Prevejo os bons tempos de José Sócrates!!!
Na estratégia de combate à corrupção, o governo vai impor – e bem – que entidades públicas e privadas tenham em vigor um conjunto de instrumentos que regulem condutas e minimizem riscos de corrupção, como códigos de conduta, planos de prevenção da corrupção e canais seguros de denúncia.
A política exige liderança. A implementação de políticas exige liderança. E liderar pelo exemplo é, provavelmente, das formas mais eficazes quando se trata de mudar comportamentos e impor obrigações. Nada disto tem sido visto no combate à corrupção em Portugal. O lema não é liderar pelo exemplo, mas sim "faz o que eu digo, não faças o que eu faço". As situações repetem-se.
Na estratégia de combate à corrupção, o governo vai impor – e bem – que entidades públicas e privadas tenham em vigor um conjunto de instrumentos que regulem condutas e minimizem riscos de corrupção, como códigos de conduta, planos de prevenção da corrupção e canais seguros de denúncia. Contudo, para além de se excluir a si próprio dessas obrigações, o governo tratou de assegurar que os gabinetes dos órgãos de soberania e principais órgãos políticos, bem como Banco de Portugal, estariam fora dessas obrigações. Mais: ao excluir expressamente estes órgãos da lei, o governo dá uma machadada a anos de boas práticas, durante os quais várias dessas entidades seguiram a recomendação do Conselho de Prevenção da Corrupção e elaboraram planos de prevenção. Impor obrigações semelhantes aos partidos políticos, isso então, é tabu, ignorando as ideias já defendidas por vários, como Guilherme d’Oliveira Martins, vários militantes do PSD e também por mim.
De resto, o Código de Conduta do Governo, tal como está redigido e tem sido aplicado, jamais poderia servir de benchmark para quem quer que fosse. Para além de não ter mecanismos de supervisão ou sanções (só uma mera e vaga "responsabilidade política), nem de abranger todas as áreas sobre as quais incidem as diferentes condutas dos membros do governo (relações com a administração pública, utilização de redes sociais, assédio moral ou sexual, por exemplo), tem sido um falhanço em toda a linha. Nunca conseguiu prevenir ou tirar consequências de qualquer escândalo. O próprio Primeiro-Ministro, principal garante do cumprimento do código, pisou terreno minado ao ter aceite fazer parte da Comissão de Honra da candidatura de Luís Filipe Vieira ao Benfica. Liderar sim, pelo exemplo não, ao que parece.
O Conselho de Prevenção da Corrupção (CPC) não tem um curriculum de liderança muito melhor do que o governo nesta matéria. Ficou a saber-se, no inicio deste ano, que o CPC tomou a iniciativa de questionar a necessidade dos seus membros apresentarem a declaração de interesses, património e rendimentos, abrindo assim uma excepção à regra a quem estão sujeitos os titulares de altos cargos públicos. Não interessa se esta excepção mina a liderança da entidade que mais devia pugnar pela transparência, a probidade na vida pública e o combate à corrupção. Lei é lei e se a lei me dá oportunidade de não a cumprir, é isso que devo fazer.
Um (mau) exemplo final poderia ser a incongruência entre a proposta de protecção de denunciantes desenhada pelo governo (ainda que por imposição europeia) e a conduta do Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais que enviou à Autoridade Tributária uma "nota" sobre a participação de um funcionário no Movimento Cultural Terras de Miranda, que denunciou publicamente a negociata fiscal da venda da concessão das barragens da EDP. Este alerta do Secretário de Estado será legal daqui a uns meses, quando a lei de protecção de denunciantes entrar em vigor? Um governo que defende a protecção de denunciantes e a deve promover junto das várias entidades obrigadas pode, ao mesmo tempo, fazer queixa de um denunciante?
Uma liderança que dá o exemplo é uma liderança sem legitimidade.
Susana Coroado
Investigadora
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