“Se tudo se mantiver como está”, as pessoas vão sentir-se estrangeiras na sua própria terra, diz Pedro Passos Coelho. Seriam consideradas cosmopolitas, “o que era ótimo”, mas não é ótimo porque “as pessoas sentem-se inseguras, ameaçadas”, adverte o antigo primeiro-ministro.
“Em muito pouco tempo entrou imensa gente em Portugal”, disse Pedro Passos Coelho esta quinta-feira num discurso, em Lisboa, na apresentação do livro “Introdução ao Liberalismo”, de Miguel Morgado.
O antigo primeiro-ministro abordava os dados divulgados pela AIMA no mesmo dia, que indicam que o número de cidadãos estrangeiros a residir em Portugal quadruplicou em sete anos, com cerca de 1,5 milhões registados no final de 2024.
“E, se tudo se mantiver como está com o reagrupamento familiar e por aí fora, bem, qualquer dia também acontecerá cá aquilo que acontece noutras sociedades em que as pessoas, os nacionais, as pessoas que fazem parte daquela sociedade, se sentem estrangeiras na sua própria terra“, advertiu.
Numa intervenção consagrada ao tema do liberalismo, Passos Coelho salientou que, de acordo com essa filosofia política, “não devia haver nenhum problema em que as pessoas se sentissem estrangeiras na sua própria terra”, ironizando que seriam consideradas como “cosmopolitas, o que era ótimo”.
“O problema é que não é ótimo porque as pessoas sentem-se inseguras, ameaçadas, de certa maneira desorientadas, desconfiadas… Tudo aquilo que são características muito humanas e que, em circunstâncias normais, não valem grande coisa, em ambientes destes, as coisas podem descambar“, afirmou.
Passos Coelho considerou que “o mínimo de bom senso faz qualquer pessoa perceber isto”, antes de deixar crítica aos governos do PS liderados por António Costa, que acusou de terem tido uma política sobre imigração que tinha como princípio “deixa entrar, isto é para ser assim e não pergunto nada a ninguém”.
“Isto era o que anterior primeiro-ministro dizia aos quadros superiores do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) quando era por eles alertado ‘senhor primeiro-ministro, cuidado porque nós estamos a perder o controlo desta situação. Olhe, está a entrar muita gente, a gente nem sabe quem é. A gente nem o certificado criminal pede'”, disse.
Segundo Passos Coelho, em resposta a esses avisos que atribuiu ao SEF, António Costa respondia: “Isto é mesmo assim, está a perceber? Não pense que é um acaso, é mesmo para isso, é para meter essas pessoas cá dentro, isto é para prosseguir”.
O ex-primeiro-ministro acusou os governos PS de terem “feito isso conscientemente“, antes de deixar uma sugestão de pergunta a António Costa.
“Já alguém perguntou ao senhor presidente do Conselho Europeu se ele não queria rever essa posição, que trouxe tanto radicalismo a Portugal, tanta insegurança e incerteza na maneira como as pessoas discutem no espaço público”, disse.
Depois, Passos Coelho recordou que, na campanha para as eleições legislativas de 2024, num discurso num comício de apoio a Luís Montenegro no Algarve, já tinha advertido para o “problema da imigração“.
“Quando eu chamei a atenção para estes problemas há dois anos, meu Deus, vários órgãos de comunicação social disseram: ‘este tipo está a misturar segurança e imigração na mesma frase. Populismo, irresponsabilidade total, nem parece que foi primeiro-ministro, completamente irresponsável’. Não sei o que dirão agora”, referiu.
Num discurso de 50 minutos, Passos Coelho advertiu ainda que há “em todo o lado um radicalismo que está a tomar conta do espaço público” e considerou que o seu crescimento “resulta da forma absolutamente irresponsável com que muitos dos assuntos que preocupam e perturbam as pessoas, não foram tratados“.
Para o ex-primeiro-ministro, sempre que “há governos que se comportam com excesso de demagogia, de forma populista, que querem agradar a toda a gente e empurram com a barriga tudo aquilo que é preciso fazer”, os problemas “acumulam-se e as pessoas dizem ‘o que é que estes tipos estão lá a fazer‘”.
“Este nível de desconfiança, de descrédito, de incerteza que resulta das práticas das instituições liberais, por serem ocupadas e desempenhadas com irresponsabilidade geral, geram radicalismo. E o radicalismo gera radicalismo“, advertiu.
É uma delícia
Pedro Passos Coelho manifestou-se também “muito satisfeito” com o que considerou ser o “resultado muito bom” do PSD nas eleições autárquicas, após ter feito um discurso no qual deixou advertências quanto à política económica do Governo.
“Eu fiquei muito contente com o resultado das eleições autárquicas, até porque o meu partido, o PSD, teve um resultado muito bom. E, portanto, eu fico satisfeito”, afirmou Passos Coelho aos jornalistas após o seu discurso na apresentação do livro de Miguel Morgado.
Sobre o facto de Suzana Garcia, cuja candidatura Passos Coelho tinha apoiado, não ter conseguido ser eleita presidente da Câmara da Amadora, o ex-primeiro-ministro disse que “foi por uma unha negra“.
“Eu espero que a candidata não desista porque, realmente, é uma força da natureza, é uma pessoa que, não direi sozinha, mas, enfim, com apoios muito limitados, fez um grande resultado e isso deve fazer pensar quem tem responsabilidades para pensar sobre isso”, considerou.
Perante a insistência dos jornalistas para falar sobre outros temas, Passos Coelho disse que, sobre política, já tinha dito tudo o que tinha a dizer no discurso que fez na apresentação do livro de Miguel Morgado, antes de deixar uma garantia.
“Não me ouvirão tão cedo falar sobre coisa nenhuma”, assegurou, depois de, desde 25 de setembro, ter feito cinco intervenções públicas.
No discurso que fez na sessão de apresentação do livro de Miguel Morgado, Pedro Passos Coelho acusou os governos do PS liderados por António Costa de não terem feito “uma reforma digna de jeito“.
Segundo o antigo primeiro-ministro, foram “oito anos com uma conversa fiada a dizer às pessoas que elas iam ter imenso do que não tinham afinal. Claro, com o PCP e o BE a apoiar isso. É uma delícia. Mas com uma austeridade encapotada. Portanto, mentir às pessoas”, acusou.
Nesses anos de governação do PS, “a verdade não estava a ser dita“, disse Passos Coelho, acrescentando que isso se está a verificar agora quando se observa a “insuficiência dramática do investimento público” ou a situação no Serviço Nacional de Saúde (SNS).
Ponham-lhe uma crise económica em cima
Depois, acusando o PS de ter tido uma “política pública desqualificada” e ainda que tenha dito que não tencionava falar sobre os últimos de governação, Passos Coelho deixou uma advertência em termos de matéria económica.
“O senhor ministro das Finanças é um homem muito competente e, portanto, eu acredito que ele tenha as contas muito bem feitas e garanta que não vamos voltar aos défices públicos e à dívida pública e isso tudo. Mas a minha experiência de vida também mostra que há muita coisa que não depende do ministro das Finanças”, referiu.
E, no que não depender do ministro das Finanças, prosseguiu Passos Coelho, “a coisa não está a encaminhar-se para o resultado” desejado.
“Deveríamos estar a preparar-nos para aliviar o passo do desendividamento da economia porque o que se está a passar em França, onde o Governo aceitou suspender o aumento da idade da reforma, não vai acabar bem. O pensamento mágico é uma coisa que tem uma duração limitada”, advertiu.
Passos Coelho reconheceu que se pode argumentar que Portugal está melhor porque tem “um bocadinho menos do que 90% do rácio de dívida“.
“Sim, mas ponham-lhe uma crise económica em cima, para quanto é que passa o rácio da dívida? Desde logo, o denominador encolhe, a despesa aumenta toda, para onde é que vai o rácio dívida? É muito rápido voltar a um rácio mais elevado”, concluiu Passos Coelho.
ZAP
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