sexta-feira, 24 de março de 2023

Como fazer sabão caseiro sustentável.

Veja o passo a passo de como fazer um sabão caseiro sustentável.

Saber como fazer sabão caseiro com óleo usado é uma óptima forma de economizar e ainda diminuir a geração de resíduo, evitando o uso de produtos como sabão em pó. A receita de sabão caseiro descrita a seguir é de alta qualidade e criada a partir de uma fórmula mais amigável ao meio ambiente, pois reutiliza óleo de cozinha usado.

Assim, é uma óptima forma de praticar o consumo consciente e a Economia Circular, já que você não perde os recursos gastos na produção do óleo e ainda gera um novo produto. Você já deve saber que o óleo de cozinha usado não pode ser despejado na pia (pois causa entupimento) e nem descartado de forma incorrecta.

É bem provável que já tenham te contado alguma história sobre a possibilidade de fazer sabão caseiro com óleo de cozinha usado. Você já tentou realizar a experiência?

Existem inúmeras receitas de sabão caseiro com óleo de cozinha espalhadas pela internet, mas estudos realizados comprovaram que a maioria utiliza soda cáustica em excesso e isso é extremamente perigoso devido a alguns motivos:

  • A substância é prejudicial à saúde por conta de suas propriedades corrosivas e desidratantes, sendo muito agressiva à pele, que fica ressecada, pode apresentar rachaduras e até hipersensibilidade e inflamações;
  • Ela prejudica também o meio ambiente, pois aumenta muito o pH do esgoto doméstico que, dependendo da sua destinação, vai desequilibrar o pH dos rios e lagos, interferindo em todo o ecossistema;
  • O excesso de soda pode destruir os tecidos e roupas durante a lavagem, diminuindo sua vida útil.

Mas se a soda é tão nociva, por que a utilizamos para fazer sabão caseiro?

O carácter prejudicial da soda cáustica está no contacto com a pele e os olhos, e no uso ou descarte directo no meio ambiente ou esgoto. Porém, ao utilizá-la para fazer sabão caseiro, sua reacção com o óleo de cozinha vai transformar esses dois ingredientes em outros produtos, que são o próprio sabão caseiro e a glicerina. Se você tiver o cuidado de usar as quantidades necessárias descritas na receita a seguir, não haverá excesso de nenhum ingrediente no produto final.

Dessa forma, o seu sabão caseiro produzirá o menor impacto ambiental possível, porque embora o sabão seja biodegradável, ou seja, é decomposto por micro-organismos presentes na natureza, não significa que ele não tenha impacto ambiental. Logo, o que buscamos aqui é ter uma pegada mais leve, com o menor impacto possível ao meio ambiente, já que precisamos do produto de higiene para as nossas necessidades diárias de limpeza.

A equipe do Portal eCycle pesquisou e testou algumas receitas de sabão caseiro, tomando todo o cuidado para chegar em uma fórmula final que contivesse somente as quantidades estritamente necessárias de cada componente. Assim, seria possível atingir um produto final com boa qualidade e com o pH mais próximo possível da neutralidade. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) determina que o pH máximo dos sabões deve ser até 11,5, mas muitas das receitas estudadas apresentaram pH bem superior a esse.

A fórmula apresentada abaixo foi a que apresentou melhor resultado. É extremamente importante usar as proporções descritas a seguir. Confira o vídeo exclusivo do canal do Portal eCycle no YouTube para visualizar o procedimento completo.

  1. O que precisa para fazer sabão caseiro?
      • 1 quilo de óleo de cozinha usado;
      • 140 mililitros de água;
      • 135 gramas de soda cáustica em escamas (concentração superior a 95%);
      • 25 mililitros de álcool (opcional);
      • 30 gramas de aromatizantes/essências (opcional).;
      • 10 gramas de alecrim em pó (conservante natural) (opcional);
      • Recipientes para o molde do sabão caseiro (formas específicas, bandejas de plástico ou embalagens longa vida – jamais utilize recipientes de alumínio);
      • Colher de sopa de pau;
      • Par de luvas para lavar louças;
      • 1 máscara descartável;
      • Óculos de protecção;
      • Balde grande;
      • Recipiente pequeno.
  2. Modo de preparo
    1. Em primeiro lugar, coloque os óculos de protecção, as luvas e a máscara. A soda cáustica é altamente corrosiva e deve ser manuseada com muito cuidado. Vamos ao passo a passo de como fazer sabão caseiro
  3.  Passo 1
      1. Coloque a água para esquentar até que ela fique morna (em torno de 40°C). Desligue o fogo. Feito isso, coloque os 140 mililitros de água morna no recipiente pequeno e despeje o conteúdo da soda cáustica lentamente e em pequenas porções no mesmo recipiente, misturando sempre a cada adição. Nunca adicione água fria sobre a soda! A ordem dos ingredientes também deve ser respeitada: colocar soda sobre a água, e nunca a água sobre a soda (isso pode provocar uma reacção forte e causar acidentes). É muito importante utilizar um balde ou recipiente plástico de material grosso e resistente, e nunca utilizar garrafas PET para fazer a diluição da soda, pois elas não suportam a temperatura que a reacção atinge, podendo romper e vazar esse material extremamente corrosivo. Mexa com a colher de pau até diluir completamente a soda, de modo que não haja mais escamas. Atenção: não utilize recipientes de alumínio descartável em conjunto com a soda cáustica e certifique-se de que eles sejam suficientemente altos, pois essa dissolução pode efervescer e causar espuma.

  4. Passo 2
    1. Depois de retirar as impurezas (é possível fazer isso com uma peneira), acrescente o óleo aos poucos (a uma temperatura de 40°C) e adicione-o ao balde que será utilizado para colocar todos os demais ingredientes. Em seguida, insira a soda bem lentamente, em pequenas porções e misturando continuamente. Esse cuidado aumenta a sua segurança, pois a reacção com a soda cáustica libera muito calor, além de produzir um sabão de boa qualidade – se você colocar a soda de uma única vez ou muito rápido sem a agitação adequada, o sabão pode empelotar e ficará difícil reverter isso.
  5. Passo 3
    1. Misture somente o óleo e a soda por cerca de 30 minutos. A consistência final ideal deve ser parecida com a do leite condensado. É necessário respeitar esse tempo de mistura para que haja a reacção entre o óleo e a soda.
  6. Passo 4
      1. Após esse tempo de mistura, tem início o momento ideal para adicionar os demais ingredientes. Coloque a essência de sua preferência e conservante (caso queira). Mexa bastante até que todos os ingredientes se incorporem plenamente à mistura.

  7. Passo 5
      1. Caso a massa final de sabão esteja muito líquida, insira o álcool lentamente e mexa bem por dez minutos para que a mistura não empelote. Nessa etapa, a massa do sabão caseiro ganhará consistência rapidamente. É recomendável que a forma em que será colocado o sabão já esteja preparada e próxima.

  8. A pasta
    1. A “pasta” do seu sabão caseiro vai ficar desse jeito:
  9. Recipiente
      1. Agora é só despejar o sabão no recipiente que você separou…

  10. Cura
      1. Por último, basta aguardar o processo de cura do sabão caseiro (que leva de 20 a 45 dias)

O Seu sabão caseiro está pronto!

      Pronto! Depois de esperar o tempo de curso, é só desenformar e cortar e você terá um excelente sabão caseiro em barra para usar no seu dia a dia. Recomenda-se, ainda, deixar em processo de cura (de 20 a 45 dias), de preferência n um recipiente opaco, que fique num lugar fresco e sob abrigo do Sol.

Esse processo visa garantir a reacção completa da soda cáustica, além de permitir ao sabão perder a umidade excessiva. O tempo poderá variar de acordo com as condições climáticas locais. Exemplo: se o clima estiver mais chuvoso, pode ser que sejam necessários mais dias; ocorre o contrário caso o tempo esteja mais seco.

Entenda os ingredientes dessa receita de sabão caseiro

Soda cáustica

Na fabricação do sabão, há uma preocupação acerca da soda cáustica, pois ela é muito corrosiva e teme-se que ela possa ser prejudicial à saúde e ao meio ambiente. Realmente seu uso requer muita atenção e alguns cuidados, já que seu contacto com pele e mucosas (inalação) pode causar queimaduras. Caso algum acidente ocorra, é importante lavar a região com água corrente fria por 15 minutos.

Após a reacção de saponificação com os óleos, durante o chamado tempo de cura, a soda vai perdendo a alcalinidade, ou seja, seu pH vai baixando. Isso porque os álcalis reagem com os óleos e se transformam no sabão caseiro (entenda mais sobre o sabão em barra).

Fique atento às quantidades

Portanto, é preciso ficar atento e utilizar exactamente as quantidades recomendadas de soda para que a substância não sobre na mistura e falte óleo para ela reagir, deixando o seu produto final excessivamente alcalino. Isso pode torná-lo mais agressivo às suas mãos, além de modificar o pH do esgoto, o que pode ser prejudicial ao meio ambiente, como já dito anteriormente.

Em muitos relatos de receitas de sabão caseiro que usam excesso de soda, percebe-se que, com o passar dos dias, o sabão vai branqueando. Isso se deve ao acúmulo da soda que não reagiu e que, ao reagir com o ar, forma carbonato de sódio, que é branco, e pode causar desidratação e reacções alérgicas em contacto com a pele.

Por isso, muitas pessoas reclamam do sabão caseiro, dizendo que é agressivo à pele. Mas, como visto, o problema não está no sabão, e sim na quantidade de soda usada.

Um clareamento gradual da massa durante o processo de cura é normal, mas sua cor final não será branca. E lembre-se: esta receita de sabão não deve ser utilizada para fins cosméticos. Para limpeza geral, é recomendado o uso de luvas devido à sua alcalinidade intrínseca.

Álcool

A sua adição ocorre porque a solubilização do óleo é melhor no álcool do que em água e assim o endurecimento do sabão caseiro se torna mais rápido. Esse ingrediente pode ser dispensável caso você note que, ao fim dos 20 minutos de agitação, a massa de sabão já tem uma consistência adequada para ser colocada na forma.

Conservantes

Existem dois problemas a serem considerados na deterioração de óleo e gordura: a rancificação e a contaminação por bactérias e outros micro-organismos.

Os óleos, em geral, sofrem de um problema que se chama rancificação. Em outras palavras, a deterioração da gordura, evidenciada pelo seu cheiro característico de óleo/gordura estragado. Esse problema aumenta com o tempo de estocarem, pela presença de luz e pelo seu contacto com o ar, mais especificamente com o oxigénio, que causa a auto-oxidação das gorduras, responsável por esses defeitos.

Para minimizar esse problema, você pode:
  • Fazer seu sabão caseiro em pequenas quantidades: produtos naturais feitos em casa não terão a mesma durabilidade dos comercializados pela indústria. Armazená-lo por longos períodos aumentará as chances de problemas como os citados ocorrerem;
  • Armazenar seu sabão em embalagens a vácuo ou em potes hermeticamente fechados: isso diminui a exposição do produto ao oxigénio;
  • Armazenar em recipientes escuros ou em embalagens opacas para mantê-los longe dos efeitos nocivos dos raios solares;
  • Armazenar na geladeira, diminuindo a velocidade de deterioração;
  • Adicionar conservantes naturais ao seu sabão, tais como o pó de alecrim (caso queira, você pode misturar pó de alecrim na água de diluição da soda para que haja efeito conservante. Mas é preciso verificar se o volume final vai ser de 140 ml mesmo, já que a água evapora no preparo).
Corantes e essências

A adição de corantes e essências depende do seu uso:

1. Corantes
  • A adição de corantes não é primordial, já que não traz nenhum benefício para a performance do produto. Trata-se de uma questão estética;
  • Caso você realmente deseje adicionar cor ao seu sabão, prefira os corantes naturais;
  • Os corantes alimentícios não são uma boa opção, mesmo os naturais, já que não possuem uma boa estabilidade no meio alcalino do sabão e, portanto, a cor final não será a mesma da desejada;
  • As argilas são uma óptima opção para colorir os sabões, proporcionando uma cor opaca e permanente, com a opção de grande variedade, além de serem naturais. Saiba onde comprar;
  • Se for usar o sabão caseiro para lavar roupas, não adicione os corantes, pois podem manchar as peças brancas.
2. Aromatizantes
  • O uso é oportuno para neutralizar o cheiro do óleo já usado;
  • Evite o uso de essências sintéticas que contêm parabenos e ftalatos, prejudiciais à saúde e ao meio ambiente;
  • Uma alternativa é o uso de fragrâncias isentas de ftalatos;
  • Pode-se também usar as essências aromáticas na água de diluição da soda, lembrando sempre de respeitar a quantidade indicada de 140 ml de água e 135 ml de soda cáustica. Porém, elas não produzirão aroma intenso, seu efeito é mais para neutralizar o cheiro característico do óleo de cozinha. Saiba como fazer sua essência aromática;
  • Outra opção é a adição do amaciante de roupas, porém fará com que seu sabão perca sustentabilidade;
  • Para lavar pratos, não são necessários os aromatizantes;
  • Uma boa opção é fazer uso do pó de alecrim – além de aromatizar, ele possui acção conservante sobre o sabão.

Obs: Como todo e qualquer produto de limpeza, mantenha o sabão caseiro fora do alcance de crianças.

Se você não quiser ou puder fazer o seu próprio sabão caseiro, procure postos que recebem óleo usado na seção postos de reciclagem do Portal eCycle.

Se você prefere sabão líquido, saiba como transformar seu sabão em barra na versão líquida na matéria:


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      https://www.ecycle.com.br/sabao-caseiro/

     

quinta-feira, 23 de março de 2023

INCITAMENTO À ‘GUERRA CIVIL EMOCIONAL’ (e à desobediência cívica, civil e ‘não-civil’)

Este GOVERNO PS – a continuar o trajecto que já iniciou – vai deixar-nos um legado que poderá levar gerações a desaparecer (ou destruirá para sempre a proverbial e extraordinária bonomia cultural e civil da sociedade portuguesa).

A estratégia defensiva deste governo – quando criticado e ao ver colocada em evidência a sua incompetência – tem sido sempre a mesma:

Colocar portugueses contra portugueses, apontando ‘inimigos’.

É – na minha opinião – uma atitude ‘criminosa’ e só possível devido à extrema mediocridade, incompetência e falta de sentido de estado dos ‘pulhíticos’ que estão no poder (se ‘eles e elas’ tivessem estado no poder em 1975, teríamos certamente tido centenas de milhares de mortos durante esse período revolucionário e colocado famílias contra famílias e classes contra classes, eventualmente para todo o sempre).

O ‘terrorista e criminoso’ Otelo e os seus comparsas das ‘FP 25 de Abril’ bem podem ser considerados uns ‘meninos bem-comportados’ pois só aterrorizaram, roubaram e cometeram ‘uma dúzia’ de assassinatos.

Este governo pode conseguir destruir para sempre uma das sociedades mais pacíficas e amigáveis que há neste planeta.

Eis alguns exemplos actuais (mas poderão adicionar mais…eu não o faço para não me alongar):

· A culpa é dos não vacinados! (lembram-se?)

· A culpa é dos médicos (e dos enfermeiros)!

· A culpa é dos professores!

· A culpa é dos pilotos!

· A culpa é dos proprietários de apartamentos!

· A culpa é dos estrangeiros, que não investem cá!

· A culpa é dos outros!

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PS:

Um amigo meu perguntou-me se o meu texto era um apelo à desobediência.

Eis o meu esclarecimento:

Não, na realidade o meu texto não é um apelo à desobediência.

Quem está com as suas acções a incitar a uma 'guerra civil emocional' pondo 'portugueses contra portugueses', apontando sempre culpados por problemas que a sua incompetência vai criando quase diariamente, é o governo.

…Tudo começou com 'Diga o que a Constituição diga', essa extraordinária 'máxima' do nosso primeiro-ministro.

A desobediência (uma vez que o sentimento de 'ódio' é incentivado pelo governo contra os 'culpados' ) poderá ser uma consequência vulgar e eventualmente, atraente o suficiente, para podermos ter o 'caldo entornado'.

Pergunta sem resposta:

Será que os '13 marinheiros' teriam feito o que fizeram se não tivesse havido o 'Diga o que a Constituição diga'  e todo um conjunto de acções ao longo dos últimos anos, que os incentivaram a pensar que 'Why not me too'?

Repito: o meu texto não é um apelo à desobediência (é 'simplesmente' a expressão do meu receio de que o governo - com as suas acções - esteja a incentivar ao ódio contra os apontados pelo governo, como 'culpados' e à desobediência, pondo portugueses contra portugueses e destruindo a nossa sociedade).

E peço desculpa pelas minhas limitações no uso da nossa língua, escrevendo textos que permitem mais que uma interpretação. MEA CULPA.

Um abraço

AFP

O que têm em comum as Finanças e a TAP?

As más e as boas notícias mostram como vai a nação. Primeiro, o Conselho de Finanças Públicas (CFP) alerta para uma inflação persistente e para uma forte desaceleração do consumo. O CFP é o organismo independente que tem por missão escrutinar a trajectória das contas públicas e monitorizar a evolução macroeconómica no país e mostra-se preocupado. Além da inflação, o impacto da subida das taxas de juro decididas pelo Banco Central Europeu (BCE) vai encolher o consumo das famílias durante todo o ano. Não há volta.
A boa notícia, é que o país vai voltar a registar excedente orçamental ainda antes do final da legislatura, antecipa também aquele organismo. O défice deste ano pode ficar abaixo do que prevê o ministro das Finanças. A entidade, presidida por Nazaré Costa Cabral considera que as contas públicas estão mais ou menos bem encaminhas, apesar das muitas incertezas que ensombram o caminho durante todo o presente ano.
Nas novas previsões, o défice público de 2023 deverá ficar nos 0,6% do Produto Interno Bruto (PIB), abaixo dos 0,9% referidos pelo ministro das Finanças, Fernando Medina. Depois, deverá cair para um défice de apenas 0,1% do PIB em 2024 e, no ano seguinte, transformar-se num excedente público de 0,1%, o segundo da História da democracia portuguesa (o primeiro aconteceu em 2019, com Mário Centeno nas Finanças). Resta agora saber o que pretende o governo fazer com estas boas notícias, se prefere ajudar os que mais precisam ou continuar a olhar para a tabela de excel.
A propósito de más e boas notícias, vejamos também as contas da TAP: os lucros atingiram 65,6 milhões de euros em 2022, antecipando as metas definidas por Bruxelas em dois anos. Os resultados operacionais dispararam e as receitas bateram recordes. Boas notícias numa companhia em reestruturação, com uma CEO demitida, uma privatização a caminho e funcionários que continuam com cortes salariais mais dois anos.
Resta saber agora o que vai a TAP fazer com tão bons resultados? Apenas embelezar a noiva para que surjam noivos interessados no processo de privatização? Ou, finalmente, acabar com os cortes salariais, que já foram de 25% e passaram neste ano aos 20%?
A forma como as Finanças e a TAP vão usar as boas notícias ditará se querem continuar a alimentar a contestação, nas ruas e dentro da companhia, ou se preferem seguir a via da paz social, valorizando trabalhadores e contribuintes, que já aguentaram os anos difíceis da pandemia e um ano de guerra e agora estão a braços com uma tempestade inflacionista, qual tsunami. A decisão está na mão de cada uma das entidades.

Rosália Amorim
Directora do Diário de Notícias

O Governo quer impedir que José Sócrates seja julgado?


Há milhares de processos em risco de prescrever porque o Governo anda há ano e meio para publicar uma portaria que regulamenta a sua distribuição em tribunal.

A pergunta que dá título a este artigo foi feita nesta quarta-feira a António Costa. Durante o debate parlamentar, o líder da Iniciativa Liberal explicou que há milhares de processos em risco de prescrever porque o Governo anda há ano e meio para publicar uma portaria que regulamenta a sua distribuição em tribunal. Entre esses processos está o de José Sócrates. A lei exigia que a regulamentação fosse feita no prazo de 30 dias. Estamos à espera desde Outubro de 2021. Daí a pergunta de Rui Rocha: “O senhor primeiro-ministro quer correr o risco de que os portugueses pensem que é propositado?”

António Costa não reagiu à provocação. Limitou-se a responder: “A portaria que regula esse diploma está para publicação muito em breve no Diário da República.” Não clarificou quão breve era o “muito em breve”. Sempre que lhe colocam à frente um microfone para comentar um caso embaraçoso que esteja sob investigação, António Costa responde com um mantra que os portugueses já conhecem de cor: “À política o que é da política, à justiça o que é da justiça.” Parece simples – mas não é. Os tribunais aplicam leis, só que essas leis são aprovadas por políticos. O funcionamento dos tribunais está regulamentado, mas esses regulamentos são aprovados por políticos. A justiça necessita de certos recursos para funcionar, e esses recursos são aprovados por políticos. Se os tribunais ou a justiça não funcionam e for preciso mudar as coisas, as reformas têm de ser aprovadas por políticos.

Ainda que o lugar da política seja fora das salas dos tribunais, ela detém um poder de intervenção desmesurado através das leis, dos regulamentos, das nomeações ou do financiamento. Portanto, sempre que António Costa repetir o seu insuportável mantra, convém desmascarar-lhe a sonsice. Por exemplo, remetendo-o para o discurso que o presidente da Associação Sindical dos Juízes Portugueses, Manuel Soares, fez no sábado no Funchal, no encerramento do XII Congresso de Juízes, perante o Presidente da República e a ministra da Justiça. Disse ele: “A realidade que se constata quando estão envolvidas pessoas com poder na política, na banca, nos negócios, no desporto, na justiça, é que os processos não têm fim. Há casos que dificilmente chegarão a uma decisão final antes da prescrição.” E acrescentou: “Não podemos continuar a olhar para isto como se nada fosse, parecendo cúmplices de uma ineficiência que objectivamente beneficia a impunidade de pessoas poderosas.”

Há um mês, já aqui tinha denunciado a nova actividade favorita da defesa de José Sócrates: de cada vez que um juiz é escolhido para analisar um dos inúmeros recursos da Operação Marquês, Pedro Delille entrega novo recurso a pedir o seu afastamento, por a distribuição ter sido feita através de um sorteio desconforme à lei. Contudo, não tinha ainda noção da dimensão desses recursos. Sem se referir directamente a Delille ou ao processo, Manuel Soares perguntou isto: “Será normal, legítimo, aceitável que um só advogado, num só tribunal de recurso, em nove meses, suscite 23 incidentes de recusa dos juízes, duas, três e quatro vezes nos mesmos processos e que não haja maneira de pôr termo a isso, apesar das sucessivas decisões que negam provimento aos seus pedidos?”

Aí está o número: 23 incidentes de recusa em nove meses só porque o Governo está há ano e meio para regulamentar uma lei. Se isto não é querer impedir Sócrates de ser julgado, parece. E parece mesmo muito.

João Miguel Tavares

O autor é colunista do PÚBLICO

quarta-feira, 22 de março de 2023

Cerca de dois mil professores apresentaram baixa médica desde o início do mês.

O Ministério da Educação já tinha anunciado há cerca de um mês que seriam constituídas 7.500 juntas médicas para verificar situações de professores em baixa médica que "suscitam dúvidas".

Desde o início do mês de Setembro, já apresentaram baixa médica cerca de dois mil docentes, afirmou hoje o ministro da Educação, indicando que as 7.500 juntas médicas anunciadas para avaliar essas situações estão em fase de adjudicação.

Num balanço feito hoje em conferência de imprensa sobre a contratação de professores, o ministro João Costa na segunda reserva de recrutamento, cujas listas foram divulgadas hoje, estiveram a concurso 4.416 horários, dos quais cerca de dois mil decorrem de pedidos de substituição por baixa médica.
Em vésperas do início do ano lectivo, que arranca entre terça-feira e sexta-feira, essas duas mil baixas médicas foram apresentadas desde o início do mês de Setembro.
A propósito desse tema, o Ministério da Educação já tinha anunciado há cerca de um mês que seriam constituídas 7.500 juntas médicas para verificar situações de professores em baixa médica que "suscitam dúvidas".
"Estamos na fase de adjudicação", disse hoje João Costa, que esclareceu que o objectivo é avaliar padrões irregulares nos pedidos de baixa, casos que, segundo o ministro, criam "muita instabilidade na escola" e prejudicam os professores em regime de substituição.
São, no entanto, situações minoritárias, assegurou o responsável, sublinhando também que "não há um absentismo na profissão docente estatisticamente muito superior ao resto da administração pública".
Recentemente, estruturas sindicais e representantes dos directores escolares têm alertado para um possível aumento do número de baixas médicas no próximo ano lectivo, devido ao novo regime de mobilidade por doença.
A partir de Junho, esse regime, que permite aos professores mudar de escola por motivo de doença, passou a reger-se por um conjunto de novos critérios que, por exemplo, limitam a colocação dos docentes à capacidade de acolhimento das escolas.
Por outro lado, tornam obrigatória a componente lectiva, e definem uma distância mínima entre a escola de origem, a residência ou prestador de cuidados médicos e a escola para a qual o docente pede transferência. O objectivo, justificou na altura a tutela, era evitar situações de recurso abusivo à mobilidade por doença.
No entanto, perante as novas regras, os sindicatos do sector alertaram que muitos professores ficariam de fora e, de facto, segundo os resultados para o ano lectivo 2022/2023, só 4.268 dos 7.547 pedidos de transferência no âmbito desse regime foram aceites, o equivalente a 56%.
Comparativamente ao ano lectivo passado, quando cerca de 8.800 doentes tinham mudado de escola por motivo de doença, o número de professores em mobilidade caiu para menos de metade.
O Ministério da Educação comprometeu-se, entretanto, a analisar caso a caso os pedidos recusados, mas o processo ainda não arrancou, uma vez que a tutela solicitou um parecer jurídico depois de a Federação Nacional dos Professores ter questionado a legalidade desse procedimento.

09 de Setembro de 2022

https://www.sabado.pt/portugal/detalhe/cerca-de-dois-mil-professores-apresentaram-baixa-medica-desde-o-inicio-do-mes

segunda-feira, 20 de março de 2023

Programa vistos gold aumenta riscos de corrupção

É a quarta vez em 11 anos que Portugal ocupa a 33.ª posição no ranking do Índice de Percepção da Corrupção. Neste período de tempo esta é a pior marca. Vistos gold são uma das causas.

Marta Moitinho Oliveira e Infografia | PÚBLICO

A percepção sobre a corrupção que existe em Portugal manteve-se em 2022 ao mesmo nível que existia no ano anterior, mas no ranking mundial que compara 180 países Portugal perdeu um lugar quando se olha para a tabela que classifica os países e os ordena desde os mais transparentes aos mais corruptos. Esta trajectória colocou Portugal na 33.ª posição pela quarta vez em 11 anos, naquele que é a pior marca nesse conjunto de tempo. O programa vistos gold, cuja avaliação foi anunciada por António Costa há quase três meses, contribui para o aumento dos riscos de corrupção, considera a Transparência Internacional.

A conclusão pode ser retirada do Índice de Percepção da Corrupção para 2022, publicado esta terça-feira pela Transparência Internacional, uma coligação mundial de Organizações Não Governamentais (ONG) anticorrupção. De acordo com o relatório, Portugal obteve 62 pontos em 2022, o que corresponde à 33.ª posição no ranking mundial. Este registo permite concluir que a percepção sobre a corrupção no ano passado manteve-se estável em relação ao ano imediatamente anterior, quando o índice também tinha alcançado 62 pontos, mas a posição no ranking baixou um lugar quando comparada com a 32.ª posição conseguida em 2021.

A análise de uma série mais longa - a começar em 2012, o que permite juntar 11 anos de registo, mostra que o índice para Portugal se tem mantido estável. O ponto mais baixo aconteceu em 2020 quando somou 61 pontos e o mais alto em 2015 e 2018 quando registou 64 pontos.

Porém, a classificação na tabela, que depende também das movimentações dos outros países, variou mais. Em 2022, tal como em 2020, 2013 e 2012, Portugal ficou na 33.ª posição na tabela - a pior marca em 11 anos. O melhor resultado no ranking aconteceu em 2015 quando Portugal obteve a 28.ª posição.

Face à União Europeia, Portugal encontra-se com uma pontuação abaixo, já que este conjunto de países consegue 66 pontos, contra os 62 de Portugal.

A Transparência Internacional considera que "a escala do problema é enorme", já que a média global não se altera há 11 anos "e mais de dois terços dos países (122, no total) têm um sério problema de corrupção, com uma pontuação abaixo de 50".

A Dinamarca volta a encabeçar o índice deste ano, com 90 pontos, mais dois do que no ano passado, seguida da Nova Zelândia e Finlândia, com a mesma pontuação (87). Síria, Sudão do Sul (13) e Somália (12) continuam nos últimos lugares.

Entre os restantes países de língua portuguesa, Angola obteve 33 pontos, mais quatro do que em 2021, mas ainda longe do meio da tabela, ocupando a posição 116. No caso do Brasil, o índice marcou 38 pontos, sem alteração face a 2021, colocando este país no lugar 94 da tabela.

Estratégia e vistos gold

No relatório produzido para 2022, a Transparência Internacional assinala que, em Portugal, "a Estratégia Nacional Anticorrupção (ENAC) foi lançada sem directrizes ou plano de monitorização, resultando em fraca aplicação e implementação lenta de medidas dirigidas à prevenção da corrupção no sector público".

A ENAC, criada durante o segundo Governo de António Costa, tem como objectivos melhorar o conhecimento, a formação e as práticas institucionais em matéria de transparência e integridade; prevenir e detectar os riscos de corrupção na acção pública; comprometer o sector privado na prevenção, detecção e repressão da corrupção; reforçar a articulação entre instituições públicas e privadas; e garantir uma aplicação mais eficaz e uniforme dos mecanismos legais em matéria de repressão da corrupção, melhorar os tempos de resposta do sistema judicial e assegurar a adequação e efectividade da punição.

Nuno Cunha Rolo, presidente da Transparência Internacional Portugal e responsável pelo capítulo para Portugal, considera que os resultados deste índice para Portugal "decorrem da continuada incapacidade de sucessivos governos e governantes perceberem a imensa riqueza das lideranças e políticas anticorrupção, abertas, transparentes, participadas e íntegras, tanto no sistema político e administrativo, quanto nos sectores da economia e sociedade".

Este responsável acrescenta que "os casos recentes que se vão sucedendo nos media a ritmo vertiginoso, muito se devem à falta de vontade e visão políticas – no Governo e no Parlamento - em matéria de anticorrupção, transparência e integridade”.

A Transparência Internacional Portugal salienta que já antes "havia alertado para as deficiências da Estratégia Nacional Anticorrupção, nomeadamente por ignorar praticamente por inteiro a questão da corrupção política".

Outro dos problemas apontados pelo relatório com implicações na percepção da corrupção em Portugal prende-se com o regime dos vistos gold, devido ao aumento dos riscos de corrupção e ao facto de colocar pressão no mercado imobiliário. Segundo Karina Carvalho, directora executiva da Transparência Internacional Portugal, “o exemplo vistos gold é paradigmático das falhas identificadas porque coloca a nu não apenas a crónica falta de diligência devida, de controlo e de avaliação, suportada por sucessivos governos, mas sobretudo a enorme resistência em instituir a prevenção da corrupção, da fraude e do branqueamento de capitais enquanto política pública”.

A responsável acrescenta que “em muitas outras áreas, desde logo a da contratação, fundamental para o crescimento do país, mas também para a sua defesa e segurança, vemos uma atitude displicente por parte dos principais responsáveis políticos ante o comportamento escandaloso, e até mesmo criminoso, de quem foi mandatado para proteger o interesse público e o dinheiro" dos contribuintes.

Há quase três meses, o primeiro-ministro, António Costa, anunciou que o Governo estava a avaliar o regime que concede autorizações de residência a estrangeiros em troca de investimento no país em capitais, imobiliário ou criação de emprego. O chefe do executivo considerou que o regime de vistos gold "provavelmente já cumpriu a função que tinha a cumprir e que neste momento não se justifica mais manter".

Sobre Portugal, o relatório refere ainda que o sector da defesa precisa de "maior transparência e supervisão, fazendo notar que processos de contratação envoltos em secretismo e práticas de transparência financeira deficientes enfraquecem as salvaguardas contra a corrupção nas instituições de defesa" em Portugal.

Um dia a escola vem abaixo…

As imagens que nos chegaram da Turquia e da Síria evidenciaram um cenário de catástrofe e de horror que não deixaram ninguém indiferente.

Pior ainda quando pensamos que o mesmo sucederá um dia em Lisboa. A cidade, todos sabemos, irá sofrer um sismo de grande intensidade, só não sabemos é quando. Segundo estimativas recentes de especialistas do “Técnico” para a Câmara Municipal de Lisboa (CML), metade dos edifícios da capital corre o risco de não resistir. Tal deve-se ao facto de 60% do parque edificado ter sido construído antes de 1958, isto é, da primeira legislação nacional anti-sísmica. Perante esta inevitabilidade importa que os poderes públicos tomem todas as medidas que se impõem para minorar os efeitos da catástrofe anunciada. Mas do que se vai vendo parece que não é bem assim.

Em 2018, por ocasião de uma petição submetida à Assembleia Municipal de Lisboa por várias Associações de Estudantes de escolas da capital, preocupados com a falta de planos de emergência nas mesmas, ficou-se a perceber que, dos 80 estabelecimentos sob gestão directa do município, apenas dois tinham as designadas Medidas de Autoprotecção (MAP). Em todas as outras escolas, e ainda que a legislação a tal obrigasse desde 2008, não havia MAP’s. Pior, foram relatadas situações de portas de emergência fechadas a cadeado por questões de segurança, ou saídas de emergência bloqueadas por arrumações. Desde essa altura que a CML deitou mãos à obra e hoje, ainda que não todo, mas a grande maioria do parque escolar autárquico já tem MAP’s, ou está em vias de as ter.

• Leia este artigo na íntegra na edição em papel desta semana já nas bancas

Rodrigo Mello Gonçalves

O Diabo

Volta, Seguro, estás perdoado!

Conta a história que, há quase uma década, Pedro Passos Coelho e António José Seguro, líderes dos dois maiores partidos portugueses, haviam firmado um pacto de entendimento relativamente a matérias estruturais para o país, nomeadamente na saúde, educação, justiça e economia. Seria um memorando conjunto, a vigorar para vários anos, independentemente de quem governasse em determinado momento. Dois estadistas a colocarem o país à frente de interesses pessoais ou partidários e, sobretudo, a salvo das pressões de cada momento.

António Costa, depois de espetar a faca nas costas de Seguro, perdeu as eleições. Mas a sua ânsia de poder e as suas metas pessoais levaram-no a fazer um pacto com uma esquerda polarizada, mas com um propósito único: impedir que Passos Coelho, democraticamente eleito, governasse. Não havia uma ideia para Portugal, não havia um plano conjunto, não havia uma estratégia a longo prazo. Apenas e tão só o desejo de poder firmado num compromisso de votarem favoravelmente os orçamentos que os socialistas viessem a apresentar. Fossem eles quais fossem!

Não havendo almoços grátis, Costa pagou esse preço bem alto, tendo, sucessivamente, que ceder a bandeiras que não eram as suas, mas reivindicadas por comunistas e bloquistas, de forma “ad hoc” e com elevado ruído mediático. Sob a capa das aparências e os jargões habituais, o Portugal dos telejornais e capas de revista dava saltos quânticos em matéria de igualdades, de liberdades, de solidariedade e de assistencialismo social. Mas Portugal não é um romance, nem um item meramente estatístico e cá habitam pessoas reais. Daquelas que têm problemas e contas a pagar. Os socialistas, quer pelo agrilhoamento permitido, quer por manifesta incompetência, quer porque reféns de uma visão ideológica irrealista, perpetuaram uma governação ao sabor das reivindicações do momento e da crueza das sondagens. Governaram sempre em função do momento e nunca em função do futuro, sem rumo ou estratégia, mas de forma garantística e interesseira – no sentido de garantirem os votos que lhes permitiriam continuar no poder. Apenas e só!

Portugal hoje navega sem rumo e com o futuro hipotecado por várias gerações…

Exemplo disso é a recente política de habitação. Os socialistas foram incapazes de antecipar as consequências de diversas políticas erradas que, pomposamente denominaram como visionárias. Interessa aos socialistas – e a toda a esquerda que se alcandora nos pequenos poderes territoriais – que Portugal se mantenha dividido, polarizado, onde continuem a pontificar presidentes de junta, empresas públicas, organismos de supervisão, observatórios e tantos outros, sem poderes efectivos, com orçamentos deficitários, inúteis na sua essência e interdependentes entre si, quer administrativa, quer burocrática, quer financeira, quer politicamente, mas que permitam encostar uns tantos aparelhistas e manter uma aparente prova de vida (basta ver o que o PS pretende, uma vez mais, fazer com as uniões de freguesias, revertendo o modelo, sem que se vislumbre qualquer benefício ou efeito prático da medida, que não garantir mais uns quantos lugares pagos pelo erário público). Esta falta de autonomia, aliada ao centralismo puro e duro, sem precedente na restante Europa civilizada, faz com que Lisboa e Porto, tudo concentrem e sequem o resto do país. Estas duas cidades (mais a inevitável periferia), concentram cerca de 70% da população portuguesa. Operando a lei da oferta e da procura, não será difícil de perceber que os preços da habitação disparem para níveis incomportáveis pela maioria dos portugueses. A falta de empregos, de oportunidades, de transportes, de investimentos âncora, resulta no êxodo das pessoas para a capital ou para a invicta, onde a oferta habitacional escasseia… Fácil é culpar o movimento especulador e o investimento estrangeiro e, uma vez mais, “inventar” uma legislação à pressa, mascarando que o Estado está atento aos problemas e dispõe das soluções adequadas. Ora, nem uma coisa, nem outra!

16/03/2023

https://jornaldiabo.com/destaque/volta-seguro-estas-perdoado/#

Novo Banco emprestou dois milhões ao PS.

O BES foi resolvido em Agosto de 2014, tendo sido dividido em duas partes: o banco mau e o Novobanco, que já teve de receber mais de três mil milhões de euros do Fundo de Resolução através do mecanismo de capital contingente criado em 2017, aquando da venda da instituição aos americanos do Lone Star.

13 de Dezembro de 2017

Para obter o financiamento, Partido Socialista hipotecou 27 imóveis, os quais estão avaliados em 1,1 milhões de euros e que apenas cobrem 55% do valor financiado
O Novo Banco, antigo Banco Espírito Santo, emprestou dois milhões de euros ao Partido Socialista. O contracto de financiamento foi assinado a 30 de Novembro. No mesmo dia, foi celebrada uma escritura de hipoteca de 27 imóveis propriedade do partido, avaliados em 1,1 milhões de euros, valor que cobre apenas 55% do montante financiado.
A escritura de hipoteca foi celebrada pelo notário Pedro Rodrigues e foi assinada por Luís Patrão, antigo membro do secretariado nacional do PS e considerado como um dos homens de confiança de António Costa para a organização interna do partido, e por Hugo Bento Pereira, vogal do conselho de administração da empresa Águas do Tejo Atlântico, na qualidade de procuradores do Partido Socialista. No documento, a que a SÁBADO teve acesso, os socialistas constituíram a favor do Novo Banco uma hipoteca de 27 imóveis para garantir as obrigações de dois contractos de financiamento: um de 500 mil euros e o segundo de 1,5 milhões de euros.
De acordo com o contracto de financiamento, a finalidade do empréstimo de 1,5 milhões prende-se com "liquidação de responsabilidades de apoio à tesouraria", ou seja será para liquidar outro crédito contraído. O prazo contracto é de 120 meses, com uma taxa indexada à Euribor a 12 meses, acrescida de um spread de três pontos. Quanto ao financiamento de 500 mil euros, segundo os documentos, este resulta de uma alteração a um contracto já existente entre o Novo Banco e o PS, o qual terá passado por um reforço do montante emprestado, assim como pela hipotecas de imóveis.
Pelo menos desde 2016 que o PS atravessa uma situação financeira complicada. Já este ano, na apresentação do Relatório e Contas do partido relativo ao ano anterior, Luís Patrão, num texto colocado no site do PS, assinalava que o partido tenha reduzido o "seu passivo em 942 mil euros" e  aumentado "em 255 mil euros os capitais próprios", continuava a  "a apresentar um cenário preocupante em termos económico-financeiros". Ainda assim, segundo o próprio Patrão, as contas de 2016 já permitiam "antever um caminho positivo para a resolução progressiva desses problemas".
"O plano de liquidação ordenada de dívida a fornecedores permitiu realizar uma significativa redução dos valores em aberto, com o pagamento de mais de 1,335 milhões de euros e o cumprimento de 27 planos de liquidação de dívida antiga, dos quais no fim de 2017 restarão apenas 6 ainda por liquidar integralmente", reforçou o homem das contas socialistas.


https://www.sabado.pt/portugal/detalhe/novo-banco-emprestou-dois-milhoes-ao-ps

sexta-feira, 17 de março de 2023

As grandes fortunas das antigas colónias

Tiveram os maiores barcos de Angola, fizeram corridas de carros em Jaguares, mandaram erguer igrejas com santos e bispos vindos da metrópole, a mesma metrópole de onde chegaram a enviar governantas para casas com ares condicionados instalados por portugueses. Na África de todas as oportunidades, alguns montaram negócios nunca vistos – como os pioneiros da cerveja e do whisky local –, outros enriqueceram com algodão, fazendas de gado e abacaxi ou conservas de atum.


Índice
1 O império de Manuel Vinhas
2 Whisky made in Angola
3 O prédio mais alto do Império
4 Uma missa para 3 mil pessoas
5 Os quatro irmãos Quintas
6 Angola, “querida Angola”

Nos anos 60, quando a Baía Farta ainda não tinha sequer banco, José Domingues Antunes já pagava milhares de contos em salários aos funcionários da fábrica de conservas Atlântico. O dinheiro vinha de Benguela, a 35 quilómetros de distância, em duas camionetas que faziam vários serviços para a empresa angolana.
Um dia, além do habitual pacote de notas, as famosas Austin e Scania trouxeram uma segunda embalagem, aparentemente igual mas recheada de carne – em vez de dinheiro. “Só que houve um engano e puseram o dinheiro no frigorífico e a carne no cofre. Isto aconteceu numa sexta-feira e na segunda toda a gente comentava o cheiro horrível que andava pelo edifício”, lembra divertido Armando Cardoso, de 75 anos, antigo funcionário da companhia.
O patrão, um português de Proença-a-Nova, era “um pioneiro que vivia numa das melhores (e poucas) casas de primeiro andar de Benguela”. Um reclame da época anuncia que mandou construir aquele que chegou a ser o maior barco de Angola, o primeiro a congelar peixe em alto mar quando nas antigas colónias ainda ninguém o fazia.
Foi também ele que, depois de uma viagem à Europa, decidiu importar uma caixa frigorífica de Itália para fazer igual na Baía Farta. “Levou-a para a carpintaria, mandou desmanchar e copiar. A primeira desfez-se toda na estrada. ‘Bem, vamos lá ver onde é que erramos e tentar de novo’, disse aos funcionários. E foi assim que começaram a circular camionetas com caixas frigoríficas na Baía Farta”, acrescenta Armando Cardoso.


A família de José Domingues Antunes (o primeiro da esquerda) no Sobrainho, em 1939.Arquivo pessoal

Quando o Presidente da República Américo Tomás visitou Angola, em 1963, desembarcou no cais da empresa. “A Atlântico era, na altura, uma das maiores fábricas de conservas da África Austral”, garante à SÁBADO Alexandre Soares, sobrinho-neto de José Domingues Antunes.
A primeira pescaria tinha sido inaugurada em 1940, nessa altura com barcos feitos de madeira portuguesa. “O meu avô cortava a madeira em Proença-a-Nova, a madeira ia de barco para Lisboa no rio Tejo e daí seguia para Angola. Foi assim que começaram a construir barcos de pesca. Mais tarde o meu avô, a minha avó e os filhos também foram para lá.
No início viviam numa praia desabitada, a 20 quilómetros de Benguela, numa barraca de madeira. Depois começaram a pescar cada vez mais, a fazer barcos maiores e a madeira já não ia daqui. A dada altura separaram os negócios: o meu avô ficou com uma pecuária e o meu tio-avô com a pescaria” que transformou nas conservas Atlântico.
“Quando cheguei, em 1963, já era uma fábrica muito grande, com seis ou sete barcos de pesca de atum, duas traineiras e esse arrastão, a jóia da coroa, que estava certificado para navegar no mar do Norte”, recorda Armando Cardoso. Ao lado da conserveira nasceu um estaleiro naval, depois uma carpintaria, várias oficinas e fábricas, salinas próprias e um bairro onde os trabalhadores viviam – os solteiros em quartos, os casados em casas com mobília, portas e janelas também elas fabricadas na Baía Farta.

O Pioneiro, da Fábrica de Conservas Atlântico, chegou a ser o maior barco de Angola

arquivo pessoal
Uma economia a crescer
Em 1967, quando adoeceu com papeira durante o serviço militar, Armando Cardoso pediu para ser retirado de Nova Lisboa para o hospital da Atlântico. “Estive lá um mês internado. Antes de fazer o hospital, o Sr. José Domingues Antunes já tinha oferecido um posto médico com condições para fazer pequenas cirurgias, como uma operação à apendicite, a Sobrainho dos Gaios, a terra onde nasceu. Pagava o médico, a enfermeira e a maior parte dos medicamentos.”
Anos mais tarde, além de Angola, a Atlântico passou a exportar para Itália e para os Estados Unidos e teve um representante na Beira, em Moçambique, onde a mulher do famoso jogador de futebol Eusébio, Flora, chegou a trabalhar, assegura Armando Cardoso.
E em 1973, pouco antes da revolução, Domingues Antunes estava a negociar a compra de pelo menos dois helicópteros para fazer o balizamento dos cardumes de atum. “Em vez de os barcos andarem no mar a fazer isso, podia-se fazer uma busca por avião e depois transmitir aos navios. A compra não avançou por causa do 25 de Abril”, explica o antigo funcionário.

Até 1974, nada fazia prever que José Domingues Antunes – e muitos outros portugueses – abandonassem Angola e Moçambique, terras onde tinham feito negócios e fortuna. Como os muitos portugueses que para lá emigraram – entre 1940 e 1960 só a população de Luanda passou de 60 mil para mais de 220 mil pessoas – o dono das conservas Atlântico foi à procura de oportunidades que não encontrava em Portugal.
E eram muitas: entre 1960 e 1970 a indústria cresceu sempre a dois dígitos e em alguns casos, como aconteceu com a extracção de diamantes e de ferro, acima dos 170%. Foram tempos de criação de novas empresas, com muito mais capital investido (mais 600% entre 1960 e 1972). Uma época em que o PIB disparou – entre 1970 e 1974 Angola cresceu em média 7,8% por ano – e em que se assistiu ao nascimento de vários novos empresários. E de muitas histórias, como as que vai continuar a ler aqui.


O emblemático hotel Presidente, em Luanda. Em 1971, Angola tinha 927 hotéis e 239 pensões. Os maiores em Luanda, Nova Lisboa e Sá da BandeiraJean-Charles Pinheira
O dono do Jaguar amarelo


Apesar de se ter feito rico, José Domingues Antunes não era dado a extravagâncias. Gostava de ir às termas ao fim de semana, mas não frequentava o Lobito Sports Club ou outros clubes onde os portugueses se juntavam, e continuou sempre a conduzir um Volkswagen Carocha.
Já o pai de Francisco Guedes, que em Angola todos conheciam como Farrobilha Guedes, apaixonou-se pelas corridas de carros e pelo autódromo de Luanda. “Foi durante vários anos corredor de automóveis. Começou com um Triumph TR4, muito famoso na altura e depois teve um Jaguar amarelo. O meu pai e o Manuel Vinhas [o milionário dono das cervejas Cuca] tinham dos melhores carros de Angola”, conta o seu único filho.
Luís Farrobilha Guedes chegou a Luanda em 1961, numa altura em que ninguém sabia o que eram frigoríficos. “Nem havia rede eléctrica, era preciso trabalhar a petróleo”, conta o filho. Ao fim de um ano, decidiu lançar-se por conta própria e abriu a Frigoríficos Polo Norte.
“Um dos nossos maiores clientes foi o Estado português, através das Forças Armadas. Vendemos milhões de frigoríficos e de arcas congeladoras para o exército português em Angola. Para as messes, quartéis, para todo o lado. Em 1967 já tínhamos 95 empregados e em 1970 abrimos uma filial em Moçambique.”
Dois anos depois, voltaram a inovar: “Fizemos a primeira linha de montagem de ares condicionados totalmente angolana em Angola”, acrescenta o filho, que ainda se ri quando recorda um dos slogans da marca – “Durma com a Amana e durma melhor.” A mãe, Albertina, foi essencial para o sucesso da empresa. “Não pode falar do meu pai sem falar da minha mãe”, garante o filho. “Era ela que comandava as oficinas. O meu pai liderava a parte comercial.”
Juntos construíram uma “fortuna considerável”, que além da casa no bairro de Alvalade, um dos melhores de Luanda, incluía um prédio de 16 andares que sempre arrendaram. “Todos os frigoríficos e ares condicionados que o primeiro Presidente de Angola [Agostinho Neto] tinha, era o meu pai que lhos oferecia. Eram amigos pessoais”, acrescenta.

O império de Manuel Vinhas

O apartamento que o empresário Manuel Vinhas mandou fazer em Luanda, no segundo piso da fábrica da Cuca, era um dos que à época já tinha ar condicionado. Quase de certeza fornecido por Farrobilha Guedes, adianta o filho. “Eram muito amigos”.
Ao contrário de Farrobilha Guedes, Manuel Vinhas não vivia em Luanda, mas passava cerca de seis meses por ano em Angola. Tempo suficiente para lá ter não só motorista, mas também governanta. Era a Dona Gracinda, que se mudou de Lisboa para Angola, quem se ocupava da casa com seis suítes, casa de jantar e uma sala envidraçada com ligação ao terraço.
Apesar de ser um dos homens mais ricos de Portugal, e herdeiro da fábrica de cervejas Portugália, foi em Angola que Vinhas mais fez crescer o seu império. Em 1972, no auge do império que construiu, tinha 53 empresas no País. Só a Companhia União de Cervejas de Angola (Cuca) dava emprego a 3.500 funcionários e faturava um 1,2 milhões de contos por ano (hoje mais de 300 milhões de euros).

Manuel Vinhas (ao centro) com a filha Rita e um amigo na Herdade do Zambujal, onde organizou grandes caçadasarquivo pessoal

“Em 1952 iniciámos em Angola a actividade cervejeira e por isso legitimamente reivindicamos para nós o título de pioneiros de uma indústria que, passados 20 anos, ainda é a primeira indústria transformadora de Angola”, disse Manuel Vinhas na assembleia-geral anual da Cuca desse mesmo ano.
Cerveja era Cuca”, garante à SÁBADO José Marques Leandro, 93 anos, que chegou a ser presidente da câmara de Nova Lisboa (hoje Huambo). “Havia três cervejeiras grandes em Angola: a Cuca, a Cristal e a Nocal. Mas só a Cuca era sinónimo de cerveja. Dizia-se muito: ‘Traz-me uma Cuca, mas de preferência Nocal ou Loira Tropical.” Não é que não se bebesse cerveja antes de Manuel Vinhas chegar a Angola – bebia-se, e muito – mas era importada e, por isso, mais cara.
Com o sucesso na cerveja, Manuel Vinhas foi abrindo novos negócios. Em 1965, para aproveitarem as borras que sobravam da produção de cerveja, começaram a produzir rações. Mais tarde tiveram participações em fábricas de caixas de cartão, de caricas e de vidro; produziram sumo de maracujá e vegetais, aventuraram-se na pecuária e na avicultura (com, em tempos, um milhão de galinhas); entraram nos meios de comunicação social de Angola.
Além de casas e de um grupo cultural e desportivo, os filhos dos funcionários tinham direito a creche – um dos brinquedos era a primeira camioneta de distribuição de cerveja que o empresário teve em Angola.
Vigiado pela PIDE desde que, em 1962 escreveu o livro Para um Diálogo sobre Angola, Vinhas nunca discriminou funcionários. Pelo contrário, conta-se ainda hoje em Luanda: quando percebeu que o bar América não aceitava negros ou mestiços, abriu outro, na mesma rua, com o cartaz “Servimos todas as raças”. Ali, só não se vendia vinho, a bebida preferida do maior industrial de cervejas de Angola, que já antes do 25 de Abril tinha uma das mais importantes fortunas portuguesas e uma das principais colecções de arte.
Nas 999 verbas listadas no inventário da sua herança, a que a SÁBADO teve acesso, cerca de 600 são quadros. Há duas colagens de Paula Rego, dezenas de quadros de Júlio Pomar (que fez o retracto do próprio Manuel Vinhas), Almada Negreiros, Cruzeiro Seixas, entre muitos outros pintores portugueses e estrangeiros.
Outra das suas grandes paixões eram as caçadas, que fazia em Angola, mas também em Moçambique. Chegou a viajar milhares de quilómetros de carro para perseguir elefantes, leões e muitos outros animais. Na época, os safáris liderados por portugueses duravam vários dias e tinham uma logística complexa. Numa das vezes em que foi a Moçambique com a mulher, Maria Alice Bustorff, que tratava por Concha, e os oito filhos, o camião que levava o material de apoio viajou 24 horas antes da família Vinhas.

Whisky made in Angola

Em Luanda, os fins de tarde eram muitas vezes passados nas esplanadas da Portugália e do Calhambeque, no bar do hotel Continental ou no Baleizão, famoso sobretudo pelos gelados. Além de imperiais e cervejas bebia-se muito gin tónico e whisky. Whisky que, a dada altura, também podia ser nacional.
“O primeiro whisky de Angola foi feito por um português e chegou a ser exportado para a África do Sul”, lembra Marques Leandro. “Era o whisky mais barato que havia, mas era uma mixórdia. Bebia-se muito com Seven Up”, recorda Floripo Salvador, responsável pela publicação virtual Recordações de Luanda. Marques Leandro concorda.
“Era uma aguardente wiskada, mas não era grande coisa. A empresa chamava-se Sociedade de Bebidas Espirituosas do Lobito (SBELL), mas depois inventaram-se outros nomes a brincar com as iniciais [e com a qualidade da bebida]. Os mais famosos eram: Se Beberes Este Líquido Lixas-te e Salazar Bebeu Este Líquido e Lerpou”, lembra divertido.


O whisky Sbell era produzido na cidade do Lobito, a 500 quilómetros de Luanda.

Além de uma moradia na fazenda do Lubango, Mário Ventura mandara arranjar uma casa no centro do Lobito. “Era um casarão enorme. Ele vivia no primeiro andar e o rés do chão estava alugado ao Banco Pinto & Sotto Mayor”, controlado por António Champalimaud, acrescenta Jorge Briosa.

O prédio mais alto do Império

O crescimento da banca foi, aliás, um dos reflexos da aposta de Portugal em Angola e Moçambique. “O número de dependências e agências bancárias em todo o território angolano, que era de 17 em 1960 (pertencentes a dois bancos), foi acrescido, entre 1961 e 1968, de 91 estabelecimentos suplementares pertencentes agora a cinco bancos”, escreveu Adelino Torres em Estratégia Colonial Portuguesa e Estruturas Económicas de Angola nos Anos 1960 e 1970.
Além do Pinto & Sotto Mayor, de António Champalimaud, estavam em Angola instituições financeiras como o Banco de Crédito Comercial e Industrial (BCCI), de Miguel Quina, que controlava um dos sete maiores grupos empresariais portugueses da época.
Tal como Miguel Quinta, também Artur Cupertino de Miranda já era rico antes de investir nas antigas colónias. “Foi pioneiro da banca em Angola e em Moçambique. O banco de Moçambique foi uma derivação do Banco Comercial de Angola (BCA), o primeiro banco privado de Angola, criado em 1956.”
A 28 de Janeiro de 1967, o BCA inaugurou uma nova sede naquele que seria, durante anos, o maior arranha-céus do império, com 87 metros de altura e 26 pisos. Para o evento, a administração encomendou um bolo à pastelaria mais famosa da cidade, a Paris-Versailles, que tinha fama de fazer bolos em forma de edifícios, conta Rita Garcia no livro Luanda como Ela Era.
“O bolo era tão grande que não cabia nas portas nem nos elevadores do BCA. Foi preciso descobrir uma forma de o içar para o terraço”, descreve. Para isso, teve de se pedir uma grua aos Serviços Municipalizados de Água e Electricidade. Na inauguração, que contou com um discurso de Cupertino de Miranda estava, claro, a elite de Luanda, que subiu ao 21º piso para beber champanhe.

António Champalimaud, com o Pinto & Sotto Mayor, foi um dos milionários portugueses que investiu na banca em Angola


De acordo com o livro Angola: Estrutura Económica e Classes Sociais, de Henrique Guerra, a “camada de colonos ricos” teria, então, “entre uma e duas centenas de famílias”. Juntos, os influentes empresários controlavam as maiores empresas agrícolas e pecuárias de Angola, mas também “a maior parte das indústrias de pesca e grande parte das indústrias transformadoras”, empresas de transportes, diversões e muitas outras. “As primeiras companhias de seguros foram criadas por esta camada.”
Venâncio Guimarães Sobrinho, sogro de Cardoso e Cunha, ministro da Agricultura e Pescas dos governos de Sá Carneiro e de Pinto Balsemão, foi outro dos empresários que teve uma grande influência na economia de toda a Angola. Antes do 25 de Abril as suas empresas já tinham um avião bimotor Piper, usado para deslocações mais longas.
O maior produtor de gado do Sul de Angola teve uma influência decisiva sobretudo no desenvolvimento dos distritos da Huíla e Cunene (Moçâmedes). “O Grupo Venâncio Guimarães estendia a sua actividade do comércio [incluindo o Jornal da Huíla], à indústria, agricultura e pecuária, passando pela pesca e pela exploração de carreiras rodoviárias. Esta última actividade teve um papel fundamental no desenvolvimento do Sul e Centro de Angola, porque [anos depois deu origem à EVA (Empresa de Viação de Angola) que durante muito tempo foi o único meio de transporte do comum das pessoas e de grande parte das mercadorias em trânsito, de e para o Huambo, Benguela e Cunene”, escreveu Fernando Cerviño Padrão, em A Colonização do Sul de Angola: 1485 a 1974.
Nascido em São Pedro do Sul em 1933, Venâncio Guimarães Sobrinho foi para Angola depois de sair da Escola Naval. Começou por trabalhar para a Venâncio Guimarães & Companhia, no Lubango, detida por um tio com quem partilhava o nome. Quando a parceria terminou, fez uma empresa concorrente, com o mesmo nome, que se tornou ainda maior e mais famosa.
Para o genro, Cardoso e Cunha, que se juntou a ele nos anos 60, Venâncio Guimarães sempre foi “o comandante”. Tal como acontecia com Manuel Vinhas, as chefias da empresa tinham casa no mesmo edifício onde funcionavam os escritórios. Alguns, como acontecia por vezes com Cardoso e Cunha, chegavam a descer de pijama para ir resolver assuntos de trabalho – e logo a seguir regressar a casa.

António Cardoso e Cunha trabalhou muito tempo com o sogro, Venâncio Guimarães Sobrinho, em Angolad.r.
Leston Bandeira foi trabalhar para Venâncio Guimarães Sobrinho pouco antes da independência de Angola, como director da Rádio Comercial. E acabou a ser despedido – tal como a restante direcção – pelo empresário português. “Fomos os 4 despedidos porque o Venâncio Guimarães Sobrinho disse uma frase muito engraçada: ‘Eu não pago para que digam bem de mim, mas seguramente também não lhes pago para que digam mal.’”
E a Rádio, admite Leston Bandeira, “dizia mal de toda a gente”, incluindo do partido no poder, o MPLA. “Foi a primeira rádio livre em que trabalhei. Nós éramos todos marxistas, só mais tarde percebemos que o marxismo era uma coisa do século XIX. E acabámos obviamente por ser demitidos.” Venâncio Guimarães Sobrinho era, diz, “um homem soft e sóbrio, que investia muito em Angola e era membro do conselho legislativo do País”. A dada altura entrou, também, no negócio das cervejas. “Criou, com capitais sul-africanos, a fábrica da N’gola.”
Leston Bandeira voltaria a trabalhar para ele depois da Independência de Angola, quando o MPLA o colocou como administrador de uma fábrica de farinha do empresário. “Nessa altura eu ainda fazia parte da direção política do Sul do MPLA e os meus colegas pediram-me que fosse para lá.” Quando chegou ao Lubango começou logo a ter problemas com um dos cinco administradores colocados pelo MPLA.
Estávamos numa reunião, eu distribui um documento e vi que ele estava a lê-lo de pernas para o ar. Chamei o Santos, que me tinha convidado e disse-lhe: ‘Olha, aquele fulano, mandei-o para a escola, porque ele é analfabeto. E para administrar uma fábrica como esta é preciso gente competente, senão não estou aqui a fazer nada.”

Uma missa para 3 mil pessoas


Quando as havia, as excentricidades dos colonos não se limitavam a Jaguares ou a caçadas longínquas. Podiam, também, ser religiosas. Quando o telegrama chegou a Sisal do Bocoio, a 80 quilómetros do Lobito, em Angola, o gerente da enorme herdade onde José Lopes Ferreira dava emprego a 2 mil pessoas, a maior parte delas em plantações de abacaxi, entrou em pânico.
A ordem do patrão, um velho colono que indiferente ao calor vestia sempre fato de linho branco e gravata, era muito clara: “acaba a capela rapidamente porque eu vou no barco e levo uma imagem igual à da Nossa Senhora do Mont’Alto para pôr aí”, lembra José Marques Leandro, que na altura trabalhava na câmara do Lobito. “O gerente ficou muito aflito e chegou a pedir ajuda ao empreiteiro da câmara. ‘Eu pago, eu pago’”, acrescenta.

A inauguração do santuário do Mont'Alto, num artigo de três páginas d'A Comarca de Arganil


Apesar de todos os esforços, quando o comendador chegou – acompanhado pelo Bispo de Coimbra e pela imagem – a capela que mandara construir à semelhança da que havia na terra onde nascera, no concelho de Arganil, ainda não estava pronta.
Nem por isso a inauguração foi adiada: no dia 15 de agosto de 1964, pela primeira vez na história, celebrou-se missa na colina que viria a ser conhecida por Mont’Alto. A imagem que chegara de Portugal foi colocada num andor construído propositadamente para a ocasião no Lobito. Para o carregar, organizaram-se três turnos, de quatro pessoas cada (Marques Leandro integrou o primeiro).
Depois da procissão, a que assistiram mais de 3 mil pessoas e seis sacerdotes, seguiu-se um enorme banquete. “Qualquer pessoa vulgar desistiria de dar almoço a todos os que naquela hora se encontravam no Mont’Alto de Angola. Mas o comendador José Lopes Ferreira não é uma pessoa vulgar. E, assim, deu ordens para que fossem mortos bois, porcos, galinhas, sem calculismo de quem tem medo de desperdícios. Fez transportar para o local camionetas carregadas com pipas de vinho, cerveja, whisky e muitas outras bebidas. De véspera, pedira a pessoas da Sarnadela [a terra onde nasceu] que fossem para o Mont’Alto a tempo de prepararem torresmos à maneira de Santa Quitéria, em Pombeiro da Beira”, escreveu o jornal Comarca de Arganil a 22 de agosto de 1964.
“Agora entronizada entre nós, rogamos-vos, Nossa Senhora do Mont’Alto: amparo, proteção, bênção e paz para todos os habitantes de Angola”, rezou o comendador José Lopes Ferreira.
Nos dias seguintes, as obras continuaram. Não apenas da igreja: ao lado da capela foi construída uma escola destinada não só aos quase 2 mil operários que trabalhavam naquela fazenda, como a outras pessoas que vivessem nas redondezas. Ao lado do Santuário, onde passou a haver missa todos os domingos, ficou também a casa do chamado “ermitão”, o homem que dia e noite velaria por aquele local sagrado.
José Lopes Ferreira era tão católico que costumava dizer que as mulheres mais caras que tivera na vida eram freiras. “As freiras de um colégio que ele ajudava”, conta divertido Marques Leandro. Quando chegou a Angola, vindo da Sarnadela, dificilmente imaginaria que ia fazer fortuna com plantações de abacaxi.
“À noite, quando regressei ao Lobito com o filho [tinha, além deste, duas filhas], parámos no meio do caminho na casa comercial onde o pai tinha começado a trabalhar. O velho soba disse-lhe: ‘Quando vieste para cá tinhas as meias rotas e agora tens muito dinheiro.’”
Outra empresa muito grande, acrescenta Marques Leandro, era a Jomba. “Tinha a concessão de uma água mineral que exportava com grande êxito principalmente para a África do Sul, que tem muita água, mas não tem minerais. Mas a maior atividade era uma fábrica de bombons e rebuçados.”
O dono da Jomba e da Ossi, Lisboa Fernandes, chegou a ser vice-presidente da câmara do Lobito. “Dizia que em Angola tinha açúcar, coisa que em Portugal não havia, e mão de obra. Só faltavam os técnicos, que levou para lá. O grande importador era a Favorita, que a dada altura quis comprar a empresa. Mas ele não vendia, era muito empreendedor”, acrescenta.



Em casa de Marques Leandro, os bombons da Jomba eram uma das guloseimas mais procuradas. “De vez em quando levava-me umas caixas de muitas variedades. Os meus filhos eram miúdos e andavam sempre à procura dos chocolates.”

Os quatro irmãos Quintas


Quando os portugueses começaram a investir em Angola, o petróleo da época era o café, que entre 1946 e 1972 foi a principal exportação do País, recorda Onofre dos Santos. “Grandes exportadores de café portugueses, como os Mota, eram uns cinco ou seis. Depois havia importantes empresários agrícolas, como o Venâncio Guimarães Sobrinho, e outros que diversificaram muito os negócios, como o Manuel Vinhas e o Mabílio de Albuquerque. No comércio, por exemplo, os Armazéns do Minho, que ainda lá estão, até tinham uma peça feita pelo famoso artista português Querubim Lapa numa das fachadas. E os Quintas & Irmão tinham lá um grande e muito emblemático estabelecimento comercial”, o maior de Luanda.
A Quintas & Irmão era uma das lojas mais concorridas da baixa da capital. Pertencia não a um, mas a quatro irmãos, que além de um estabelecimento comercial multiproduto tinham uma grande distribuidora de gás (Gás Quintas), uma fábrica de tintas e metade do capital da cervejeira Eka.
“Dois viviam em Luanda, o António e o Júlio, os outros dois [Joaquim e Armando] mais em Portugal”, confirma à SÁBADO uma pessoa próxima da família. Vendiam de tudo: de frigoríficos a muitos outros eletrodomésticos, passando por talheres, porcelanas, cristais ou canetas Dupont e Parker. No Natal, era ali que os portugueses iam comprar brinquedos – alguns feitos em Angola, outros importados. Como também se importava o bacalhau que os portugueses continuaram sempre a comer (tal como a feijoada e o cozido à portuguesa) e a roupa.

Porque só “após 1966 foi permitida a instalação nas colónias do setor têxtil, até então interdito com receio de forte concorrência à indústria da metrópole”, escreve-se em A Evolução Económica de Angola Durante o Segundo Período Colonial, de Nuno Valério e Maria Paula Fontoura. Quatro anos depois, em 1970, o têxtil era já a segunda maior indústria de Angola.

Um dos maiores empresários do setor era Manuel Lagos, tio da jurista Rita Amaral Cabral, a mais famosa namorada de Marcelo Rebelo de Sousa. “Tinha, além de algodão, várias fazendas em Angola”, diz uma fonte próxima.


O interior do Pão de Açúcar, em Luanda, o primeiro hipermercado em todo o território português.DR


Foi a negociar algodão que o Entreposto, à época a maior companhia de Moçambique, começou a fazer-se grande. A mais antiga empresa do grupo, a Companhia Nacional Algodoeira, foi criada em 1926 numa sociedade entre José Dias da Cunha, pai de António Dias da Cunha, antigo presidente do Sporting, e o seu companheiro de caça, Joaquim Palhinha.

Mais tarde, com a semente do algodão, começaram a fazer óleos comestíveis. Depois vieram os carros, (primeiro com a representação da Mercedes, Peugeot e Massey-Ferguson) e a importação e exportação de vários produtos, incluindo petróleo. Só em 1967 o Grupo Entreposto, que nasceu em Moçambique, expandiu a sua atividade para Portugal, onde começou por vender carros Nissan (na altura Datsun).

Outra empresa muito grande, que ainda hoje se mantém em Moçambique, surgiu com João Ferreira dos Santos, que nasceu em Baraçais, no Bombarral, em 1878, e veio para Lisboa ainda miúdo. Foi na capital, onde começou por trabalhar numa farmácia, que ouviu pela primeira vez falar das potencialidades de África. A 24 de janeiro de 1897, na altura com 19 anos, embarcou no cargueiro Zaire com destino à Ilha de Moçambique.

Ainda estava no barco quando conheceu José António dos Santos, também do Oeste, que lhe deu emprego numa pequena loja da Ilha de Moçambique. Ao fim de oito meses, lançou-se por conta própria. E foi assim que começou a construiu um império com várias áreas de negócio – além do algodão há chá, castanhas e amêndoas de caju, investimentos na pecuária e na indústria, projetos imobiliários, de energia, metalomecânica, automóvel e até fábricas de bicicletas.
Quando o neto – com o mesmo nome – morreu, em 2015, a João Ferreira dos Santos era uma das 10 maiores empresas portuguesas em Moçambique. Continua, até hoje, nas mãos da mesma família.

Angola, “querida Angola”

Tal como os Ferreira dos Santos, também Francisco Guedes mantém a Frigoríficos Polo Norte. “Com o 25 de Abril, os meus pais venderam a atividade em Moçambique e ficaram só com a de Angola, da qual sou herdeiro. Os frigoríficos Polo Norte têm, agora, cerca de 15 funcionários. Nas outras empresas somos uns 140”, diz à SÁBADO. Outros, como Manuel Vinhas, tiveram que abandonar o país depois das independências.

Antes da Revolução, os cinemas de Luanda já passavam os grandes êxitos de HollywoodJean-Charles Pinheira
A 19 de agosto de 1975, já exilado no Rio de Janeiro, e depois de uma ida ao estádio do Maracanã, o empresário escreveu (no livro Profissão Exilado) um relato emotivo sobre Angola. E sobre um regresso que não chegou a acontecer.
“Nas bancadas, um gigantesco batuque africano que me transporta à outra margem do Atlântico. Onde jogadores também morenos fazem as mesmas imaginosas, astuciosas, diabólicas piruetas; onde acontecem as mesmas imprevistas e desconcertantes mudanças de ritmo; onde, sem comunicação telepática e só por obediência às raízes, se desenham os mesmos gestos dos passistas de samba. Onde é Angola. Onde voltarei um dia, quando for governada por angolanos, livre, como espero, das proibições, dificuldades e ameaças a que fui sujeito antes por extremistas da direita, e agora por extremistas da esquerda. Onde continua a ser terra de esperança, e me recuso a aceitar que seja de desilusão. Onde pedi para ser enterrado, quando há alguns anos a minha vida perigou, mas, sobretudo, onde desejaria viver. Querida Angola.”

António Champalimaud com a família e amigos numa caçada em Moçambique. Em cima, João F. Mayer, Cristina Lino, João Champalimaud, Isabel L. Marques; em baixo: Luís e António Champalimaud e Maria da Luz Abreuarquivo pessoal


Champalimaud, o colosso dos cimentos
O milionário António Champalimaud ainda não tinha 27 anos quando embarcou para Moçambique para reconstruir os Cimentos da Matola. Antes de lá chegar, fez escala em Angola e começou a cimenteira do Lobito.
“A Companhia dos Cimentos de Angola tinha uma grande fábrica no morro fronteiro à cidade do Lobito”, recorda Marques Leandro. “Também tinham fábricas em Luanda e na Beira [em Moçambique] e controlava a Siderurgia Nacional de Angola. Exportavam cimento para todo o lado”, acrescenta o antigo presidente da câmara de Nova Lisboa.
Além da indústria, o grupo português estava nos seguros (com a Companhia de Seguros Fidelidade Atlântica), era acionista da Nocal (Empresa de Cervejas de Angola) e do jornal O Comércio, e controlava o Banco Pinto & Sotto Mayor, uma das instituições financeiras que mais crédito concedia em Angola e que estava, também, em Moçambique. António Champalimaud era um apaixonado por África.


Espírito Santo, os donos do açúcar
Em 1970, o Grupo Espírito Santo (GES) era dono da maior fazenda de café do mundo, na Gabela, responsável por cerca de 10% do café produzido em Angola. Também era do GES o monopólio da produção de açúcar, através da Companhia Agrícola do Cassequel e da Companhia do Açúcar de Angola, que controlavam muitas outras empresas de menor dimensão, nomeadamente fazendas de sisal e de bananas.
Tinham, além disso, uma empresa na área da construção, a Cimianto de Angola. Em 1973, participaram na fundação, em Luanda, do Banco Interunido, uma filial comum do Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa (BESCL) e do First National City Bank, do milionário americano John D. Rockefeller.
Foi também com Rockefeller e com o grupo colonial Motta Veiga que criou a Companhia de Fosfatos de Angola (COFAN). José Maria do Espírito Santo, Manuel Ribeiro e António Espírito Santo foram os maiores impulsionadores dos negócios em África.




CUF, o monopólio da navegação
A CUF, o maior grupo industrial português, dominava o negócio da navegação em Angola, através da Companhia Nacional de Navegação. Tinha, além disso, vários outros negócios no País: o milionário Alfredo da Silva era dono de fábricas de sabões e de óleos, de empresas de pesca e de roças de palmares, mas também de participações em produções de gado e de tabaco.
No comércio, era acionista dos supermercados Pão de Açúcar, uma parceria com investidores brasileiros. Desde 1966 estava também na banca, com o Banco Totta Standard de Angola e na fábrica de sacaria (de sacos, portanto) SIGA. Em Moçambique estava igualmente no negócio da navegação e na indústria. No fim dos anos 60, começou a investir no turismo dos dois países, com a Navetur.


Cupertino de Miranda, pioneiro da banca
Era acionista fundador do Banco Comercial de Angola, o primeiro banco privado do País, com 50% do capital. Em 1970, o BCA internacionalizou-se para Moçambique, com agências em Lourenço Marques, Beira e Nampula.
Era através desta instituição financeira que Cupertino de Miranda controlava participações maioritárias numa dezena de empresas, como a Algodoeira de Fomento Colonial, a Alumínio Português (Angola) e a Vidrul. Era, também, o principal acionista privado de uma das maiores têxteis de Moçambique, a Text’África, que tinha aeroporto, avião, 350 casas para os trabalhadores e até um caçador.
“A equipa de futebol da Text’África foi a primeira campeã nacional de Moçambique e a equipa de tiro aos pratos campeã de Portugal”, conta Frederico Magalhães, filho de Manuel Magalhães, que geriu a empresa.


O famoso prédio azul da Cuca, em Luanda, com 12 pisos, onde o empresário Manuel Vinhas fez um apartamentoJean-Charles Pinheira
Uma saída atribulada
José Domingos Antunes pegou em quatro barcos com os trabalhadores e famílias que quiseram embarcar, e rumou à África do Sul . “Um dos navios foi vendido lá, para pagar as despesas da viagem”, diz à SÁBADO o antigo funcionário Armando Cardoso.
A ideia era ficar em Lisboa mas, como não os deixaram atracar, seguiram para o Brasil.” Do outro lado do Atlântico, e sem autorização para trabalhar em águas territoriais brasileiras, pescavam ao largo e vendiam em alto mar, o que não era rentável – os navios acabaram por ser vendidos.

Ana Taborda

https://www.sabado.pt/vida/detalhe/as-grandes-fortunas-das-antigas-colonias

sexta-feira, 10 de março de 2023

“Ninguém acredita que o governo não soubesse da indemnização” paga pela TAP. Juridicamente, “isso não existe”


A mentira é vulgar e faz parte do dia-a-dia

Juridicamente, uma empresa não pode chegar a acordo para a saída de um administrador sem que o accionista saiba – e o accionista da TAP é o Estado, representado pelo governo.

A explicação é do advogado João André Antunes, sócio da Pinto Ribeiro Advogados e especialista em direito societário, que afirmou ainda na CMVM que, na sua análise, a comunicação enviada pela TAP à CMVM foi incorrecta.

Em causa está a saída de Alexandra Reis da administração da TAP com uma indemnização de meio milhão de euros, que está a marcar um vendaval político que já levou à demissão da própria Alexandra Reis do governo, onde tomara posse há poucas semanas. A polémica política depende também de questões legais, sendo neste momento relevante saber quem decidiu, aprovou e interveio no processo de indemnização de Alexandra Reis na TAP, que quatro meses depois seria escolhida pelo mesmo Estado para presidir à NAV.

“O Conselho de Administração não nomeia administradores”, pelo que também “não tem a capacidade de destituir por si só [um administrador], de mandar pessoas embora, não pode fazê-lo. Tem de o fazer sempre com o acordo de quem os nomeou”, explica João André Antunes, que ressalva estar a falar da aplicação da lei em abstracto.

É pois “muito difícil acreditar” que o Conselho de Administração da TAP tivesse negociado o acordo sem que o accionista soubesse. “Ninguém acredita que o governo não soubesse”, assevera o advogado. “O Conselho de Administração é quem representa a empresa mas não é quem decide este tema pela empresa… Se alguém manda embora um administrador sem o conhecimento do accionista - isso não existe”, completa. Se o tivesse feito sem informar o accionista, isso seria “uma violação grave dos deveres do Conselho de Administração , gravíssima”.

Em causa está também a forma como a TAP comunicou então a saída de Alexandra Reis, para aferir se disse ou não a verdade à CMVM. Porque a companhia tem “deveres de reporte”, o que a obriga a “ser completamente transparente”, acrescenta João André Antunes. Na análise do advogado o que a TAP comunicou, dizendo que Alexandra Reis tinha renunciado ao cargo na TAP, “não é uma informação verdadeira. E nem sequer é uma informação completa”. Porque “quando se escreve ‘renúncia’ e não se escreve ‘acordo de revogação’, ou não se escreve que ‘chegaram a acordo’”, não se está a prestar a informação verdade. “Há regras”, sublinha.

CNN-28.12.2022