quinta-feira, 27 de maio de 2021

Os 15 bairros mais perigosos de Portugal.

Estes são os bairros mais perigosos de Portugal e, infelizmente, a situação parece não melhorar. São os bairros mais problemáticos de Portugal e situam-se na periferia das grandes cidades e neles abundam os problemas sociais e a criminalidade, sobretudo praticada por gangues de jovens. As autarquias têm apostado no apoio social e na inclusão dos seus habitantes, mas muito há ainda para fazer.

A existência destes bairros faz com que existem zonas a evitar em Lisboa e no Porto (e nas suas áreas metropolitanas, ou seja, na periferia de Lisboa e do Porto).

Muitos destes bairros são os designados “bairros sociais”, ou seja, bairros que foram construídos para realojar pessoas que viviam anteriormente em bairros de lata (favelas) ou em barracas.

No entanto, importa ressalvar que, mesmo sendo alguns dos locais mais problemáticos das áreas urbanas de Lisboa e do Porto, aqui também moram boas pessoas, trabalhadoras e cumpridoras das regras cívicas mais elementares e que não devem ser confundidas com quem, efectivamente, comete crimes e causa problemas. Descubra os 15 bairros mais perigosos de Portugal.


1. Bairro da Bela Vista (Setúbal)

bairros mais perigosos de Portugal

Os primeiros realojamentos de famílias residentes em barracas e de refugiados das Ex-colónias datam de 1980. O bairro tem sido palco de vários desacatos. A 7 de Maio de 2009 voltou a ficar a ferro e fogo quando os moradores se revoltaram contra a PSP, após o funeral de um amigo, morto a tiro pela GNR.

A Câmara de Setúbal disse, depois, que quer desmantelar o bairro. Agora, o Sindicato Profissional da Polícia juntou-se ao Centro Cultural Africano e aos Sapadores Bombeiros para criarem um gabinete de gestão de conflitos.


2. Chelas (Lisboa)

Chelas


Notícias de tiroteios, perseguições de última hora, agressões à polícia e nas escolas. É assim que Chelas é apresentada nos telejornais e nas manchetes dos jornais portugueses. Um antro de violência a menos de dez estações de metro ou 15 minutos de carro da Praça do Comércio, onde turistas queimados pelo sol bebem gins tónicos e comem petiscos “portugueses” de óculos escuros na cara.

Para muita gente, Chelas é só mais um “bairro periférico”. Mas o estatuto de periferia é uma decisão política – Chelas não é mais longe da Praça do Comércio do que as Amoreiras, o Areeiro, Campo de Ourique, Campolide, Parque das Nações ou Alcântara. Ainda assim, taxistas não conduzem para o bairro, pizzarias recusam-se a levar lá comida.


3. Bairro da Jamaica (Seixal)

Bairro da Jamaica (Seixal)

Bairro da Jamaica (Seixal)

A Urbanização do Vale de Chícharos no Seixal, concelho do distrito de Setúbal (Grande Lisboa), acolhe, na sua maioria, imigrantes dos países africanos de língua portuguesa. Há quem viva no bairro há mais de 20 anos. Os prédios inacabados, propriedade da Urbangol, uma sociedade sedeada num paraíso fiscal com dívidas ao fisco, foram ocupados por pessoas de baixa renda que não tinham condições para comprar uma casa. Aguardam, ao longo destes anos, pela promessa de realojamento por parte da autarquia local.

Por uma das entradas do Jamaica, os visitantes são recebidos por estes murais pintados na parede que cerca a instalação de transformadores da EDP, Energias de Portugal. As pinturas expõem os sentimentos de mudança e a visão do mundo por parte dos artistas que aspiram viver em um bairro melhor.


4. Bairro Amarelo (Almada)

Bairro Amarelo (Almada)

Bairro Amarelo (Almada)

Também conhecido pelo Bairro do Picapau Amarelo, na outra banda, perto da Costa de Caparica, este aglomerado de casas e prédios tem sido muitas vezes cenário de reportagens pelos piores motivos. Alguns realojamentos feitos sem planeamento prévio têm gerado conflitos entre vizinhos e famílias realojadas.


5. Bairro Portugal Novo (Lisboa)

Bairro Portugal Novo

Bairro Portugal Novo

Construído na década de 70 por uma cooperativa de habitação (Ex-SAAL ou “Serviço Ambulatório de Apoio Local”), entretanto falida, este bairro situa-se perto da Rotunda das Olaias e está hoje numa situação confusa no que respeita à propriedade das habitações apresentando hoje um elevado grau de degradação e abandono. Ocupações de casas, arrombamentos seguidos de ocupação de casas de idosos recentemente falecidos, vendas e alugueres ilegais e até empréstimos com agiotagem são hoje comuns.

Está tudo chamuscado de pequenas fogueiras junto das empenas dos prédios e nas entradas. Não existe um canteiro, um parque para as crianças brincarem, uma bica de água, um banco na sombra de uma árvore. O que há são janelas e portas entaipadas ou completamente destruídas, lixo espalhado por ruas que nem ruas são. Dura isto há vinte anos.


6. Bairro Pinheiro Torres (Porto)

Bairro Pinheiro Torres (Porto)

Bairro Pinheiro Torres (Porto)

Assumiu nos últimos anos um novo protagonismo, com o tráfico de droga a ser o maior flagelo. As autoridades referem que é um dos principais focos de criminalidade da cidade. Já houve homicídios, em 2008, motivados por confrontos motivados por tráfico de droga.


7. Bairro Quinta da Fonte (Loures)

bairros mais perigosos de Portugal

Bairro Quinta da Fonte (Loures)

É um bairro de construção clandestina que recebeu, depois de 1977, muitas pessoas que viviam em bairros de lata na área de Lisboa e arredores. Trata-se de um bairro jovem: cerca de 50% dos seus habitantes têm menos de 20 anos. A grande maioria é de origem africana: 75% são cabo-verdianos, mas há também guineenses e angolanos.

Nos últimos anos, trabalhadores dos países de leste também encontram abrigo no bairro. Quanto a portugueses são essencialmente oriundos do interior do País. Bairro de má fama, foi palco de vários confrontos violentos entre polícia e traficantes.

A maioria da população activa masculina trabalha na construção civil (44,5%). As mulheres trabalham essencialmente no serviço doméstico e de limpeza.


8. Quinta do Mocho (Loures)

bairros mais perigosos de Portugal

Quinta do Mocho (Loures)

A ocupação do bairro começou na década de 70, com imigrantes das antigas colónias.

Hoje, 90% dos habitantes são de origem africana. Em Agosto de 2008, um tiroteio entre dois gangues rivais originou a morte de um rapaz de cerca de 20 anos.


9. Bairro do Cerco (Porto)

bairros mais perigosos de Portugal

É o segundo maior bairro do Porto, com muitos problemas de crime e toxicodependência. Recebeu parte da população desalojada pela demolição do bairro de São João de Deus.

Roubos e apreensões de armas são habituais. Existe um Contracto Local de Segurança, que ontem inaugurou o seu espaço no bairro.


10. Quinta da Princesa (Seixal)

bairros mais perigosos de Portugal

Quinta da Princesa (Seixal)

Inaugurada há cerca de 30 anos, a Quinta da Princesa é um bairro social onde várias raças se cruzam, sendo a esmagadora maioria de origem africana.

A 10 de Dezembro de 2008 o bairro foi notícia porque alguns moradores mantiveram presos cinco rivais da Cova da Moura, guardados por cães de raça ‘pit bull’. O caso, conhecido como “Cárcere Privado”, resultou de um ajuste de contas por alegados negócios de tráfico de droga mal sucedidos em 2006.


11. Cova da Moura (Amadora)

bairros mais perigosos de Portugal

Cova da Moura (Amadora)

A ocupação maciça aconteceu em 1977. 75% da população é cabo-verdiana. O bairro, de construção clandestina, tem uma população jovem.

É conhecido pelas ligações ao tráfico de droga e de armas, e relatórios associam-no a muita da criminalidade violenta verificada em Lisboa.


12. Bairro Branco (Almada)

bairros mais perigosos de Portugal

No aglomerado de habitação social no Monte de Caparica (Almada), o chamado Bairro Branco é identificado pela população como um local pouco seguro. Os prédios pintados de branco, pouco cuidados, não convidam à permanência.

O tráfico de droga é um dos crimes mais frequentes, mas também há relatos de furtos de carros e lutas ilegais de cães. A esquadra mais perto fica no Pragal. Está prevista a construção, no Monte de Caparica, de um posto da GNR.


13. 6 de Maio (Amadora)

bairros mais perigosos de Portugal

6 de Maio (Amadora)

Juntamente com a Cova da Moura, o Estrela d’África e o Santa Filomena, é um considerado um dos mais perigosos bairros do concelho da Amadora.

Tráfico de estupefacientes e de armas e roubo são os principais crimes identificados ali pelas autoridades policiais, que quase sempre têm dificuldade em entrar neste labirinto à beira da Estrada Militar. Não são raros os episódios de confronto entre os moradores e a PSP, com detenções, feridos e desacatos.


14. Bairro Casal da Mira (Amadora)

Bairro Casal da Mira

Quem vive no Casal da Mira, na Amadora, onde foram realojadas mais de 700 famílias que viviam em barracas, ainda sente o preconceito que o estigma de bairro problemático constrói, mas já trabalha para “um bairro melhor”. O realojamento aconteceu entre 2004 e 2005 para dar casa a milhares de pessoas que viviam em barracas na Azinhaga dos Besouros, na zona envolvente ao que é agora a Circular Regional Interior de Lisboa (CRIL), e permitir construir a via.

Vivem no bairro cerca de 2.500 pessoas. Durante anos, o espaço viveu isolado. Está no alto de uma colina e nem o autocarro lá subia. O Casal da Mira foi aparecendo nos jornais e na televisão pelas piores razões: desacatos, armas, drogas. Foi envergonhando quem ali vive, criando em torno do nome do bairro um preconceito difícil de gerir, por exemplo, na escola ou quando se procura um emprego.


15. Bairro do Aleixo (Porto

Bairro do Aleixo (Porto)

Bairro do Aleixo (Porto)

É conhecido como o hipermercado da droga do Grande Porto, registando frequentes incidentes. No ano passado, um tiroteio entre famílias levou à intervenção da PSP. Há relatos de várias agressões.

A polícia só entra no bairro, em especial na Torre 1, com um contingente especial. Constituído por cinco torres, está anunciada a sua demolição, mas os moradores têm lutado para travar essa medida.

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Os novos donos do Alentejo.

Paulo Barriga

Cerca de 70% do território agrícola do Alqueva mudou de mãos nos últimos 10 anos. Seis grupos detêm ou gerem mais de 65% dos olivais da região. Graças aos novos olivais alentejanos, Portugal passou de importador crónico a quinto maior exportador mundial de azeite.

Novos Donos do Alentejo

Índice

Novos Donos do Alentejo

Alqueva é a obra de regime da época dourada do betão nacional. Quando a 8 de Fevereiro de 2002 o primeiro-ministro pegou num walkie-talkie para ordenar o fecho das comportas da grande barragem, o que animou António Guterres não foi o eventual anúncio de um mundo novo para a agricultura portuguesa. Foi, isso sim, a glorificação da era das obras públicas que tinha atingido o apogeu com a exposição mundial de 1998 e cujo declínio se avizinhava com a realização do campeonato europeu de futebol de 2004. Alqueva era então a cereja no topo da argamassa.

Só assim se explica que não tivesse havido amanhã para o regadio de Alqueva; que ninguém tivesse pensado no dia seguinte. E que ainda hoje, passados quase 18 anos e mais de 2 mil milhões e meio de euros de investimento público depois, não exista um plano de ordenamento, uma estratégia de desenvolvimento para a área regada, ou sequer a definição de uma política agrícola que garanta a sustentabilidade do território. Como afirma Francisco Palma, presidente da Associação de Agricultores do Baixo Alentejo (AABA), o Alqueva foi mais "uma exigência das empresas de obras públicas" do que uma "aposta no desenvolvimento da região com base no recurso natural água".
Enquanto o Estado se deteve na obra em si, foram os privados - nomeadamente o sector olivícola andaluz -, que olharam para o Alqueva como um novo eldorado. E não tardou que se iniciasse uma verdadeira corrida pelo uso e pela posse da terra, antes mesmo de estarem concluídos os primeiros circuitos hidráulicos e blocos de rega. "O preço da terra significativamente menor do que o praticado na Andaluzia e, é claro, a disponibilidade de água" impulsionaram em definitivo a "invasão" espanhola, constata Marino Uceda Ojeda, professor jubilado da Universidade de Jaén e consultor internacional de olivicultura.
O proprietário tradicional alentejano, ainda não restabelecido dos efeitos da Reforma Agrária, condicionado pelas directivas da Política Agrícola Comum (PAC) e depauperado em virtude dos sucessivos anos de seca da década de 90, pouca ou nenhuma resistência ofereceu à investida estrangeira. Apesar de não existirem dados oficiais sobre a transacção de propriedades agrícolas na zona de intervenção do Alqueva, as organizações de agricultores estimam que, nas últimas duas décadas, entre 60% e 70% do território produtivo tenha mudado de mãos.
E se hoje o investidor deixou de ter rosto e são os grandes fundos financeiros internacionais que apostam no "activo terra", nos seus primórdios o Alqueva constituiu-se como uma "extensão natural" dos olivais andaluzes que actualmente, sem espaço para crescer, ocupam mais de 1,6 milhões de hectares de território agricultável, segundo dados do Ministério da Agricultura espanhol. A grande nuance entre um e o outro lado da fronteira é que "na Andaluzia é muito difícil obter concessão de água para novos olivais", realça o investigador Marino Ojeda. Já em Portugal, não só não é imposta qualquer restrição ao consumo agrícola até aos 600 milhões de metros cúbicos, como está em marcha o plano de alargamento do perímetro regado do Alqueva em mais 50 mil hectares, que ficarão dependentes da reserva de água existente.
O forte incremento da cultura intensiva do olival, que em Dezembro de 2019 ocupava 56.488 dos 100 mil hectares de terrenos em produção, de acordo com a Empresa de Desenvolvimento e Infra-estruturas do Alqueva (EDIA), está a provocar profundas alterações no território. Não apenas na paisagem, onde o dourado temporário das searas de cereais cedeu em permanência lugar ao verde-petróleo da oliveira, mas também ao nível da ecologia, da economia, da estrutura fundiária e até da demografia e da vida social.

Novos Donos do Alentejo

A terra a quem a trabalha


António Merêncio tinha acabado de completar 28 anos quando, a 10 de Dezembro de 1974, liderou o rancho de camponeses que deu início ao processo de Reforma Agrária nos campos do Sul de Portugal. Foi no Monte do Outeiro, em Santa Vitória, Beja. Lá, onde "o sonho se tornou realidade" e onde a realidade, em apenas oito anos, se haveria de transformar em "pesadelo", revive o antigo trabalhador rural. Com efeito, não durou muito a primeira experiência coletivista no Alentejo pós-revolucionário. Intrigas no seio do grupo, incompatibilidades ideológicas e impreparação para pôr em prática um novo modelo de gestão agrícola, depressa deitaram por terra a Unidade Coletiva de Produção que, de forma simbólica, levou o nome de Vanguarda do Alentejo.
Em 1975, a ousadia dos sem-terra do Outeiro chegou à capa da revista Time e abriu telejornais na principal rede televisiva do Japão. "Estávamos no caminho certo." E se dúvidas algum dia lhe assistiram, é quando hoje visita o Monte do Outeiro que António Merêncio se enche de certezas: "Sim, era possível." Aquilo que os olhos do antigo sem-terra alcançam é o mar de oliveiras plantadas em regime super-intensivo, em sebe, que ocupam a quase totalidade dos 360 hectares que compõem a herdade. "Ironia do destino", diz Merêncio quando reconhece que, por fim, as terras do Outeiro estão nas mãos de quem as trabalha.
E quem as trabalha é nada mais, nada menos do que a Elaia, empresa detida em partes iguais pelo fundo de investimento espanhol Atitlan e pela Nutrinveste SGPS, a holding do setor agro-industrial do grupo Jorge de Mello que detém na totalidade o grupo Sovena, "o maior projeto mundial de azeite", de acordo com o diretor-geral adjunto da Elaia, Vasco Cortes Martins. O Monte do Outeiro, onde se iniciou a Reforma Agrária, está a ser igualmente parte integrante do maior movimento de concentração de terras de que há memória no Alentejo. Só a Sovena, segundo o Anuário Agrícola de Alqueva 2018, possui cerca de 10 mil hectares de olivais, o que perfaz 17,7% da área total ocupada por esta cultura permanente.
Não só não foram alcançados, como acabaram efetivamente pervertidos os dois objetivos capitais que presidiram à fundação do regadio de Alqueva: o desmembramento do grande latifúndio e a diversificação de culturas. Com efeito, o avanço massivo do olival deitou por terra a constituição de um mosaico pluricultural e, devido à necessidade de obter escala no negócio olivícola, boa parte das propriedades rurais acabaram concentradas como nunca antes na história do Alentejo. Aquela que fora anunciada como a "verdadeira reforma agrária" depressa sucumbiria perante o avanço desregrado da monocultura do olival.
Ao dia de hoje, e a tendência concentracionista mantém-se ambiciosa, apenas três entidades, com a Elaia e a gigante agroalimentar espanhola De Prado à cabeça, mas onde se pode incluir também a empresa espanhola de gestão agrícola Aggraria, detêm ou gerem 46% dos cerca de 56 mil hectares de olivais plantados no Alqueva. E esta cifra pode atingir os 65,5% se a estes três "colossos" se juntarem a Olivomundo, a Innoliva e a Bogaris. Os restantes 740 clientes inscritos com olival no balcão da EDIA operam os sobrantes 30% da mancha olivícola.Novos Donos do Alentejo

Chamava-se Catarina

Há uma foice e um martelo em lata, pincelados de cinzento, que anunciam o local exato onde Catarina Eufémia foi baleada por um tenente da GNR, em 19 de maio de 1954. Foi no Monte do Olival, em Baleizão. O destino tem destes acasos. Para além do monumento e da reminiscência das lutas rurais que ainda perdura na memória dos mais idosos, pouco ou nada ali resta do velho Alentejo agrícola das searas, das ceifas e das mondas à força de trabalho braçal. A aldeia, como tantas outras no Alqueva, está sitiada por olivais. Toda a vida social e económica depende da cultura da azeitona. "A agricultura como até aqui a conhecíamos não existe mais. Isto está a mudar a uma velocidade louca e nem o Estado, nem ninguém, parece ter capacidade para pôr um travão no assunto", diz Joaquim Silva.
Foi no Monte do Olival que a empresa familiar de Joaquim Silva plantou, em 1998, quatro anos antes do encerramento das comportas de Alqueva, um dos primeiros olivais intensivos do Alentejo. "Por causa dos subsídios que eram dados, chamavam-lhe oliveiras da CEE", ironiza. Mas nem os apoios comunitários, nem o chamamento da terra obstaram a que o Monte do Olival, e as herdades contíguas das Fontes e do Carapetalinho, fossem vendidas em 2017 a um fundo financeiro francês e que as terras passassem a ser administradas por uma das várias empresas de gestão de "carteiras" agrícolas que operam na região, a CH Business Consulting, propriedade de Brigido Chambra, cidadão espanhol conhecido como o "pai do olival em Alqueva". Só a CH possui atualmente sete herdades e dá assistência a outras 18, num total de cinco mil hectares de olivais e amendoais.
No caso concreto de Joaquim Silva, foram as desavenças familiares que precipitaram a venda. Mas, um atrás do outro, por questões sucessórias, de solvência ou por manifesta falta de vocação e de cultura empresarial, os proprietários tradicionais alentejanos - quer os antigos terratenentes brasonados, quer os chamados "velhos-novos-ricos" -, estão a ceder ao avanço do capital. Nenhuma outra geografia agrícola portuguesa sofreu tão profundas alterações fundiárias e paisagísticas no último século como o território que hoje está a ser irrigado pelo Alqueva. Em cima da forte desmatação promovida aos tempos da ditadura militar em nome da autonomia alimentar do País, operação conduzida pelo coronel Linhares de Lima e que teve o nome Campanha do Trigo, alicerçou-se agora uma reflorestação intensiva de olival, com consequências ambientais e sociais difíceis de prever. No entanto, é quase unânime no setor a ideia de que a primeira bolha a rebentar será a da sustentabilidade financeira do negócio no longo prazo.
Muito mais do que uma mera intervenção agrícola, as culturas permanentes no Alqueva, com o olival à cabeça logo secundado pelo amendoal, são agora objeto de forte pressão financeira. Com as taxas de juro em terreno negativo, a finança "começou a olhar para a terra como um valor seguro", reconhece Luís Mira Coroa, diretor da União de Cooperativas Agrícolas do Sul (UCASUL). Pressionada pela procura em alta, a terra viu o seu valor aumentar cinco a seis vezes nos últimos 15 anos. Um hectare das melhores terras era comercializado em 2005 por valores a rondar os 5 mil euros, hoje qualquer terreno, desde que esteja dentro dos blocos de rega, não é vendido por menos de 25 mil euros. "O regadio envolve muito dinheiro e a forma como está a ser financiado pode e deve ser questionada", completa Francisco Palma: "Está aqui criado um grande fosso entre financeiros e agricultores." Nos últimos cinco a 10 anos, a agricultura do Alqueva passou velozmente do setor primário, ao secundário e ao terciário: é lavoura, é agro-indústria e é, antes de tudo, finança.Novos Donos do Alentejo

O mundo a seus pés

Quando o investidor andaluz Manuel Goméz Cabrera chegou ao Alentejo em 2003, supostamente com os bolsos cheios de dinheiro, o mundo agrícola caiu-lhe aos pés. Numa altura em que a água para rega em Alqueva era ainda uma incerteza, Cabrera adquiriu uma das mais emblemáticas propriedades do concelho de Beja, a Quinta de São Pedro, cujo palácio e respetiva envolvente urbana chegou a ser sede da extinta freguesia de São Pedro dos Pomares. Ao mesmo tempo, o industrial dos presuntos e do gado bovino comprou a propriedade contígua, a Rabadôa, que à data pertencia ao grupo cordovês Martinez Segrera e cujos 1.800 hectares de plantação intensiva lhe valiam o epíteto de maior olival do mundo num só artigo predial. A estas, juntou de seguida a vizinha herdade da Quinta da Chaminé e um considerável conjunto de pequenas parcelas agrícolas e courelas. Por fim, mandou construir um lagar capaz de processar a totalidade das safras.
O investimento direto da empresa familiar Belloliva no Alentejo ascendeu a 100 milhões de euros. Nas mãos dos especuladores, vítima de maus anos agrícolas e apertado por investimentos de rendibilidade duvidosa, como a compra de duas gigantescas máquinas de apanha de azeitona de fabrico argentino, as Colossus, cujas 27 toneladas de peso bruto se revelaram desastrosas a operar nos olivais alentejanos, ou a implementação de captações de água diretamente do rio Guadiana, que fica a mais de oito quilómetros das propriedades, o império de Manolo, como é conhecido, caiu com estrondo em 2016. Por pagar à Caixa Geral de Depósitos (CGD) ficaram 90 milhões de euros de crédito malparado.
Tal como Manuel Cabrera, boa parte dos investimentos espanhóis da primeira vaga do Alqueva acabaram por derrocar. A banca portuguesa, ao contrário da relação que mantinha com os agricultores nacionais, acolheu-os de braços abertos e fez fé nos balanços financeiros positivos que demonstravam nas empresas que detinham em Espanha. O problema é que as garantias foram dadas em cima de ativos provenientes essencialmente do ramo imobiliário. Quando as ondas de choque da crise do subprime chegaram à Península Ibérica, foi a ruína para muitos.
Para minimizar perdas, a CGD acabou por passar a Belloliva para a Oxy Capital, que é uma sociedade gestora de fundos de private equity com interesses em Portugal e Itália e que, entre outros ativos, tem em carteira o Casino de Troia e a gasolineira Prio. Apesar da Belloliva ser um dos grandes devedores do banco público, a administração da Caixa nega a existência de uma bolha no negócio da olivicultura e reafirma que "apoia os investimentos do agronegócio no Alqueva e no resto do País, desde que o projeto proposto seja bem fundamentado e a empresa apresente capitais próprios e garantias suficientes e o mesmo seja aprovado pela direção comercial e de risco do banco".

Safra e contrassafra

Uma opinião que diverge daquela que é hoje a voz corrente nos meios agrícolas. Para Francisco Palma, "a bolha imobiliária está criada e apenas resta saber quando vai rebentar". Já Luís Mira Coroa reconhece que "os fundos financeiros vieram atrás da rentabilidade, uma vez que a terra passou a ser um ativo de liquidez imediata, mas nem tudo está a ser bem resolvido". Por seu turno, Pedro Gonzalo Ybarra, presidente do grupo Aggraria, que opera em Portugal, Espanha e Chile e que foi dos primeiros espanhóis a investir no Alqueva, em 2003, afirma não restarem dúvidas de que "quando os preços baixarem, e vão baixar, vai haver inevitavelmente problemas de pagamentos".
Nas análises que os bancos estão a fazer aos investimentos no olival, prossegue Pedro Gonzalo Ybarra, "estão sempre a contar com o melhor dos cenários, mas isso é de todo irrealista". Apesar de a média regional rondar as três toneladas, segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), numa campanha de produção ótima, como a atual, um hectare de olival irrigado de alto rendimento, intensivo ou super-intensivo, pode produzir 12 toneladas de azeitona. De onde se obterão 1.920 quilogramas de azeite que renderá perto de 4.300 euros, segundo a mediana ao início de dezembro de 2019 de 2,26 euros por quilo fixada pela bolsa oleícola espanhola POOLred, por onde o mercado internacional se regula. Como as despesas anuais de produção se cifram entre os 2.500 e os 3 mil euros, neste cenário perfeito, o rendimento não só dá para amortizar investimento, como este se revela um verdadeiro negócio da China.
O problema é que o ciclo da oliveira é como o ritmo cardíaco. Umas vezes para cima e outras para baixo, com as devidas arritmias pelo meio. A única certeza do agricultor é que a seguir a um bom ano, virá um ano menos bom. Os antigos chamavam safra e contrassafra a esta oscilação que tem a ver com a retração das próprias plantas à violência da apanha, mas que também pode estar relacionada com questões de ordem climatérica ou fitossanitária. E hoje, mais do que nunca, com a especulação comercial. Dominado por dois dos maiores embaladores de azeites do mundo, a Sovena/Oliveira da Serra e a Unilever Jerónimo Martins/Gallo, e dependente no restante dos grandes brokers internacionais do comércio a granel, o mercado português está perfeitamente emaranhado numa teia especulativa.
Apesar de a produção nacional anteceder a dos demais países produtores de azeite do Hemisfério Norte, nomeadamente de Espanha, certo é que, como nesta campanha está a acontecer, acaba por não haver fluidez no escoamento da produção. Excluindo alguns pequenos e médios engarrafadores italianos, que procuram os azeites verdes do início da safra alentejana para os comercializarem em pequenos nichos de mercado sob rótulo próprio, são os grandes "tubarões" que "acabam por regular o setor em seu próprio benefício", condena o pequeno olivicultor José Vasco Carvalho.
Com vasta capacidade de armazenamento, as multinacionais compram "à cabeça" os primeiros azeites da campanha para reavivar os stocks acumulados de um ano para o outro. E retiram-se logo de seguida, deixando o mercado em suspenso. Neste quadro, ao consumidor chegará por estes dias um azeite velho "revitalizado" e ao pequeno produtor mais não restará do que aguardar por uma janela de venda - e perder valor, uma vez que a praça do azeite abre em alta em outubro, no início da apanha, e vai em progressiva queda até ao final da mesma, entre fevereiro e março.Novos Donos do Alentejo

O que vale é ter azeite

A operação de apanha da azeitona na herdade da Aldeia dos Condes acabou em meados de dezembro. Não correu nada mal. Os primeiros olivais intensivos que a família de José Vasco Carvalho plantou há 25 anos ainda mantiveram vitalidade para gerar, em média, 11 toneladas por hectare. A terra foi generosa para com o agricultor, "mas neste negócio o que conta não é o produto da terra, a azeitona, é o azeite. E, desta forma, não há alternativa: não controlamos nada, estamos sempre nas mãos dos especuladores". No lagar ficaram por "despachar" 130 toneladas de azeite, à espera de um milagre que se espera sempre possa soprar de Espanha, que tem a maior capacidade produtiva mundial e onde a campanha é mais tardia. Um mau ano do lado de lá da fronteira é sempre bom para os olivais alentejanos.
A preponderância do olival é relativa para as boas contas da sociedade gestora da Aldeia dos Condes. Para evitar os "humores" do mercado, José Vasco Carvalho optou por diversificar. Há por ali vinha, nogueiras, floresta de pinhal e de azinho e uma zona para culturas anuais com três pivôs de rega, onde normalmente produz cereais de regadio. Contudo, esta não é a prática comum em Alqueva. A monocultura do olival, agora salpicado por alguns amendoais, coloca os agricultores numa verdadeira posição de dependência em relação aos especuladores, à qual se junta uma certa ansiedade da banca no que respeita a derrapagens na amortização dos investimentos. Os pequenos e médios produtores, como Manuel Castro e Brito, não deixam de lamentar que passam "mais tempo nos bancos e a tratar de papelada e da burocracia" do que a cuidar daquilo que sabem "fazer como ninguém: o melhor azeite do mundo".
Até que um olival super-intensivo, como aquele que Manuel Castro e Brito plantou em 2017 no Monte das Nogueiras, em que cada hectare pode comportar até 1.975 plantas, entre em produção é necessário decorrer entre dois anos e meio a três anos. E a formação plena das árvores apenas acontecerá ao fim de sete anos. Já a infraestruturação dessa mesma área e os custos gerais de operação até à primeira colheita estarão entre 8 e 10 mil euros. Se estivermos a falar, como é o caso, de 62 hectares, as contas são fáceis de fazer. Isto sem incluir o preço da compra ou do arrendamento do terreno. Ainda assim, Filipe Ravera desvaloriza os eventuais impactos negativos do negócio, como a especulação imobiliária ou a captura do preço do azeite por parte das grandes multinacionais. O diretor do gabinete de agro-negócios da CGD sustenta que "a capacidade produtiva das terras não está abaixo do valor das mesmas. O valor resulta diretamente da convicção dos produtores que, ao investirem, confrontam com o maior cuidado os valores de aquisição ou arrendamento que pagam pelas terras com o valor atual dos resultados económicos que calculam vir a obter com a exploração produtiva das mesmas". No entanto, no Alqueva, o espectro da Bellolliva continua a pairar no ar.

Bandeiras negras


O anúncio caiu que nem uma bomba. Quando o então ministro da Agricultura, Capoulas Santos, comunicou na Assembleia da República, a 12 de junho de 2019, o fim dos apoios aos novos investimentos no olival do Alqueva e às agro-indústrias que lhe estão associadas, a reação do setor não se fez esperar. A Federação das Associações de Agricultores do Baixo Alentejo (FAABA) recebeu a notícia "com grande perplexidade", considerando-a "contraditória, desadequada e irrealista". Por seu turno, a Associação de Olivicultores do Sul (Olivum) reputou as declarações do ministro como "discriminatórias e infundadas", colocando inclusivamente em causa a legalidade da proposta.
Capoulas Santos apresentou-se no parlamento no âmbito de um debate de urgência agendado pelo Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV), que já a 8 e 9 de abril, durante as suas jornadas parlamentares no Baixo Alentejo, tinha espalhado bandeiras negras por algumas plantações. Na presente legislatura, os deputados José Luís Ferreira e Mariana Silva, a 30 de outubro, deram entrada ao Projeto de Lei 25/XIV, que baixou à Comissão Parlamentar de Agricultura e Mar a 6 de novembro. Um diploma que, no essencial, propõe o arranque coercivo das plantações que distem menos de 300 metros das populações e o fim dos apoios comunitários às culturas intensivas.
O PEV materializou nesta iniciativa legislativa a vaga de contestação que as principais associações ambientalistas vinham há meses a propalar contra os olivais intensivos. Uma posição comum a todos os partidos que apoiaram o anterior governo. Também o Bloco de Esquerda, a 6 de março de 2019, propôs uma recomendação ao Governo para que se instaurasse uma "moratória à instalação de amendoal e olival intensivo e super-intensivo em todo o País até que se defina regulação da sua limitação".
Mas se no programa deste "amplo movimento rasteiro", como o classificou Pedro Lopes, presidente da Olivum, durante as jornadas do setor que se realizaram em Beja a 26 de novembro, o foco está essencialmente centrado nas questões ambientais e de saúde pública, houve uma linha de debate, na sequência das palavras de Capoulas Santos, que se emancipou: o tema da posse da terra e a política de ajudas públicas à instalação de projetos agrícolas em regime de produção intensiva.

Alarmes e subsídios

É opinião corrente no setor agrícola do Alqueva que a interdição dos apoios comunitários à olivicultura foi uma cedência política do Governo aos parceiros da esquerda, em tempo de pré-campanha eleitoral. Até porque o Ministério da Agricultura acabou por anunciar de "forma alarmista", no dizer de Pedro Lopes, o que há muito era dado por adquirido: não seria aberto mais nenhum concurso para a olivicultura ao abrigo do Programa de Desenvolvimento Rural 2020, uma vez que 90% deste pacote financeiro estava já comprometido. E os restantes 10% seriam endereçados a projetos que ainda estavam em fase de análise. "Não se pode prometer aquilo que não se tem", esclarece o diretor regional adjunto da Agricultura do Alentejo, José Velez.
Mas nem todos ficaram melindrados com a medida. Para os pequenos detentores de terras que se queiram instalar, o que já antes era quase impossível sem recurso à banca, transformou-se agora numa miragem. Já o setor financeiro do Alqueva rejubila com a nova situação. Com 83,3% dos 120 mil hectares do empreendimento já em produção, a terra começa a ser um bem cada vez mais escasso no interior do perímetro de rega. Daí que as grandes multinacionais, para obstar à instalação de concorrentes, tenham inflacionado os preços dos terrenos para níveis acima da sua capacidade produtiva. A par da especulação imobiliária, o desencorajamento ao investimento anunciado pe- lo antigo governante favorece ainda mais a concentração. "Os poucos agricultores locais sobreviventes acabam por vender ou por arrendar as suas terras", as- segura Francisco Palma.
Sem a existência de um plano de ordenamento do território agrícola, os grandes detentores da monocultura do olival acabam por ser os verdadeiros beneficiários do maior investimento que o Estado, com recurso a fundos comunitários, alguma vez concretizou no Alentejo: 2,5 mil milhões de euros. A estes poder-se-ão juntar perto de 800 milhões de euros de apoio ao investimento para o setor do olival e do azeite, atribuídos no decurso dos últimos dois quadros comunitários de apoio. Entre 2007 e 2014, na vigência do Proder, a olivicultura no Alentejo recebeu 515 milhões de euros, de acordo com um estudo recentemente realizado pela empresa de consultoria agrícola Consulai e pelo guru internacional dos olivais, o espanhol Juan Vilar. Em relação ao atual instrumento estratégico e financeiro de apoio, o Plano de Desenvolvimento Regional 2020, segundo o mesmo documento, com a execução em 50%, foram já afetados perto de 290 milhões de euros.
A par das ajudas à instalação, a olivicultura de regadio beneficia ainda do Regime de Pagamento Base (RPB) que é comum à agricultura em geral e também de apoios agro-ambientais no âmbito do segundo pilar da PAC.
Para agilizar a gestão das empresas, para otimizar os recursos, mas também para aceder aos fundos comunitários os grandes grupos, cujo capital de base por norma provém de diferentes ramos industriais que não a agricultura, estão fracionados num emaranhado de empresas-mãe, sociedades e joint ventures que se entrecruzam. Não é fácil seguir o rasto do dinheiro que, no Alqueva, se chama "terra". José Luís Santaella, por exemplo, é gerente da De Prado Portugal SA, da De Prado Sul Unipessoal, cuja casa-mãe é a De Prado Negocios e Inversiones SL, e de outras 13 sociedades agrícolas. É representante da Agricola Alentejo, vogal da Almazara OFF e presidente do conselho de administração da Tranquilopadrão, Fonte dos Azeites e De Prado Negócios e Investimentos SGPS SA. Só a De Prado Portugal faturou em 2018 mais de 63 milhões de euros em vendas de azeite. Porém, a organização em teia não é um exclusivo da De Prado, nem dos grupos empresariais espanhóis. É uma prática comum no Alqueva que não olha a nacionalidades.

Campanhas

Duas campanhas cruzaram-se a 21 de setembro de 2015, na herdade dos Falcões, próximo da aldeia de Cabeça Gorda, em Beja. A eleitoral iria dar uma vitória curta ao então primeiro-ministro Pedro Passos Coelho. Já a olivícola viria, então, a bater todos os recordes. Nesse ano, colheram-se em Portugal mais de 858 mil toneladas de azeitonas, de acordo com os dados do Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral (GPP).
O líder do PSD decidira encetar a caça ao voto no Baixo Alentejo inaugurando um dos maiores e mais sofisticados lagares de azeite do mundo, o da Olivomundo. Um equipamento cujo investimento de 8,5 milhões de euros autonomizaria a produção oleícola do único grande grupo exclusivamente português a operar na zona de influência dos novos olivais irrigados.
A Olivomundo é um caso de estudo no universo da olivicultura no Alqueva. Iniciado por José Manuel Gonçalves, em 2004, com a compra e a infraestruturação de uma parcela de terreno com 60 hectares, o grupo familiar explora atualmente quase cinco mil hectares, por compra ou por arrendamento, tem uma centena de funcionários a tempo inteiro e produz 35 mil toneladas de azeitona, o que perfaz cerca de 10 mil toneladas de azeite por ano. A quase totalidade da produção é vendida a granel para o exterior, principalmente para Espanha e Itália, onde é embalada e comercializada como produto local. Em 2018 a Olivomundo faturou perto de 24 milhões de euros. Na presente campanha, José Gonçalves prevê que o volume de negócios possa ascender aos 26 milhões.
Apesar de a EDIA fazer publicidade do facto de, em 2018, 61% do investimento na cultura do olival dentro do Empreendimento de Fins Múltiplos de Alqueva ser de origem portuguesa, 35% espanhola e os restantes 16% divididos por investidores ingleses, suíços, chilenos, dinamarqueses, alemães, brasileiros, franceses, holandeses e sauditas, a empresa que gere o maior regadio português estará, por certo, apenas a ter em consideração os números de identificação fiscal dos operadores e não a verdadeira nacionalidade dos mesmos.
A preponderância do capital espanhol na região não é um mito. Mesmo nos grupos com sede e origem em Portugal, como a Elaia, o investimento é repartido com fundos estrangeiros, neste caso concreto espanhol. A Olivomundo é a exceção que tem tanto de surpreendente como de intrigante. É o próprio José Manuel Gonçalves que reconhece não ser "fácil uma empresa familiar ganhar tamanho e estrutura suficientes para competir com os grandes tubarões". Para o conseguir, prossegue o empresário, foi necessário "muita imaginação, ponderação e cautela nos novos investimentos".

Facas afiadas

Imaginação, ponderação e cautela de pouco servirão se não houver disponibilidade de terra, muita terra, e essa, já se viu, é cada vez mais escassa, mais cara e está cada vez mais concentrada. E, acima de tudo, se não houver garantia de água para rega. A 31 de dezembro deste ano termina o contrato de concessão dado por sete anos pelo Estado à EDIA. Uma vez que perto de metade do regadio português deriva das águas retidas na barragem do Alqueva, a gestão da água manteve-se nas mãos da sociedade anónima de capitais exclusivamente públicos que também foi responsável pela construção e infraestruturação do equipamento. Trata-se de uma situação inédita. Nas demais circunscrições de rega do País as concessões são dadas a longo prazo, por norma a 35 anos, a associações de regantes e de beneficiários que se criam para o efeito.
Não se estranhe, por conseguinte, que com o aproximar do término da concessão, as facas se comecem a afiar. Já em novembro de 2018, a Federação Nacional de Regantes de Portugal promoveu as suas jornadas em torno da questão do modelo de governança do regadio. O encontro decorreu em Montes Velhos, Aljustrel, no coração de um dos cinco perímetros confinantes ao Alqueva, o Roxo. E foi precisamente à margem do encontro que o presidente da Fenareg, José Núncio, avisou que "existem razões substanciais para que o atual modelo de gestão do EFMA seja revisto". E, claro, que o controlo da água possa passar para as mãos dos agricultores beneficiários.
É que, para além da "guerra ideológica" que existe em torno do uso e da gestão da água, as receitas por ela geradas não são despiciendas. Segundo o relatório e contas de 2018, a EDIA, incluindo a cobrança de taxas de conservação, faturou 15 milhões e 220 mil euros só em água. E as estimativas para 2019, juntando as receitas de água e de energia, indicam que a empresa vai arrecadar qualquer coisa como 34 milhões e 723 mil euros. A este "conflito de interesses público-privado" responde o presidente da EDIA com a locução futebolística, "em equipa que ganha não se deve mexer". José Pedro Salema sustenta que "os resultados positivos inequívocos dos últimos anos reforçam as vantagens de uma gestão integrada de todo o sistema".
Mas tal como acontece com o uso da terra, o problema da água no Alqueva reside, mais uma vez, no planeamento. Ou na falta dele. A construção da segunda fase do Alqueva no âmbito do Programa Nacional de Regadios, cujos contratos de empreitada estão em fase de análise, é o exemplo acabado da deficiente definição das políticas agrícolas. Ao todo, serão mais 240 milhões de euros que o Estado, através de verbas provenientes do PDR 2020, mas essencialmente de empréstimos bonificados conseguidos junto do Banco Europeu de Investimentos e do Banco de Desenvolvimento do Conselho da Europa, pretende investir até 2023 no aumento da área regada do Alqueva em mais 50 mil hectares. Um alargamento cuja estimativa de consumos foi delineada com base no volume de água consumido pela cultura dominante, o olival.
João Cavaco Rodrigues, presidente da recém-criada Associação de Proprietários e Beneficiários de Alqueva (APBA), já fez as contas e concluiu não ser possível "avançar para a expansão sem a grande preocupação de que a água possa não chegar". Apesar de o caudal útil para rega no Alqueva ser de 1,7 mil milhões de metros cúbicos, a EDIA apenas tem a concessão anual de cerca de 600 milhões de metros cúbicos. Com o alargamento, a superfície regada pela grande barragem rondará os 200 mil hectares, incluindo os chamados blocos de rega confinantes e os regantes precários, que são uma espécie de colonatos agrícolas que a EDIA promoveu nas margens do empreendimento quando a adesão ao mesmo era ainda residual.
Neste cenário, em teoria, o território não poderá receber qualquer cultura que consuma mais de três mil metros cúbicos anuais por hectare. Ou seja, de entre as lavouras que até à data foram experimentadas ou estão em produção em Alqueva, apenas terão viabilidade hídrica o olival e a vinha. "Os pressupostos que há cinco anos levaram os governantes a avançar com o projeto de expansão já não se verificam", alerta João Cavaco Rodrigues. A elevada taxa de adesão ao regadio, que em 2019 atingiu os 100 mil hectares, o avanço mais rápido que o esperado dos efeitos provocados pelas alterações climáticas e, acima de tudo, a reconversão de olivais modernos em amendoais, cuja exigência de água é em 50% superior à oliveira, estão na base das apreensões do presidente da APBA.

Crescer sempre

Hoje, o "setor primário", com o olival na linha da frente, faz assento na tecnologia, na ciência, na inovação, nos mercados externos. "No fundo", diz Pedro Lopes, "estamos a falar em quantidade, mas também em grande qualidade de investimento e é pela qualidade que se está a transformar definitivamente o Alentejo". Ainda que "exista quase uma espécie de religião contra o olival, o setor está a operar uma verdadeira revolução na região do Alqueva", diz Pedro Santos, um dos autores do estudo Alentejo a liderar a olivicultura moderna internacional. Nos próximos 10 anos, segundo as conclusões do ensaio apresentado em novembro, Portugal "será a maior referência na olivicultura moderna e eficiente do mundo", passará a ser o sétimo produtor de olival e o terceiro maior em produção de azeite. Tudo, conclui-se, graças às plantações do Alqueva que estão a liderar a "atual transformação da agricultura internacional".
É a própria ministra da Agricultura que realça à SÁBADO que "depois de um longo período em que éramos deficitários em azeite, passámos a exportadores líquidos". Maria do Céu Albuquerque, apesar de o seu ministério ter em marcha neste momento um estudo para analisar a possível delimitação da área máxima de olival no perímetro de Alqueva, constata que esta "é uma cultura rentável e muito competitiva".
Num outro estudo sobre as perspetivas agrícolas da União Europeia para os mercados e rendimentos dos Estados-membros, no período de 2019-2030, a produção de azeite em Portugal poderá crescer perto de 88%, em comparação com o período de 2014-2018, o que esmaga a média comunitária que se prevê ser de 1,1% ao ano. Porém, os técnicos da Direção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural da Comissão Europeia não deixam de alertar para os impactos das monoculturas em certas regiões e sobre as questões ambientais relacionadas com o uso da água. Mas essa é outra história.

Artigo originalmente publicado a 16 de janeiro de 2020.

https://www.sabado.pt/investigacao/detalhe/os-novos-donos-do-alentejo

quarta-feira, 26 de maio de 2021

TPC: escreva três vezes "Mariana será ministra"

Helena Matos

Enquanto Mariana não é ministra vamos fazendo os exercícios da gramática esquerdista. Porque sim. E porque o país se habituou a aceitar como destino aquilo que o Bloco de Esquerda quer.

1Regra nº 1: só têm relevância os assuntos que o BE e seus compagnons definem como relevantes.

Grupo de 20 homens cerca polícias e liberta detido em Almada. Suspeito conseguiu escapar. PSP chamou reforços mas teve de libertar o homem.” — Supor-se-ia que um grupo de vinte homens a cercar dois agentes da polícia a meio da tarde em Almada seria por si um facto capaz de suscitar várias perguntas: donde apareceram os vinte homens? Como é que a polícia apesar de ter recebido reforços não foi capaz de manter detido o homem que acabara de prender? O que levara à detenção do homem?…

Na verdade supõe-se mal: o caso não mereceu atenção. Esta desatenção é tanto mais estranha quanto na zona de Almada se acumulam casos que provam não só que a lei não se aplica a todos de igual modo mas também  que alguns impõem já sem qualquer entrave a sua própria lei: há dois meses um grupo de sete homens invadiu a casa de uma agente da GNR durante a noite. Um grupo de sete homens a entrarem a meio da noite na casa de uma agente da GNR não é banal nem pode ser banalizado. Nem sequer o facto de o marido da agente ter sido barbaramente agredido e de na casa se encontrarem duas crianças, as filhas do casal, foi suficiente para que a notícia saísse das páginas do Correio da Manhã.  O país debate amestradamente a violência que os observatórios, o ISCTE e os diversos departamentos universitários que parecem secções do BE dizem ser uma chaga. Sobre o resto impera o silêncio.

2Regra nº 2: perante o falhanço das políticas socialistas repetir três vezes a palavra “desigualdades”.

Saíram os rankings das escolas e mais uma vez a diferença de resultados entre escolas públicas e privadas está a servir de pretexto para que se invoquem as “desigualdades”.  Não deixa de ser espantoso que tendo o sistema de ensino sido concebido em boa parte para combater as desigualdades acabe neste momento a reforçá-las. Mais espantoso é que ninguém pergunte: como é isto possível? Como é que aqui chegámos? O que falhou?..

É óbvio que o meio em que se nasce conta tal como conta ser-se mais ou menos inteligente. Mas para a grande maioria dos alunos, ou seja aqueles que não são génios e também não são nem ricos nem pobres, o que pode ser decisivo é a forma como a escola funciona e as expectativas que tem perante os seus alunos. Até prova em contrário  a melhor forma de combater as desigualdades é assegurar um ensino de qualidade num escola que funcione com regras claras. Ora acontece que os esquerdistas que mandam na 5 de Outubro transformaram os alunos do ensino público em problemas sociológicos: eles não vão à escola para aprender mas sim para serem alvo de programas de combate a isto e àquilo. Pior, dá-se como adquirido que só baixando a exigência conseguirão obter resultados.

Mariana Mortágua não será ministra da Educação (Louçã acalenta para ela o sonho da pasta das Finanças) mas também não precisa: o Ministério da Educação está transformado numa madrassa do activismo esquerdista. Consequentemente temos a discussão reduzida às “desigualdades” e ao papel dos rankings na promoção das desigualdades. Sobre o ensino propriamente dito nem uma palavra.

3Regra nº 3. A principal indústria do país socialista é a produção de fascistas.

A chegada de Mariana Mortágua a ministra depende em absoluto da produção de fascistas: a cada fascista combatido outros milhares logo surgirão. E a cada combate desses cresce a inevitabilidade de Mariana ser ministra. O combate aos fascistas reais e imaginários desempenha também o papel de poupar a esquerda e seus apoiantes a explicar o que aprovam para lá da gritaria e o que decidem nos bastidores. Quanto mais de esquerda mais um governo depende dos fascistas. Afinal, se se descobrisse que não existem fascistas, os esquerdistas teriam de explicar o que é e onde nos está a conduzir o socialismo. Mariana a provável ministra precisa de um fascista a cada esquina.

4Regra nº 4. As pessoas que não sabem que palavras usar para referir a realidade acreditam em tudo.

Em Ceuta temos migrantes, imigrantes ou refugiados? A confusão entre os termos não é casual. A partir do momento em que a utopia da descolonização foi substituída pelo activismo da multiculturalidade,  instituiu-se a ideia de que a Europa pode e deve  acolher todas as pessoas que procuram entrar nas suas fronteiras. Uma vez cá dentro esperam os seus auto-denominados defensores que estes “imigrantes/ migrantes/refugiados” desagreguem o qb o quotidiano da sociedade. De todos os  problemas gerados por esta visão instrumentalmente ideológica dos imigrantes há um particularmente grave e por isso mesmo pouco ou nada abordado. Esse problema são os chamados menores não acompanhados. As imagens que agora chegam de Ceuta  dão conta de centenas e centenas de crianças a passar para o lado espanhol. Espera-se que muitas delas regressem às suas famílias. Mas é preciso ter em conta que várias não regressarão e que em Espanha existem milhares de menores estrangeiros, sem família, que estão a cargo do Estado até atingirem a maioridade. São os chamados “MENAS” (menores estrangeiros não acompanhados).

Em 2019 eram 12.300, o dobro dos contabilizados em 2017. Em França no mesmo ano de 2019 eram 40 mil.

A institucionalização de menores traz sempre problemas, mais a mais se eles forem estrangeiros e estiverem desligados das suas famílias.  As redes de exploração sexual e criminal captam vários desses menores. Os encargos com o seu acolhimento são grandes e não é difícil perceber que têm de ser alargados para lá da maioridade: aos 18 anos. sem família por perto, estes jovens tornam-se independentes como?

As consequências da Europa ter entregue o controlo das suas fronteiras à Turquia e a Marrocos são visíveis na forma como estes países usam os fluxos dos ditos imigrantes/migrantes/refugiados para obterem vantagens. (Alguém se lembra do que tinha ido a senhora Ursula discutir com Erdogan quando este a deixou sem sofá?) Mas para lá deste problema que é enorme há que ter em conta que ele encerra outros como é o caso dos menores não acompanhados.

Abordar este assunto tornou-se quase um tabu. O número real dos menores não acompanhados gera discussões. Os encargos com o seu acolhimento são um terreno minado. Os activistas consideram-nos a sua reserva não de índios mas de futuros ressentidos.

Que as imagens de Ceuta sirvam para que se pergunte: para onde vão estas crianças?

5Regra nº 5. Não é bem uma regra mas sim o resultado de uma constatação: proponho que se institua o Prémio Jornalístico Mariana Mortágua. O mesmo visa distinguir os jornalistas pelo seu abnegado esforço de promoção do BE em geral e desta sua dirigente em particular.

Observador

Não contem com Francisco Louçã para o alterne

Tiago Dores

A direita voltar ao Governo, um dia? Isso é que era bom. É que nem pensar. Com Francisco Louçã não há cá alternância democrática para ninguém. Não, não. Com Louçã não se alterna coisa nenhuma.

Meus amigos, para quem ainda tinha dúvidas sobre a postura inatacável do conselheiro de Estado, Francisco Louçã, a última Convenção do Bloco de Esquerda esclareceu-as integral e definitivamente. Isto porque, no dito certame, garantiu Louçã:

“Com esta força do Bloco, Portugal tem agora a certeza de que não voltaremos a ter a maioria absoluta que protege a desigualdade social, nem a direita voltará ao Governo.”

Ora, aí está. A direita voltar ao Governo, um dia? Isso é que era bom. É que nem pensar. Com Francisco Louçã não há cá alternância democrática para ninguém. Não, não. Com Louçã não se alterna coisa nenhuma, pá. Não contem com este menino para o alterne.

A propósito, uma adivinha. Porque é que Francisco Louça só anda de transportes públicos? A quem respondeu “Porque considera que o automóvel é o símbolo máximo da lógica depredadora do capitalismo e o principal entrave à justiça climática e equidade ambiental”, duas questões. Primeira: hã? Segunda: vejo que nunca leu uma crónica minha. Bem-vindo, caro leitor. E foi, desde já, um gosto. Pois suspeito que, findo este parágrafo, não voltarei, nunca mais, a vê-lo. Bom, mas retornando à adivinha “Porque é que Francisco Louça só anda de transportes públicos?”. A resposta é óbvia. Porque tem nojo de ser proprietário de coisas, claro, para mais de coisas como um veículo automóvel, que possui uma peça a que se chama “alternador”. E, como já sabíamos, Louçã abomina tudo o que tenha a ver, mesmo que remotamente, com alternâncias.

E com esta adivinha, para grande desgosto de todos vós, estou certo, esgotei o portfólio de adivinhas que metem Francisco Louçã. Ou, pelo menos, o portfólio de adivinhas para as quais sei a resposta. Resta-me um enigma para o qual, confesso, não tenho solução. Que é o seguinte. Como pode um indivíduo que deseja profundamente a não existência de alternância democrática, ser conselheiro de Estado de um país que se diz (quer dizer, acho que ainda se diz. Ainda se diz?), lá está, democrático. Dá ideia de não fazer muito sentido. Mas não sei. Vai-se a ver e nas reuniões do Conselho de Estado, sempre que é chamado a opinar, diz Francisco Louçã: “Bom, o meu conselho é que haja ainda um bocadinho menos de democracia. Estamos a caminhar no bom sentido, mas creio que conseguimos fazer ainda muito pior. Melhor, queria eu dizer. Melhor.”

Já que falamos de democracia, é obrigatório referir a sua palavra geminada, Bielorrúsia. Parece que houve para lá qualquer coisa na Bielorrúsia. Acho que não foi nada de mais. Foi só um avião de um país da União Europeia, que fazia um voo entre duas cidades da União Europeia, a ser desviado por um estado terrorista para o seu território, para efeitos de captura de um jornalista que, porventura, será condenado à morte, ou similar. Até aqui, tudo normal. O que espantou foi a reacção do actual Presidente do Conselho da União Europeia, António Costa. Então não é que o nosso Primeiro-Ministro condenou o terrorismo de Estado da Bielorrússia. Quem diria que António Costa gostava de condenar terrorismos. É que, ainda há dias, Costa teve oportunidade de condenar o terrorismo levado a cabo por um efectivo grupo terrorista, o Hamas, e optou, antes, por condenar o Estado democrático vítima desse mesmo terrorismo, Israel. Desta não estava à espera, confesso.

Quem também reagiu de forma assertiva a este caso foi Ursula von der Leyen, muito peremptória na condenação dos actos perpetrados pelo governo de Alexander Lukashenko. Fontes próximas da Presidente da Comissão Europeia garantem que a diplomata ficou tão furiosa com o desvio do avião da Ryanair, que chegou a confessar um plano para, na próxima cimeira UE/Bielorrússia, partir uma cadeira na cabeça de Lukashenko. Caso lhe cedessem uma cadeira, claro.

Observador

Aqui d’el Ranking!

José Diogo Quintela

É óbvio que Brandão Rodrigues não gosta de comparações. O que se percebe, uma vez que é frequentemente considerado o pior ministro da Educação desde a alfabetização dos Suevos.

A polémica com o ranking das escolas mostra bem o estado da Educação em Portugal. Não por causa do ranking em si, mas pelo facto de se dizer “ranking” e não “lista”, “classificação” ou “hierarquia”, algumas das várias palavras em português que podem substituir com eficácia o termo em estrangeiro.


Esta observação pretensiosa era tudo o que tinha para dizer sobre o tema. Só que, entretanto, ouvi o ministro da Educação a queixar-se dos rankings. O que, em si, não é bem uma novidade. Não devemos esquecer que foi Tiago Brandão Rodrigues quem, no confinamento de Janeiro, impediu as escolas privadas de darem aulas online, prejudicando todos os alunos por igual. É óbvio que não gosta de comparações entre estabelecimentos de ensino, prefere nivelar por baixo. Aliás, não deve gostar de comparações no geral. O que se percebe, uma vez que é frequentemente considerado o pior ministro da Educação desde a alfabetização dos Suevos. Para Brandão Rodrigues, o único ranking aceitável é a tabela classificativa de um campeonato de futebol antes da primeira jornada. Quando estão todos empatados. Com zero pontos.

Segundo o ministro: “É uma pena se estes rankings forem utilizados única e simplesmente por uma questão de marketing das instituições de ensino.” Foi esta a afirmação que me chamou a atenção. Quando Brandão Rodrigues fala em marketing, devemos tomar nota. Afinal, trata-se do ministro que, de Março a Junho do ano passado, foi oito vezes à televisão garantir que todos os alunos teriam acesso a computadores com ligação à internet se fosse necessário confinar outra vez. Investiu tudo nos anúncios e nada no produto. Se isto não é um especialista em propaganda, eu não sou um especialista em generalizações simplistas.

Mas Brandão Rodrigues acerta ao levantar a questão do marketing. É, reconheça-se, um factor de desigualdade entre o ensino público e o ensino privado. Enquanto as escolas públicas não precisam de fazer publicidade, já que sabem que vão ter sempre gente, as privadas percebem que têm de se promover, caso contrário não atraem alunos e acabam por fechar.

De qualquer modo, não faria sentido uma escola pública recorrer ao marketing. Por melhor que seja, só podem frequentá-la os alunos que moram ao lado. Para quê anunciar um produto que não está disponível? É como fazer publicidade num supermercado venezuelano. Neste aspecto, o ranking é realmente cruel para os alunos que frequentam o ensino público. Mostra que há escolas públicas boas, mas eles não as podem frequentar porque têm o azar de viver mais perto de uma escola pior.

Os críticos dos rankings contestam a utilidade da hierarquização das escolas consoante os exames. Só que, habitualmente, também contestam a utilidade dos exames. O que gera a dúvida: se não dão importância aos exames, porque é que os chateia que haja quem dê? É o mesmo que um ateu aborrecer-se com uma beata que avalia como superiores os poderes milagreiros de Santo António em relação aos de São Francisco de Assis. Estes críticos acham positivo haver menos informação disponível. O que, paradoxalmente, os devia fazer apreciar o ranking: mostra as escolas de onde as crianças saem com menos informação.

Apesar de tudo, o ministro tem razão. As notas não devem ser os únicos indicadores para avaliar as escolas. Há outras perspectivas a ter em conta e o ranking ignora-as. Por exemplo, na passada 5ª feira, véspera da publicação do ranking, houve greve de trabalhadores do Estado e o meu enteado, que frequenta uma escola pública, ficou sem aulas. Isto, quando está a meio da época de exames. Mesmo a calhar. Concordei logo com Brandão Rodrigues: este ranking é incompleto. Faz falta outro com os dias de aulas que se perdem por causa de greves. E um com os dias de aulas que se perdem quando o professor está de baixa e o Ministério demora 6 meses a substituí-lo. E um com os dias de aulas que se perdem porque não há material informático para lições online.

No entanto, sou sensível aos argumentos de quem é contra rankings escolares. Também eu, em estudante, fui vítima de listas que elencavam avaliações. Nomeadamente, das coligidas pelas colegas que davam notas à aparência dos rapazes da turma e que, com uma regularidade impressionante, me deixavam sempre no fundo da tabela. Quer no colégio, quer no liceu. O achincalhamento foi o mesmo. Independentemente de os meus pais pagarem ou não mensalidade, independentemente de haver padres no recreio ou haver traficantes no recreio, a minha capacidade para repugnar membros do sexo oposto foi transversal à escola pública e à privada. Se, na altura, os rankings não tivessem sido tornados públicos, teria sofrido menos? Talvez. Mas seria fraco consolo, já que teria continuado a não ter sorte nenhuma com raparigas.

Observador

domingo, 23 de maio de 2021

Portugal–aniversário

Estamos todos de parabéns, já que Portugal faz oficialmente 842 anos – somos, afinal, um dos países mais antigos do mundo! Apesar de não haver um consenso entre os especialistas quanto à data que assinala oficialmente a mais correcta, o dia 23 de Maio parece-nos ser o mais correcto e o dia mais oficial para celebrar de acordo com os costumes da época, já que foi neste dia, em 1179, que o Papa Alexandre III, que representava a Igreja Católica (que governava a Europa na altura) emitiu a bula “Manifestis Probatum”, reconhecendo Portugal como um reino independente.

Bandeira Portuguesa

sexta-feira, 21 de maio de 2021

FRASES QUE GANHARAM IMORTALIDADE

Se a minha avó, não tivesse morrido, estava viva    !!!

Estar vivo é o contrário de estar morto. - Lili Caneças

Nós somos humanos como as pessoas. - Nuno Gomes, SL Benfica

Quem corre agora é o Fonseca, mas está parado. - Jorge Perestrelo

Inácio fechou os olhos e olhou para o céu! - Nuno Luz (SIC)

O meu coração só tem uma cor: azul e branco. - João Pinto, antigo capitão do FC Porto

A China é um país muito grande, habitado por muitos chineses... - Charles de Gaulle

Lá vai Paneira no seu estilo inconfundível... (pausa) ...mas não, é Veloso. - Gabriel Alves

Juskowiak tem a vantagem de ter duas pernas! - Gabriel Alves

É trágico! Está a arder uma vasta área de pinhal de eucaliptos. - jornalista da RTP

Um morreu e o outro está morto. - Manuela Moura Guedes

Prognósticos só depois do jogo. - João Pinto (FCP)

Antes de apertar o pescoço da mulher até à morte, o velho reformado suicidou-se. - João Cunha, testemunha de crime

Quatro hectares de trigo foram queimados. Em princípio trata-se de incêndio. - Lídia Moreno (Rádio Voz de Arganil)

O acidente foi no tristemente célebre Retângulo das Bermudas. - Paulo Aguiar (TV Globo)

O acidente fez um total de um morto e três desaparecidos. Teme-se que não haja vítimas. - Juliana Faria (TV Globo)

Os antigos prisioneiros terão assim a alegria do reencontro para reviver os anos de sofrimento. - Maria do Céu Carmo, psiquiatra

À chegada da polícia, o cadáver encontrava-se rigorosamente imóvel. - Ribeiro de Jesus, PSP de Faro

O acidente provocou forte comoção em toda a região, onde o veículo era bem conhecido. - António Bravo (SIC)

Ela contraiu a doença em vida. - Dr. Joaquim Infante, Hospital de Santa Maria

Há muitos redatores que, para quem veio do nada, são muito fiéis às suas origens. - António Tadeia, Crónicas do Correio da Manhã

A vítima foi estrangulada a golpes de facão. - Ângelo Bálsamo, Jornal do Incrível

A polícia encontrou no esgoto um tronco que provém, seguramente, de um corpo cortado em pedaços. E tudo indica que este tronco faça parte das pernas encontradas na semana passada. - Agente Paulo Castro, Relações Públicas da P. J.

Os sete artistas compõem um trio de talento. - Manuela Moura Guedes (TVI)

Esta nova terapia traz esperanças a todos aqueles que morrem de cancro em cada ano. - Dr. Alves Macedo, oncologista

Quando o jogo está a mil, minha naftalina sobe. - Jardel, ex-jogador do Sporting

Querem fazer do Boavista o bode respiratório. - Jaime Pacheco, treinador do Boavista

Não tem outra, temos que jogar com essa mesma. - Jaime Pacheco, treinador do Boavista, ao responder à pergunta do repórter se eles iriam jogar com aquela chuva

Se entra na chuva é para se queimar. – Denilson, jogador da Seleção do Brasil

Haja o que hajar, o Porto vai ser campeão. - Deco, ex-jogador do FC Porto

O difícil, como vocês sabem, não é fácil. - Jardel

Jogador tem que ser completo como o pato, que é um bicho aquático gramático. - César Prates, ex-jogador do Sporting

No Porto é todo mundo muito simpático. É um povo muito hospitalar. - Deco, ex-Jogador do FC Porto, a comentar a hospitalidade da população

Eu disconcordo com o que vocês disse. - Derlei, do F. C. PORTO, em entrevista ao Jornal Record

Em Portugal é que é bom. Lá, a gente recebe semanalmente de 15 em 15 dias. - Argel, jogador do Benfica

Nem que eu tivesse dois pulmões alcançava essa bola. - Roger, jogador do Benfica

Tenho o maior orgulho de jogar na terra onde Cristo nasceu. - Djair, jogador do Belenenses ao chegar a Belém (zona do Restelo – Mosteiro dos Jerónimos) no dia que assinou contrato com este clube

Finalmente, a água corrente foi instalada no cemitério, para satisfação dos habitantes. - Presidente da Junta da Freguesia do Fundão

Viver em grande em casas pequenas. 42 imagens de micro-apartamentos pelo mundo.

Nas grandes cidades, entre arranha-céus e asfalto, o espaço é um bem precioso. Por isso é que arquitectos e designers se juntaram para criar micro-casas, onde se pode viver em grande. Conheça algumas.

No mundo, há 31 cidades com população superior a 10 milhões de pessoas. É como se Portugal inteiro coubesse numa única cidade em expansão, dominada por arranha-céus e por auto-estradas cruzadas. Cidades tão desenvolvidas como Londres, Manhattan em Nova Iorque ou Hong Kong sofrem agora de uma crise de espaço, que passou a ser um bem precioso (e muito, mas muito caro) nestes grandes centros urbanos.

Encontrá-lo não é fácil. Por isso é que arquitetos e designers se juntaram para criar um novo conceito de apartamentos: são muito pequenos e compactos, mas primam pela modernidade e pelo conforto que oferecem. São as micro-casas. Mas dentro delas, pode viver-se em grande.

É esta a conclusão que a CNN encontrou no livro “Small Homes, Grand Living”. A obra de Gestalten fala sobre os pontos positivos de viver em apartamentos pequenos — ou mesmo minúsculos — construídos às portas de uma cidade socialmente agitada e em expansão. E tudo parece resumir-se num ponto: um apartamento mais pequeno do que a média pode poupar-nos tempo e dinheiro. Agora, importa menos ter móveis luxuosos ou peças de design a enfeitar a sala: o luxo agora é sinónimo de tempo. Mais do que isso, opina o arquiteto alemão Sigurd Larsen, estes apartamentos têm a vantagem de serem energeticamente mais eficientes e serem amigos do ambiente.

Conheça catorze desses apartamentos, incluindo um português, na fotogaleria com 42 imagens.

https://observador.pt/2017/05/08/viver-em-grande-em-casas-pequenas-42-imagens-de-micro-apartamentos-pelo-mundo/

Marta Leite Ferreira

Carlota Joaquina: a rainha infiel que inventou a caipirinha

Carlota Joaquina foi uma mulher peculiar: além de ter ficado com fama de infiel, também há quem diga que inventou a caipirinha. Descubra a a sua história.

Carlota Joaquina

Carlota Joaquina Teresa Caetana de Bourbón e Bourbón nasceu a 25 de Abril de 1775 em Espanha, no Palácio Real de Arajuez. Era a filha primogénita de D. Carlos IV (Rei de Espanha) e da rainha D. Maria Luísa de Parma. Desde muito nova teve o destino traçado: deveria casar com o infante D. João de Portugal, futuro rei do nosso país.

Em 08 de Maio de 1785 com apenas dez anos de idade D. Carlota Joaquina casou-se com o infante D. João Maria de Bragança com então 18 anos. Carlota foi recebida com receio na corte portuguesa por ser espanhola e acabou por procurar refúgio e amizade na rainha D. Maria I que ascendeu ao trono em 24 de Fevereiro de 1777.

A partir de 1788 os acontecimentos que mudariam a vida de Carlota Joaquina sucedem-se de forma vertiginosa. Em 11 de Setembro desse ano, o herdeiro da coroa portuguesa D. José (irmão mais velho de D. João), faleceu vítima de varíola aos 27 anos, tendo Carlota e seu marido passado a ser os novos herdeiros do trono português.

Carlota Joaquina

Apesar de Carlota nunca se ter resignado com o destino que lhe foi dado pelos pais, acabou por se tornar a rainha consorte do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, tendo assumido a regência do país em algumas ocasiões pontuais.

Contudo, a sua personalidade bem marcada e forte acabou por se tornar um estorvo na vida do rei, com o povo a odiá-la devido aos seus caprichos e a corte sem lhe votar grande estima. Era acusada de influenciar negativamente o rei a favor da Coroa Espanhola, entre outras acusações de carácter igualmente sério, como a de conspiração política.

A sua má fama crescia de dia para dia, com os elogios a escassearem e as críticas a subirem de tom com acusações de infidelidade. Sabe-se que Carlota foi realmente uma esposa infiel e manipuladora, tendo conspirado contra o marido por este ser liberal.

Ao que se sabe, na história de Portugal nenhum rei foi mais enganado pela esposa que D. João VI. Enquanto este se ocupava com o reino, a rainha coleccionava amantes, desde o Marquês de Marialva a um simples cocheiro da quinta do Ramalhão (e de quem as más-línguas diziam que D. Miguel era filho).

A criação da caipirinha tem sido atribuída à rainha, sendo que ela terá mandado misturar frutas com cachaça, com a ideia de fazer compotas. Para se refrescar, no entanto, foi ingerindo a mistura com gelo, e a moda acabou por pegar.

Analisando a lista de compras do seu palácio, podem-se encontrar quantidades absurdas de aguardente de cana. A rainha consumiria em excesso esta bebida, chegando a beber 20 litros de caipirinha por dia!

Carlota Joaquina

Carlota Joaquina tinha uma personalidade forte e talvez fosse demasiado ambiciosa. Em 1806, D. João descobriu que a sua esposa tramava contra ele quando percebeu que ela tinha enviado uma carta ao seu pai, que havia ascendido ao trono de Espanha em Dezembro de 1788, incitando-o a invadir Portugal. A partir de então o casal distanciou-se e a sua relação passou a ser marcada pela desconfiança mútua.

Em terras brasileiras as intrigas políticas nas quais Carlota Joaquina estava envolvida não acabaram. Em Março de 1808, D. Carlota pretendia converter-se na máxima autoridade do Vice-Reino do Rio da Prata (actual Argentina) e do Vice-Reino do Peru. Alegava que era a única representante legitima da casa de Bourbon espanhola que não havia sucumbido ao poder de Napoleão.

Faleceu em 07 de Janeiro de 1830 com 54 anos depois de uma vida conturbada e cheia de intrigas políticas. Alguns historiados afirmam que teria posto fim à própria vida por causa do seu isolamento e afastamento dos filhos. Foi sepultada no Panteão Real da Dinastia de Bragança, ao lado marido, no Mosteiro de São Vicente de Fora em Lisboa, onde repousa até os dias de hoje.

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quinta-feira, 20 de maio de 2021

Por que a academia não pode tolerar divergências sobre sexo biológico?

Por JOHN STADDON

Não deve ser controverso afirmar que existem apenas dois sexos.

Se passaram por uma ou duas gerações de pós-comprimido de libertação sexual única para sexo e género mais uma vez tornar-se impossível para discutir de forma desapaixonada - mesmo num local supostamente científico, como um listserv da American Psychological Association (APA )

Recentemente, fui excluído de uma lista de discussão por e-mail da APA. Não fui informado exactamente por quê, embora eu acredite que tenha sido por causa de alguns comentários um tanto cépticos que fiz sobre sexo não binário. E gostei da ironia que meu expelido me disse, enquanto no acto de me expulsar, que ele reconhecehá uma ampla gama de pontos de vista sobre muitos assuntos”.

Talvez sim. Mas os fatos biológicos aqui são claros. Todos os mamíferos se reproduzem sexualmente; a reprodução requer um óvulo e um espermatozóide, o macho fornece o espermatozóide e a fêmea o óvulo - não há espaço para terceiros. Masculino e feminino são isso. Algumas espécies não mamíferas mostram uma flexibilidade surpreendente. Alguns zooplânctons, como os rotíferos, têm um complexo arranjo de compartilhamento que ainda está sendo separado (pelo menos por nós; os rotíferos parecem perfeitamente claros sobre o assunto). As espadas adultas ( Xiphophorus helleri ), um popular peixe de aquário vivo, às vezes mudam de sexo de fêmea para macho. Muitas outras espécies de peixes mudam de sexo quando adultos - de fêmea para macho e vice-versa. Em peixe-palhaço ( Amphiprion), a mudança é desencadeada, por exemplo, pela composição do cardume (se for toda fêmea, uma fêmea pode mudar para macho) ou simplesmente pela idade.

Os mamíferos são menos flexíveis, mas essencialmente todas as espécies de mamíferos que foram cuidadosamente estudadas mostram desvios do comportamento heterossexual normal - “normal” no sentido de que é tanto o padrão maioritário quanto essencial para a sobrevivência da espécie. Os seres humanos obviamente também apresentam uma variedade de padrões anormais, como a homossexualidade. (“A homossexualidade é tão natural quanto a heterossexualidade”, como Myra Breckinridgeo autor Gore Vidal disse. “Observe que uso a palavra 'natural', não normal.”) Inclua também o desejo de ser, ou a sensação de ser, o sexo oposto (transgénero). Essas variantes constituem uma pequena fracção da população. Entre 2 e 10 por cento da população masculina dos EUA pode ser homossexual e talvez 1 a 2 por cento das mulheres. A proporção de bissexuais e transexuais é provavelmente muito menor. Todos esses números são alvos móveis e variam com os ventos da mudança cultural.

As causas das diferentes variantes são incertas; sem dúvida, factores culturais e biológicos (genéticos, de desenvolvimento) estão envolvidos numa mistura ainda desconhecida. A função adaptativa de indivíduos que não se reproduzem também não é clara. Obviamente, se uma fracção substancial da população parar de se reproduzir, o futuro da espécie parece sombrio. Por outro lado, a divisão de interesses e a divisão do trabalho podem significar que algumas minorias não reprodutivas (as seitas religiosas celibatárias são um exemplo óbvio) contribuem em vez de diminuir a “adequação” de uma cultura.

Como as variantes devem ser avaliadas é uma questão de ética e política, não de ciência. Mas a biologia é importante; e aqui, a política pode distorcer a ciência. Que existem dois sexos é biologicamente indiscutível. Que existem várias variantes minoritárias também é indiscutível. Mas o sexo não é um continuum.

Existem diferenças reais entre homens e mulheres. Algumas afirmações chegam a um consenso: quase todos concordarão com elas. Outros, nem tanto. Por exemplo, os homens em geral são mais fortes do que as mulheres: correm mais rápido, levantam pesos pesados ​​e são melhores jogadores de futebol. Apesar da milagrosa Simone Biles, os homens podem ser ginastas ainda melhores. Os homens também tendem a morrer mais cedo, cometer crimes mais violentos, correr mais riscos e sofrer mais acidentes. A maioria das pessoas concorda com essas coisas. O que eles significam para a participação das mulheres nas forças armadas? Participação de mulheres trans (isto é, homens) em desportos femininos?

Os psicólogos também nos dizem que os homens tendem a se interessar mais pelas coisas, enquanto as mulheres se interessam mais pelas pessoas. Essa diferença pode explicar parcialmente as disparidades entre homens e mulheres em profissões como enfermagem e engenharia? Os machos, na maioria das dimensões, são mais variáveis ​​do que as fêmeas. Em algumas medidas cognitivas, por exemplo, as médias populacionais são as mesmas, mas a distribuição masculina é mais espalhada: mais idiotas do sexo masculino e também mais génios do sexo masculino. Aludir a isso como uma explicação para a representação desproporcional de homens nos departamentos de matemática em Harvard colocou o então presidente de Harvard, Larry Summers, em apuros alguns anos atrás. No entanto, é um fato.

(AMAYRA / stock / Getty Images)Não deve ser controverso afirmar que existem apenas dois sexos

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JOHN STADDON é o ilustre professor de psicologia e neurociência de James B. Duke e professor de biologia, emérito da Duke University.

Como pode um agricultor belga mover acidentalmente a fronteira com a França? É surpreendentemente fácil, como mostra a história.

Um agricultor recentemente levantou a possibilidade de um incidente internacional quando inadvertidamente redesenhou a fronteira entre a Bélgica e a França . Ele teria ficado irritado com um pedaço de rocha que bloqueava o caminho de seu tractor, e então ele o moveu. Mas esta rocha acabou por ser uma pedra de fronteira que estava no lugar desde 1819. Ao jogá-la para fora do caminho de seu tractor, ele redesenhou a fronteira franco-belga em 2,29 metros (7,5 pés), tornando a Bélgica maior e a França menor.

O incidente foi, felizmente, recebido com bom humor - mas se o fazendeiro se recusar a devolver a pedra à sua posição original, ele pode enfrentar acusações criminais, e o caso precisará ser encaminhado ao Ministério das Relações Exteriores da Bélgica. O ministério, por sua vez, precisaria convocar uma comissão de fronteira franco-belga. Não houve uma reunião de tal órgão desde 1930.

A fronteira franco-belga foi estabelecida sob o Tratado de Kortrijk - assinado em 1820 após a derrota de Napoleão em Waterloo cinco anos antes. Este foi um de uma série de tratados de fronteira assinados pela França no século XIX. Mas esses tratados nunca encerraram o assunto. A posição exacta da fronteira precisava acomodar a paisagem e, portanto, no caso da fronteira franco-belga, as negociações entre os administradores locais de ambos os lados duraram até 1825.

Em outras áreas da França, as fronteiras ao longo dos rios mudaram quando os rios foram redireccionados ou estouraram suas margens. Algumas cidades foram completamente ignoradas pelas comissões de fronteira. Na fronteira franco-alemã, todos os que viviam na área presumiram que uma floresta pertencente à cidade de Leidingen ficava no lado alemão da fronteira. Em 1918, foi descoberto que o protocolo de 1833 não havia feito nenhuma provisão para isso e que a floresta estivera na França o tempo todo. Enquanto isso, travessias regulares para trabalhar ou fazer compras, combinadas com poucas (se houver) restrições na fronteira, significava que as pessoas que moravam ao lado da fronteira geralmente prestavam pouca atenção a ela.

Boas fronteiras fazem bons vizinhos

As fronteiras da França mudaram novamente após a primeira guerra mundial, quando a Alsácia-Lorena voltou da Alemanha. Como o Tratado de Kortrijk, o Tratado de Versalhes estabeleceu a fronteira , mas depois deixou para os administradores locais definirem para onde deveria ir. Em resposta, ambos os lados contactaram as prefeituras locais para garantir que a linha evitasse dividir aldeias, cortar estações ou separar os fazendeiros de suas terras, então a linha fixada em Versalhes se moveu como resultado.

Na nova aldeia francesa de Schonecken , por exemplo, a fronteira planeada cortou duas casas pela metade e deixou uma terceira casa na Alemanha, o que significa que os residentes teriam que cruzar a fronteira toda vez que fossem às lojas, pubs ou igrejas. Depois que os habitantes protestaram, a fronteira foi mudada.

Para a França, esse exercício de consulta massiva tinha o objectivo de evitar um incidente de fronteira com a Alemanha e o reinício do conflito após a primeira guerra mundial, trabalhando com o princípio de que boas fronteiras fazem bons vizinhos.

Depois que a fronteira franco-alemã foi consertada, alguns incidentes deixaram as autoridades nervosas. Em 1923, uma pedra da fronteira entre a França e o vale do Saar foi revirada e cortada em duas. Esse vandalismo deixou os administradores locais preocupados por representar uma forma de protesto de um local insatisfeito com o governo francês. Não sabemos se eles descobriram a verdade.

No ano seguinte, a linha da fronteira entre a França e Luxemburgo foi redesenhada quando as pedras da fronteira em Audun-le-Tiche foram roubadas, deixando os moradores incertos sobre onde ficava a fronteira.

E o redireccionamento do Reno em 1872 significou que muitas aldeias descobriram que suas terras comuns agora ficavam do lado alemão da fronteira. De repente, eles precisaram cruzar a fronteira nacional para pescar ou caçar. Quando chegaram ao Ministério das Relações Exteriores relatórios de moradores locais sendo detidos sob pretextos espúrios , isso aumentou os temores franceses sobre tensões na fronteira. Mas nenhum incidente aconteceu. Isso foi um alívio para o governo francês, que fazia questão de evitar o confronto com a Alemanha, mas também estava preocupado em manter a estabilidade dentro da França. Tendo acabado de recuperar a Alsácia-Lorena, eles estavam particularmente interessados ​​em manter a população feliz.

Em Setembro de 1939, os temores da França se concretizaram quando um incidente encenado na fronteira se tornou o pretexto para a invasão alemã da Polónia. No Verão seguinte, as tropas na fronteira entre a França, a Alemanha e a Suíça agiram como uma isca enquanto as tropas alemãs invadiam a França pelo norte. Hitler cruzou a fronteira do rio Reno em Junho de 1940 quando a Alsácia-Lorena foi anexada ao Terceiro Reich e a fronteira foi fechada e cercada por uma zona proibida. O fim da segunda guerra mundial viu a Alsácia-Lorena retornar à França e uma nova identidade para a região como um símbolo da reconciliação franco-alemã.

Fronteiras no século 21

Embora possamos imaginar as fronteiras fixas ou inamovíveis, elas mudaram e mudaram como resultado da guerra e ajustes territoriais - mas também como resultado das acções de pessoas comuns.

Seja o aborrecimento com uma pedra bloqueando o caminho de um tractor ou um apelo ao Itamaraty por intervenção, os moradores locais têm uma longa história de mudança e mudança de fronteiras. A forma como os estados respondem a tais incidentes depende de seu relacionamento com os países adjacentes. O fato de o recente movimento da fronteira franco-belga ter sido visto com bom humor por ambos os lados é uma prova da relação da França e da Bélgica como bons vizinhos, mesmo que suas fronteiras sejam um pouco vagas.

Laura Hood

Editor de Política, Editor Assistente

Corrupção: Faz o que digo, não o que eu faço.

Prevejo os bons tempos de José Sócrates!!!


Na estratégia de combate à corrupção, o governo vai impor – e bem – que entidades públicas e privadas tenham em vigor um conjunto de instrumentos que regulem condutas e minimizem riscos de corrupção, como códigos de conduta, planos de prevenção da corrupção e canais seguros de denúncia.

A política exige liderança. A implementação de políticas exige liderança. E liderar pelo exemplo é, provavelmente, das formas mais eficazes quando se trata de mudar comportamentos e impor obrigações. Nada disto tem sido visto no combate à corrupção em Portugal. O lema não é liderar pelo exemplo, mas sim "faz o que eu digo, não faças o que eu faço". As situações repetem-se.

Na estratégia de combate à corrupção, o governo vai impor – e bem – que entidades públicas e privadas tenham em vigor um conjunto de instrumentos que regulem condutas e minimizem riscos de corrupção, como códigos de conduta, planos de prevenção da corrupção e canais seguros de denúncia. Contudo, para além de se excluir a si próprio dessas obrigações, o governo tratou de assegurar que os gabinetes dos órgãos de soberania e principais órgãos políticos, bem como Banco de Portugal, estariam fora dessas obrigações. Mais: ao excluir expressamente estes órgãos da lei, o governo dá uma machadada a anos de boas práticas, durante os quais várias dessas entidades seguiram a recomendação do Conselho de Prevenção da Corrupção e elaboraram planos de prevenção. Impor obrigações semelhantes aos partidos políticos, isso então, é tabu, ignorando as ideias já defendidas por vários, como Guilherme d’Oliveira Martins, vários militantes do PSD e também por mim.

De resto, o Código de Conduta do Governo, tal como está redigido e tem sido aplicado, jamais poderia servir de benchmark para quem quer que fosse. Para além de não ter mecanismos de supervisão ou sanções (só uma mera e vaga "responsabilidade política), nem de abranger todas as áreas sobre as quais incidem as diferentes condutas dos membros do governo (relações com a administração pública, utilização de redes sociais, assédio moral ou sexual, por exemplo), tem sido um falhanço em toda a linha. Nunca conseguiu prevenir ou tirar consequências de qualquer escândalo. O próprio Primeiro-Ministro, principal garante do cumprimento do código, pisou terreno minado ao ter aceite fazer parte da Comissão de Honra da candidatura de Luís Filipe Vieira ao Benfica. Liderar sim, pelo exemplo não, ao que parece.

O Conselho de Prevenção da Corrupção (CPC) não tem um curriculum de liderança muito melhor do que o governo nesta matéria. Ficou a saber-se, no inicio deste ano, que o CPC tomou a iniciativa de questionar a necessidade dos seus membros apresentarem a declaração de interesses, património e rendimentos, abrindo assim uma excepção à regra a quem estão sujeitos os titulares de altos cargos públicos. Não interessa se esta excepção mina a liderança da entidade que mais devia pugnar pela transparência, a probidade na vida pública e o combate à corrupção. Lei é lei e se a lei me dá oportunidade de não a cumprir, é isso que devo fazer.

Um (mau) exemplo final poderia ser a incongruência entre a proposta de protecção de denunciantes desenhada pelo governo (ainda que por imposição europeia) e a conduta do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que enviou à Autoridade Tributária uma "nota" sobre a participação de um funcionário no Movimento Cultural Terras de Miranda, que denunciou publicamente a negociata fiscal da venda da concessão das barragens da EDP. Este alerta do Secretário de Estado será legal daqui a uns meses, quando a lei de protecção de denunciantes entrar em vigor? Um governo que defende a protecção de denunciantes e a deve promover junto das várias entidades obrigadas pode, ao mesmo tempo, fazer queixa de um denunciante?

Uma liderança que dá o exemplo é uma liderança sem legitimidade.

Susana Coroado

Investigadora

https://www.sabado.pt/