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Texto:
O ex-adjunto acusa António Costa de ter dado o benefício da dúvida a Sócrates — "à justiça o que é da justiça" — enquanto a ele o condenou sumariamente: "É insultuoso, difamatório, injurioso".
Frederico Pinheiro, antigo adjunto de Pedro Nuno Santos e João Galamba, foi acusado de roubo de um computador pelo primeiro-ministro e pelo ministro das Infra-Estruturas. O SIS foi chamado a intervir e telefonou-lhe à noite, para reaver o computador pessoal que pertencia ao Ministério das Infra-Estruturas.
Vamos àquela noite em que o SIS o abordou…
Em relação a esse episódio, que aconteceu há cerca de meio ano, vou ser completamente honesto: eu tenho muita dificuldade em rever tudo aquilo que aconteceu. Não é dificuldade em lembrar-me. Foi algo muito violento emocionalmente. Só muito recentemente é que consegui assistir na totalidade às conferências de imprensa que o senhor primeiro-ministro e o senhor ministro das Infra-Estruturas deram sobre este caso. Estive meses a preparar-me para ouvir e eu já sabia o que é que diziam porque tinha lido nos jornais. Mas é algo duro, insultuoso, difamatório, injurioso. E, do ponto de vista pessoal, não é fácil ouvir aquilo.
Sou abordado diariamente por pessoas que não conheço, cidadãos completamente anónimos, a expressarem a sua solidariedade, porque creio que perceberam que, num determinado momento, responsáveis políticos com um poder muito grande utilizaram uma narrativa injuriosa, falsa, apenas por motivos políticos. Creio que existe uma dificuldade muito grande no nosso país em perceber como é que um primeiro-ministro que, perante um caso que envolvia um, na altura camarada seu do Partido Socialista, antigo primeiro-ministro, se escudou correctamente numa formulação de dizer que "à justiça o que é da justiça…"...
Estamos a falar de José Sócrates...
Exactamente. E [reage de maneira diferente] num caso perante o qual não tinha informação e que envolvia um trabalhador do Governo que, dias antes, era considerado leal, era considerado competente, era considerado honesto e sincero ao ponto de participar em reuniões altamente sensíveis...
Das negociações da TAP...
Uma ou duas semanas antes de tudo o que aconteceu, participei em reuniões altamente sensíveis. Como é que, passado um ou dois dias, estava a ser injuriado, difamado e insultado pelo primeiro-ministro e pelo ministro das Infra-estruturas em directo, perante milhões de portugueses, acusado de agressões e de roubo? São acusações graves e obviamente que, para mim, é difícil ainda rever tudo o que aconteceu nessa altura.
O que está a dizer é que foi condenado sumariamente pelo primeiro-ministro, ao contrário do que aconteceu com José Sócrates?
Publicamente, sim, pelo primeiro-ministro e pelo ministro das Infra-Estruturas, que fazem as acusações que estão a fazer.
Avançou com um processo contra o primeiro-ministro e o ministro das Infra-Estruturas por difamação?
Não, ainda não avancei. Mantenho todas as hipóteses legais em aberto. Ainda estamos dentro dos prazos legais. Eu tenho dois filhos, um com seis anos e outro com quatro, que felizmente ainda não percebem o que é que aconteceu. Não viam notícias. Não viram o pai a ser insultado, injuriado na televisão. Isso foi uma das minhas principais preocupações, proteger os meus filhos desse processo. Sei que se avançar judicialmente para proteger os meus direitos e o meu bom-nome na justiça contra entidades políticas tão poderosas, à medida que o tempo vai passando, os meus filhos podem-se aperceber do que está a acontecer. E eu pondero bastante essa situação.
Admite não avançar em nome dos seus filhos?
Na verdade, também para me proteger e para proteger a minha família, porque estamos a falar de processos que são muito longos, são violentos também do ponto de vista pessoal e público. Eu passei por um processo em que foram utilizados todos os instrumentos de coacção que poderiam ser utilizados. Nunca imaginei ter o SIS à minha porta ou a telefonar a meio da noite. Portanto, posso imaginar o que é que pode acontecer se eu avançar uma acção judicial por difamação e injúria contra o primeiro-ministro e contra o ministro das Infra-Estruturas… Creio que é totalmente justificada, obviamente, mas é um processo de decisão que ainda não encerrei.
Como é que é hoje a sua vida? É jornalista, voltou à sua profissão de origem...
Eu estive 16 anos fora da profissão. Mas é de inteira justiça referir a sensibilidade que a administração da RTP teve na minha integração, a direcção de Informação e a equipa na qual estou integrado neste momento, a RDP África, que acabou de ser premiada com o Prémio Gazeta Rádio 2022. Encontrei uma equipa extraordinária, com muita sensibilidade para perceber o que aconteceu e que me tem dado todo o apoio do mundo.