, e que nos unimos aos partidos e votamos por benefícios sociais. Estamos apenas agitando bandeiras. Estou tentando mostrar que se eu votar democrata, eu sou um professor universitário adequado. Ou que sou um irlandês de Boston. Se eu votar republicano, isso significa que eu sou um evangélico sulista adequado, e além disso, outros evangélicos do sul podem ser meus amigos e fazer negócios comigo.

Allen: Mas neste momento, a maioria das pessoas não são mais membros de um partido. Não sei se a análise de filiação partidária realmente se mantém.

Brennan: Bem, a maioria das pessoas que não pertencem a um partido político quase sempre votam da mesma maneira. As pessoas dizem: "Sou independente", mas são quase todos os chamados partidários do armário e votam mais ou menos exclusivamente para democratas ou republicanos.

Smarsh: Descobri que a sensação de torcer por uma equipe influencia uma comunidade a votar em uma direcção majoritária. A crescente tribalização da política americana é algo que observei muito directamente ao longo da minha vida aqui no Kansas. Quando eu estava chegando à maioridade e entrando em consciência política em meados dos anos noventa, os conservadores estavam atacando liberais com veneno hipócrita. Newt Gingrich estava segurando no Congresso; Rush Limbaugh estava tomando conta das ondas de rádio; A Fox News estava emergindo como uma potência. Por causa desses esforços, a política não é mais apenas suas ideias — é sua identidade, sua equipe. Essa estratégia conservadora acordou a oposição, também. Muitas das pessoas que eu cresci por perto que não prestaram atenção agora prestam muita atenção como progressistas recém-activados. Mas para os conservadores em particular, a política tornou-se entretenimento, um desporto sangrento que oferece a emoção de pertencer.

Beha: Em outras palavras, são pessoas cujo senso de pertencimento pode superar, digamos, sua inclinação para votar em um candidato cujas políticas estão mais alinhadas com seu interesse próprio. E talvez aqueles que sentem o mais forte e zeloso senso de pertencimento acabam sendo aqueles que estão motivados a ir às urnas.

Taylor: Mais uma vez, é por isso que a ideia de expandir o eleitorado é tão importante. O eleitorado não é uma coisa estável — as demonstrações mudam ao longo do tempo. E democracia não é uma pesquisa, um relato do que as pessoas pensam neste exacto momento. É algo que podemos trabalhar para mudar, transformar, expandir.

allen: Isso é muito bem dito. O desafio é construir conversas públicas que desempresem formas claras de pensar sobre o que é interesse próprio, e se o interesse próprio está ou não ligado ao bem-estar do todo.

É política, cara! É aí que está o trabalho, essa é a questão. Essa é a diversão, essa é a luta. É aí que descobrimos quem somos como povo, onde podemos moldar a cultura. É por isso que é coisa boa.

quarta-feira, 28 de outubro de 2020

arts and culture google

Link fabuloso

Escolhe uma cor existente na banda superior e verás uma coleção de quadros onde predomina a cor que escolheste.

E se lhes tocares eles ampliam-se, mostram o nome do pintor, ano em que foi pintado e a coleção ou o museu a que pertence.


https://artsandculture.google.com/color

Guia dos Melhores 100 SciFi e Fantasy Books

Role até o centro para iniciar... Dica #1: Segure o CTRL para baixo quando clicar em um livro para abrir uma nova guia facilmente. Dica #2: O Firefox é o melhor navegador para visualizar este documento porque lhe dá mais tempo mostrando os títulos pop-up de cada livro. O Internet Explorer só lhe dá 3 segundos, o que é realmente frusterating.

http://cliptank.com/fantasy-scifi-book-guide-with-links.html


Theodore Hook & the Berners Street Hoax

Ultimate PrankHoax Street

O Sr. Hook levou a brincadeira de "pedir pizza para um estranho" a um nível épico no ano de 1809 nas ruas de Londres. Theodore enviou milhares de cartas solicitando entregas, serviços e visitantes para vir em um determinado dia para uma casa selecionada aleatoriamente. Quando o dia chegou, ele e seu amigo assistiram de uma casa do outro lado da rua enquanto um exército de trabalhadores, prestadores de serviços e entregas bombardeava a casa a partir das 4:00 da manhã continuando até tarde da noite. Começou com doze chaminés, uma frota de carrinhos de entrega de carvão, e dezenas de bolos de casamento começaram a chegar em intervalos de uma hora. Entregas de peixes e sapatos se seguiram. Para tornar as coisas ainda mais caóticas, seis pianos e uma equipe de homens fortes chegaram para entregar um órgão. Uma série de médicos, advogados e padres também foram convocados para atender alguém que lhes foi dito que estava morrendo na casa. Quando a loucura na rua estreita atingiu o pico, dignitários como o Governador do Banco da Inglaterra, o Duque de York, o Arcebispo de Cantuária e o Senhor Prefeito da Cidade de Londres também chegaram

. Fonte

Celebridades que encontraram sucesso apesar de pareceram um camelo.

Ser bem sucedido e famoso é um trabalho duro, especialmente se você parece um camelo.

http://cliptank.com/famous-camel-look-alike.htm

As pessoas mais más que já viveram

Pintura dos Heróis e Vilões da História

Pintura Histórica com Links da Wikipédia e Mouse sobre a marcação

Uma colecção das pessoas mais boas e más que já viveram… Quem você adicionaria? Os pensadores mais influentes, cientistas, políticos, filantropos, manifestantes, defensores da liberdade e contribuintes para o bem comum foram incluídos. Os caras "maus" incluem assassinos em série, tiranos, monges de guerra, e aqueles que esmagaram o espírito humano. Esses são listados como "bons" perfeitos? Provavelmente não, mas suas contribuições para a sociedade, ou suas histórias icônicas, são difíceis de ignorar. Existem justificativas para todos os atos malignos ou são todos os mal realizados por mentes dementes.

http://cliptank.com/GoodvsEvilPainting.html

As mulheres mais inspiradoras da história

Este é um tributo a todas as mulheres políticas, guerreiras, pilotos, cientistas, artistas, dançarinas, actrizes, artistas, espiões, prisioneiros de guerra, activistas, escritores, rainhas, foras-da-lei, atletas, engenheiros, astronautas, magnatas dos negócios, inovadores, matemáticos, pilotos de carros de corrida, médicos, cirurgiões, lutadores da liberdade e mães.

http://cliptank.com/InspiringWomenPainting.html

Pintura de Pessoas Famosas - Discutindo a Divina Comédia com Dante

Pintura Histórica com Links da Wikipédia e Mouse sobre a marcação

Artistas chineses Dai Dudu, Li Tiezi e Zhang An, 2006, óleo sobre tela

Muito bom!

http://cliptank.com/PeopleofInfluencePainting.htm

As Causas. Sacudir a água do capote para cima dos cidadãos e o que mais há

A 2ª vaga está a revelar os erros de quem manda na Saúde e na luta contra a pandemia. Novos dados são finalmente divulgados, mas outros essenciais não existem. Sacudir a água do capote para cima dos cidadãos é fácil, mas não vai resultar.

O REI VAI NU (e hoje não é o PR…)

A chegada da 2ª vaga fez desaparecer a tolerância pública – tão portuguesa – com a falta de competência, arrogância e o limitado sentido democrático de quem manda na Saúde em Portugal. De repente, começou a ler-se e ouvir-se nos media o que muitos me diziam sotto voce, e de que me fiz eco, já desde finais de abril.

Os exemplos são inúmeros. Entre os mais recentes, e por exemplo, (i) uma carta publicada no Público e assinada por 6 bastonários da Ordem dos Médicos, pelo menos um deles da área socialista, (ii) declarações numa entrevista televisiva do ex-Ministro socialista Adalberto Campos Fernandes, (iii) textos de jornalistas e comentadores respeitados, (iv) e no plano dos cidadãos uma sondagem que revela que em 4 meses, o saldo da confiança em relação à falta de confiança na DGS passou de 50% para 3% (e isto antes da passada semana).

Começaram a ouvir-se com mais insistência críticas de epidemiologistas, investigadores, médicos de saúde pública, em relação à ineficiência, caos, falta ou retenção de informação, e que ao longo dos meses as mensagens foram contraditórias, confusas, pouco ou nada transparentes.

Também nos últimos dias comecei a ler e ouvir que a estratégia de comunicação é errada, que o foco da comunicação é demasiado genérico e ineficiente, como aliás eu antes referira aqui.

A questão não é a reta intenção da Ministra e da DGS, pois de boas intenções está o inferno cheio. A questão é a incapacidade de montar e fazer executar uma estratégia, de a comunicar bem aos cidadãos, e não apenas pela necessidade de respeitar a soberania popular, mas também porque sem credibilização nunca haverá a adesão do público.

Não se esquece que a tarefa é dura e difícil, que a equipa que dirige a saúde não foi escolhida para gerir uma pandemia, que o cansaço deve ser muito elevado, como se compreende. Como disse o Secretário de Estado adjunto da Saúde, talvez pensando em nós e não no Governo, “O cansaço de todos é legítimo, mas não pode legitimar o nosso fracasso”.

Sacudir a água do capote para cima dos cidadãos não é justo, não serve para desculpabilizar e é contraproducente. Quem está na frente de batalha há quase 7 meses, mereceria melhores generais.

Foi por antecipar tudo isso (pois os sinais desde finais de abril eram óbvios) que em 5 de maio comecei a criticar a estúpida teoria de que durante uma guerra se não mudam generais, pois nessa altura já se percebia a inadequação da equipa. E depois tudo se foi agravando de um modo exponencial.

OS GRAVES EXEMPLOS DE INCOMPETÊNCIA E CAOS

Veja-se o caso do Conselho Nacional da Saúde Pública. Nunca foi convocado pela Ministra – soube-se agora – desde início de março.

E, no entanto, é esta a missão do CNSP: “é um dos pilares do Sistema de Vigilância em Saúde Pública (SP), constituindo-se como o órgão consultivo do Governo no âmbito da prevenção e do controlo das doenças transmissíveis e, em especial, para análise e avaliação das situações graves, nomeadamente surtos epidémicos de grande escala e pandemias”.

Pasme-se, os seus membros foram designados pela Ministra em 30 de janeiro de 2020. Ou seja, a Ministra nem sequer acha que valha a pena ouvir quem ela própria nomeou, o que é um sinal pouco democrático de autoritarismo e de arrogância. Aparentemente, ela não ouve ninguém que a possa criticar e por isso o Bastonário dos médicos referiu há dias que o Presidente da República está a fazer esta semana o que a Ministra nunca fez.

Mas há um exemplo mais grave – que os bastonários dos médicos referem: o “Plano Integrado Outono-Inverno para o SNS”. Em vez de ter sido apresentado em junho/julho, ainda em 7 de setembro estava em preparação, disse a Ministra, e só em 21 de setembro (ou seja, na véspera do início do Outono…) foi divulgado. Mas ontem o atual bastonário revelou que “ainda não está fechado”. Era como se a Casa Chanel lançasse a moda do outono-inverno em plena época natalícia…

Pior, e mais um sinal de arrogância, o Plano nunca foi posto a debate, e contém medidas (por exemplo criar uma “task force de resposta aos doentes não-Covid”, criar zonas “covid free”, aumentar o tempo dedicado ao atendimento nos centros de saúde) que deveriam existir e estar no terreno há meses.

Não admira por isso que o presidente da Associação Portuguesa dos Administradores Hospitalares, tenha dito de imediato – e cito do Público – que “a rede covid e não covid e os mapas de risco epidemiológico, já deveriam estar implementados” e que “falta gestão operacional”. E também que o Plano “não diz quais os recursos que vão ser afectos e quais as áreas que vão ficar dedicadas à covid, a partir de que níveis serão accionadas as unidades free covid ou quantas camas terão”. Quanto à task force para doentes não covid, refere que será constituída por membros das ARS que “têm estado sempre envolvidas e que se mostraram incapazes de reactivar a resposta”.

E os 6 bastonários dos médicos (em 14 de outubro) escrevem, e cito: “os números dispensam adjetivos: neste período covid-19, houve 100 mil cirurgias atrasadas no SNS, a que se junta um milhão de consultas nos hospitais, milhares de rastreios que ficaram por fazer, designadamente em oncologia, 17 milhões de meios e exames de diagnóstico e terapêutica, cinco milhões de consultas presenciais nos cuidados de saúde primários. O número de óbitos não-covid disparou, com mais 7144 mortes entre março e setembro do que a média dos mesmos meses dos últimos cinco anos”.

ALGUNS OS DADOS COMEÇAM A SER DIVULGADOS, MAS FALTAM OS ESSENCIAIS

Mas nem tudo é péssimo. Finalmente foi dada resposta a duas das perguntas que venho fazendo há muitas semanas: o Público pôde informar no passado sábado que cada doente ficou em média internado em enfermaria 18 dias (em março) e 10 dias (em agosto) e em UCI o número de dias passou de 28 para 15. O que são boas notícias (e seriam melhores se fossem explicadas as causas disso).

Sabe-se finalmente agora que, de março a outubro, foram apenas internados em todo o País 7186 pessoas em enfermaria e 930 em UCI, o que compara com mais de 2000 mortos e cerca de 100 000 positivos confirmados.

Até aos 60 anos somos 7,4 milhões e há 74191 pessoas confirmadas como positivos.

Assim, em 6 meses, com menos de 60 anos, terão estado, por cada 10 000 pessoas, 100 positivos, desses 3 em enfermaria (2743 pessoas), 0,4 em UCI (311 pessoas), e morreram 0,13 (100 pessoas).

Mas continuamos a não saber quantos deles tinham comorbibilidades.

Na fixa etária acima dos 60 anos, somos 2,9 milhões e há 25800 pessoas confirmadas como positivos.

Assim, em 6 meses, com mais de 60 anos, terão estado, por cada 10000 pessoas, 88 positivos (menos 12% que abaixo dos 60 anos), e desses 15 em enfermaria (4443 pessoas), 2,1 em UCI (619 pessoas), e morreram 7 (2081 pessoas).

Ou seja, e em resumo, acima dos 60 anos somos apenas 40% do total dos que têm menos de 60 anos, mas apesar disso houve ou há 500% mais em enfermaria e em UCI. E morreram 2000% mais.

Estes resultados só agora, que nos deram mais informação, se revelam. E mostram que, ao contrário do que se imaginava, a pandemia é ainda muitíssimo pior para os mais velhos do que para os menores de 60 anos.

Considero que a pandemia é perigosa, pode deixar sequelas, exige cautelas (máscaras, distanciamento social, desinfeção de mãos). Não sou “negacionista”. Mas também não sou “paniquista”.

E, graças a Deus, esta não é uma tragédia cósmica; sobretudo quando se recorda que, em 19 de janeiro de 2019, o DN noticiava a morte de 500 pessoas no dia 14 desse mês de gripe (vírus AH3), “especialmente idosos”, no que teria sido “um dos dias com mais mortes da última década”, ou seja algo evento mais recorrente do que se desejaria.

Como resulta destes dados, finalmente acessíveis, parece claro que a pandemia é grave, mas controlável com boas políticas públicas, se os recursos e energias forem aplicados na proteção dos grupos de risco, o que exigiria informação que a DGS parece que não tem ou não sabe encontrar.

É que a DGS revelou (o que o Público aceitou com acrítica compreensão) que não é possível perceber se houve alteração na idade das pessoas internadas em 6 meses, e – mais grave, e ao contrário do que ocorre noutros países - “não foi possível ter informação sobre as doenças prévias mais prevalentes”, “remetendo a DGS para os hospitais” o jornalista!

Estas minhas perguntas continuam por isso sem resposta. Mas, pior, como é possível definir uma estratégia de combate e de comunicação se estas básicas informações não são conhecidas pela DGS?

Mas tudo parece ser ainda pior: chegam-me informações fidedignas de que o tratamento dos dados é na prática impossível porque o que a DGS tem é caótico, lacunar e por vezes repetido.

Talvez isso explique a cambalhota do Primeiro-Ministro, que no dia 13 de outubro afirmava que não havia problemas e no dia 15 entrou em pânico. Ninguém o tinha informado. Razão tem o provérbio popular, “quem não sabe é como quem não vê”.

COSTA NO SEU LABIRINTO

Parece que os peixes começam a apodrecer pela cabeça. Políticos não são peixes, mas acabam parecidos devido ao pânico que chegou a S. Bento, com as “trapalhadas” (disse o Professor Reis Novais), e a “estupidez” (disse Daniel Oliveira e repetiu Manuel Loff) como decidem.

Realmente, a disparatada proposta de tornar obrigatório ter sempre ligado o telemóvel e nele instalada a app “Stayaway Covid” deve ter começado como uma “chico-espertice”.

Creio que a ideia seria culpar a Assembleia da República pelo que se irá passar, perante a antecipada e evidente recusa em aceitar esta solução pelos eleitos do povo. Mas hoje em dia até os ministros que estão em grupo de risco sugerem que não vão instalar a app!

António Costa – antes de recuar - tentou responder com novos disparates em cima dos velhos disparates, que evoluem desde “só é obrigatório se não cumprirem” até “é obrigatório, mas não é fiscalizado”. Ricardo Araújo Pereira tratou bem do tema (mais adequado para um humorista), que faz lembrar a histórica explicação do então comentador Marcelo sobre se o aborto era crime ou não era…

Já começam a ser erros em excesso para um grande político. Será que alguém me consegue explicar o que está a passar-se?

Ou será que quem tem razão é Fernando Pessoa: “disperso, nada é inteiro/Ó Portugal, hoje és nevoeiro...”

O ELOGIO

A Marcelo Rebelo de Sousa pelas audiências que está a fazer esta semana para tomar o pulso à Saúde, não ouvindo apenas quem a Ministra levava ao Infarmed.

Escusava era de nos oferecer o seu corpo crístico a ser vacinado. Mas, ao menos para a minha geração, isso teve uma utilidade. Apesar do exercício, afinal ele não está mais musculado do que nós…

LER É O MELHOR REMÉDIO

A excelente entrevista feita a Paulo Portas por Maria João Avillez é de leitura obrigatória. Portas lançou no domingo a sua candidatura a Belém para 2026, dando o melhor apoio possível vindo da Direita à reeleição de Marcelo Rebelo de Sousa, começando assim a vestir os sapatos do futuro “defunto”.

Por vezes as respostas dele roçam a hagiografia, e outras vezes não conseguem disfarçar completamente as críticas nem as transformar em elogios. Mas não acredito que fosse ou seja possível fazer melhor.

Dada a inexistência objetiva do candidato liberal, o eleitorado que se não deixe apanhar por André Ventura e o seu populismo e que não queira abster-se, tem aqui o vademécum perfeito para se convencer a votar no presidente da República.

A PERGUNTA SEM RESPOSTA

O Instituto Nacional de Saúde Ricardo Jorge (INSA) afirmou que os testes nasofaríngeos para detetar contaminados têm “fiabilidade elevada”, pois possuem “uma sensibilidade de aproximadamente 100%” e “uma especificidade [E] de entre 91% e 100%”. Como se sabe, quanto maior for a especificidade do teste, menor é a probabilidade de um falso positivo.

O matemático Tiago Mendes (que não conheço, mas tem um doutoramento em Oxford) fez cálculos sobre uma hipótese em que a prevalência de falsos negativos é de 5% e de falsos positivos é só de 1%. Mesmo assim, conclui e explica que “para uma margem de erro pré-teste 5 vezes maior para falsos negativos do que para falsos positivos, a margem de erro pós-teste, e para valores de prevalência de 2-10% e E= a 99%, é 10 a 75 vezes menor do que a de falsos positivos”.

A pergunta é óbvia: será que o INSA pode responder ao estudo do Professor Tiago Mendes? É que, para um leigo como eu, o raciocínio deste professor é cristalino; e, se assim for, se calhar a realidade dos chamados infetados pode ser muito mais baixa do que a DGS todos os dias revela…

A LOUCURA MANSA

O Observador publicou no sábado um texto intitulado “Ana Gomes, a irresponsável e perigosa candidata que aspira a ocupar Belém”, escrito pelo ex-Embaixador da União Europeia em Cabo Verde, Pinto Teixeira.

Com base em rumores, Ana Gomes acusou-o publicamente de corrupção e crimes quejandos à volta de um terreno onde construiu uma casa na Cidade da Praia.

Dois anos depois, ele foi ilibado de todas as acusações, e o artigo descreve em detalhe tudo o que passou. Infelizmente este é o grave padrão dos populistas que também a define. Seria uma loucura mansa não ler o artigo antes de votar…

José Miguel Júdice

JOSÉ MIGUEL JÚDICE

Expresso

segunda-feira, 26 de outubro de 2020

A astúcia do dr. Costa, e a solidez democrática dos nossos ministr@s

CASO O DR. MARQUES MENDES NÃO ME TIVESSE EXPLICADO TUDO MUITO BEM, AINDA HOJE NÃO ENTENDERIA AQUELA IDEIA DE UMA APP SER OBRIGATÓRIA

COMENDADOR MARQUES DE CORREIA


O Dr. Marques Mendes encontrou-me na rua (ou melhor, eu encontrei o dr. Marques Mendes, porque ele é mais difícil de encontrar do que eu) e perguntei-lhe: “Ó Luís…” (eu conheço o dr. Marques Mendes ainda ele não era dr. nem Marques Mendes, conjunto que por inteira justiça pertencia a seu pai, dr. António Marques Mendes, e que ele naturalmente herdou). Mas, voltando ao tema, encontrei o ilustre vocalitivo (se plumitivo se refere a quem escreve, quem fala penso ser vocalitivo) e perguntei-lhe: “Ó Luís, o que é isto da app ser obrigatória e...” — ia eu a perguntar o que era uma app, quando ele, ainda mais rápido, respondeu: “O Costa não queria aquilo obrigatório, queria era abanar esta modorra dos portugueses, e fazer com que muitas mais pessoas instalassem a app, muitos mais médicos gerassem códigos e muitos mais infetados introduzissem esses códigos.”

Eu, sem perceber nada do que ele dizia, respondi: “Aaaahhh!” E ele disse: “Está a ver?” Respondi que não estava a ver a Clara de Sousa e despedimo-nos cordialmente.

Fui para casa estudar a resposta do ilustre aparecista (se publicista é o que publica em jornais e revistas, aparecista deve ser o que aparece na televisão). Depois de a compreender em toda a sua extensão, não tive dúvidas em concordar com ele. O dr. Costa (que também conheci antes de ser dr. e antes de ser Costa, conjunto que era pertença de seu pai, dr. Orlando da Costa, esse sim, publicista em todos os sentidos da palavra), o dr. Costa (António) é de facto habilidoso e inteligente. Numa palavra astuto! Como defensor extreme da democracia, nunca quis obrigar ninguém a nada.

Isso mesmo se verifica pelo exemplo que dá uma ministra do seu governo, ministra dileta, por ser da Modernização do Estado e da Administração Pública, a drª Alexandra Leitão (nunca a conheci noutra qualidade). A drª, quando lhe perguntaram se tinha a dita app, respondeu: “Com toda a simpatia vou declinar responder a essa pergunta. Porque acho que é uma questão do foro pessoal (...)”.

Infelizmente, o exemplo da drª Alexandra Leitão não é seguido por muitos agentes públicos que ainda não têm a modernidade do Estado interiorizada. Há poucos dias, num serviço do Estado pediram-me o Número de Identificação Fiscal e eu respondi: “Com toda a simpatia, vou declinar responder porque acho que é uma questão do foro pessoal.” Não aceitaram a resposta. O mesmo se passa quando perguntam o número da Segurança Social, já para não falar de coisas tão pessoais e íntimas como o nome do pai e da mãe (como se não pudesse passar sem eles) ou a morada (como se alguém tivesse algo a ver com isso) ou a data de nascimento (como se fosse elegante fazer uma pergunta dessas). Pelo contrário, e ao arrepio dos esforços que a drª Alexandra Leitão manifesta e publicamente faz, a Administração Pública quanto mais se moderniza, mais quer saber de nós, dos nossos segredos, das nossas entranhas. Por exemplo, para sacar um Cartão de Cidadão, coisa que só demora uns 12 anos, pedem-nos tudo, incluindo o número do telemóvel e o e-mail... depois informam-nos que podemos ir levantá-lo a um sítio qualquer, para o qual temos de telefonar para marcar; depois não atendem o telefone. Moderno deve ser, porque a malta nova nunca atende o telefone, vá lá saber-se porquê. Mas parece-me pouco eficiente.

Seja como for, o que importa é o sentimento de liberdade que perpassa todo o Governo! A defesa assoberbada da intimidade e privacidade! A batalha pela integridade de cada indivíduo, o grito inflamado contra a opressão. Eu vergo-me e vergar-me-ei diante tal maremoto de pensamentos, emoções, ações e, sobretudo, omissões. Que eu sou agradecido ao Governo por nos ensinar a liberdade e a inviolabilidade do nosso ser, do nosso eu.

Posto isto, vou revalidar a carta de condução, introduzindo o meu Cartão do Cidadão com um chip num computador para que tenham a certeza de que sou eu. O procedimento é simples para mim, pois já o tive de fazer para renovar o Cartão do Cidadão. Depois, vou ao sítio da Segurança Social, onde eles têm o meu nome, morada, números de contribuinte, da conta bancária, e do Cartão do Cidadão; endereço, endereço eletrónico, números do telefone fixo e do telemóvel e data de nascimento. Ocorre-me que não sabem das minhas doenças, mas que no BI-CSP (Bilhete de Identidade dos Cuidados de Saúde Primários) já devem saber as que tenho e as que vou ter. Não me peçam para revelá-las, porque é pessoal!

620 mil dias.

O que todos de uma forma ou outra podemos constatar! Ou como eu já constatei, quando precisei, e as portas se me fecharam.


Miguel Sousa Tavares

“Como é óbvio, o país inteiro não fala e não pensa noutra coisa que não nesta malfadada pandemia que veio para nos roubar um ano de vida a todos, desgraçando a economia, as relações familiares e sociais e arruinando cada projecto pessoal. Acordamos com o sonho de uma vacina ou de uma solução à vista e adormecemos para o mesmo pesadelo sem fim. Mas, paralelamente e como se habitasse num mundo à parte, a classe política — ou, para ser mais preciso, a esquerda da nossa classe política — entretém-se há meses com um filme, visto e revisto, ensaiado e repetido até à náusea, que ameaça prolongar-se ainda por mais um mês e de cujo fastio apenas ela parece não se dar conta: o Orçamento do Estado. Todos os dias, e várias vezes ao dia, escutamos os mesmos actores repetirem o mesmo texto, tentando convocar-nos para o dramatismo de um filme que já ninguém consegue acompanhar. Lá vem Jerónimo de Sousa jurar que o Orçamento serve o “grande capital” — onde quer que essa mítica entidade hoje se esconda entre nós; lá vem Catarina Martins insistir em vírgulas e décimas — que, todavia, podem valer milhares de milhões lançados ao vento; lá vem Inês Sousa Real, do PAN, exigir hospitais veterinários públicos (enquanto há hospitais públicos para humanos que se mantêm fechados) e queixar-se, espantada, de que o Orçamento é “marcadamente do PS” — como se não fosse o PS que tivesse ganho as eleições; e lá vem o infatigável António Costa, numa estratégia de polvo — ora tentando assustar, ora fugindo, ora espalhando tinta, ora torcendo-se e retorcendo-se —, sem jamais largar a rocha a que está agarrado. E, no fim, dando a tudo isto o tom de filme cómico, ainda vem o escudeiro socia­lista José Luís Carneiro acusar Rui Rio — escorraçado por Costa de todo o processo — de esquecer o “interesse nacional”, quando ele, logicamente, anunciou o voto do PSD contra o Orçamento. Os meninos brincam à volta da fogueira, enquanto os velhos morrem nos lares, a epidemia cresce todos os dias e multiplicam-se os alertas sobre a situação no SNS.

Justamente, uma das reivindicações da extrema-esquerda para deixar passar o OE é o reforço do SNS, em dinheiro e em meios humanos. Parece uma exigência consensual, sobretudo nos tempos que correm. Consensual e já garantida: vão ser mais 450 milhões para o SNS e mais 4200 profissionais, entre médicos, enfermeiros e auxilia­res, fora os milhares que o Governo diz já ter acrescentado nos quatro anos anteriores. Não chega, diz o BE. Mas será verdade? Num artigo publicado no jornal “Público” do passado sábado, António Barreto, socorrendo-se de dados oficiais da Pordata, INE e Eurostat, diz: “Preparem-se para algumas surpresas”, ao analisar os números referentes ao corpo clínico e ao corpo docente português, que contrariam todo o discurso sindical e corporativo, que a imprensa e a esquerda adoptaram, sem questionar. Eis alguns dados que cita, referentes à situação na Saúde: na Europa a 27, Portugal ocupa o 8º lugar em termos de despesa com a Saúde relativamente ao PIB — gastamos 8%, nem sequer muito longe do país que mais gasta, a Alemanha, com 9,5%; em número de médicos, espantem-se, estamos em 3º lugar entre os 27 (e em 1º lugar em médicos de clínica geral), sendo o 1º lugar ocupado pela Grécia, o que parece indicar que não há uma relação directa entre a quantidade de médicos e a qualidade do serviço; e onde estamos pior, em 20º lugar, é no número de enfermeiros, porque os baixos salários os convidam à emigração.

Estes números, por si sós, deve­riam merecer uma reflexão séria e um mínimo de coragem política. Alguém — um partido, um deputado — deveria erguer-se tranquilamente e dizer: “Somos um país pobre e endividado que não se pode dar ao luxo de pagar necessidades que não tem. Não temos falta de meios nem de dinheiro na Saú­de pública; temos, portanto, falta de outras coisas que é preciso enfrentar: organização, planeamento, disciplina, empenho e dedicação.” Mas quem se atreverá a dizer isto?

Durante meses, vivemos com a doce fábula do notável êxito do SNS no combate à pandemia na Primavera passada, aquando do seu primeiro assalto. Hoje sabemos que esse suposto êxito se ficou a dever a dois factores essenciais: ao confinamento voluntário e maciço a que os portugueses se entregaram muito antes de ele ser obrigatório e ao abandono a que o SNS votou os doentes não-covid. Esse abandono, em parte, foi também voluntário: houve doentes que tiveram medo de ir aos hospitais ou Centros de Saúde; mas os doentes graves não podiam evitar ir. E a grande maioria, que se sentia realmente doente, que precisava de consultas urgentes, que tinha cirurgias marcadas e algumas inadiáveis sem graves riscos para a sua saúde, não encontrou uma porta aberta nem sequer quem lhe atendesse o telefone. Claro que eu sei de médicos que deram tudo à luta contra a covid, alguns até voluntariando-se; mas também sei de outros que estiveram meses sem pôr um pé no hospital e sei de serviços que fecharam e mandaram os doentes para casa a pretexto da covid, da qual nunca viriam a ocupar-se. Uns, de facto, estiveram lá para fazer frente ao novo inimigo; outros fugiram. Foi assim e foi por isto que 1 milhão e 200 mil consultas e 230 mil cirurgias ficaram por fazer entre Março e Agosto. Não há volta a dar a esta verdade terrível, não há palavrinhas mansas para suavizar o que se passou: para atender a uma minoria de doentes covid, o SNS abandonou a esmagadora maioria dos seus doentes, sem nenhuma justificação razoável para tal. E o balanço final — que não se pode afirmar com segurança absoluta que seja resultado disso, mas cuja probabilidade de o ser é imensa — são 6 mil mortos a mais do que em igual período do ano passado.

Tudo isto é doloroso de dizer, mas pior ainda é tentar escondê-lo ou fingir que nada de grave se passou. Um estudo encomendado pela Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH) a uma consultora externa e divulgado esta semana quis perceber se havia uma relação directa entre o número de consultas e cirurgias que ficaram por fazer e o absentismo anormal verificado no mesmo período (Março a Agosto) no SNS. Os resultados foram avassaladores: em seis meses de uma crise de Saúde pública, quando os portugueses mais precisavam dos seus serviços, os profissionais do SNS faltaram 64% mais do que em igual período de 2019. Todas as justificações tiveram um acréscimo, incluindo as faltas não justificadas, mas o grosso dos motivos invocados foi… doença. No total, foram mais 467 mil dias de faltas por doença ou 620 mil juntando todos os motivos. Mas, ao mesmo tempo que dizia que era preciso uma “investigação aprofundada” para encontrar uma “explicação para um aumento tão significativo do absentismo por doença”, a APAH foi adiantando algumas explicações habituais, tais como o burnout ou “exaustão e sobrecarga”. Exaustão e sobrecarga? Mas como, se o horário no SNS, e em todo o funcionalismo público, passou de 40 para 35 horas com este Governo? Como, se o absentismo no sector já é dos maiores em toda a Função Pública? Como, se sobejam médicos? Como, se as faltas ao serviço aumentaram 64%, deixando mais de 1 milhão de consultas e mais de 200 mil cirurgias por fazer? Como, se, felizmente, nunca vivemos nada que se parecesse com a situação dramática vivida nos hospitais de Espanha, Itália, França, Inglaterra, Brasil, Estados Unidos?

Na semana passada, ao escutar a ministra da Saúde afastar veementemente o recurso aos hospitais privados no tratamento de doenças não-covid, em caso de saturação do SNS, julguei que a movia apenas um preconceito ideológico contra a medicina privada. E, embora eu também não goste nada de ver dinheiros públicos a financiar negócios privados, entendo que aqui se sobrepõe o dever do Estado de assegurar a cobertura da saúde a todos os portugueses. Mas agora que li este estudo percebo a resistência de Marta Temido. É que o SNS não está saturado, nem exausto, nem sobrecarregado. Com os meios e o dinheiro (8 mil milhões de euros por ano) que os contribuintes põem à sua disposição, tem perfeita capacidade e estrita obrigação de não deixar ninguém para trás. Portanto, o que está errado no discurso de Marta Temido, o que lhe falta dizer — a ela e a todos os políticos que tenham coragem para tal — é a outra parte do discurso: que o SNS tem de cumprir o seu dever sem esperar pela ajuda dos privados.

As proclamações grandiloquentes, as juras de amor ao SNS, as palmas às janelas… tudo isso é muito bonito, mas não apaga o resto: as insuportáveis listas de espera por consultas e cirurgias que podiam e deviam estar em dia, as vergonhosas filas de velhinhos e doentes na rua para serem atendidos ou vacinados, os telefonemas que ninguém atende, as indignas condições que perduram nos hospitais civis, a soberba indiferença perante o sofrimento com que tantos são tratados. Tudo isso, apesar das louváveis excepções, existe ainda no nosso tão louvado SNS. E, 8 mil milhões depois, tudo isso é demasiado feio e injustificável.”


Expresso – 24-10-2020 - Miguel Sousa Tavares escreve de acordo com a antiga ortografia