sexta-feira, 13 de junho de 2025

O mês dos LGBT e etc

11 jun. 2025, Tiago Dores, 'Observador'

Desde já, um esclarecimento. Claro que não esqueci existir um indispensável QIA+ a completar o LGBT. Era o que faltava. A formatação de títulos aqui no Observador, com a sua raiz patriarcal e sanha heteronormativa — e, talvez mais relevante, um limite de caracteres — é que castrou a integral explanação deste movimento. Valha-nos ainda ter cabido o T, que pelo menos assim não ficou tudo por castrar.

Por falar em caber, ontem foi Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas. Uma efeméride que, sendo celebrada a 10 de junho, cabe (pelo menos até ver) no festejo, mais amplo, do mês do orgulho LGBT. "Assim, se vê a força LGBT", escutou-se no desfile pela Avenida da Liberdade, em Lisboa, numa versão do clássico "Assim se vê a força do PC". Não fazia ideia que os comunas do PCP fossem tão modernos, confesso. Ui, o Fidel e o Che Guevara devem estar às voltas nas tumbas.

Mas portanto, este ano, a 10 de junho, ainda tivemos o costumeiro e cinzento Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas, mas espero que, para o ano, a data tenha sido devidamente integrada nos coloridos festejos que realmente importam, e que tenhamos já o Dia de PortugaLGBT, de Camões LGBT e das Comunidades LGBT.

A propósito de Camões, ocorreu-me algo que já outro poeta, Fernando Pessoa, lembrava: "Navegar é preciso, querer desembarcar em Gaza com um grupo de fãs de terroristas trata-se de despautério que não é preciso". No entanto, seria essa a intenção da cada vez mais idiota e, por isso, cada vez mais útil, Greta Thunberg, e da sua corja de amigos, aspirantes a ainda mais idiotas, ainda mais úteis.

Com destaque para um já extremamente idiota e muitíssimo útil Thiago Ávila, que além de aparecer em confraternizações com outros indefectíveis democratas a gritar "Morte à América, morte a Israel, vitória do islão!", também pontificou no funeral do ex-líder do Hezbollah, Hassan Nasrallah. Quem nunca prestou uma última e sentida homenagem a um psicopata carniceiro nazi que atire a primeira pedra. E que fique por aí, em vez de se juntar aos que, não podendo atirar essa primeira pedra, estão ocupados a lapidar uma senhora que recusou manter relações íntimas com o pai, irmãos e primos em primeiro grau, com a desculpa de que lhe doía a cabeça, só porque já estava a meio de ser lapidada.

Quem não achou altamente instagramável a vontade da chamada Frota de Selfie, liderada pela Greta, de tornar as visitas de propaganda terrorista a Gaza uma trend, foram as Forças de Defesa de Israel. Vai daí abordaram a Greta e seus compinchas e logo estes se aliviaram dos telemóveis, jogando-os ao Mediterrâneo. Poluiquê? Alterações climátiquais? Isso de destruir o Ocidente, ao longo de décadas, com políticas ambientais suicidas é tão 2019. Para quê esperar esse tempo todo se há tanta oferta de suicidas fundamentalistas islâmicos que despacham o trabalho de forma tão mais explosiva?!

Estaria a Greta a congratular-se com este plano, quando constatou que as IDF a levariam, mais aos coleguinhas, para Israel, pondo-os a assistir a uma compilação de vídeos dos massacres perpetrados pelo Hamas a 7 de Outubro de 2023. No entanto, ao que parece, à Greta e amigos não lhes apeteceu ver o filme. O que não surpreende. Estes idiotas úteis são dados é ao teatro.

Acredito que quem tivesse interesse nesta película fosse o Almirante Gouveia e Melo. Pelo menos, numa intervenção há dias, mostrou ser fã de cinema, ao mencionar o Star Wars. Querendo explicar que todo o ser humano tem, dentro de si, a capacidade de fazer o bem e o mal, o — Deus nos livre e guarde, embora Deus seja impotente face ao elenco de candidatos presidenciais — futuro Presidente da República socorreu-se de que referência? Os Irmãos Karamázov, de Dostoiévski? O clássico "A linha que separa o bem do mal atravessa o coração de todo ser humano", de Soljenítsin? Não, mas está lá perto. Gouveia e Melo optou por explicar que todos temos, dentro de nós, um Jedi e um Sith. E que "temos de fazer um esforço para nutrir os Jedis", porque "quando fazemos isso, o trabalho em comunidade aparece, como na vacinação"… A candidatura do Almirante que deu a pica dá muito menos pica que a candidatura de qualquer pica da Carris.

Por um punhado de euros

A nossa 'provecta idade' permite-nos encarar filosoficamente a 'idiótica evolução em curso'.

O 'Big Brother is controlling you' já não nos ameaça...

Mas não vai ser fácil para os nossos descendentes...

PORCA MISERIA

AFP


De: xxxxxxxxxxxx

 

observador.pt

Por um punhado de euros

Nuno Lebreiro



De uma perspectiva empírica, ou seja, partindo da realidade do mundo tal qual experimentado pelo Homem, a vida resume-se a um permanente acto de escolha entre diferentes valores que concorrem entre si. Por valores, entenda-se aquilo que valorizamos e que, em diferentes graus e formas, perseguimos, desejamos ou, por oposição, evitamos e repudiamos. Na nossa relação com o mundo, seja em que aspecto for — intelectual, material, espiritual — tudo é necessariamente individualmente avaliado, sendo esse processo de avaliação entre o que é bom ou mau para nós o momento basilar que sustenta toda a acção humana — perseguimos o que valorizamos e evitamos o que desvalorizamos. Depois, claro, uma análise empírica realista acresce uma simples conclusão sobre a vida humana: não se pode ter tudo. Pelo contrário, o mundo é, por natureza, moral, política e economicamente escasso, daí que a sabedoria popular, precisamente porque reflecte estes dois "factos da vida", resuma muito bem a coisa explicando que "não se pode sempre ter o sol na eira e a chuva no nabal".

Em política, então, a coisa é por demais evidente. Se apostamos no valor máximo da segurança, por exemplo, destapa-se o cobertor do lado da liberdade; se apostamos na igualdade para todos, perde-se o reconhecimento dos méritos individuais; se valorizamos muito o progresso, esquecemos a importância da tradição; ou, mesmo em questões práticas como as vírgulas do orçamento, atente-se no eterno conflito de valores em que todos querem impostos baixos ao mesmo tempo que desejam mais e melhores serviços públicos. Em suma, e como Isaiah Berlin não se cansou de explicar, a natural escassez do mundo implica uma inevitável necessidade de escolher, sendo que essa escolha representa, simultaneamente, por um lado, uma condenação, porque assenta a responsabilidade de decisão sobre tudo — desde o mais ínfimo pensamento que se descarta até aos maiores dilemas morais da Humanidade — nos ombros do Homem, mas, pelo outro lado, essa mesma escolha representa também o momento de criação humana na medida em que é perante o dilema, decidindo o caminho A ou B que o Homem, pensa, fala, faz, põe em prática, produz, explanando a sua vontade no mundo. Em suma, escolher é criar. Do mesmo modo, o pluralismo de valores caótico, hiper complexo, caracterizado por este perpétuo conflito-escolha primordial, representa o viveiro potencial da criação humana — do caos, pela escolha, o Homem inventa o seu próprio mundo.

Assim, o conflito permanece sempre como a verdadeira base da vida humana, em particular a política e social, alicerçada, desde logo, na eterna batalha entre dois valores fundamentais: os interesses do indivíduo, que se deve proteger face ao autoritarismo do colectivo, e o interesse público, um bem igualmente necessário quanto mais não seja para garantir que os direitos, liberdades e garantias de todos os indivíduos são acautelados por igual.

Em suma, no final, não há escape: o mundo faz-se necessariamente de valores, ou seja, de coisas que são importantes para nós, estes valores colidem entre si — não se pode ter tudo —, e daí a escolha torna-se inevitável, bem como a sua inerente subjectividade, garantindo que, tal qual os valores colidem entre si, também as escolhas de milhões de indivíduos, em condições e contextos tão distintos, mas todos disputando com igual dignidade a natural escassez da realidade humana, irão entrar em conflito umas com as outras. É assim que compreendemos que o conflito é aquilo que está na base da sociedade política, e não a concórdia ou a harmonia, seja de ideias ou valores. Pelo contrário, é o conflito decorrente dos diversos objectivos e as escolhas que cada um faz que cria uma base social necessariamente concorrencial,  caótica, competitiva, conflitante.

Simplificando, há apenas duas formas como lidar sócio-politicamente com o fardo da escolha e o conflito social que esta implica: ou bem que a liderança política decide e  impõe essa decisão a todos os indivíduos, liberando-os da responsabilidade de decidir em grande parte das matérias, mas agrilhoando-os à sua vontade expressa sob a capa do "bem colectivo"; ou então, como no Ocidente, encontram-se plataformas mais ou menos institucionalizadas de negociação sócio-política onde os representantes de cada visão, ou escolha, negoceiam entre si até encontrar formas de entendimento que, mesmo não agradando a todos, conseguem transformar o conflito e a necessidade de escolher em agendas de acção (e criação) colectiva. A este processo de integração do conflito, no Ocidente, demos o nome de democracia liberal, algo que olhado desta perspectiva é de amplitude muito superior ao simples arranjo institucional de representação política que vai variando de país para país.

A razão para o sucesso do sistema democrático-liberal deriva também desta característica conflitante da sociedade na medida em que a escolha é tanto mais bem feita quanto o agente decisor estiver mais próximo dela. Porque é quem está mais próximo que melhor conhece as hipóteses em causa, o contexto particular da escolha ou as consequências directas dos actos, a democratização e liberalização da escolha permitiu que ela passasse a ser feita de forma mais directa, eficiente e prática. Já as estruturas burocráticas centralizadas onde a decisão última reside permanentemente na cúpula do sistema, essa distância entre a necessidade de escolher e a decisão efectiva leva a distorções e perversões que prejudicam grandemente o sistema, em todas as suas cambiantes. Na economia, por exemplo, Ludwig Von Mises explicou este fenómeno através da distorção nos preços que sistemas de economia planificada implicam. No mundo das ideias, Stuart Mill comprovou como também aí a democratização e a liberdade de expressão coincidem com o necessário florescimento da inovação e o fortalecimento do pensamento adquirido através da livre concorrência. Também no mundo das acções humanas, precisamente porque acoplada com a escolha vem a responsabilidade individual, Antero de Quental — várias décadas antes de Max Weber, já agora — argumentou com sucesso que as sociedades culturalmente centralizadas caem necessariamente aos pés daquelas que, por diversos motivos são mais dinâmicas socialmente por colocarem o ênfase da decisão e da escolha no indivíduo, e não na autoridade local, regional ou eclesiástica.

É por estas razões que o mercado, o tão famigerado conceito que a esquerda vilipendia, na realidade não é apenas uma escolha, apesar de o ser também, que a intelectualidade canhota, porque materialista, tende a fazer crer se encontrar apenas dentro do supermercado. Muito mais que isso, o mercado, o verdadeiro mercado, é aquele que engloba esta intrínseca e inescapável necessidade de escolher — seja essa escolha feita ao nível das coisas, das ideias ou das vontades. Daí que, e também ao contrário do que a esquerda tende a fazer com a sua defesa da "liberdade", não se deva falar da, ou de uma, liberdade, mas sim "das liberdades", pois para cada dimensão da vida, para cada mundo de escolhas, há um necessário mercado e, consequentemente, uma liberdade que o garante mais próximo da vontade e decisão das pessoas: no mundo das coisas, é a propriedade privada que assegura a livre-troca de bens e serviços; no mundo das ideias, é a liberdade de expressão que as permite circular, trocar, crescer, misturar, fecundar, isso desde que a liberdade de pensar e falar seja assegurada; tal como no mundo das vontades e da acção humanas, é a liberdade face à coerção, definida pelos direitos e as garantias relacionadas com a vida, o corpo e a autonomia de cada indivíduo — a velhinha liberdade negativa de Isaiah Berlin — que permite o natural e espontâneo, para roubar o termo a Hayek, florescimento social e humano.

Liberdade para pensar, para falar, para agir, eis a súmula da garantia de que a escolha é feita de forma subsidiária, de baixo para cima, do indivíduo para a sociedade, e não ao contrário, como no Antigo Regime, onde a autoridade central impunha, junto com a soberania, a decisão de cima, do poder político, para baixo, para o povo, a quem competia acatar as decisões. Aliás, aqui se vê como o próprio conceito de soberania popular — outro chavão pervertido pela esquerda — nada significa se não estiver umbilicalmente conectado com as liberdades para pensar, falar e agir. No final, aquela soberania, e estas liberdades, dependem de uma vitória popular no eterno conflito de valores primordial que em todas as sociedades, em todas as suas diferentes dimensões, opõe o impulso centralizador do colectivo à ordem espontânea dos indivíduos e as suas naturais ligações e vontades valorativas, afectivas e espirituais. Em suma, é este mundo complexo, espontâneo, erigido de baixo para cima, do povo para o soberano, mas da livre associação dos indivíduos, das pessoas, nas suas vontades, culturas e tradições, as quais o poder político deveria apenas reconhecer, quanto muito proteger, que compõe a essência da solução democrática e liberal que trouxe a abundância, a prosperidade e o bem-estar ao Ocidente.

Em boa verdade, vendo por esta perspectiva, não poderia ter sido de outro modo: nem os sistemas centralizados ao lidarem com o conflito podem ser sistemas verdadeiramente livres, tal como também não podem ser tão prósperos como aqueles que o são. De facto, a chave do sucesso do Ocidente é a prova empírica que valida o argumento acima exposto. Ou seja, há razões que explicam o sucesso da ordem liberal ocidental, tal como essas mesmas razões explicam o falhanço das alternativas. O Ocidente não teve o sucesso que teve apenas por ser o Ocidente, pelo contrário, teve o sucesso do qual todos ainda beneficiamos porque seguiu políticas, estratégias e ideias certas, alinhadas com o mundo real, que, pelas razões acima referidas, garantiram o seu sucesso. Daqui decorre naturalmente uma outra pequena conclusão: se o Ocidente deixar de seguir esses importantes princípios, essa forma de lidar com o mundo, os seus valores, então não serão apenas as liberdades que mudarão fundamentalmente nas nossas sociedades — inevitavelmente estas deixarão também de ter condições para serem bem-sucedidas e prósperas.

Estranhamente, porventura por desgaste, sem dúvida por ignorância, senão mesmo dolo, na Europa parece ter-se apostado seriamente neste segundo caminho. Ao longo dos últimos anos, a União Europeia tem vindo progressivamente a substituir a subsidiariedade pela centralização, e se no início apenas na perspectiva económica — no mercado das coisas —, a verdade é que agora há muito que já estendeu essa reviravolta a todas as cambiantes da vida. Hoje, desde um socialismo impante ancorado em planos quinquenais de desenvolvimento económico centralizado e posto em prática através de subsídios e regulamentação de fins e objectivos, até aos planos da moeda digital (CBDC) que, a seu tempo, em sendo bem-sucedidos, permitirão ao BCE ganhar o poder de vasculhar toda e qualquer transacção, isto quando não definir a priori em quê, e em que moldes, pode cada unidade de dinheiro digital ser gasta ou transferida, impondo um modelo de grande centralização, planificação e autoritarismo económico, ainda para mais ora justificado debaixo da capa moralista, pseudo-salvífica, derivada da insanidade anti-científica obcecada pela "transição energética".

Depois, a nível social, um bizarro suicídio assente na importação massiva de pessoas que lidam fundamentalmente com as liberdades e o conflito de forma muito diferente dos Ocidentais, um fenómeno também ele imposto de cima para baixo, por decreto, contra as pessoas, motivado por cegueira ideológica "multiculturalista", pejada de soberba, que imagina que quem vier há-de querer ser como nós. Depois, novamente de cima para baixo, através de uma clara imposição de novos valores sociais — desde o defunto wokismo às bandeirinhas arco-íris — que, também pela regulação, bem como a pura chantagem com os estados membros sequiosos de bazucas, fundos estruturais e apoios à coesão, de Bruxelas se difundem para o continente inteiro. Finalmente, uma obsessão maníaca pela harmonia política própria do discurso único, já autoritário, que em nome da "verdadeira" liberdade, ou da "ciência", perverte as próprias liberdades, como é flagrante exemplo o perverso Digital Services Act e o seu sucedâneo "Escudo Democrático" onde, em nome de um alegado combate à desinformação, se propõe agora a UE a encontrar formas de regulamentar, controlar — censurar — o discurso na internet. Em suma, a UE de hoje perverte, inverte, destrói tudo aquilo que, em tempos idos, "fez o Ocidente grande".

A tentação do controlo tecnocrata centralista a coberto de alegados valores como "eficiência" ou "segurança", bem como slogans em nome da liberdade mesmo que significando o seu exacto contrário na medida em que implicam sempre passagem de poder de decisão das pessoas para os poderes políticos, aparece-nos agora de fora, com falinhas mansas e o mais velho truque do mundo: enquanto nos acena uma mão cheia de notas que prometem a salvação económica do país, com a outra mão, à socapa, levam-nos as nossas liberdades, a nossa soberania, não apenas a popular, mas a nacional também. Como procurei mostrar, em não se invertendo o actual processo, as consequências serão, naturalmente, catastróficas, não apenas para os portugueses, mas para todos os europeus. E, por estas, não me refiro apenas à perda da independência e soberania nacionais, algo que que, suspeito, a maioria dos portugueses trocaria de bom grado pela governança estrangeira desde que no futebol continue a ser a mesma bandeirinha que exalta corações e verte lágrimas pelas vitórias e derrotas. Não, as piores consequências são mesmo aquelas que advêm da substituição do sistema Ocidental de soberania popular, das liberdades individuais e da subsidiariedade pela soberania tecnocrática das elites, o triunfo do "bem" colectivo e a centralização progressiva dos meios de produção e decisão — a falência, a violência e o totalitarismo, portanto.

Já cá no burgo, entre o subsídio europeu que controla narrativas, vende promessas de paraísos futuros e estabiliza sistemas financeiros afogados em dívida, junto com o patético provincianismo português que imagina que tudo o que vem do estrangeiro é bom e melhor do que aquilo que por cá se faz — apesar de sermos os melhores do mundo nisto e naquilo —, gerou-se um silêncio ensurdecedor na sociedade civil portuguesa incapaz de discutir a gravidade da situação. Pelas mesmíssimas razões, os nossos políticos, incluindo aqui praticamente o parlamento inteiro e o governo, bem como todo o espaço publicado e mediático, assistem de boca calada, bolsos cheios e carreiras públicas de sucesso — um crime de lesa pátria que parece passar impune. No final, por enquanto, a situação parece ser mais ou menos esta: por um punhado de euros, anafados e saciados, alienados face à realidade do mundo, tranquila e silenciosamente vamos desbaratando tudo o que recebemos dos nossos "egrégios avós". Não vai correr bem.

 

quinta-feira, 12 de junho de 2025

Derrubando o Destino: Barbarossa Revisitado

História Apocalíptica Alternativa

Provavelmente não é um bom sinal quando um artigo precisa começar com uma nota editorial que quebra a quarta parede, mas aqui estamos. Tenho análises da linha de frente na Ucrânia e uma nova entrada em nossa série de história naval em andamento, mas fui desviado por um desafio que surgiu no Twitter (recuso-me a chamá-lo de X) do qual não consegui me livrar. As pessoas estavam discutindo, como parecem fazer incessantemente, sobre o que a Alemanha poderia ter feito para vencer a Segunda Guerra Mundial. Este é um tipo de tópico perene que é uma isca fácil para o engajamento, mas eu tinha uma vontade irresistível de dar a ele um tratamento próprio.

Minha motivação, como tal, é em grande parte o mito persistente de que a Alemanha perdeu a guerra ao adiar sua ofensiva para capturar Moscou em 1941. Este é um tópico grosseiramente mal compreendido, que pressupõe uma irreal liberdade de ação alemã nos momentos críticos de agosto e setembro de 1941. De fato, a Alemanha não tinha possibilidade de avançar sobre Moscou antes do que o fez. Além disso, a obsessão por Moscou ofusca a verdadeira crise enfrentada pela Wehrmacht, que era o desgaste de suas unidades mais importantes, a escassez de pessoal de reposição e a escassez de combustível. Portanto, em vez de recorrer ao motivo popular de que a guerra foi decidida às portas de Moscou, analisaremos de forma mais holística a crise da Wehrmacht e traçaremos um rumo melhor.

Para manter essa análise fundamentada em algum senso de realismo, tentaremos especular sobre a tomada de decisões alemã dentro de suas limitações históricas, particularmente no que se refere a efetivo, transporte logístico e inteligência militar. Em outras palavras, não alteraremos a força da força alemã original nem presumiremos qualquer conhecimento prévio sobre as reservas da URSS. No entanto, examinaremos maneiras pelas quais o Exército Alemão poderia ter aumentado significativamente sua geração de forças e força logística, com base em soluções adotadas posteriormente na guerra. Demonstraremos que foi razoável que a liderança alemã tivesse "puxado o gatilho" para tais medidas muito antes do que realmente o fez. Assim, embora não concedamos à Alemanha mais forças do que ela foi capaz de mobilizar no total, podemos demonstrar que foi razoável que a Alemanha tenha priorizado os esforços de mobilização. Também faremos o possível para tratar o esquema de manobras de forma realista e não atribuir objetivos que estivessem muito além do alcance de ataque do exército. O resultado é uma versão alternativa de 1941 que, embora não provável, era pelo menos possível, e isso terá que servir.

Guerra Preventiva: A Lógica Estratégica de Barbarossa

Qualquer discussão sobre a Segunda Guerra Mundial que pergunte "por que" a Alemanha perdeu quase imediatamente se transformará no clichê do grande erro estratégico de Hitler: o grande erro foi atacar a União Soviética em primeiro lugar .

Como base para uma discussão mais ampla sobre Barbarossa, e correndo o risco de fazer um pedido de desculpas pela guerra mais destrutiva e violenta da história registrada, não é difícil entender que a invasão alemã da União Soviética não era apenas estrategicamente defensável, mas talvez fosse o único curso de ação possível, dada a crise estratégica mais ampla enfrentada por Berlim.

É relativamente comum que Barbarossa seja defendida com base no argumento de que foi um "ataque preventivo", operando sob a suposição de que Stalin estava preparando sua própria invasão terrestre ao Reich. Há elementos de verdade que vale a pena seguir, mas, em geral, tais discussões não diferenciam entre guerra "preemptiva" e "preventiva": conceitos semelhantes, mas distintos, com nuances importantes. O ataque da Alemanha à União Soviética foi preventivo, mas não preemptivo, e entender a diferença vale a pena.

A diferença entre ataque preventivo e preemptivo é principalmente uma questão de cronograma. O termo "preemptivo" é usado para denotar uma operação militar realizada em antecipação a uma ameaça iminente do inimigo. Isso contrasta com a guerra preventiva, que implica guerra com o propósito de prevenir um conflito esperado no futuro, momento em que se projeta que o inimigo desfrute de circunstâncias e proporções de força mais favoráveis. A diferença se reduz em grande parte a uma questão de liberdade de ação e da imediatez da ameaça. A ação preemptiva é, em grande medida, forçada pela perspectiva de um ataque inimigo iminente, enquanto a guerra preventiva é empreendida de forma um pouco mais voluntária, a fim de impedir o fortalecimento do inimigo a longo prazo. Enquanto a ação preemptiva é forçada por uma ameaça imediata especificada, a guerra preemptiva se baseia em cálculos de força de longo prazo e no medo de que a outra parte inicie a guerra em uma data posterior não especificada, em condições mais favoráveis.

Neste caso, certamente não havia nenhum plano para um ataque iminente do Exército Vermelho. Embora uma série de evidências circunstanciais sejam apresentadas para sustentar a ideia de que Stalin estava planejando um ataque ao Reich, ela geralmente se baseia em uma compreensão equivocada do pensamento militar soviético. É verdade que o vocabulário militar soviético era de cunho ofensivo, mas isso se deve em grande parte ao forte culto à ofensiva do Exército Vermelho, que presumia – como por mágica – que qualquer ataque inimigo poderia ser rapidamente absorvido, permitindo que as forças soviéticas passassem rapidamente ao ataque em caso de guerra. É inegável que a liderança soviética estava prevendo uma guerra com a Alemanha em alguma data indeterminada no futuro próximo, mas isso é completamente diferente de afirmar que a União Soviética tinha planos concretos para atacar a Alemanha em 1941.

Para citar apenas um exemplo, um dado comum levantado para sustentar a hipótese de ataque soviética foi uma proposta de Zhukov, de maio de 1941, que esboçava um desdobramento secreto do Exército Vermelho para operações ofensivas contra a Wehrmacht. A proposta era bastante real, mas geralmente se ignora o fato de que o plano de desdobramento de Zhukov nunca foi aprovado por Stalin, nem era o esquema de desdobramento em uso pelo Exército Vermelho às vésperas da guerra.

Mais precisamente, o estabelecimento adequado do cronograma deixa claro que Hitler e a Wehrmacht se prepararam para atacar a URSS sob sua própria responsabilidade, e não em resposta a uma ameaça iminente percebida. A decisão de Hitler de atacar a URSS costuma ser atribuída a uma reunião em 31 de julho de 1940, em Berghof, onde ele declarou pela primeira vez sua intenção de destruir a União Soviética "de uma vez por todas". Os primeiros esboços operacionais para a campanha já haviam sido apresentados pelo Major-General Erich Marcks em 5 de agosto de 1940, e a operação recebeu a designação de "Barbarossa" em dezembro.

Em contraste, os dados que sugerem agressão soviética geralmente datam do ano seguinte (1941, o ano da invasão). Em março, a inteligência militar alemã começou a enviar relatórios relacionados à mobilização soviética nas regiões de fronteira. Além disso, em 14 de março de 1941, os Exércitos Estrangeiros Alemães do Leste observaram em seu relatório de situação que o Exército Vermelho estava em estado de mobilização parcial. Observando os desdobramentos soviéticos em andamento ao longo da primavera, em maio, Hitler e a equipe de operações da Wehrmacht reconheceram que as formações do Exército Vermelho eram muito maiores do que o previsto inicialmente e que era possível que os soviéticos tomassem suas próprias ações preventivas para interromper a preparação para a Operação Barbarossa.

Em conjunto, surgem três fatos-chave que devem nos desmistificar fortemente a ideia de que um ataque soviético à Alemanha estava planejado para 1941. Primeiro, o planejamento alemão para Barbarossa começou no verão de 1940, meses antes de a inteligência alemã começar a fornecer relatórios constantes sobre o acúmulo de forças soviéticas perto da fronteira. Segundo, na primavera de 1941, a inteligência alemã ainda avaliava que o Exército Vermelho estava em estado de mobilização parcial; na medida em que temiam um ataque soviético, estavam preocupados com as operações limitadas do Exército Vermelho para interromper os preparativos para Barbarossa. Terceiro e último (e muito mais pertinente), até o momento não há documentação de uma ofensiva estratégica soviética antecipada de nenhum dos lados - seja na forma de um alerta da inteligência alemã sobre um ataque soviético, ou de planos soviéticos para tal operação.

Barbarossa não foi um ataque preventivo. Isso não significa, contudo, que não tivesse uma lógica estratégica fundamentalmente sólida como guerra preventiva .

O problema da Alemanha, como tal, não era que Stalin estivesse se preparando para atacar o Reich em 1941, mas sim que a força da URSS estava aumentando ao longo do tempo em relação à Alemanha, enquanto contradições ideológicas e geopolíticas tornavam essencialmente impossível construir um acordo estável entre os dois Estados a longo prazo. Pontos de atrito específicos residiam tanto nos termos do comércio germano-soviético quanto no crescente atrito sobre esferas de influência nos Estados limítrofes.

O problema estrutural, da perspectiva alemã, era que o comércio com a URSS se baseava amplamente na troca de tecnologia alemã por recursos naturais soviéticos. No curto prazo, isso deu a Berlim uma maneira de contornar o bloqueio britânico, mas a questão básica era que as commodities trazidas da União Soviética – grãos, petróleo e insumos metalúrgicos – eram consumíveis que não fortaleciam a Alemanha a longo prazo: pelo contrário, colocavam a Alemanha na dolorosa posição de dependência abjeta de Moscou. O governo soviético, por sua vez, não hesitou em enfatizar esse ponto. Em 1940, a URSS suspendeu temporariamente as exportações de grãos e petróleo para a Alemanha em resposta a um atraso nos embarques de carvão alemão. A ameaça de atrasos ou cancelamentos de entregas soviéticas era tão grave que Göring emitiu uma diretiva estipulando:

Todos os departamentos alemães devem partir do fato de que as matérias-primas russas são absolutamente vitais para nós... De acordo com uma decisão explícita do Führer, onde entregas recíprocas aos russos estão em perigo, até mesmo as entregas da Wehrmacht alemã devem ser retidas para garantir a entrega pontual aos russos."

Essa sensação de dependência contínua e interminável de um anátema ideológico como a URSS era considerada essencialmente intolerável, e havia pouca perspectiva de alívio. Um relatório do Departamento de Desenvolvimento Econômico do Reich concluiu que, mesmo que os britânicos pudessem ser expulsos do Norte da África e do Oriente Médio (colocando esses campos de recursos sob controle alemão), o Reich ainda enfrentaria escassez de 19 das 33 matérias-primas vitais identificadas. Em outras palavras, mesmo a resolução bem-sucedida da guerra contra a Grã-Bretanha não poderia trazer autossuficiência econômica.

Enquanto isso, a Alemanha enviava um fluxo constante de tecnologia sensível e capital industrial para a União Soviética. Em 1940, os soviéticos exigiram (e obtiveram) a entrega de uma planta completa para a produção de borracha sintética e combustível, seguida de uma exigência para que recebessem o processo inovador da IG-Farben para a produção de tolueno, um insumo essencial para o combustível de aviação de alta qualidade da Alemanha. Protótipos alemães de tanques, bombardeiros e artilharia também foram enviados para a URSS. Esse era o preço dos grãos.

Em suma, Stalin tinha Hitler sob controle. Não havia absolutamente nenhuma dúvida de que a economia de guerra alemã não poderia funcionar sem matérias-primas soviéticas, mas – sem poder real sobre Moscou – a Alemanha não tinha escolha a não ser enviar um fluxo constante de segredos industriais sensíveis, protótipos militares e máquinas-ferramentas para o leste. A Alemanha havia escapado do bloqueio britânico, ao custo de se tornar um vassalo econômico da União Soviética. Isso representava uma inversão quase exata do objetivo declarado de uma economia alemã autossuficiente e, ainda mais importante, prometia um aumento a longo prazo do poder da URSS à medida que absorvia a tecnologia industrial alemã.

A situação chegou ao auge, no entanto, com a visita de Vyacheslav Molotov a Berlim em novembro de 1940. A cúpula Molotov-Hitler foi talvez a última chance real para a Alemanha e a União Soviética alcançarem algum tipo de coexistência estável, e nisso foi um fracasso abjeto. O ponto geral que emergiu, como se já não fosse óbvio, foi que Moscou tinha uma enorme influência sobre a Alemanha, que Hitler não podia retribuir. Apesar de uma tentativa grandiloquente de descarrilar Molotov com discursos sobre os odiosos "anglo-saxões" e um incentivo fantasioso para a URSS tomar a Índia Britânica (não estava claro como ou por que isso poderia ser alcançado), Molotov manteve-se firmemente focado na Europa e apresentou aos alemães uma série de exigências que equivaliam a um xeque-mate geopolítico.

Encontro com Molotov

Entre as exigências estipuladas por Molotov, a URSS insistia que a Alemanha retirasse todas as suas tropas e conselheiros militares da Finlândia, aderisse à ocupação soviética dos estreitos turcos e reconhecesse a Bulgária como uma "zona de segurança" da União Soviética, o que implicaria uma ocupação pelo Exército Vermelho em breve. Por razões óbvias, isso era inviável para Hitler, pois implicava uma maior invasão soviética de parceiros comerciais alemães vitais. A Finlândia, por exemplo, era uma fonte insubstituível de níquel e madeira, enquanto uma posição do Exército Vermelho na Bulgária colocaria as forças de Stalin bem perto dos campos de petróleo da Romênia, que eram a única fonte significativa de petróleo não soviético para a Alemanha.

Quando se consideram as demandas de Molotov e Stalin no final de 1940 no contexto mais amplo da relação germano-soviética, torna-se extremamente claro que a Alemanha estava geoestrategicamente encurralada. A dinâmica central dessa relação era a dependência abjeta da Alemanha em relação às matérias-primas soviéticas, e a tentativa de Stalin de se impor ainda mais na Finlândia, Bulgária e Romênia ameaçava exacerbar essa dependência. Hitler tinha poucas alavancas para se apoiar contra isso, particularmente porque ele (ainda em guerra com a Grã-Bretanha) não tinha opções, enquanto Stalin (que não estava nominalmente em estado de guerra) tinha o tempo a seu favor.

Essa, portanto, era a lógica básica por trás da Operação Barbarossa, e era bastante sólida. A Alemanha havia se lançado em uma armadilha estratégica, conquistando vastos territórios na Europa que simplesmente careciam dos recursos naturais necessários para alcançar a autossuficiência econômica almejada por Hitler; em vez disso, ele agora dependia economicamente de Moscou e enfrentava a perspectiva de um estrangulamento ainda maior de recursos, à medida que Stalin pressionava por novas invasões no Báltico e nos Bálcãs. Hitler não tinha influência estratégica ou econômica suficiente para reagir, e por isso optou por se apoiar na alavanca mais forte em suas mãos: a Wehrmacht.

Era evidente que nenhum acordo poderia ser concebido para garantir uma coexistência estável entre a URSS e o Reich alemão, dadas as bases de recursos vastamente desproporcionais dos dois países. Diante da perspectiva de uma guerra futura (talvez em 1942-43) em circunstâncias menos favoráveis, ou de um ataque imediato contra um Exército Vermelho que ainda estava em processo de reorganização e armamento, Hitler optou pela guerra preventiva.

Geração de Força e Guerra Total

Finalmente chegamos à parte interessante, onde investigamos realidades alternativas. Como a Alemanha poderia ter derrotado a União Soviética, se isso fosse possível?

Qualquer discussão sobre a derrota da Alemanha no leste e suas causas deve começar com um dos maiores erros de inteligência militar de todos os tempos: a avaliação alemã das reservas soviéticas e do potencial de geração de força. A figura totêmica, que cito frequentemente como o núcleo do grande desastre alemão, foi a suposição (incorporada aos jogos de guerra da Wehrmacht) de que o Exército Vermelho poderia mobilizar 40 novas divisões em resposta à invasão, enquanto o número real era de aproximadamente 800. Essa subestimação de 20:1 da geração de força soviética estava, implícita ou explicitamente, no cerne do fracasso de Barbarossa e da contínua perplexidade expressa pela liderança alemã com o surgimento de novas formações soviéticas em campo.

O outro lado dessa questão diz respeito à capacidade da própria Alemanha de gerar poder de combate, tanto mobilizando homens quanto administrando a economia industrial em tempo de guerra. Aqui, no entanto, existe uma discrepância significativa na compreensão convencional da guerra: uma discrepância que se origina na péssima gestão do conflito pela Alemanha, iniciada no verão de 1941.

A apresentação padrão da guerra no leste enfatiza o terrível desgaste da Wehrmacht em 1941, quando foi esmagada primeiro por uma tenaz defesa soviética, seguida por uma série de contra-ofensivas do Exército Vermelho durante o inverno. A impressão é a de um Exército alemão cansado e desgastado, reduzido a uma casca de si mesmo. Elementos dessa história são certamente verdadeiros, com o livro-razão revelando que muitas das divisões do exército oriental estavam se agarrando a talvez metade de sua força regulamentar. O que essa história ignora, no entanto, é que a Wehrmacht foi consistentemente capaz de reconstituir sua força e até mesmo aumentar o número total de efetivos ativos – não apenas em 1942, para se recuperar da Barbarossa e das ofensivas de inverno soviéticas, mas novamente no início de 1943, após o desastre em Stalingrado. A produção de armamentos também aumentou significativamente, atingindo seu pico em 1944.

Reconciliar esses quadros contraditórios exige sondar as profundezas da inépcia estratégica alemã, particularmente a incapacidade da liderança alemã de compreender a guerra que travava no leste e sua gestão esquizofrênica de recursos humanos. No cerne da questão estava a confiança alemã em uma vitória rápida sobre a União Soviética por meio de uma blitzkrieg planejada, o que deixou pouco ímpeto para planejar uma guerra prolongada que exigiria mobilização contínua. Quando a Guerra Barbarossa começou, a liderança alemã planejava desmobilizar pessoal para reincorporar à força de trabalho. Apesar de já ter ficado evidente até 21 de julho, no máximo (data que detalharemos mais adiante), que a guerra não estava indo conforme o planejado e que mais efetivo seria necessário, Hitler e o alto comando ainda operavam sob a impressão de que grande parte do exército poderia ser dispensada do serviço no ano seguinte. De fato, foi somente na primavera de 1942 que a Alemanha começou a resolver seriamente seus problemas de mão de obra, liberando trabalhadores adicionais para o serviço militar, intensificando o recrutamento obrigatório e mobilizando trabalhadores estrangeiros e prisioneiros de guerra para fornecer a mão de obra necessária à indústria. Além disso, foi somente em 1943 que a Alemanha adotou o que se poderia chamar de economia de guerra total, com racionalização, planejamento centralizado rigoroso e restrições à produção civil.

Um elemento central da guerra fracassada da Alemanha, portanto, foi um atraso fatal na transição para uma economia de guerra totalmente mobilizada e uma mobilização mais ampla de pessoal para o exército. Isso se encaixou na má alocação de pessoal, garantindo que o exército de campanha no leste ficasse desnecessariamente sem efetivo. A causa foi um amálgama mortal de trauma político e excesso de confiança. O trauma teve origem na Primeira Guerra Mundial, que trouxe privações generalizadas aos civis alemães, já que a economia estava totalmente mobilizada para a guerra, enquanto era pressionada por um bloqueio britânico. Embora os efeitos do bloqueio sejam frequentemente exagerados, visto que o exército de campanha alemão permaneceu amplamente solvente e adequadamente abastecido, a lembrança da escassez de civis persistiu, e a liderança alemã na Segunda Guerra relutava em interromper a produção civil. Simultaneamente, Hitler e o alto comando permaneceram tolamente confiantes no iminente colapso soviético e, portanto, não estavam dispostos a acelerar a mobilização em 1941.

O resultado de tudo isso foi que, enquanto a União Soviética passava por uma mobilização total de praticamente todos os seus recursos humanos e econômicos (auxiliada por aquele maravilhoso instrumento de poder, o Partido Comunista), a Alemanha estava surpreendentemente letárgica. Hitler não considerou seriamente mobilizar trabalhadores industriais adiados (compensados ​​pelo emprego de prisioneiros de guerra, pela restrição da produção de bens civis e pela exploração da força de trabalho dos territórios ocupados) até março de 1942, e mesmo assim o processo de mobilização prosseguiu lentamente. Dada a escala da guerra que se desenrolava diante de seus olhos, o fracasso alemão em lançar uma mobilização enérgica em 1941 destaca-se como um ponto de virada crucial no conflito, que privou o exército oriental de pessoal durante sua crucial janela de oportunidade.

Qualquer história alternativa da Guerra Nazi-Soviética, portanto, deveria começar com a sugestão de uma mobilização alemã muito anterior. Isso é particularmente atraente porque não exige muita especulação: uma exploração mais agressiva da reserva de mão de obra depende apenas de mecanismos que os alemães acabaram utilizando na prática. Essas foram capacidades que os alemães demonstraram em 1942-44 e, em nosso cenário, precisamos apenas fingir que eles foram mais rápidos em reconhecer a crise à sua frente e adotar essas políticas no verão de 1941.

Em particular, o emprego imediato de prisioneiros de guerra, a racionalização e adoção de uma economia de guerra e a liberação de trabalhadores industriais protegidos para o serviço militar teriam liberado quase 1 milhão de pessoas para o exército oriental até o final de 1941. Isso é evidenciado pelo fato de que, em 1º de julho de 1942, o efetivo total da Wehrmacht era cerca de 1,1 milhão a mais do que no início da Guerra Barbarossa, apesar das graves perdas sofridas no ano anterior.

Na realidade, a Wehrmacht recebeu um número chocante de substitutos em 1942 e reconstituiu seu poder de combate com muito mais eficácia do que muitos historiadores reconhecem. No entanto, esse afluxo de pessoal não foi alocado de forma eficiente, principalmente porque a Luftwaffe e a Kriegsmarine conseguiram pressionar com sucesso por mais homens. A Luftwaffe , por exemplo, aumentou seu efetivo em cerca de 355.000 homens entre junho de 1941 e julho de 1942, com a maior parte do aumento ocorrendo nos primeiros meses de 1942. Notavelmente, a chegada de homens de Göring ocorreu em grande parte devido aos aumentos planejados antes do início da Operação Barbarossa.

Isso é emblemático da péssima gestão de recursos humanos da Alemanha. Antes da invasão da União Soviética, havia planos idealistas para desmobilizar o efetivo do exército, liberando homens para a economia e, ao mesmo tempo, aumentando a força da Luftwaffe. Em meados de 1941, deveria ter sido óbvio que a guerra estava indo mal e que o exército precisava de todos os homens que pudesse obter, mas a liderança alemã permaneceu relutante em começar a retirar homens da força de trabalho industrial e permitiu que a Luftwaffe absorvesse cerca de um terço do aumento no efetivo total da Werhmacht.

Basta ajustar um pouco o cronograma para aumentar drasticamente o poder de combate alemão na Frente Oriental durante sua crucial janela de oportunidade (1941-42). Primeiro, iniciando a convocação ampliada de trabalhadores industriais e iniciando a transição para uma economia de guerra em julho de 1941 (data que, reiterando, defenderei mais adiante), pode-se estimar aproximadamente 560.000 reservistas treinados, liberados para o exército na segunda metade de 1941 (na realidade, esses homens só foram mobilizados na primavera de 1942), o que poderia ter sido ainda mais ampliado restringindo o acesso da Luftwaffe ao pessoal em favor do exército oriental. Se a liderança alemã tivesse respondido com mais clareza e compreensão da crise que enfrentava, no total, pelo menos 750.000 militares adicionais poderiam ter sido enviados para o exército de campanha na União Soviética até o inverno de 1941 – e tudo isso, em grande parte, tomando as decisões de março de 1942 em julho do ano anterior. O exército teria então passado por mais reabastecimento e expansão com a convocação da turma de recrutamento de 1942.

Estamos tomando liberdades, é claro, com tais hipóteses. A realidade era que o regime nazista era significativamente menos reativo e unificado do que seu oponente. Hitler não possuía alavancas de controle equivalentes às exercidas por Stalin, e muito depois do início da Guerra Barbarossa, o regime alemão continuou a ver suas energias dissipadas por feudos em conflito. A Luftwaffe e a Marinha continuaram a pressionar com sucesso por acesso a pessoal e mão de obra industrial, e, em geral, a liderança era psicologicamente incapaz de admitir que a blitzkrieg planejada estava falhando. Até novembro, ainda havia ilusões de que – em vez de canalizar reforços para o leste – as tropas poderiam ser retiradas para a Alemanha durante o inverno, ou mesmo desmobilizadas. Como afirma a história oficial alemã da guerra:

A burocracia do Terceiro Reich não conseguiu responder de forma flexível às mudanças na situação militar. Inicialmente, a liderança política manteve uma lealdade rígida ao conceito de blitzkrieg. Esses fatos podem ser demonstrados com particular clareza no caso do sistema de adiamentos. Apesar do aumento das taxas de baixas no exército no leste durante o verão de 1941, o número de adiamentos continuou a aumentar drasticamente. Em setembro de 1941, atingiu o maior número da primeira metade da guerra, com quase 5,6 milhões de homens.

O regime não seria abalado desse estupor até que as ofensivas de inverno soviéticas tornassem a crise impossível de ignorar. Se a necessidade de mobilização ampliada fosse o elefante na sala, o inverno de 1941-42 foi quando o elefante agarrou alguém com a tromba e arrancou seu membro. A ação foi tomada, tardiamente, em março de 1942, que finalmente viu a torneira da mão de obra aberta. Para nossa hipótese, no entanto, prossigamos como se Hitler tivesse notado o elefante em julho e agido de acordo.

Logística no Fim do Mundo

O segmento anterior demonstrou, esperançosamente, que, embora a Alemanha tenha enfrentado grave escassez de mão de obra em muitos momentos da guerra, teve capacidade em 1941 e 1942 para regenerar seu poder de combate, mas não conseguiu fazê-lo em tempo hábil devido a neuroses políticas. A Wehrmacht de fato reconstituiria sua força na frente oriental em duas ocasiões, mas em 1941 não o fez, e consequentemente mergulhou no inverno em um estado deplorável.

O segundo elemento da derrota alemã no leste que geralmente recebe destaque nas manchetes é a logística. Aqui, a conversa geralmente toma dois rumos distintos. Uma versão da história trata o colapso logístico da Wehrmacht como uma questão de incompetência alemã, como se eles simplesmente não tivessem considerado os desafios de abastecimento. É aqui que as pessoas geralmente riem da ideia de que o exército alemão esqueceu seus equipamentos de inverno, como se não soubessem que faz frio em Moscou. Outra versão da história trata o lapso logístico como uma espécie de inevitabilidade, como se simplesmente não houvesse nada a ser feito diante das distâncias da URSS, das duras condições climáticas e de terreno e da rede rodoviária e ferroviária subdesenvolvida.

Como frequentemente acontece, a verdade reside em algum ponto intermediário. É certo que, independentemente do que os alemães fizessem, seria difícil abastecer adequadamente os vastos exércitos na Rússia Central. A Wehrmacht simplesmente não tinha um componente motorizado suficiente para manter um transporte adequado de caminhões, e a escassez de combustível e borracha (combinada com frequentes panes devido às más condições das estradas soviéticas) agravava a escassez orgânica de transporte motorizado. O abastecimento do exército oriental exigia um delicado equilíbrio entre transporte ferroviário, caminhões, veículos sobre esteiras e humildes carroças puxadas por cavalos, todos sobrecarregados de maneiras sem precedentes no leste.

Embora seja uma conclusão inevitável que a logística alemã nunca seria totalmente satisfatória no leste, deve-se reconhecer que, mais uma vez, uma gestão disfuncional exacerbou o problema. Muitos dos problemas técnicos com as ferrovias no leste são exagerados nas histórias populares. Por exemplo, é comum notar que a bitola dos trilhos soviéticos era diferente do padrão europeu, forçando os alemães a remanejar as linhas ferroviárias. Isso é verdade, mas, na verdade, a conversão dos trilhos foi uma tarefa de engenharia bastante simples para as tropas ferroviárias alemãs. Em dezembro de 1941, engenheiros alemães haviam recalibrado 15.000 quilômetros de trilhos e aumentado o total para 21.000 em maio de 1942. Comparado à alteração da bitola dos trilhos, a tarefa mais complicada acabou sendo consertar e construir centros de serviço e outras instalações ferroviárias, mas isso também foi concluído a tempo.

O maior problema com a rede ferroviária no leste não era a dificuldade de conversão e reparo dos trilhos, mas a escassez de locomotivas, a insuficiência de pessoal entre as tropas ferroviárias e o pessoal logístico, e uma gestão caótica (que frequentemente descambava para comandantes que "sequestravam" trens de suprimentos para seus próprios fins). Assim como no âmbito da mão de obra, onde os alemães responderam letargicamente, a recuperação do sistema logístico demorou a acontecer, principalmente devido à má gestão e à liderança insensível. Em meio ao congestionamento geral da rede ferroviária, as autoridades ferroviárias civis (a Reichsbahn) e suas contrapartes militares (as Eisenbahntruppen) se transformaram em um atoleiro tóxico de acusações, competição jurisdicional e desconfiança.

Os esforços alemães para fortalecer o transporte logístico nas ferrovias só se concretizaram em novembro de 1941: muito depois de a situação do abastecimento ter se agravado, e tarde demais para beneficiar o avanço em direção a Moscou. Somente no final de novembro a Reichsbahn recebeu ordens de enviar recursos adicionais para o exército oriental. A chegada subsequente de mais pessoal ferroviário e 1.000 locomotivas quase imediatamente impulsionou o tráfego ferroviário diário para o front em 50%, e esses ganhos foram ampliados pela liberação constante de mais locomotivas nos primeiros meses de 1942. Somente em maio de 1942, Albert Speer foi encarregado da remediação enérgica da rede ferroviária oriental, que ele enfrentou dedicando mais recursos ao reparo de instalações no leste, racionalizando e acelerando os procedimentos de descarregamento e retirando material circulante dos territórios ocupados no oeste. No verão de 1942, o Departamento de Economia de Guerra avaliou que o tráfego ferroviário para o leste era suficiente para abastecer o exército no front.

Assim como no caso da mão de obra para o exército, dificilmente havia um botão mágico que os alemães pudessem apertar para fornecer instantaneamente pessoal e suprimentos infinitos. Mais uma vez, porém, a letargia da liderança alemã em responder à crise no front sugere que as coisas poderiam ter sido diferentes. Decisões críticas, como a alocação de recursos ferroviários civis e as mudanças gerenciais de Speer, só ocorreram muitos meses depois que a crise de suprimentos deveria ter se tornado evidente: um atraso que pode ser atribuído, mais uma vez, à relutância da liderança alemã em admitir que a campanha não estava indo conforme o planejado.

Se a liderança alemã tivesse sido mais flexível cognitivamente e responsiva à crise militar em desenvolvimento, muitas dessas decisões poderiam ter sido antecipadas para o verão de 1941. Em um mundo onde Berlim admite em julho que a guerra será muito mais longa e exigirá mais recursos do que o previsto (um mundo onde a Alemanha está disposta a fazer a transição para uma posição de guerra completa antes que seja tarde demais), mais pessoal ferroviário, recursos de engenharia e locomotivas poderiam ser despachados durante o verão, resultando em um aumento mais robusto de suprimentos durante os meses críticos do outono.

Tanto no caso das ferrovias quanto da crise de mão de obra, o tema geral que emerge é o da liderança alemã que responde apenas a crises extremas, particularmente na forma das ofensivas de inverno do Exército Vermelho. Foi somente a intensa pressão dessas ofensivas de inverno – que levaram o Grupo de Exércitos Centro à beira do colapso – que finalmente despertou Hitler e forçou uma convocação tardia de reservistas da força de trabalho; da mesma forma, foi somente quando a crise de abastecimento atingiu seu ponto crítico, em novembro, que a Alemanha começou a mobilizar recursos adicionais para a ferrovia oriental.

O resultado foi que tanto o equilíbrio de mão de obra quanto a cadeia logística da Alemanha foram amplamente restaurados, embora tarde demais. A crença rígida na vitória rápida e o iminente colapso soviético deixaram a liderança alemã sem o conjunto de ferramentas intelectuais para reconhecer a crise enquanto ela ainda estava em seus estágios iniciais. Ficamos com uma justaposição notável. É difícil imaginar um Estado que personificasse melhor a guerra total do que a Alemanha em 1944 e 1945 – mobilizando jovens menores de idade e idosos, canibalizando praticamente todos os recursos demográficos e econômicos enquanto desafiava o esquecimento. No entanto, em 1941, quando a crise estratégica se manifestou pela primeira vez, esse mesmo regime mostrou-se chocantemente complacente quanto à mobilização de recursos adicionais para o exército oriental. A economia alemã só transitou para uma situação de guerra plena em meados de 1943 e, durante a crucial janela operacional, o exército oriental teve acesso negado a recursos logísticos e humanos críticos.

Ponto de virada em Smolensk

A impressão geral que tentamos transmitir é que, embora os recursos alemães fossem certamente limitados (e lamentavelmente inadequados para uma guerra contra dois inimigos com recursos que abrangiam todo o continente), a Wehrmacht dispunha de reservas de recursos humanos, industriais e logísticos que foram deixados inexplorados em 1941, criando uma crise militar generalizada no inverno. Em geral, a liderança alemã intensificou o esforço de guerra em resposta à catástrofe do inverno, em vez de antecipá-la com a mobilização oportuna de recursos.

Surge então a seguinte pergunta lógica: houve um momento em 1941 em que era razoável que a liderança alemã tivesse compreendido que estava presa em uma catástrofe militar iminente? Seria possível discernir o elefante na sala antes que ele se alastrasse? Embora qualquer abordagem deste tópico deva, com razão, observar as neuroses institucionais peculiares do regime alemão – impulsionadas tanto pelas personalidades singulares envolvidas quanto pela estrutura de comando dissipada e conflituosa –, argumento inequivocamente que tal oportunidade para correção de curso existiu.

Especificamente, a segunda quinzena de julho de 1941 apresenta-se como o momento em que a campanha alemã não só começou a se desviar radicalmente dos trilhos, mas também o ponto em que a crescente crise estratégica deveria ter se tornado evidente. Uma liderança alemã um pouco mais racional e cognitivamente flexível, menos cega por sua fé na vitória rápida e no colapso soviético, deveria ter corrigido o curso nesse ponto. O período fatídico data especificamente de 21 a 31 de julho.

Durante este período crítico, quatro marcos importantes foram verificados em sequência rápida:

  1. O Exército Vermelho iniciou uma ampla contra-ofensiva com exércitos de campo recém-implantados que a Wehrmacht não esperava encontrar, provando definitivamente que as suposições pré-guerra sobre a geração de forças e reservas soviéticas estavam erradas.

  2. O alto comando alemão, incluindo Hitler, pela primeira vez ficou dividido e incerto quanto aos próximos passos operacionais. Não foi possível chegar a um consenso sobre o formato e a prioridade das operações seguintes.

  3. As formações críticas do Grupo de Exércitos Centro se mostraram incapazes de concluir tarefas operacionais essenciais.

  4. O primeiro erro operacional flagrantemente óbvio da guerra foi cometido, com o grupo panzer de Heinz Guderian contribuindo materialmente para a derrota alemã ao tentar tomar e manter a Cabeça de Ponte de Yelnya (mais sobre isso em breve).

Em conjunto, o final de julho pode ser visto claramente como o ponto em que a campanha começou a descarrilar em todos os níveis. Estrategicamente, o comando alemão começou a demonstrar paralisia e confusão quanto à forma de prosseguir a campanha, enquanto o Grupo de Exércitos Centro começou a vacilar tanto em suas escolhas operacionais quanto na diminuição do poder de combate de suas formações críticas. Este foi o momento em que uma liderança alemã um pouco mais racional poderia e deveria ter mantido discussões internas honestas e respondido tanto mobilizando recursos adicionais (deslocando mais pessoal e ativos ferroviários para o leste e iniciando a convocação de reservistas treinados para a força de trabalho civil) quanto implementando alterações racionais no esquema de manobras.

A catástrofe da Wehrmacht se desenrolou da seguinte forma.

A fase inicial da Batalha de Barbarossa é bastante bem compreendida, com o Grupo de Exércitos Centro (o maior e mais ricamente equipado dos três grupos de exércitos alemães, com dois dos quatro grupos panzer do exército oriental) capturando um agrupamento de exércitos soviéticos em um enorme bolsão ao redor de Minsk, o que capturou centenas de milhares de prisioneiros e abriu um enorme buraco na frente ocidental do Exército Vermelho. Com base na vitória em Minsk, a liderança alemã fez seus famosos pronunciamentos de que os soviéticos já haviam sido praticamente derrotados, com Halder (Chefe do Estado-Maior do Alto Comando do Exército) escrevendo em seu diário que a guerra havia sido praticamente vencida em duas semanas e que mais a leste os alemães encontrariam forças "apenas parciais".

Em 4 de julho, porém, enquanto o enorme bolsão ao redor de Minsk se encontrava em seus estágios finais de redução, os dois principais elementos de ataque do Grupo de Exércitos Centro – o 3º Grupo Panzer de Hermann Hoth e o 2º Grupo Panzer de Heinz Guderian – já estavam partindo da área de Minsk, movendo-se rapidamente em ângulos de 45 graus entre si. Hoth avançava para nordeste a fim de tomar uma travessia sobre o rio Dvina, enquanto Guderian se movia para leste, em direção ao Dnieper. Embora a forma geral desses avanços sugerisse um movimento concêntrico em direção a Smolensk, o poder de combate do Grupo de Exércitos Centro estava se dissipando sutilmente, com dois comandantes, um em Hoth e outro em Guderian, que tinham suas próprias ideias em jogo. Contudo, o perigo parecia relativamente baixo, dada a avaliação de que os soviéticos eram incapazes de construir uma linha defensiva nova e coerente. Como Hoth lamentaria mais tarde, no entanto, "as consequências de uma avaliação imprecisa do inimigo tornaram-se prontamente aparentes".

Embora comentemos alguns detalhes operacionais, o tema geral que agora emergiria era uma estranha relutância por parte dos principais comandantes em campo (Guderian talvez o mais importante) e do alto comando alemão em reagir adequadamente à descoberta de um agrupamento inteiramente novo de exércitos de campo soviéticos ao redor de Smolensk.

Guderian em campo

Ainda em 6 de julho, figuras-chave alemãs como Hoth e Halder estavam convencidas de que encontrariam apenas forças soviéticas parciais ou "reunidas" a leste. O mapa da situação alemã de 4 de julho identifica apenas dois exércitos de campanha soviéticos ao redor de Smolensk: o 11º e o 13º, com muitas das divisões soviéticas marcadas com a palavra "Reste", que significa remanescentes ou sobras , implicando unidades parciais que haviam sido previamente massacradas. Em 12 de julho, no entanto, os mapas alemães retratam novos exércitos, como o 19º, o 21º e o 22º, aos quais o 20º seria adicionado alguns dias depois.

Essas eram as forças recém-chegadas do Exército de Reserva Soviético que tinham sido recentemente despachadas para reforçar sua Frente Ocidental (uma "frente" sendo o jargão soviético para um Grupo de Exércitos). O aparecimento do que equivalia a um grupo de exércitos totalmente desconhecido (com milhares de tanques), deveria ter sido o momento em que a liderança alemã começou a despertar para a realidade e a reconhecer que havia subestimado gravemente a geração de força soviética, mas não o fez.

Mais importante ainda, a falha alemã em reagir aos novos exércitos soviéticos em torno de Smolensk ocorreu em dois níveis críticos de comando. No nível estratégico, não houve revisão da expectativa de que o Exército Vermelho estava entrando em colapso e, consequentemente, não foi possível tentar começar a se preparar para uma guerra mais longa e abrangente, mobilizando reservistas e redirecionando recursos logísticos para o leste. No nível operacional, contudo, comandantes de campo como Guderian fizeram uma série de escolhas equivocadas que transformaram a Batalha de Smolensk subsequente em uma vitória vazia e pírrica, que em grande parte condenou a guerra alemã.

O primeiro efeito dominó na crise operacional emergente foi uma série de contra-ataques soviéticos nos flancos e articulações dos Grupos Panzer que avançavam. Dois corpos mecanizados soviéticos atacaram na área ao redor de Lepel e Syanno (na atual Bielorrússia), perto da fronteira entre os grupos de Hoth e Guderian. Embora o ataque soviético tenha fracassado com pesadas baixas, ele obrigou Guderian a redirecionar a 17ª Divisão Panzer para atacar o flanco das formações soviéticas atacantes. Enquanto isso, o 21º Exército soviético atacou o flanco sul exposto de Guderian, que se projetava em espaço aberto devido à grande distância que o Grupo de Exércitos Centro havia ultrapassado seu vizinho ao sul.

Guderian estava totalmente obcecado em continuar seu avanço para o leste e se ressentia do fato de as forças em ambos os seus flancos estarem sendo desviadas por contra-ataques soviéticos. Em 7 de julho, ordenou que as batalhas em ambos os flancos fossem interrompidas com o inimigo "mantido sob observação", enquanto começava a canalizar tropas sobre o Dnieper para avançar mais para o leste. Isso irritou muito Hoth, pois ainda havia fortes forças soviéticas lutando ao longo de sua fronteira operacional. Com a 17ª Divisão Panzer de Guderian partindo para avançar para o leste, Hoth ficou "com a mão na massa", como ele mesmo disse. Além disso, em sua pressa para atravessar o Dnieper o mais rápido possível, Guderian contornou bolsões de tropas soviéticas que ainda defendiam ao longo da linha do rio e, em particular, deixou um forte agrupamento soviético atrás de si em Mogilev. A redução dessas posições caberia às divisões de infantaria que seguiam na esteira de Guderian, o que, por sua vez, atrasou sua chegada à frente em torno de Smolensk.

O mapa da situação alemã de 20 de julho já revelava todos os rumos que a batalha estava tomando. Guderian havia empurrado suas divisões panzer sobre o Dnieper e avançado a 10ª Divisão Panzer até Yelnya, que ele considerava um ponto de partida crucial para a próxima fase do objetivo (visando Moscou). Infelizmente para os alemães, a fixação de Guderian em mergulhar para a cabeça de ponte de Yelyna havia criado grandes problemas e marcava o primeiro ponto em que as escolhas operacionais alemãs estavam claramente equivocadas.

Mapa de Situação do Grupo de Exércitos Central em 20 de julho de 1941

Em primeiro lugar, ao empurrar suas divisões panzer para o leste, em direção a Yelnya, Guderian deixou o cerco que agora se formava em torno de Smolensk inacabado. O comandante do Grupo de Exércitos Centro, Fedor von Bock, ficou horrorizado, escrevendo: "Só há um bolsão na frente do grupo de exércitos! E ele tem um buraco!" Os alemães levariam semanas para fechar o bolsão em torno de Smolensk, com o grupo panzer de Hoth fazendo quase todo o trabalho pesado. Em 1º de agosto, sob forte pressão dos contra-ataques soviéticos, o cerco foi rompido. Quase metade das tropas soviéticas cercadas escaparia, com cerca de 50.000 partindo para o leste nos primeiros dias de agosto.

O problema básico era que Guderian era um oficial com forte predisposição à insubordinação, que tinha suas próprias ideias sobre a direção que a campanha estava tomando. Ele continuava a acreditar que um avanço direto em direção a Moscou era o melhor curso de ação e priorizava manter sua cabeça de ponte em Yelnya acima de praticamente qualquer outra prioridade operacional. Na última semana de julho, com o cerco em torno de Smolensk ainda permitindo a fuga de tropas soviéticas para o leste, Guderian efetivamente transferiria unidades de Smolensk para Yelnya, e não o contrário.

No final, a posição de Guderian em Yelnya revelou-se uma das escolhas operacionais mais contraproducentes da guerra. Não só contribuiu diretamente para uma vitória de Pirro em Smolensk, com a fuga de grande parte da força cercada, como também acelerou o desgaste das unidades panzer do Grupo de Exércitos Centro. Isso aconteceu por dois motivos: primeiro, ao negligenciar o cerco, Guderian transferiu a responsabilidade para o Grupo Panzer de Hoth, que sofreu baixas correspondentemente elevadas. Em particular, a 7ª Divisão Panzer acabou por conduzir a maior parte dos combates pesados, tentando, sem sucesso, isolar a estrada Smolensk-Moscou.

Mais importante, porém, a cabeça de ponte de Yelyna tornou-se um campo de extermínio para as forças de Guderian. A saliência saliente, com cerca de 60 km de largura, foi submetida a ataques pesados ​​em um arco de 180 graus. Em 26 de julho, o diário de guerra do Grupo Panzer 2 registrou:

Nos combates em torno de Yelnya, a situação é especialmente crítica. O corpo tem sido atacado o dia todo por forças fortemente superiores, com tanques e artilharia... O fogo constante de artilharia pesada está causando pesadas baixas às tropas... O corpo não tem absolutamente nenhum projétil disponível... O corpo talvez consiga manter sua posição, apenas ao preço de um severo derramamento de sangue.

O Grupo de Exércitos Centro sofreria cerca de 100.000 baixas em agosto e setembro, diante dos persistentes contra-ataques do Exército Vermelho. Destes, pouco mais de 40% ocorreram na cabeça de ponte de Yelnya, a posição mais exposta na frente alemã. Os alemães abandonariam a posição em setembro, mas somente após sofrerem pesadas perdas e permitirem que a posição desviasse recursos da finalização das forças do Exército Vermelho cercadas em Smolensk e Mogilev.

Em suma, a Cabeça de Ponte de Yelnya custou aos alemães material valioso, além de tempo. Como resultado direto da indiferença de Guderian em selar os cercos, foram necessárias várias semanas para estabilizar a frente e reduzir os vários bolsões, e durante todo esse tempo as forças ao redor de Yelnya permaneceram expostas ao pesado fogo soviético. Considerando a posição de Yelnya, as decisões de Guderian custaram à Wehrmacht aproximadamente dez dias de atraso (ao prolongar a batalha em torno de Smolensk), permitiram que mais de 50.000 soldados soviéticos escapassem do cerco e aumentaram consideravelmente o desgaste dos grupos panzer.

A liderança alemã estava ciente de tudo isso. Halder escreveu em seu diário que os combates ao redor de Yelnya haviam sido brutais e estavam infligindo pesadas perdas às forças alemãs que ocupavam a cabeça de ponte, e Bock certamente sabia que o bolsão de Smolensk estava vazando. Apesar disso, ninguém nos escalões mais altos da cadeia de comando interveio para forçar Guderian a se retirar de Yelnya. Por quê?

Em contraste com a sua reputação imperiosa, Hitler não exerceu uma liderança enérgica no momento crítico de julho-agosto de 1941.

A resposta reside na paralisia estratégica emergente que dominava os alemães. Um forte bloco de oficiais (incluindo Halder, Bock e Guderian) havia surgido, favorecendo os preparativos para uma retomada imediata da ofensiva em direção a Moscou. Eles se opunham a Hitler, que estava comprometido em destacar os Grupos Panzer do Grupo de Exércitos Centro, deslocando o grupo de Hoth para o norte a fim de auxiliar o Grupo de Exércitos Norte em sua investida contra Leningrado, enquanto Guderian cortava para o sul, em direção à Ucrânia soviética. A decisão de manter a Cabeça de Ponte de Yelnya, apesar de seus custos exorbitantes, constituiu um mecanismo para os "oficiais de Moscou" avançarem em seu plano, comprometendo-se com o eixo de ataque em direção à capital soviética. Guderian, em particular, era altamente habilidoso em insubordinação e se opunha veementemente a qualquer desvio de suas forças para o sul. A Diretiva 33 do Führer, emitida em 19 de julho, foi o primeiro documento a instruir explicitamente o Grupo Panzer 2 a se preparar para se destacar do Grupo de Exércitos Centro e se deslocar para o sul, mas Bock e Guderian, durante semanas, tratariam essa ordem como se estivesse sujeita a negociação.

Foi esse debate que geralmente forma a base da discussão sobre "quando a Alemanha perdeu a guerra". Uma teoria muito popular argumenta essencialmente que Halder e Guderian estavam certos e que Hitler perdeu a guerra quando desviou os panzers de Guderian para o sul, em direção à Ucrânia, em vez de continuar pela estrada em direção a Moscou. Essa teoria é totalmente incorreta, e nos resta o fato incômodo de que Hitler estava certo.

O problema básico era que a estrada para Moscou não estava desobstruída, e o Grupo de Exércitos Centro não estava em condições de continuar sua ofensiva no início de agosto. A razão básica para isso foi a chegada de uma falange de exércitos de reserva soviéticos que manteriam uma pressão ofensiva implacável até setembro, enquanto o Exército Vermelho tentava uma ampla contraofensiva em frente ao redor de Smolensk. Embora o Grupo de Exércitos Centro tenha se mantido em geral (embora abandonando o saliente sangrento ao redor de Yelnya), o aspecto mais importante dessa ofensiva foi que ela manteve o Grupo de Exércitos Centro travado em combate de alta intensidade, o que o impediu de acumular suprimentos ou se reequipar para uma nova ofensiva. Nesse ponto, a conectividade logística com o exército na frente era adequada para abastecer o Grupo de Exércitos Centro na defesa, mas fraca demais para permitir a construção de depósitos de suprimentos para apoiar uma nova ofensiva. Foi somente quando a ofensiva soviética finalmente entrou em colapso em setembro que Bock conseguiu organizar suas forças para retomar o ataque.

Mapa de Situação do Centro do Grupo de Exércitos em 5 de agosto de 1941

Portanto, quando oficiais como Guderian reclamam que a estrada para Moscou estava "aberta" e que eles não conseguiram tomar a cidade apenas porque Hitler interveio, eles estão mentindo. De fato, o Grupo de Exércitos Centro passou praticamente todo o mês de agosto e o início de setembro se defendendo e não estava em condições de realizar a preparação necessária para retomar o ataque. Portanto, a decisão de Hitler de desviar Guderian para o sul a fim de cercar as forças soviéticas em Kiev foi essencialmente correta. Nenhuma ofensiva contra Moscou era possível em agosto de 1941.

O problema, porém, era que, mesmo onde sua sensibilidade estratégica estava geralmente correta, Hitler demonstrava indecisão e paralisia, o que criava uma direção estratégica confusa. Em 4 de agosto, ele voou para o quartel-general do Grupo de Exércitos Centro em Borisov para se encontrar com Bock, Hoth e Guderian. Os três generais ecoaram os argumentos de Halder de que a escolha correta era atacar Moscou o mais rápido possível. O encontro pareceu aprofundar momentaneamente a indecisão de Hitler, e Guderian voou de volta para seu próprio quartel-general determinado a se preparar para um ataque a Moscou.

No geral, as conferências de comando do início de agosto sugerem fortemente a forma geral da crise alemã. Os comandantes de campo – e Hitler, por extensão – permaneceram preocupados com a escolha operacional entre uma ofensiva imediata em direção a Moscou e o desvio dos panzers para o sul, a fim de limpar a Ucrânia soviética. Pouca atenção foi dada ao desgaste das forças panzer e à queda do poder de combate do exército na frente de batalha. Nenhum crédito foi dado ao Exército Vermelho, que se mostrou muito mais tenaz, com reservas muito mais profundas do que o esperado. Nesse ponto, a Alemanha ainda tinha reservas panzer substanciais não comprometidas – por exemplo, a 2ª e a 5ª Divisões Panzer ainda estavam na Alemanha – mas nenhuma discussão séria foi feita sobre seu desdobramento. A questão-chave, em suma, permaneceu sendo uma questão de ajustar o esquema de manobra, e a indecisão de Hitler e a incapacidade de decidir sobre uma direção clara custaram à Wehrmacht tempo e recursos valiosos.

Como poderia ter sido diferente? Chegamos aqui ao ponto de partida, que depende, em primeiro lugar, da demonstração de determinação de Hitler e de tornar suas diretrizes muito mais explícitas. Também devemos presumir que os comandantes de campo alemães, com sua forte tendência independente, de fato seguem ordens. Esta é uma suposição tênue, mas, para o bem do nosso experimento mental, terá que servir. Considere as seguintes mudanças no esquema operacional alemão:

  1. Em 19 de julho, ordens explícitas foram emitidas estipulando que a Cabeça de Ponte de Yelnya não deveria ser perseguida, com as 10ª e 17ª Divisões Panzer redirecionadas para o norte para se unirem às forças de Hoth e selar o cerco de Smolensk.

  2. As ordens de Hitler deixam claro que as instruções de Guderian são para priorizar o fechamento do cerco de Smolensk, seguido pela readaptação dos preparativos para um desvio para o sul, em direção à Ucrânia.

  3. Após a conferência de comando de 4 e 5 de agosto, Hitler libera a reserva panzer para o exército oriental. As 2ª e 5ª divisões panzer chegam para reforçar o Grupo de Exércitos Centro em setembro.

  4. Em 11 de agosto, Guderian inicia seu ataque ao sul, em direção a Kiev - nota: na verdade, essa ordem só foi dada em 25 de agosto, devido à indecisão de Hitler e aos atrasos causados ​​pela falha de Guderian em fechar o bolsão de Smolensk.

Somado à nossa decisão de mobilizar reservas e ativos ferroviários mais cedo (com o gatilho sendo a descoberta inesperada de exércitos de campanha soviéticos em Smolensk), isso coloca a Wehrmacht em uma posição significativamente mais forte. O desgaste do Grupo de Exércitos Centro teria sido significativamente menor, tanto em termos relativos quanto absolutos, tanto porque as severas perdas sofridas no saliente de Yelnya teriam sido evitadas, quanto devido à redução mais rápida e abrangente do bolsão de Smolensk. Uma liderança mais decisiva também teria adiantado a Wehrmacht duas semanas em relação ao seu cronograma, com a operação em Kiev começando em 11 de agosto, em vez de 25.

Este cronograma acelerado não é difícil de justificar e pode, de fato, ser conservador. Conforme os eventos de fato se desenrolaram, Guderian relatou que suas forças estavam preparadas para a ação em 15 de agosto, mas a ordem de virar para o sul em direção a Kiev só veio no dia 25 devido à indecisão do alto comando. Podemos acelerar ainda mais a operação presumindo uma resolução mais rápida para o bolsão de Smolensk (facilmente possível se Guderian tivesse se importado) e uma rotação mais rápida das unidades panzer: como as coisas realmente aconteceram, Guderian teve grande dificuldade em retirar suas unidades mecanizadas da linha devido aos agressivos ataques soviéticos a Yelnya. Defendendo mais a oeste em uma posição menos exposta, ele poderia ter inserido a infantaria na linha mais rapidamente para permitir que os panzers se reequipassem e se preparem para o ataque.

Estabelecendo-se: Operações Finais em 1941

Até agora, elaboramos um cenário em que o Grupo de Exércitos Centro evitou desgastes desnecessários, obteve uma vitória mais completa em Smolensk e encerrou suas operações lá pelo menos duas semanas antes do previsto. Isso, por sua vez, teria acelerado a operação alemã em direção a Kiev, que se tornou talvez a maior vitória alemã da guerra. Com o grupo panzer de Guderian avançando para o sul, em direção ao centro da Ucrânia, a Wehrmacht cercou quase toda a Frente Sudoeste do Exército Vermelho, capturando cerca de 650.000 soldados soviéticos, além de centenas de milhares de mortos e feridos. Esta foi, sem dúvida, uma das grandes vitórias da guerra, que aniquilou um grupo do exército soviético e invadiu regiões econômicas críticas. Hitler cometeu muitos erros, mas o desvio em direção a Kiev não foi um deles.

Aniquilação em Kiev

Até agora, no geral, ganhamos duas semanas no cronograma alemão, reduzimos modestamente o desgaste dos grupos panzer e reagimos adequadamente à mobilização do Exército Vermelho, iniciando a remediação da crise de mão de obra, material e logística no final de julho, em vez de esperar pelas ofensivas soviéticas no inverno. Essas são mudanças importantes, mas como podem se traduzir em um resultado diferente?

A fixação com Moscou tende a obscurecer a conversa. Pode-se argumentar que as medidas que tomamos aqui aumentam as chances da Wehrmacht capturar Moscou, permitindo que a Operação Tufão comece duas semanas antes. Com a Batalha de Kiev agora terminando por volta de 10 de setembro, em vez do dia 26 (como um efeito dominó da capacidade de Guderian de se mover mais cedo), teoricamente o Tufão pode ter começado em meados de setembro, em vez de 2 de outubro, como de fato aconteceu. Conforme os eventos se desenrolaram, Guderian iniciou seus movimentos para o norte em 30 de setembro – mas o que teria acontecido se ele estivesse duas semanas à frente?

É fácil tecer um cenário em cascata. Talvez, com um lançamento antecipado para o Typhoon, os alemães se aproximem de Moscou antes da chegada das reservas soviéticas, durante o pânico de outubro. Talvez a 2ª Divisão SS do Reich chegue à encruzilhada de Borodino antes da 32ª Divisão de Fuzileiros do Exército Vermelho (na vida real, os soviéticos venceram essa corrida por uma margem mínima). Talvez, talvez.

Ou talvez estejamos nos precipitando. Pode-se argumentar que o fator limitante que impediu o lançamento antecipado do Typhoon não foi a necessidade de esperar que Guderian limpasse Kiev, mas sim a contraofensiva soviética que se estendeu até setembro, impedindo o Grupo de Exércitos Centro de construir uma base de suprimentos para uma nova ofensiva. Durante o prolongado ataque soviético, os alemães continuaram a despender pesados ​​recursos na defesa, o que impediu o necessário reequipamento e reabastecimento para o Typhoon. Mesmo com Guderian duas semanas antes do previsto, a base de suprimentos para o Typhoon pode não ter se acomodado a um cronograma acelerado.

Em vez disso, redirecionamos grande parte da força ofensiva do Tufão. Em vez de enviar Guderian de volta ao norte para participar do Tufão, mantemos o 2º Grupo Panzer na Ucrânia para continuar a ofensiva em direção ao leste. Portanto, em vez de mobilizar tardiamente a reserva panzer para o Grupo de Exércitos Centro para um avanço fracassado em direção a Moscou, os agrupamentos panzer do Grupo de Exércitos Sul (incluindo o grupo de Guderian) são reforçados, e o foco principal alemão em setembro e outubro passa a ser a conquista da Linha Donets e do curso médio do Don, que podem servir como âncoras defensivas para o inverno. Na realidade, as forças alemãs conseguiram chegar a Rostov, nas extremidades da confluência do Don e do Donets, em novembro, mas foram forçadas a recuar devido aos contra-ataques soviéticos. Com um cronograma acelerado, o benefício do 2º Grupo Panzer e forças adicionais de tanques vindas da Alemanha, nossa linha proposta está ao nosso alcance.

Em nosso cenário, os recursos ofensivos acumulados para o Typhoon (incluindo a 2ª e a 5ª Divisões Panzer) são alocados ao Grupo de Exércitos Sul, com nossas duas semanas críticas de antecedência usadas para realizar uma investida mais enérgica contra o Donets e o Don em torno de Voronezh. Tendo atingido esse objetivo (que os alemães quase alcançaram de qualquer forma, apesar de menos tempo e forças muito mais fracas), a Wehrmacht estaria muito melhor posicionada para as operações em 1942, mantendo uma posição defensiva muito mais forte, com mobilização muito mais antecipada permitindo o reabastecimento dos exércitos durante o inverno, e uma conectividade logística mais forte.

Linha de parada de inverno proposta

Tal esquema teria proporcionado vantagens significativas para os alemães durante o inverno e os primeiros meses de 1942. O inverno de 1941-42 foi a primeira crise da Wehrmacht, quando o superdimensionado Grupo de Exércitos Centro sofreu intensa pressão da ofensiva de inverno soviética. Foi durante esses meses que a escassez de mão de obra começou a atingir níveis críticos, com a força na linha de frente caindo para 2,5 milhões (de 3,3 milhões em setembro).

Em nosso cenário, a decisão mais prudente de se entrincheirar na frente do Grupo de Exércitos Centro, através do corredor Smolensk-Bryansk, teria reduzido as perdas exorbitantes do inverno. O Grupo de Exércitos estaria muito melhor abastecido nessa posição, muito mais próximo de suas linhas férreas e protegido por linhas fluviais. Isso representa uma economia adicional de mão de obra, além do menor desgaste das unidades panzer devido à melhor gestão em Smolensk e à decisão de resistir ao fatídico mergulho na lama em direção a Moscou. Isso, combinado com nossa decisão de dispensar reservistas da força de trabalho no outono e priorizar substituições para o exército oriental, teria deixado a Wehrmacht em uma posição significativamente mais forte ao entrar em 1942.

Mais importante ainda, manter o grupo panzer de Guderian na Ucrânia e direcionar o poder de combate para Rostov teria colocado a Wehrmacht em uma posição incomparavelmente mais forte para lançar a campanha de verão de 1942. Como os eventos se desenrolaram na realidade, a investida da Alemanha em direção aos campos de petróleo em 1942 começou de uma linha de partida que estava simplesmente muito longe do objetivo para ser viável. A Wehrmacht desperdiçou os meses de verão simplesmente limpando a curva do Don, de modo que grande parte de seu combustível e tempo foram desperdiçados antes que pudessem avançar para o Cáucaso e a curva do Volga. Em nosso cenário, a linha de partida para o Caso Azul é significativamente adiantada, de modo que a primeira metade da operação nem é mais necessária. O Grupo de Exércitos Sul também começa em uma posição muito mais forte graças à decisão de mobilizar reservas de forma mais oportuna, em vez de aguardar a crise do inverno.

Em nosso cenário, com a campanha de 1942 partindo de um cenário muito mais vantajoso, a Wehrmacht de fato tem os campos de petróleo a uma distância de ataque e consegue avançar para o Cáucaso em junho de 1942, em vez de no outono. Com menos terreno a percorrer, também é razoável que a curva interna do Volga pudesse ter sido desobstruída na fase inicial da operação, evitando o desastre em Stalingrado. A Alemanha obtém os campos de petróleo, e um Exército Vermelho, com escassez de combustível, não consegue tirar proveito de sua crescente motorização. Este é, de fato, um mundo diferente.

Resumo: História Alternativa

O que me esforcei para demonstrar aqui é um argumento duplo sobre a Operação Barbarossa. Primeiro, é certamente verdade que os alemães tinham opções que poderiam tê-los colocado em uma posição muito mais forte ao entrar em 1942, com uma linha mais favorável e forças significativamente mais fortes. Segundo, o argumento comum de que o erro da Alemanha foi atrasar o ataque a Moscou é incorreto.

Após a Batalha de Smolensk, simplesmente não é verdade que a estrada para Moscou estivesse "aberta" em qualquer sentido. Um escalão de exércitos de campanha soviéticos recém-implantados atacou o Grupo de Exércitos Centro implacavelmente por semanas, e o custo de repelir essa ofensiva soviética impediu o grupo de exércitos de Bock de acumular os suprimentos e materiais necessários para retomar a ofensiva. Não importava muito o que Guderian fizesse em agosto de 1941, pois a contraofensiva soviética minava o ímpeto alemão.

No entanto, os erros alemães durante a Batalha de Smolensk sobrecarregaram seu cronograma e causaram desgaste desnecessário dos grupos panzer. A insistência de Guderian em manter a cabeça de ponte de Yelnya impediu o fechamento e a redução oportunos do bolsão em Smolensk. O Grupo de Exércitos Centro desperdiçou tempo e poder de combate em Smolensk. No entanto, Guderian manteve a cabeça de ponte de Yelnya porque acreditava erroneamente que Smolensk seria seguido por um rápido avanço em direção a Moscou, apesar de Hitler estar firmemente inclinado a um desvio para o sul. Há culpa suficiente para todos. Guderian foi insubordinado em muitas ocasiões e errou gravemente em sua decisão de tomar e manter Yelnya, mas Hitler, da mesma forma, falhou em fornecer liderança decisiva durante aquelas semanas críticas e não articulou claramente o roteiro estratégico.

Demonstramos, no entanto, que uma melhor gestão da batalha em Smolensk teria proporcionado à Wehrmacht um tempo valioso e reduzido o desgaste de unidades-chave. Além disso, a Alemanha possuía reservas de mão de obra e recursos logísticos que não conseguiu mobilizar até que a crise do inverno atingisse seu ápice. Isso também fez com que o exército oriental ficasse muito mais fraco do que o necessário. A solução desses problemas exigiria uma liderança decisiva de Hitler em momentos de crescente confusão estratégica, o que não foi possível.

Podemos, portanto, delinear as seguintes alterações à conduta alemã na guerra em 1941:

  1. A Alemanha inicia uma mobilização intensificada em 21 de julho em resposta à descoberta de novos exércitos soviéticos em torno de Smolensk. Isso inclui medidas imediatas para mobilizar reservistas, racionalizar a gestão econômica, reduzir a produção da economia civil, transferir prisioneiros de guerra para o trabalho industrial e implantar meios ferroviários no leste. Argumentamos que o surgimento de um novo escalão soviético em Smolensk representa um momento racional em que a liderança alemã poderia ter descartado suas suposições equivocadas sobre o colapso soviético e a disponibilidade de mão de obra e iniciado uma mobilização intensificada que, na realidade, só começou em 1942-43. Isso resulta em 750.000 efetivos adicionais destacados para o exército oriental e uma capacidade ferroviária 50% maior até o outono.

  2. A Alemanha adota uma política de pessoal mais racional, que coloca o exército oriental em posição de prioridade absoluta, restringindo o acesso da Luftwaffe e da Kriegsmarine a novos efetivos. Isso libera pelo menos 250.000 militares adicionais para o exército.

  3. Durante os estágios iniciais em Smolensk, Hitler emite ordens explícitas para que Guderian abandone o avanço em direção à cabeça de ponte de Yelnya e se junte ao 3º Grupo Panzer para cercar e reduzir completamente o agrupamento do Exército Vermelho em Smolensk. A trajetória estratégica é definida de forma inequívoca: não há avanço iminente sobre Moscou; a prioridade é resolver o cerco em Smolensk para liberar o 2º Grupo Panzer para que ele possa rumar para o sul, em direção a Kiev.

  4. Guderian agora inicia o cerco em Kiev duas semanas antes do previsto e com mais força (devido às perdas evitadas em Yelnya). Depois de limpar o cerco de Kiev, Guderian permanece ligado ao Grupo de Exércitos Sul, que é reforçado com as 2ª e 5ª Divisões Panzer.

  5. O agora fortemente reforçado Grupo de Exércitos Sul avança em direção ao Donets e ao curso médio do Don, com objetivos críticos de outono sendo a captura de Voronezh e Rostov.

A Wehrmacht começaria 1942 com mais força, mais tempo e uma distância menor a percorrer para chegar ao Cáucaso e aos campos de petróleo, desferindo o único golpe "vitorioso" que era realmente possível contra um inimigo como a União Soviética.

Essas sugestões ilustram duas coisas. Primeiro, é óbvio que a margem de erro da Alemanha era mínima, pois mesmo pequenos deslizes prometiam fazer a situação estratégica sair do controle como duas peças de dominó caindo umas sobre as outras. O fato de ser tênue traçar um caminho para a vitória, mesmo em retrospectiva, sugere que a probabilidade de encontrá-lo em tempo real era realmente pequena. No entanto, devemos lembrar que, mesmo com todos os seus erros, a Wehrmacht milagrosamente se viu ao alcance da vitória repetidas vezes. Em 1941, chegaram aos subúrbios de Moscou e, em 1942, chegaram a dois quilômetros dos campos de petróleo de Ordzhonikidze. A história costuma ser uma coisa que quase corre.

https://bigserge.substack.com/p/overthrowing-fate-barbarossa-revisted