Já foram várias centenas e rondam agora os 300. Alguns recebem salário e não têm tarefas atribuídas. Estatuto Material dos Funcionários, documento que não é público, foi revisto em 1998.
Ser funcionário do PCP é “servir com grande disponibilidade um ideal político”, é ser “um revolucionário profissional” mesmo “à custa de sacrifícios e perdas”. É assim que o PCP tem descrito sucessivamente nas suas reuniões o que significa ser funcionário do partido, uma realidade que saltou agora para os holofotes mediáticos por causa de Paulo Raimundo, o futuro secretário-geral do PCP, que, aos 46 anos, tem tal função como o principal ponto do seu currículo. Em 2020, segundo a resolução política do comité central eleito no congresso desse ano, o número de empregados do partido era “de mais de 300 (incluindo reformados no activo, cujo número aumentou)”. Em 2008, por exemplo, chegavam a ser 350 (números da organização do XVIII congresso).
A maior parte dos funcionários é recrutada entre membros da JCP e há uma preocupação da direcção do partido em que as suas origens sejam proletárias. Isso mesmo se lê, por exemplo, na resolução do XX congresso, em 2016, que regista “insuficiências na organização do partido nas empresas e locais de trabalho que se reflectem no recrutamento de operários para o quadro de funcionários do partido”.
É preciso “prestar cuidadosa atenção à origem social dos quadros, particularmente dos funcionários, não perdendo de vista que o reforço do partido está estreitamente ligado à composição social dos seus quadros”, sublinhava, por sua vez, a resolução aprovada no XVII congresso, em 2004.
Mesmo já funcionários, estes militantes são acompanhados de perto e a sua doutrinação política é contínua. São obrigados a frequentar “cursos e acções de formação política e ideológica” e a manter “o estudo de documentos fundamentais do partido, o seu programa, os estatutos, as resoluções de congresso, os clássicos de marxismo-leninismo, a obra de Álvaro Cunhal, a história do partido e da revolução portuguesa”, como explicava José Capucho, membro do secretariado do PCP no XX congresso do PCP, em Almada, em Dezembro de 2016.
Coube a José Capucho, durante muitos anos, a tarefa de fazer esse balanço sobre “Os Quadros e a Formação Política e Ideológica” em vários congressos, a partir de 2000. Antes disso, a tarefa estava nas mãos do histórico José Vitoriano, dirigente oriundo do Algarve, que passou a funcionário do partido na clandestinidade nos anos 1950, que esteve preso duas vezes (somou 17 anos de prisão) e foi deputado à Assembleia da República entre 1977 e 1987, chegando a ser vice-presidente do Parlamento.
José Capucho aderiu ao PCP só em 1975 e tornou-se funcionário em 1986, destacando-se como dirigente da Organização Regional de Setúbal.
“Sacrifícios” e estudo da obra de Cunhal
E que “sacrifícios e perdas” são essas, para que sempre alertava José Vitoriano? De acordo com os mesmos documentos, consultados pelo PÚBLICO, trata-se de sacrifícios a dois níveis: financeiros e de preconceitos sociais.
As questões financeiras estão reguladas por um documento que se chama Estatuto Material dos Funcionários. Em 1996, o PCP assumia que era preciso dar “uma maior atenção e melhorar as suas condições de vida e de trabalho” e, em 1998, foi efectivamente feita uma revisão daquele estatuto, a crer pela resolução aprovada no XVI congresso em 2000: “A revisão do Estatuto Material dos Funcionários, realizada em 1998, foi por sua vez mais um passo na consideração e atenção às condições de vida e de trabalho dos funcionários, que há que continuar a aprofundar, no quadro das disponibilidades financeiras do partido.”
Ao PÚBLICO, fonte oficial do partido adiantou apenas que o salário-base ilíquido, ao abrigo do Estatuto Material dos Funcionários, é de 800 euros mensais. A mesma fonte não quis revelar quais os subsídios que acrescem a este salário.
Pelo que o PÚBLICO soube junto de funcionários do partido, existe a regra de estes não irem ganhar mais do que aquilo que estavam a auferir no último trabalho que tiveram, estando obrigados a comunicar ao partido as despesas variáveis que vão tendo ao longo da vida com habitação ou encargos com filhos (há um apoio extra atribuído em função do número de menores dependentes).
Outra dificuldade tem que ver com “os ataques e calúnias” de que são alvo, nas palavras de dirigentes como José Capucho, que considera que são perpetrados por “oportunistas e inimigos de classe”.
Há ainda outro pormenor que é o facto de, pelos vistos, haver funcionários que não têm tarefas de organização atribuídas, ou seja, não têm a seu cargo uma célula (como os trabalhadores de um sector específico) ou um grupo de militantes (como uma organização concelhia). Isso mesmo ficou plasmado nos documentos do XVII congresso, em 2004, em que, na parte sobre a situação financeira do PCP, é traçado como um dos objectivos “diminuir o peso relativo de funcionários sem tarefas na organização”.
Nesta lógica de centralismo democrático, existe uma espécie de rede em pirâmide, em que cada militante tem um “controleiro” que deve ser o seu primeiro e único interlocutor superior.
O peso dos funcionários no comité central, principal órgão entre congressos, porém, tem vindo a diminuir ao longo dos anos. Em 1996, era de 68% e em 2012 era de 62,5% (número publicado no Avante!, jornal oficial do PCP).
“Espinha dorsal” do PCP
Durante os anos de clandestinidade, os funcionários eram essenciais para a sobrevivência do PCP (“a espinha dorsal”), pois era graças a esta rede que o partido difundia a sua ideologia e fazia oposição ao regime do Estado Novo. Nessa altura, as próprias famílias dos presos políticos eram apoiadas financeiramente pelo partido, que vivia sobretudo de donativos discretos. Actualmente, as maiores fontes de rendimento do PCP são as quotizações dos seus militantes (na casa dos 40 mil), as receitas da anual Festa do Avante!, as subvenções públicas e a tradicional fatia de donativos que os eleitos do PCP nos diversos órgãos políticos fazem para o partido.
O Ex-dirigente e Ex-militante Domingos Lopes escrevia neste domingo no Expresso um artigo de opinião em que lamentava a forma como um núcleo de funcionários do partido, fechado em si próprio, manda cada vez mais no PCP. “A direcção do PCP foi instalando na direcção do partido, nos deputados da AR, no movimento sindical, nas organizações de massas os seus mais fiéis quadros, em suma, aqueles em que podia confiar, mesmo contra o próprio tempo. Estava assim criado o partido em que uma dezena controla toda a vida partidária através daquilo a que chamam “centralismo democrático” e de uma caricatura do marxismo-leninismo, coisa que provavelmente nem Marx nem Lenine teriam propugnado”, defendeu.
O PÚBLICO pediu nesta segunda-feira de manhã ao gabinete de comunicação que indicasse um dirigente que explique o que significa ser-se funcionário do PCP, mas o partido não mostrou disponibilidade, tal como não divulgou o Estatuto Material dos Funcionários.
O peso dos funcionários no comité central, principal órgão entre congressos, porém, tem vindo a diminuir ao longo dos anos. Em 1996, era de 68% e em 2012 era de 62,5% (número publicado no Avante!, jornal oficial do PCP).
“Espinha dorsal” do PCP
Durante os anos de clandestinidade, os funcionários eram essenciais para a sobrevivência do PCP (“a espinha dorsal”), pois era graças a esta rede que o partido difundia a sua ideologia e fazia oposição ao regime do Estado Novo. Nessa altura, as próprias famílias dos presos políticos eram apoiadas financeiramente pelo partido, que vivia sobretudo de donativos discretos. Actualmente, as maiores fontes de rendimento do PCP são as quotizações dos seus militantes (na casa dos 40 mil), as receitas da anual Festa do Avante!, as subvenções públicas e a tradicional fatia de donativos que os eleitos do PCP nos diversos órgãos políticos fazem para o partido.
O Ex-dirigente e Ex-militante Domingos Lopes escrevia neste domingo no Expresso um artigo de opinião em que lamentava a forma como um núcleo de funcionários do partido, fechado em si próprio, manda cada vez mais no PCP. “A direcção do PCP foi instalando na direcção do partido, nos deputados da AR, no movimento sindical, nas organizações de massas os seus mais fiéis quadros, em suma, aqueles em que podia confiar, mesmo contra o próprio tempo. Estava assim criado o partido em que uma dezena controla toda a vida partidária através daquilo a que chamam “centralismo democrático” e de uma caricatura do marxismo-leninismo, coisa que provavelmente nem Marx nem Lenine teriam propugnado”, defendeu.
O PÚBLICO pediu nesta segunda-feira de manhã ao gabinete de comunicação que indicasse um dirigente que explique o que significa ser-se funcionário do PCP, mas o partido não mostrou disponibilidade, tal como não divulgou o Estatuto Material dos Funcionários.
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