segunda-feira, 5 de junho de 2023

A polémica dos novos Certificados de Aforro em 20 perguntas e respostas

Diogo Cavaleiro, João Silvestre, Sónia M. Lourenço

As Finanças surpreenderam na noite de sexta-feira com uma alteração às regras dos certificados. A anterior série E que tinha taxa máxima foi encerrada e criada uma nova - a F - com taxa inferior (2,5%). O Governo tem sido acusado de ceder à banca. Será assim? Saiba tudo neste descodificador.

A alteração às regras dos Certificados de Aforro chegou na noite da última sexta-feira. A série E que estava em vigor, com uma taxa máxima de 3,5% (mais prémio de permanência) e período de 10 anos, foi encerrada e criada uma nova. A série F tem um prazo máximo de 15 anos só que a taxa é inferior: tem um tecto de 2,5% a que acrescem prémios de permanência.

A decisão do Governo foi vista - por alguns comentadores e partidos da oposição - como uma cedência à banca que, nos últimos meses, tem perdido milhares de milhões de euros em depósitos. Já se esperava esta decisão? Quem já tem dinheiro investido sai afectado? A nova taxa de juro continua a ser vantajosa face à dos depósitos? Os bancos saem a ganhar? Deixamos-lhe um explicador, em 20 perguntas com resposta.

1 - A TAXA DOS CERTIFICADOS VAI BAIXAR?

Sim. A taxa de juro base da nova série dos certificados de aforro (série F) corresponde à taxa Euribor a três meses, com um tecto de 2,5%. A taxa é determinada mensalmente no antepenúltimo dia útil do mês, tendo em conta a média dos valores da Euribor observados nos dez dias úteis anteriores. Por comparação, na anterior série de certificados de aforro (série E), que esteve em comercialização até à última sexta-feira, 2 de Junho, essa taxa de juro base correspondia à Euribor a três meses acrescida de 1 ponto percentual (p.p.), com um tecto de 3,5%. Resultado, quem subscreveu certificados na semana passada tem uma taxa de juro base de 3,5%. Quem subscrever esta semana fica pelos 2,5%.

2 - OS PRÉMIOS DE PERMANÊNCIA TAMBÉM SOFREM ALTERAÇÕES?

Sim. A par do alargamento do prazo máximo da aplicação, de 10 anos para 15 anos, O IGCP mexeu nos prémios de permanência, que somam à taxa de juro base. E que, agora, começam em valores muito baixos. Na série F, são de 0,25 p.p. entre o segundo e o quinto ano após a subscrição; sendo de 0,5 p.p. do 6º ao 9º ano; de 1 p.p. no 10º e 11º ano; de 1,5 p.p. no 12º e 13º ano; e de 1,75 p.p. no 14º e 15º ano. Por comparação, na anterior série E, os prémios de permanência começavam em 0,5 p.p., pagos logo desde o 2º e até ao 5º ano, atingindo 1 p.p. do 6º ao 10º ano. Comparando os valores, conclui-se que os prémios de permanência foram cortados para metade nos primeiros nove anos de subscrição dos certificados de aforro.

3 - O VALOR MÁXIMO QUE OS AFORRADORES PODEM INVESTIR DIMINUI?

Sim. O valor máximo de subscrição baixa de 250 mil euros na série E, para 50 mil euros na nova série F. Mais ainda, considerando as duas séries, os aforradores apenas podem aplicar um valor máximo de 250 mil euros. Ou seja, quem tiver aplicado o valor máximo da anterior série dos certificados de aforro (série E), não pode subscrever a nova série F.

4 - QUEM JÁ TINHA INVESTIDO ANTES É AFETADO?

Não. As novas condições de remuneração aplicam-se apenas às novas subscrições de certificados. Quem investiu em certificados de aforro da anterior série E, que esteve em comercialização até à passada sexta-feira, 2 de Junho, mantém todas as condições que tinha. Ou seja, a taxa de juro base continua a corresponder à Euribor a três meses acrescida de 1 p.p., com um tecto de 3,5%, que já foi atingido. Os prémios de permanência também se mantêm inalterados.

5 - A NOVA TAXA MÁXIMA DE 2,5% CONTINUA A SER VANTAJOSA FACE AOS BANCOS?

Em regra, sim. Os dados do Banco de Portugal sobre a taxa de juro média dos novos depósitos a prazo das famílias indicam que está a subir, mas mantém-se muito longe desses 2,5% dos certificados de aforro. Em Abril, essa taxa média nos novos depósitos a prazo das famílias foi de 1,03% (0,9% em Março). Discriminando por prazo dos depósitos, o Banco de Portugal indica que os novos depósitos com prazo até 1 ano foram remunerados, em média, a 0,95% (0,88% em Março); a remuneração média dos novos depósitos de 1 a 2 anos foi de 1,29% (1,12% em Março); e a dos novos depósitos acima de 2 anos foi de 1,12% (0,79% em Março). Atenção: estes são valores médios, o que significa que é possível encontrar propostas de depósitos mais vantajosas no mercado. Em regra, os bancos mais pequenos tendem a pagar taxas de depósitos mais elevadas, para atrair clientes, enquanto os bancos maiores, com maior liquidez face ao montante de crédito que concedem, tendem a pagar taxas mais baixas.

6 - COMO COMPARA PORTUGAL COM OS OUTROS PAÍSES DA ZONA EURO NA TAXA DE JURO MÉDIA DOS DEPÓSITOS A PRAZO?

A taxa de juro média dos novos depósitos a prazo das famílias em Portugal é das mais baixas na zona euro. Nos depósitos com prazo até um ano só no Chipre e Eslovénia os bancos pagam menos, em média, do que em Portugal tendo em conta os últimos dados disponíveis, relativos a Abril. Mais ainda, Portugal regista o terceiro menor aumento entre Dezembro de 2021 – imediatamente antes de as taxas de juro começarem a subir – e Abril de 2023. O acréscimo foi de 0,91 pontos percentuais, com a taxa a passar de 0,04% para 0,95%. Nos novos depósitos das famílias com prazo superior a um ano, o cenário é semelhante. Portugal tinha, em Abril, a terceira taxa média mais baixa da zona euro, nos 1,24%, registando o sexto menor aumento face a Dezembro de 2021 (1,17 pontos percentuais).

7 - TAMBÉM SOMOS DOS QUE PAGAM MENOS JUROS /NO CRÉDITO À HABITAÇÃO?

Não. A situação é bem diferente da que se vive na taxa de juro média dos novos créditos à habitação. Portugal tinha, em Abril, a oitava mais alta da zona euro, nos 3,97%. Mais ainda, esta taxa subiu 3,14 pontos percentuais face a Dezembro de 2021. Foi o terceiro maior aumento entre os países da zona euro. E é um aumento muito superior ao registado na taxa de juro média dos novos depósitos das famílias.

8 - QUAL A JUSTIFICAÇÃO PARA ESTA MUDANÇA NOS CERTIFICADOS?

O Governo recusa estar a ceder a qualquer apelo da banca para esta decisão, o que surgiu no espaço público devido a palavras de João Moreira Rato, que preside ao Banco CTT, e que numa entrevista à CNN disse que a subscrição de Certificados devia ser suspensa – que, tendo sido presidente do IGCP, considera que o Governo deveria colocar esse travão devido ao peso na dívida pública. “A criação da nova série F realinha a remuneração dos certificados de aforro com a remuneração das restantes fontes de financiamento da República Portuguesa. Além de promover a coerência da remuneração entre os vários instrumentos de financiamento, a nova série F permitirá também distribuir de forma mais equilibrada as amortizações de dívida por diferentes anos, assim contribuindo para a gestão prudente da dívida pública”, foi a justificação dada pelo Executivo na sexta-feira. Na prática, é tirar remuneração aos portugueses, que estavam em força a recorrer a este produto em busca de uma remuneração mais atractiva em época de inflação a disparar, para não sobrecarregar o Estado quando chegar a hora de reembolsar estes produtos.

9 - QUEM PODE VENDER CERTIFICADOS?

Esta é uma das mudanças mais significativas no que diz respeito à decisão de alterar a remuneração dos Certificados de Aforro: até aqui só era possível fazer a subscrição por via do IGCP, junto do seu site, nos espaços da AMA (Agência para a Modernização Administrativa) e, fora do Estado, nas lojas dos CTT. Para isso, o IGCP tem um contracto de distribuição com os CTT, através do qual, segundo o presidente, Miguel Martín, o instituto paga 0,585% nas subscrições até dado montante (não identificado), a partir do qual passa a pagar apenas 0,26% pela subscrição. Mais pormenores não são conhecidos. Na nova série, há uma alteração: além do que estava em vigor, acrescentam-se as “redes físicas ou digitais de qualquer instituição financeira ou de pagamentos inscrita no Banco de Portugal e indicadas para o efeito pelo IGCP, E. P. E.”. Ou seja, os bancos e instituições de pagamento (como Raize e Easypay ou Payshop) são elegíveis para vir a comercializar estes certificados. Mas tal comercialização ainda não acontece; até porque a Associação Portuguesa de Bancos (APB) diz desconhecer ainda quais as condições para promover essa comercialização.

10 - POR QUE ATÉ AGORA OS BANCOS NÃO COMERCIALIZAVAM?

As portarias do Governo definem quais as entidades com acordos para a venda dos certificados, mas, na portaria publicada na passada sexta-feira, é que foi definido que as “instituições financeiras ou de pagamento” podem também fazer a comercialização. Numa audição parlamentar em Fevereiro, o presidente do IGCP, Miguel Martín, assumia que não era positivo para o Estado o exclusivo da venda dos certificados (porque pagava aos CTT uma comissão definida sem concorrência, de 0,585% até um determinado montante de títulos subscritos, 0,26% a partir daí), mas sublinhava que a banca não tinha incentivo para vender estes produtos, já que os certificados canibalizam os seus depósitos ou outros produtos, de outros parceiros, como seguros, que possam gerar comissões maiores. O Governo anunciou que os bancos podiam agora fazer esta comercialização, sem com eles contactar inicialmente, deixando parte da pressão sobre o lado do sector bancário.

11 - JÁ SE ESPERAVA ESTA DECISÃO?

Não era segredo que esta reflexão tinha de acontecer – e já estava a acontecer. Numa audição parlamentar no início de Fevereiro, Miguel Martín disse que o pensamento é contínuo, mas tinha afirmado que havia pouca visibilidade sobre a política monetária do Banco Central Europeu, que só haveria mais em Junho. A análise tinha de conjugar vários factores, admitiu o presidente do IGCP: as taxas de juro, os produtos alternativos, as necessidades de financiamento do Estado, os canais de distribuição, etc. Segundo foi já assumido pelo Governo, há um mês que estava já definida a mudança de condições dos certificados, mas só agora foi anunciada. E, queixou-se a APB, sem que houvesse conversas prévias com os bancos para perceber a sua disponibilidade para comercializar o produto.

12 - QUANDO SERÁ POSSÍVEL SUBSCREVER VIA BANCOS?

Não se sabe, e bem pode demorar algum tempo. Desde logo, e como referido, os bancos podem só promover a distribuição se assim o entenderem, e o BCP, por exemplo, diz que ainda não foi contactado para saber se estava disponível. Além disso, depois de uma decisão desse género, é preciso tempo para criar o sistema informático que facilite a subscrição; o que até agora era difícil. Nos CTT, por exemplo, é preciso ir fisicamente aos balcões para fazer a primeira subscrição, sendo só é possível fazer reforços através da plataforma digital do IGCP.

13 - QUAL O PESO DOS CERTIFICADOS DE AFORRO PARA O FINANCIAMENTO DO ESTADO?

Normalmente, os Certificados de Aforro têm um peso relativamente baixo na dívida pública. No final de 2020, ano da pandemia, somavam 12.220 milhões, menos de 5% da divida total. Um ano mais tarde, ainda em tempo de taxas de juro ‘zero’, estavam pouco acima em 12.469 milhões. E só no ano passado, a partir do momento em que o Banco Central Europeu (BCE) iniciou a subida das taxas, é que as subscrições aceleraram. No final de Dezembro ascendiam já 19.626 milhões e em Abril, o último mês com dados disponíveis, atingiam 30.324.

14 - QUE DESVANTAGENS PODEM DECORRER DAQUI?

O peso na dívida praticamente triplicou e tornou este instrumento mais relevante do que era habitual para o financiamento do Estado. O que, sendo uma aplicação sujeita a alguma volatilidade, pode representar um risco acrescido para a gestão financeira do Estado. Para se ter um termo de comparação: representa quase cinco vezes o montante de Bilhetes do Tesouro e o equivalente a 60% dos empréstimos que ainda restam dos fundos da União Europeia do programa da troika.

15 - OS CERTIFICADOS DE AFORRO SÃO MAIS CAROS QUE OUTRAS ALTERNATIVAS DE DÍVIDA PÚBLICA?

Aparentemente sim. A taxa de 3,5% é superior às taxas yield de todos os prazos das Obrigações do Tesouro até 15 anos. Só a 20 e 30 anos, cujas taxas estão em 3,515% e 3,639%, o custo de financiamento é elevado. Além disso, à taxa máxima de 3,5% acrescem ainda prémios de permanência que, para aplicações que durem 10 anos, atinge 1% ao ano entre o sexto e o décimo ano.

16 - ESTA ALTERAÇÃO NA TAXA DOS CERTIFICADOS BENEFICIA OS BANCOS?

Na prática, acontece uma coisa benéfica: tira alguma pressão concorrencial. Sentido uma fuga de depósitos relevante, os bancos foram já subindo ligeiramente as taxas, mas muito abaixo das taxas que cobram nos créditos concedidos, e muito abaixo tanto da antiga como da nova remuneração dos Certificados. Com uma taxa menos atractiva, pode haver menos vontade para quebrar a inércia e retirar o produto financeiro. Mas, como referido, com uma média de 1% dos novos depósitos, a verdade é que mesmo baixando a remuneração inicial para 2,5%, a diferença é ainda substancial. Com menos pressão concorrencial, e ainda que haja essa diferença, os incentivos para melhorar a remuneração dos depósitos diminuem.

17 - POR QUE É QUE OS BANCOS NÃO SOBEM OS DEPÓSITOS?

Porque não precisam. Os bancos portugueses - e os europeus em geral - têm bastante liquidez e, ao mesmo tempo, têm reduzidos rácios de transformação (relação entre crédito e depósitos). Enquanto assim for, dificilmente as taxas de juro dos depósitos - a prazo, que concorrem mais directamente com os Certificados, mas não só - subirão. A taxa dos Certificados de Aforro mais baixa alivia a pressão sobre os bancos mas, na prática, o impacto pode não ser muito significativo. Os bancos nacionais têm neste momento mais de 30 mil milhões estacionados no BCE, a receber uma taxa de 3,25%. Só quando tiverem necessidade de liquidez - e os depósitos são, por definição, a forma tradicional de se financiarem - é que vão mexer. Até lá, nada deverá mudar muito nas taxas de juro dos bancos, até porque a concorrência entre instituições tem sido pouco intensa.

18 - OS CERTIFICADOS DE AFORRO SÃO EQUIVALENTES A DEPÓSITOS?

Os certificados são produtos com garantia de capital, pelo que o Estado só não assegura o pagamento a nível de juros, em situações de dificuldade. Já os depósitos bancários têm a protecção de capital e, por trás, têm o Fundo de Garantia de Depósitos, o que faz com que, em casos de stress ou insolvência, tenham de ser assegurados os depósitos até 100 mil euros por titular.

19 - COMO REAGIRAM OS PARTIDOS?

A reacção dos partidos, da esquerda à direita, tem sido de forte crítica à decisão do Ministério das Finanças, anunciada numa sexta-feira ao fim da tarde. Tanto PCP como BE dizem que o Governo “escolheu a banca” - estão a relacionar a decisão do Governo às palavras de João Moreira Rato. António Filipe, do PCP, escreveu um texto no Expresso a defender essa força da banca perante o Executivo. Os comunistas prometeram um requerimento para chamar o secretário de Estado das Finanças, João Nuno Mendes, ao Parlamento (que no sábado recusou estar a haver qualquer cedência à banca), e o Chega, que também fala em “subserviência” do Estado perante a banca, começou a semana a chamar o ministro e o presidente do IGCP.

20 - COMO REAGIRAM OS BANCOS?

Com cautela. Por um lado, a Associação Portuguesa de Bancos (APB) quis mostrar-se distante desta decisão que os partidos dizem ser tomada em resposta ao seu apelo ao afirmar que nem tinham sido contactados. Por outro lado, a associação presidida por Vítor Bento também diz desconhecer as condições que estão a ser propostas. Já os bancos estão a demorar a posição: a CGD, banco do Estado, remeteu totalmente para a APB. O BCP e o Novo Banco esperam para ver melhor. “A eventual decisão sobre se virá ou não a comercializar esses instrumentos será tomada quando for contactado para o efeito - saliente-se que ainda não foi -, tendo presente as condições concretas que sejam definidas”, diz fonte oficial do BCP.

https://expresso.pt/economia/2023-06-05-A-polemica-dos-novos-Certificados-de-Aforro-em-20-perguntas-e-respostas-2ccee7f0

domingo, 4 de junho de 2023

Melhorar a forma como o FMI faz negócios pode ajudar bilhões de pessoas em todo o mundo – dando dinheiro aos governos para gastar em bens públicos e aumentando a responsabilidade.


Em países do Sul Global, o lançamento de programas do FMI costuma gerar grande preocupação . Isso se deve à reputação do FMI: durante a década de 1980, muitos países da África, Ásia e América Latina recorreram ao FMI em busca de empréstimos para mitigar os desafios económicos. Esses empréstimos foram acompanhados de condições rigorosas e os países enfrentaram pressão para reduzir os subsídios públicos e os gastos sociais, reduzir a força de trabalho do sector público e aumentar os impostos. Originalmente fundado após a segunda guerra mundial , o FMI visava fornecer uma estrutura para os países cooperarem na gestão de suas taxas de câmbio e facilitar o comércio internacional. Desde então, evoluiu para fornecer assistência financeira e apoio a países que enfrentam crises económicas e emergências em todo o mundo. Os países membros contribuem com uma certa quantia de dinheiro para o FMI com base em seu tamanho económico e, por sua vez, podem acessar empréstimos como meio de ajuda.
Durante a recente pandemia de COVID-19, o FMI concedeu empréstimos a mais de 80 países . Actualmente, mais de 90 países continuam endividados com o FMI, sendo esses empréstimos acompanhados de condições de política. Neste episódio do The Conversation Weekly , conversamos com dois pesquisadores sobre o impacto dos empréstimos do FMI nos países beneficiários e por que os países continuam a depender dos empréstimos do FMI. Também discutimos possíveis alternativas a esse sistema.

Impacto contínuo do colonialismo
Danny Bradlow , professor de direito do desenvolvimento internacional e relações econômicas africanas e membro sênior da Universidade de Pretória, na África do Sul, destaca os efeitos nocivos das medidas de austeridade impostas pelo FMI.
O impacto contínuo do colonialismo significa que muitos países do Sul Global “estavam em uma situação muito terrível para começar”, explica Bradlow. “O FMI disse que, se você seguir nossas prescrições políticas, as coisas vão mudar e você se sairá muito melhor.”
As medidas impostas pelo FMI limitaram o acesso à saúde e à educação para os mais pobres. Ao longo da década de 1980, o FMI pressionou país após país - no que é conhecido como Programas de Ajuste Estrutural - com danos duradouros para economias e populações.
As medidas políticas ditadas pelo FMI também tiveram consequências ambientais prejudiciais. Para encorajar o crescimento econômico, muitos países foram pressionados a mudar “da produção de alimentos para a produção de produtos agrícolas que poderiam ser vendidos nos mercados globais”, diz Bradlow. “Muitas vezes isso significava que você estava usando fertilizantes mais prejudiciais ao meio ambiente, ou que você estava fazendo projetos de mineração extrativista que eram prejudiciais ao meio ambiente. Em alguns casos, era a extração de madeira, então os países derrubavam as florestas.”


Dívida prolongada e austeridade
Attiya Waris é professor associado de direito e política fiscal na Universidade de Nairóbi, no Quênia, e especialista em dívida externa e obrigações financeiras internacionais e suas implicações para os direitos humanos.
Como parte de seu trabalho, Waris lança luz sobre as experiências da Argentina e do Paquistão. Ambos os países receberam vários empréstimos desde a década de 1950 para enfrentar desafios econômicos, como inflação, desvalorização da moeda e crises da dívida externa. A Argentina detém atualmente a maior dívida pendente de US$ 46 bilhões, enquanto o Paquistão ocupa o quinto lugar com US$ 7,4 bilhões.
“O Paquistão é um dos 14 países em todo o mundo que tem um empréstimo do FMI com sobretaxa. Uma sobretaxa significa que, se você estiver pagando uma taxa de juros de 1% e deixar de pagar seus pagamentos, pagará 3%. Então você está sendo penalizado por não poder pagar”, explica Waris. Isso, por sua vez, aumenta a probabilidade de dívida prolongada e austeridade.
Mas para Waris, um dos maiores problemas é que os contratos em torno dos empréstimos do FMI são extremamente opacos, o que torna difícil responsabilizar a instituição ou mesmo avaliar seu impacto além das medidas de austeridade. “Isso é problemático porque não pode haver supervisão social sobre o que um grupo de seres humanos em seu país está decidindo assumir em seu nome”, diz ela. “Representativas, democráticas ou não, as pessoas precisam saber o que seus governos estão fazendo em seu nome.”
Para Bradlow, há sinais de mudança positiva. Um trabalho de pesquisa recente mostra que o FMI reconhece alguns dos impactos devastadores que teve nos países. No documento, identifica áreas de foco aprimorado, incluindo mudança climática, gênero, desigualdade e proteção social. No entanto, embora o FMI tenha adaptado seu foco e suas políticas para lidar com algumas das consequências negativas, permanece incerto como atingirá essas metas. The Conversation entrou em contato com o Fundo Monetário Internacional para comentar as questões abordadas neste episódio e está aguardando resposta.

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Ouça o episódio completo do The Conversation Weekly para saber mais sobre o impacto dos empréstimos do FMI nas nações beneficiárias, os benefícios potenciais de alocar fundos para serviços públicos no Sul Global e a importância de implementar mecanismos de responsabilidade dentro do FMI.

Este episódio foi escrito e produzido por Mend Mariwany, que também é o produtor executivo de The Conversation Weekly . Eloise Stevens faz nosso design de som, e nossa música tema é de Neeta Sarl.
Você pode nos encontrar no Twitter @TC_Audio , no Instagram em theconversationdotcom ou via e-mail . Você também pode se inscrever no e-mail diário gratuito do The Conversation aqui .
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https://theconversation.com/improving-how-the-imf-does-business-could-help-billions-of-people-worldwide-by-giving-governments-money-to-spend-on-public-goods-and-increasing-accountability-podcast-205704

segunda-feira, 29 de maio de 2023

MUNDO NOVO… O QUE VEM AÍ?....

Algumas previsões muito interessantes, mas também assustadoras:

1.) As oficinas de reparação de automóveis desaparecerão.
2.) Um motor a gasolina/diesel tem 20.000 peças individuais.  Um motor eléctrico tem 20. Os carros eléctricos serão vendidos com garantia vitalícia e só são reparados pelas concessionárias.  Leva apenas 10 minutos para remover e substituir um motor eléctrico.
3.) Motores eléctricos defeituosos não são reparados na concessionária, mas são enviados a uma oficina regional que os repara com robôs.
4.) A luz de mau funcionamento do seu motor eléctrico acende, então você dirige-se até ao que parece ser um lava-rápido. O seu carro é rebocado e enquanto você toma uma xícara de café lá vem o seu carro com um novo motor eléctrico!
5.) As bombas de gasolina irão desaparecer.
6.) As esquinas das ruas terão medidores que dispensam electricidade.  As empresas irão instalar estações de recarga eléctrica;  na verdade, eles já começaram no mundo desenvolvido.
7.) Grandes fabricantes de automóveis inteligentes já destinaram dinheiro para começar a construir novas fábricas que só constroem carros eléctricos.
8.) As indústrias de carvão irão embora.  As companhias de gasolina/petróleo irão fechar. A perfuração de petróleo irá parar.  Portanto, diga adeus à OPEP! O Oriente Médio estará em apuros.
9.) As residências produzirão e armazenarão mais energia eléctrica durante o dia e em seguida, usarão e venderão de volta para a rede.  A rede armazena e distribui para os que são grandes consumidoras de electricidade.  Alguém viu o telhado do Tesla?
10.) Um bebé de hoje só verá carros pessoais em museus.  O FUTURO está se aproximando mais rápido do que a maioria de nós podemos imaginar.
11.) Em 1998, a Kodak tinha 170.000 funcionários e vendia 85% de todo o papel fotográfico em todo o mundo.  Em poucos anos seu modelo de negócios desapareceu e eles faliram.  Quem teria pensado que isso aconteceria?

12.) O que aconteceu com a Kodak e a Polaroid acontecerá em muitos sectores nos próximos 5 a 10 anos… e a maioria das pessoas não imagina isso.
13.) Você pensava em 1998 que 3 anos depois, você nunca mais tiraria fotos em filme?  Com os smartphones de hoje, quem é que ainda tem uma câmara hoje em dia?
14.) As câmaras digitais foram inventadas em 1975. As primeiras tinham apenas 10.000 pixels, mas seguiam a lei de Moore.  Assim, como acontece com todas as tecnologias exponenciais, foi uma decepção por um tempo, antes de se tornar muito superior e se tornar dominante em apenas alguns anos.
15.) Agora vai acontecer de novo (mas muito mais rápido)  Artificial, saúde, carros autónomos e eléctricos, educação, impressão 3D, agricultura e empregos.
16.)  Esqueça o livro “Choque do Futuro”, bem-vindo à 4ª Revolução Industrial.
17.) O software interrompeu e continuará a perturbar a maioria dos sectores tradicionais nos próximos 5 a 10 anos.
18.) UBER é apenas uma ferramenta de software, eles não possuem nenhum carro e agora são a maior empresa de táxi do mundo!  Pergunte a qualquer motorista de táxi se ele percebeu isso
19.) O Airbnb é hoje a maior empresa hoteleira do mundo, embora não possua propriedades.  Pergunte aos hotéis Hilton se eles previram isso.
20.) Inteligência Artificial: Os computadores tornam-se exponencialmente melhores na compreensão do mundo.  Este ano, um computador venceu o melhor Go-player do mundo, 10 anos antes do esperado.
21.) Nos EUA, jovens advogados já não conseguem empregos.  Por causa do Watson da IBM, onde você pode obter aconselhamento jurídico (por enquanto, o básico) em segundos, com 90% de precisão em comparação com 70% quando feito por humanos. Portanto, se você estuda Direito, repense imediatamente, pois haverá 90% menos advogados no futuro, (que ideia!) Apenas os especialistas permanecerão.
22.) O Watson já ajuda enfermeiras a diagnosticar cancro, e é 4 vezes mais preciso do que as enfermeiras humanas.
23.) O Facebook agora tem um software de reconhecimento de padrões que pode reconhecer rostos melhor do que humanos.Em 2030, os computadores se tornarão mais inteligentes do que os humanos (porém nunca serão humanos).
24.) Carros autónomos: Em 2018 já chegaram os primeiros carros autónomos. Nos próximos 5 anos, toda a indústria começará a ser interrompida.  Você não vai querer mais ter um carro, pois você ligará para um carro com seu telefone, ele aparecerá em sua localização e o levará ao seu destino.
25.) Você não precisa estacionar, você só paga pela distância percorrida e pode ser produtivo enquanto dirige.  As crianças de hoje nunca terão carteira de motorista e nunca terão carro.
26.) Isso mudará as nossas cidades, porque precisaremos de 90-95% menos carros.  Podemos transformar antigas vagas de estacionamento em parques verdes.
27.) Cerca de 1,2 milhões de pessoas morrem a cada ano em acidentes de carro em todo o mundo, incluindo distracção ou condução embriagada.  Agora temos um acidente a cada 60.000 milhas;  com condução autónoma cairá para 1 acidente em 6 milhões de milhas.  Isso salvará mais de um milhão de vidas em todo o mundo a cada ano.
28.) A maioria das montadoras tradicionais irá sem dúvida à falência. Eles tentarão a abordagem evolucionária e apenas construirão um carro melhor, enquanto as empresas de tecnologia (Tesla, Apple, Google) farão a abordagem revolucionária e construirão um computador sobre rodas.
29.) Veja o que a Volvo está fazendo agora;  não há mais motores de combustão interna em seus veículos a partir deste ano com os modelos 2019, usando todos eléctricos ou híbridos apenas, com a intenção de eliminar gradualmente os modelos híbridos.
30.) Muitos engenheiros da Volkswagen e Audi estão completamente apavorados com Tesla e deveriam estar.  Veja todas as empresas que já oferecem os seus veículos eléctricos.  Isso era inédito, apenas há alguns anos atrás.
31.) As seguradoras terão grandes problemas porque, sem acidentes, os seguros ficarão mais baratos.  Seu modelo de negócio de seguro automóvel desaparecerá.
32.) Os imóveis vão mudar.  Porque se você puder trabalhar enquanto se desloca, as pessoas abandonarão as suas torres para se mudar para bairros mais bonitos e acessíveis.
33.) Os carros eléctricos se tornarão populares em 2030. As cidades serão menos barulhentas porque todos os carros novos funcionarão com electricidade.
34.) As cidades também terão um ar muito mais limpo.
35.) A electricidade se tornará incrivelmente barata e limpa.
36.) A produção solar está numa curva exponencial há 30 anos, mas agora você pode ver o impacto crescente.  E está apenas aumentando.
37.) As empresas de energia fóssil estão tentando desesperadamente limitar o acesso à rede para evitar a competição das instalações solares domésticas, mas isso simplesmente não pode continuar - a tecnologia cuidará dessa estratégia.
38.) Saúde: O preço do Tricorder X será anunciado este ano.  Existem empresas que irão construir um dispositivo médico (chamado "Tricorder" de Star Trek) que funciona com o seu telefone, que faz a varredura da retina, sua amostra de sangue e sua respiração.  Em seguida, analisa 54 biomarcadores que irão identificar quase todas as doenças.  Existem dezenas de aplicativos de telefone por aí agora para fins de saúde.
BEM-VINDO AO AMANHÃ- que na verdade, já chegou há alguns anos...

Se observamos com cuidado, podemos detectar a aparição de uma nova faixa social que não existia antes: pessoas que hoje têm entre sessenta e oitenta anos.
A esse grupo pertence uma geração que expulsou da terminologia a palavra envelhecer, porque simplesmente não tem em seus planos actuais a possibilidade de fazê-lo.
É uma verdadeira novidade demográfica, semelhante ao surgimento  da adolescência; na época, que também era uma nova faixa social, que surgiu em meados do século XX para dar identidade a uma massa de crianças desabrochando, em corpos adultos, que não sabiam, até então, para onde ir ou como se vestir.
Este novo grupo humano, que hoje tem cerca de sessenta, setenta ou 80 anos, levou uma vida razoavelmente satisfatória.
São homens e mulheres independentes que trabalharam durante muito tempo e conseguiram mudar o significado sombrio que tanta literatura latino-americana deu por décadas ao conceito de trabalho.
Longe dos tristes escritórios, muitos deles procuraram e encontraram, há muito tempo, a actividade que mais gostavam e na qual ganham a vida.
Supostamente é por isso que eles se sentem plenos; alguns nem sonham em se aposentar.
Aqueles que já se aposentaram desfrutam plenamente de seus dias, sem medo do ócio ou solidão, crescem internamente. Eles desfrutam do tempo livre,  porque depois de anos de trabalho, criação dos filhos, carências, esforços e eventos fortuitos, vale bem a pena contemplar o mar, a serra eo céu.
Mas algumas coisas já sabemos que, por exemplo, não são pessoas paradas no tempo; pessoas de sessenta, setenta ou oitenta, homens e mulheres, operam o computador como se tivessem feito isso durante toda a vida.
Eles escrevem e vêem os filhos que estão longe e até esquecem o antigo telefone para entrar em contato com seus amigos para os quais escreveme-mails ou mandam whatsapps.

Hoje, pessoas de 60, 70 ou 80 anos, como é seu costume, estão lançando uma idade que AINDA NÃO TEM NOME. Antes, os que tinham essa idade, eram velhos e hoje não são mais... hoje estão física e intelectualmente plenos, lembram-se da sua juventude , mas sem nostalgia, porque a juventude também é cheia de quedas e nostalgias e eles bem sabem disso.
Hoje, as pessoas de 60, 70 e 80 anos celebram o Sol todas as manhãs e sorriem para si mesmas com muita frequência ... Elas fazem planos para suas próprias vidas, não com as vidas dos demais.
Talvez, por algum motivo secreto que apenas os do século XXI conheçam e saberão, a juventude é carregada internamente.
A diferença entre uma criança e um adulto é, simplesmente, o preço de seus brinquedos.


Nota: Por favor, não guarde, passe adiante, sei que você tem uma juventude acumulada, não importa se são 60, 70, 80 ou mais...
A VIDA É PRA QUEM SABE VIVER...!!

domingo, 28 de maio de 2023

Governo oculta pensões milionárias de políticos

CNPD recusa pronunciar-se sobre o tema e remete para parecer da CADA que defende o acesso a essa informação.

Ana Mendes Godinho ,como “democrática” e fiel seguidora, mostra-se com a sua atitude! Não é um comportamento criminoso?

“A ministra da Segurança Social e a Caixa Geral de Aposentações (CGA) insistem em esconder o valor real da pensão mensal vitalícia que é paga, neste momento, a 298 beneficiários. O valor inicial da subvenção mensal vitalícia (SMV) atribuída aos Ex-titulares de cargos políticos e juízes do Tribunal Constitucional (TC) poderá ter duplicado, nos termos da lei n.º 4/85 (já revogada), quando os beneficiários perfizeram 60 anos de idade.
Depois de a Comissão de Acesso aos Documentos Administrativos (CADA) ter considerado que a informação “não é de acesso reservado” e deve ser facultada ao CM, foi a vez de a Comissão Nacional de Protecção de Dados (CNPD) deixar isolada a CGA e o Ministério da Segurança Social na pretensão de ocultarem o valor real da SMV paga aos antigos titulares de cargos políticos e juízes do TC.
Na sequência desse parecer da CADA, emitido em Dezembro último, a CGA informou, no início de Fevereiro último, que tomara “a iniciativa de consultar de imediato a CNPD” e aguardava pela “pronúncia da autoridade competente de modo a clarificar o enquadramento da matéria em termos de protecção de dados pessoais”. A 11 de Maio último, em resposta ao CM, a CNPD afirmou: “Sendo esta uma matéria da competência da CADA, e havendo inclusivamente um parecer já emitido pela CADA, a CNPD não tem que se pronunciar sobre esta matéria, não se colocando por isso a questão de emitir uma decisão formal sobre o assunto”. E acrescentou: “A CNPD enviou ontem [este sábado] uma resposta ao EPD [encarregado de protecção de dados] da CGA nesse sentido, clarificando que a decisão final sobre o acesso e o seu alcance caberá sempre à CGA.” Desde então, a CGA e o gabinete da ministra da Segurança Social, Ana Mendes Godinho, não responderam se permitem o acesso ao valor real da pensão mensal vitalícia paga aos beneficiários. Ao contrário da pensão de reforma, em que são feitos descontos do salário para ter acesso a essa prestação social, os beneficiários da SMV nunca fizeram descontos do ordenado para receber a SMV.


Subvenção mais do que duplicou no caso de Vara
O Ex-ministro Armando Vara é o único beneficiário da subvenção mensal vitalícia (SMV) cujo valor actual é público. Desde a atribuição, em 2003, o valor da SMV mais do que duplicou: passou de 2014 euros para 4590 euros, segundo o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa n.º9152/21.5T8LSB.L1-5. Foi um aumento de 128%. Vasco Rocha Vieira, Ex-governador de Macau, tem a SMV mais elevada: 13 607 euros brutos.”

https://www.cmjornal.pt/politica/detalhe/governo-oculta-pensoes-milionarias-de-politicos?ref=HP_PrimeirosDestaques

Quem conta uma moeda de 5 euros

Lembra-se das notas de conto? Se não se lembrar, não se atire já para um poço.


Miguel Esteves Cardoso, Publico.


Quem conta uma moeda de 5 euros

Sabe porque é que a nova moeda de 5 euros tem um dinossauro? É uma homenagem às criaturas como eu que roncam: “É pá, isso é um conto de réis!”

Lembra-se das notas de conto? Se não se lembrar, não se atire já para um poço. Eu vou explicar, para que a moeda de 5 euros lhe pese mais um agradável bocadinho no bolso. Se é que consente que uma moeda lhe estrague a linha das calças.

A Dona Maria era os anos 60 em Portugal. Era com uma destas que se comprava o Sgt. Pepper’s dos Beatles e ainda se ficava com dinheiro para jantar como um lorde, ir ao Van Gogo e pernoitar num hotel do Guincho.

Os anciões gostam de fingir que, nesses tempos, tudo era muito certinho e bem contado, que um escudo era um escudo e que cem escudos era uma fortuna. Cem escudos eram 50 cêntimos em dinheiro de hoje.

Mas havia um erro terrível que só agora, graças à moeda de 5 euros, se pode começar a esquecer.

O mal deve-se ao facto de o escudo ser uma moeda muito efémera. Os portugueses, que não gostam nada de alterações passageiras, continuaram a falar em reis.

100 mil reis eram cem escudos. O truque, já se viu, é juntar “mil reis” ao número de escudos. 1 euro são 200 escudos e logo 200 mil reis. 50 escudos são 50 mil reis e 500 escudos são 500 mil reis.

Já está a ver o problema? É que 1000 escudos não são um conto de reis. São um milhão de reis.

Aquilo que ocultaram é que, antes da tolice dos escudos, um conto era um milhar de reis. Dois contos de reis eram dois mil reis, ou seja, 2 míseros escudos ou 1 ainda mais mísero cêntimo de euro.

É espectacular que, no mundo dos escudos, o povo tenha chamado “um conto de reis”, que correspondia apenas a mil reis (1 escudo), a um milhão de reis (1000 escudos).

É uma redução muito mais violenta do que aquela que tornou 200 mil reis (200 escudos) num só euro.

Do ponto de vista psicanalítico, a culpa desta mentira, deste roubo semântico, emerge depois para amaldiçoar o euro e fingir amor ao desamado escudo.

sábado, 27 de maio de 2023

CRISTIANO RONALDO

Sobre:

CRISTIANO RONALDO: "Nenhum jogador está completo além de mim, porque sou bom de cabeça, dos pés, dos chutos livres e outros"

MICHEL PLATINI: "Se eu sou o demónio do futebol, CR7 é o Satanás"

ZINEDINE ZIDANE: "Vou dizer aos meus filhos que treinei o melhor jogador do planeta"

PEP GUARDIOLA: "O único adversário que me assusta e a minha equipa é o CR7 mesmo"

DIEGO MARADONA: "CR7 é um anjo que foi convidado para jogar entre os humanos"

JOACHIM LOW: "CR7 é uma máquina de golos"

CARLOS ANGELOTTI: "Ter CR7 na tua equipa é como começar uma partida de 1-0"

ARSENE WENGER: "O único erro que nunca consigo perdoar a mim mesmo é não comprar CR7 quando tive a chance"

DIER DESCHAMPS: "Depois da vitória de Portugal na Euro, CR7 conseguiu onde Messi falhou com a Argentina"

ROBERTO CARLOS: "No futebol se eu sou Deus filho, CR7 continua sendo Deus pai"

XAVI HERNANDES: "Odeio o Real Madrid mas não o CR7 porque ele é a estrela favorita da minha família"

FRANCESCO TOTTI: "O melhor momento da minha vida é quando vejo a camisa do CR7 na minha casa"

DANIS ALVES: "O único atacante no futebol que me faz tremer quando jogo contra ele é o CR7"

GERARD PIQUE: "CR7 faz coisas que outras pessoas não conseguem"

MARCELO: "O futebol nos controla, mas CR7 controla o futebol por ele"

NEYMAR: "Gostaria que CR7 fosse um jogador do Barcelona, ele é um génio"

MOHAMED SALAH: "O único jogador que joga melhor que o Messi é o CR7"

LIONEL MESSI: "CR7 é um fenómeno"

FLORENTINO PEREZ: "Eu vou para o céu graças a esta transferência de CR7 depois que eu morrer"

UEFA: "A Liga dos Campeões tornou-se agora uma competição CR7"

ENRIQUE IGLESIAS: "Sou uma estrela da música mas o futebol inspira-me graças a CR7"

O único objectivo L

Cristiano Ronaldo!

Torcedores do Al Nassr FC e Ronaldo Unidos.

Henry Kissinger por etapas.

DOIS PAÍSES

Nasceu a 27 de Maio de 1923 na Alemanha. Aos 15 anos a família fugiu para os EUA, para escapar às perseguições nazis.

NOVO NOME

Em 1943 adquiriu a cidadania americana e trocou o nome original, Heinz, por Henry. Alistou-se no exército americano durante a II Guerra Mundial.

HARVARD

Foi aluno e professor. Doutorou-se em 1954, com tese sobre o Congresso de Viena (1815), vertida no livro “A World Restored”. Ainda estudante, cria a revista “Confluence”.

PODER

Conselheiro do Presidente Richard Nixon entre 1968 e 1973, ano em que foi nomeado secretário de Estado (ministro dos Negócios Estrangeiros, terceiro na hierarquia do Estado). Permaneceu no cargo até 1977, já que Gerald Ford o manteve após a demissão de Nixon.

NEGOCIADOR

Acordo de paz do Vietname, negociações no Médio Oriente, degelo das relações dos EUA com a China. Equilíbrio nuclear com URSS e aposta numa nova diplomacia africana.

FAMÍLIA

Tem dois filhos de Ann Fleischer, de quem se divorciou em 1964. Casou-se com Nancy Maginnes em 1974.

De: Expresso

sexta-feira, 26 de maio de 2023

Parque Escolar: contas aprovadas pela tutela a “toque de caixa”. Dívida subiu para 1.213 milhões de euros em 2021

Nos últimos quatro anos, a Parque Escolar – escolhida agora para dinamizar a habitação pública – não mostrava contas e nem se incomodava com críticas dos partidos da oposição nem com notícias da imprensa. O PÁGINA UM meteu um processo de intimação no Tribunal Administrativo de Lisboa no passado dia 8. Esta semana, os Ministérios das Finanças e da Educação apressaram-se a aprovar os relatórios de 2019, 2020 e 2021. E prometem para breve o de 2022. Para já, ficou-se a saber que a dívida total ascende aos 1.213 milhões de euros, e há ainda um conjunto de anomalias contabilísticas detectadas pelo auditor.

por Pedro Almeida Vieira // Maio 25, 2023

A Parque Escolar – a empresa estatal que, em breve, ficará com a função de construção pública, mudando mesmo de denominação – colocou esta tarde os relatórios e conta de 2019, 2020 e 2021 no seu site. Esta decisão vem no seguimento de uma intimação apresentada no mês passado pelo PÁGINA UM no Tribunal Administrativo de Lisboa.

A administração desta empresa – que passará a denominar-se Construção Pública, tendo o diploma da sua reestruturação sido promulgado pelo Presidente da República na semana passada – remeteu também ao PÁGINA UM os ofícios enviados à tutela com as contas dos exercícios a partir de 2019, para aprovação, mas que estamos “engavetados”.

De acordo com as datas desses ofícios, agora na posse do PÁGINA UM, o relatório de 2019 estava na posse da Secretaria de Estado do Tesouro e do Ministério da Educação desde Novembro de 2020, o relatório de 2020 desde Maio de 2021 e o relatório de 2021 desde Maio de 2022.

No que diz respeito ao relatório e contas do ano passado, em ofício enviado esta tarde ao PÁGINA UM, a secretária-geral da Parque Escolar, Alexandra Viana Ribeiro, diz que “ainda não se encontra concluído, designadamente por aguardar o parecer do conselho fiscal (…) e a respectiva aprovação pelas tutelas”, prometendo o seu envio posteriormente.

Este é, para já, o corolário de mais uma vitória do PÁGINA UM em prol da transparência da Administração Pública, uma vez que a Parque Escolar, que passará a assumir funções de promoção de habitação pública, tinha o ano de 2018 como o último com contas aprovadas e disponibilizadas.

E, mesmo assim, este relatório de 2018, bem como os dos anos de 2016 e 2017, apenas foram publicados em Março do ano passado, o que suscitou então questões da Iniciativa Liberal junto do Ministério das Finanças, que tutela a empresa pública. Segundo informações avançadas na altura pelo Jornal de Negócios, a dívida da empresa em 2021 seria de 981,7 milhões de euros.

Contudo, na verdade, e de acordo com análise rápida do PÁGINA UM, a dívida é bem superior. O passivo corrente – com previsão de pagamento em menos de 12 meses – era então de 151,7 milhões de euros, mas o passivo não corrente ascendia aos 1.061,4 milhões de euros. No total, o passivo total situava-se nos 1.214,1 milhões de euros, um pouco mais de 232 milhões do que o valor apontado pelo Jornal de Negócios.

O aumento da dívida acaba por relativizar os resultados líquidos positivos, até porque os activos da Parque Escolar beneficiaram bastante pelo aumento de capital estatutário no valor de cerca de 342,5 milhões de euros por incorporação de 138 escolas e por conversão de um empréstimo da Direcção-Geral do Tesouro e Finanças, após dação em cumprimento do Palácio Valadares, no Largo do Carmo, em Lisboa.

Um dos aspectos mais relevantes dos relatórios e contas, agora disponibilizados e que estará na base do atraso de anos na sua divulgação, prende-se com as reservas feitas pelo auditor das demonstrações financeiras, a cargo da Grant Thornton.

Por exemplo, no relatório de 2019 – que somente agora vê a luz do dia, após a intervenção do PÁGINA UM –, o auditor critica a forma de cálculos das depreciações das propriedades de investimento (que incluem escolas), que além do mais, em diversas obras em curso, não tiveram ainda os terrenos transmitidos para a empresa pública, nem foram “objecto de avaliação por peritos independentes”.

Também é considerado que os cerca de 37 milhões de euros de provisões – devidos a processos judiciais em curso – podem não ser suficientes.

Mais grave ainda é o alerta transmitido pelo auditor de que “na realização de diversos concursos públicos, verificou-se que houve concertação de preços entre as empresas fornecedoras de monoblocos, no que respeita ao preço de transporte, montagem, aluguer e desmontagem dos mesmos, durante as várias fases de realização das obras”.

A Grant Thornton escreveu então que “esta situação originou gastos adicionais (…), cujo montante total não foi, ainda, possível de quantificar.”

Outra situação irregular passa-se com o mobiliário escolar e sobretudo com o equipamento informático. O auditor salienta que “não foram objecto de inventariação física”, acrescentando que, desse modo, “não podemos concluir, na presente data, sobre a existência de todos os bens e, consequentemente, do respectivo valor registado no balanço”.

Os alertas de desconformidades mantiveram-se no relatório de 2020 e 2021, praticamente nos mesmos moldes.

Saliente-se que depois de se recusar tacitamente a disponibilizar os documentos solicitados, a Parque Escolar acabou por optar por satisfazer o pedido antes de ser obrigado por sentença judicial.

Em requerimento hoje apresentado no Tribunal Administativo de Lisboa, o advogado da empresa pública diz que “nada disse [ao PÁGINA Um], apenas e só, porque alguns documentos solicitados (…) não estavam finalizados (…), porquanto faltava a aprovação dos relatórios e contas pela tutela para concluir os processos.”

Na verdade, ao juiz do processo a Parque Escolar admite mesmo que o relatório e contas de 2019 foi apenas aprovado pela tutela na passada segunda-feira, enquanto os relativos a 2020 e 2021 acabaram sendo aprovados hoje, dia 25 de Maio.

Apesar deste contra-relógio, a Parque Escolar deverá vir a ser condenada pelo tribunal ao pagamento das custas, uma vez que não respondeu favoravelmente antes da entrada da intimação do PÁGINA UM. O montante das custas gastas pelo PÁGINA UM serão aplicadas em similares processos de intimação por não divulgação de documentos públicos, através do seu FUNDO JURÍDICO.

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N.D. Todos os encargos do PÁGINA UM nos processos administrativos, incluindo taxas de justiça e honorários de advogado, têm sido suportados pelos leitores e apoiantes, através do FUNDO JURÍDICO. Neste momento, por força de 18 processos em curso, o PÁGINA UM faz um apelo para um reforço destes apoios fundamentais para a defesa da democracia e de um jornalismo independente. Recorde-se que o PÁGINA UM não tem publicidade nem parcerias comerciais, garantindo assim a máxima independência, mas colocando também restrições financeiras.

https://paginaum.pt/2023/05/25/parque-escolar-contas-aprovadas/

quarta-feira, 24 de maio de 2023

Funcionários públicos ganham mais do que privados com as mesmas qualificações.

Em 2021, os funcionários públicos ganhavam, em média, mais do que os trabalhadores do privado com o mesmo nível de qualificação.

Um estudo do Instituto Nacional de Estatística (INE) revelou que, em 2021, a média dos salários públicos foi maior do que a dos salários dos trabalhadores do privado.

Naquele ano, a remuneração bruta mensal média por trabalhador no público era 2.019 euros, e no privado 1.335 euros.

O INE divulgou as novas estatísticas sobre remunerações por trabalhador, com base na informação da Declaração Mensal de Remunerações, transmitidas pelas empresas à Autoridade Tributária e remetida mensalmente ao Instituto.

“A informação diz respeito a cerca de 4,6 milhões de trabalhadores [740.900 na administração pública e 3.799.600 trabalhadores no sector privado], considerando todos os tipos de rendimento do trabalho”, esclareceu o INE.

O Expresso expôs os números e reparou que, em 2021, a remuneração bruta mensal média dos trabalhadores da administração pública foi superior à dos trabalhadores do sector privado, em todos os níveis de escolaridade.

O INE refere que “este resultado pode estar associado, entre outros factores, à diferente composição etária dos trabalhadores”. A idade média de um funcionário público é 53 anos e a de um trabalhador do sector privado é 43 anos.

No entanto, tendo em conta apenas os trabalhadores com ensino superior, frisa o Expresso, a discrepância etária é ainda maior. No público a média mantém-se nos 53 anos, mas no privado desce para os 40 anos.

“A este facto, associam-se maior acumulação de capital humano e de experiência profissional, com tradução nas remunerações auferidas pelos trabalhadores”, diz o INE.

A administração pública é mais qualificada

O estudo do INE também revelou aquele que poderá ser o factor-chave para os funcionários públicos são mais bem remunerados.

Do universo dos trabalhadores da administração pública, em 2021, mais de 55% tinham o ensino superior. Já no sector privado, essa parcela não chegou aos 23%.

Dos 45% da função pública que sobraram, cerca de 27% tinham o ensino secundário e pouco mais de 18% tinham estudos , pelo menos, até ao 9.º ano de escolaridade.

Do lado dos privados, dos 77% que não tinham ensino superior 45% estudaram, pelo menos, até ao 9.º ano e só 32% chegaram ao secundário.

Ou seja, a média de qualificação dos funcionários públicos é, em todos os níveis de escolaridade, superior à média de qualificação dos trabalhadores do sector privado.

Por este prisma é fácil entender que os trabalhadores da administração pública sejam, em média, mais bem pagos do que os funcionários de empresas privadas.

No entanto, mesmo para os trabalhadores com o mesmo grau de escolaridade, o salário médio bruto da função pública volta sair por cima.

No grupo dos que estudaram, no máximo, até ao 9.º ano, a média mensal do salário foi 1.265 euros no público e 1.114 euros no privado.

Quem passou pelo secundário, em média, aufere por mês de um salário de 1.514 euros no público e 1.348 euros no privado.

Por fim, a média salarial mensal de quem tem curso superior é de 2.957 euros na função pública e de 2.263 euros no sector privado.

Ver o estudo aqui: https://www.ine.pt/xportal/xmain?xpid=INE&xpgid=ine_destaques&DESTAQUESdest_boui=611915613&DESTAQUESmodo=2

Publicado por: https://zap.aeiou.pt/funcionarios-publicos-ganham-mais-com-as-mesmas-qualificacoes-537149

terça-feira, 23 de maio de 2023

Uma República de Garotos

Pelo carácter atrabiliário e irascibilidade adolescente. Pela palavra gratuita, pela moral que muda, pela crueldade, pela hipocrisia: muitas destas pessoas não deviam ter acesso a postos de comando

Podemos ter a certeza: neste caso da TAP, dos respectivos antecedentes e das devidas sequelas, há, entre os seus intervenientes, um ou vários malfeitores. O problema consiste em saber se são todos ou só alguns.

É ainda certo que há alguém a preparar um roubo, a cometer uma fraude, a obter algo indevidamente, a tentar assassinar politicamente alguém, a liquidar um adversário e a destruir quem sabe segredos. Só não sabemos se é só um, se são vários ou se são todos os intervenientes.

Sabemos também que estão envolvidos titulares de cargos políticos, altos funcionários do Estado e altíssimos responsáveis da Administração Pública, universo este que pode incluir um primeiro-ministro, vários ministros e Ex-ministros, diversos secretários de Estado e Ex-secretários de Estado, chefes de gabinete, adjuntos, assessores, auditores jurídicos e administradores de empresas públicas. Uma vez mais, não sabemos se todos ou só alguns têm culpas e responsabilidades.
É seguro que algo está em causa, mais importante do que um computador, dois socos, três bofetadas e uma ameaça de agressão. Num ministério como este, das Infra-Estruturas, é difícil encontrar documentos confidenciais muito sérios. Também num país como o nosso, não é crível haver segredos de Estado vitais, ainda por cima gravados no computador de um adjunto! Muito dinheiro, muitos interesses, enormes favores e imensas negociações: eis o que pode estar em causa.
Temos diante de nós a coreografia ou o cenário perfeito da mentira: do mesmo acontecimento, dos mesmos factos, com os mesmos protagonistas, existem pelo menos duas versões contraditórias, dois elencos factuais diferentes e opostos e evidentemente dois perpetradores.

Um bando em funções de Estado, instituições supostamente respeitáveis, departamentos governamentais com responsabilidades, deputados eleitos e representantes directos dos cidadãos, empresas públicas, escritórios de advogados famosos, salteadores de capitais internacionais, funcionários de Estado obrigados a limpar as estrebarias e empresas internacionais de consultadoria estão atarefados à volta de um ministério. Este, por sua vez, ocupa-se de tudo quanto é importante na economia futura do país: aviões, aeroportos, comboios, caminho-de-ferro, portos fluviais e marítimos, grandes pontes, energia, rede eléctrica nacional, barragens e centrais térmicas e mais, tanto mais, em duas palavras, quase tudo, nas mãos de um ministro… É isso que está em causa! São decisões de muitos milhares de milhões! São os marcos da economia futura do país. É o maior investimento de que há memória e de que haverá crónica no futuro! É isso que está em causa, não é um computador, um telemóvel, uma ameaça contra quatro mulheres, um murro de um homem, uma grosseria de um ministro, um engano de um telefonema…

Já se percebeu que houve mentira, traição, ciúme, engano, ameaça, violência e abuso. Mas porquê? O que estava em causa realmente? Dinheiro? Interesses estrangeiros? A companhia de aviação? O aeroporto? O lítio? Os comboios e o TGV? A rede eléctrica nacional? As “renováveis”? Uma coisa parece certa: para que os intervenientes se tenham deixado enredar em cenas ridículas próprias de telenovela, é necessário estarem de acordo sobre um ponto: o silêncio sobre o essencial. Fica-nos a certeza de que este silêncio e a zanga têm origem num passado de cumplicidade.
Ao longo deste processo, pelo que se sabe, alguns ou todos se portaram mal, abusaram de poder e de funções, mentiram, esconderam, ameaçaram, agrediram, roubaram, destruíram, quebraram, negaram, tentaram liquidar, apagaram documentos, “limparam” telemóveis e computadores, sonegaram provas, esconderam fontes e acusaram falsamente outras pessoas. Todos? Só alguns? Quem?
Raramente, nestas décadas que levamos de democracia, se atingiu um ponto tão baixo de miséria moral, de atentado político, de vilania, de imoralidade e de sem vergonha! Há gente que, por bem menos, reside actualmente na penitenciária, em Custóias ou em Pêro Pinheiro. Raramente como agora a justiça portuguesa esteve tanto em causa. Raramente como agora o Estado de direito esteve tão ameaçado.
Na máfia, nos gangs de Nova Iorque, entre oligarcas de Moscovo, nas redes de tráfico de droga, no mercado do sexo e de trabalhadores clandestinos, nos serviços de imigrantes, no comércio de armamento, nos arranha-céus de magnates do petróleo ou nos resorts dos bilionários dos metais raros, há procedimentos parecidos com aqueles que se adivinham neste processo. Com a diferença de montantes e de pessoas envolvidas, com certeza. Mas com uma similitude moral indiscutível.
Pelo que se julgam superiores e infalíveis. Pela superioridade moral de que crêem usufruir. Pela inteligência sistémica com que tratam as estratégias de longo prazo e nada entendem da vida real. Pelo desprezo com que avaliam os outros, a opinião pública e os eleitores. Pelo modo como substituem as regras e as leis pelos seus gestos, os seus gostos e os seus valores. Pelo seu carácter atrabiliário e pela irascibilidade adolescente. Pela palavra gratuita, pela moral que muda, pela crueldade constante, pelo cinismo indisfarçável e pela hipocrisia como hábito e regra: por estes e outros atributos, estas pessoas, algumas destas pessoas, muitas destas pessoas não deveriam ter acesso a postos de comando, nem ter a capacidade de influenciar a vida de outros. Estamos perante pessoas que só têm regras claras e precisas: eles próprios, os seus amigos, os seus partidos, as suas famílias, as suas empresas e as suas auréolas de glória narcisista que designam por interesse público. Estes Garotos divertem-se com o mal dos outros, brincam e desprezam os inferiores e os menos dotados, odeiam e perseguem os superiores e mais capazes. E têm enorme consideração por si próprios.
Parece a República dos Garotos. Pelo que se julgam superiores e infalíveis. Pela superioridade moral de que crêem usufruir. Pela inteligência sistémica com que tratam as estratégias de longo prazo e nada entendem da vida real. Pelo desprezo com que avaliam os outros, a opinião pública e os eleitores. Pelo modo como substituem as regras e as leis pelos seus gestos, os seus gostos e os seus valores. Pelo seu carácter atrabiliário e pela irascibilidade adolescente. Pela palavra gratuita, pela moral que muda, pela crueldade constante, pelo cinismo indisfarçável e pela hipocrisia como hábito e regra: por estes e outros atributos, estas pessoas, algumas destas pessoas, muitas destas pessoas não deveriam ter acesso a postos de comando, nem ter a capacidade de influenciar a vida de outros. Estamos perante pessoas que só têm regras claras e precisas: eles próprios, os seus amigos, os seus partidos, as suas famílias, as suas empresas e as suas auréolas de glória narcisista que designam por interesse público. Estes Garotos divertem-se com o mal dos outros, brincam e desprezam os inferiores e os menos dotados, odeiam e perseguem os superiores e mais capazes. E têm enorme consideração por si próprios.

Como é possível que alguns ministros capazes, alguns governantes decentes, alguns altos funcionários competentes, alguns deputados honestos e alguns profissionais honrados se deixem enlamear por estes Garotos? Nunca se perceberá a razão pela qual académicos probos, professores dedicados, engenheiros competentes, autarcas responsáveis, sindicalistas empenhados, intelectuais com sentido moral da vida e políticos ciosos do bem comum se deixam envolver nesta história a todos os títulos tão sórdida.


António Barreto

O autor é colunista do PÚBLICO

Um engenheiro informático para a dra. Mónica Quintela

Infelizmente, não basta detectar os problemas — é preciso encontrar soluções sensatas para os resolver.

A deputada do PSD Mónica Quintela respondeu ao meu artigo “Um forte candidato ao Óscar de ideia mais parva de sempre”, sobre as novas e demenciais regras de distribuição electrónica de processos em tribunal, com um artigo no PÚBLICO onde se propõe “esclarecer” aqui este vosso criado sobre a necessidade da nova lei. É logo o primeiro equívoco: nunca coloquei em causa a necessidade de melhorar a transparência do processo de distribuição dos juízes. Aquilo que disse — e reafirmo — é que esta é uma maneira extremamente palerma de o fazer. A ideia é boa. A lei é estúpida. O que não é uma novidade: o que mais há por aí (outro exemplo: a obtusa lei dos sefarditas) é legislação cheia de boas intenções e de péssimos efeitos. Esta é mais uma delas.

Mónica Quintela escreveu no diário As Beiras que “a Operação Lex permitiu que viesse a público a falta de fiabilidade” do sistema de escolha de juízes, e que não é por acaso que o Ministério Público exigiu “assistir à distribuição do processo Marquês por temer que o sorteio fosse manipulado”. No seu entender, essa “é uma possibilidade bem real”. Está certo. Outras ideias com as quais concordo: a falta de sindicância do famoso algoritmo é um problema grave, tal como é um problema que a gestão e administração do sistema informático Citius esteja na dependência do Ministério da Justiça, logo, do Governo.

Infelizmente, não basta detectar os problemas — é preciso encontrar soluções sensatas para os resolver. Ora, na sua resposta, Mónica Quintela começa por garantir que juízes, procuradores e advogados não estão convocados apenas para ver um oficial de justiça teclar e clicar num computador, para logo de seguida explicar que eles estão convocados precisamente para ver um oficial de justiça teclar e clicar num computador. O suposto desmentido de Quintela é, afinal, uma confirmação do que escrevi.

As palavras são suas: “A fiscalização da distribuição impõe-se, desde logo, para assegurar que todos os nomes dos juízes daquele tribunal sejam inseridos no sistema, e não apenas alguns.” Se o oficial de justiça “só introduzir um nome no sorteio, é esse nome que é sorteado e o juiz escolhido. Além disso, pode o funcionário fazer os sorteios que entender até sair determinado nome e sem que alguém saiba. E para que isso não suceda é necessária a tal ‘burocracia’”.

Só que não é. Mónica Quintela exemplificou a sua tese com os sorteios de antigamente, feitos com esferas. Antes do sorteio, certa esfera era aquecida ou congelada para o responsável pelo sorteio saber qual tirar. “Os operadores judiciais não vão só assistir ao tirar a esfera do saco”, explica a advogada do PSD. “Vão ver se todas as esferas foram postas no saco para garantir que todos os juízes são sorteados.”

Esta explicação é abracadabrante em 2023. A deputada Mónica Quintela não tem de perceber de computadores, mas deve saber que já não vivemos no tempo das esferas. Para cada problema que colocou, uma equipa de engenheiros informáticos minimamente competente encontrará soluções infinitamente mais eficientes do que desperdiçar centenas de horas de trabalho inútil de agentes judiciais. É tudo uma questão de programação, de registos de entrada e de inventariação dos vários passos do sorteio, para futura sindicância. Será que não há assessores no Parlamento? Não há informáticos? A não ser que Mónica Quintela ainda se desloque de coche para a Assembleia da República, os seus argumentos são incompreensíveis.

João Miguel Tavares

O autor é colunista do PÚBLICO

segunda-feira, 22 de maio de 2023

A Bula papal «MANIFESTIS PROBATUM EST ARGUMENTIS»


Reino de Portugal

(Datada de 23 de Maio de 1179)

ALEXANDER EPISCOPUS, SERVUS SERVORUM DEI, KARISSIMO IN CHRISTO FILIO ALFONSO ILLUSTRI PORTUGALENSIUM REGI EIUSQUE HEREDIBUS, in perpetuum.

Manifestis probatum est argumentis quod per sudores bellicos et certamina militaria inimicorum christiani nominis intrepidus extirpator et propagator diligens fidei christiani sicut bónus filius et princeps catholicus multimoda obsequia matri tua Sacrosancte Ecclesie impendisti, dignum memoria nomen et exemplum imitabile posteris derelinquens. Equum est autem ut quos ad regímen at salutem populi ab alto dispensatio celestis elegit Apostolica Sedes affectione sincera diligat pro iustis postulationibus studeat efficaciter exaudire.

Proinde nos attendentes personam tuam prudentia ornatam, iusticia preditam atque ad populi regímen idoneam, eam sub Petri et nostra protectione suscipimus et regnum Portugalense cum integritate honoris regni et dignitate que ad reges pertinet necnon et omnia loca que cum auxilio celestis gratie de sarracenorum manibus eripueris in quibusi ius sibi non possunt christiani príncipes circumpositi vendicare excellentie tue concedimus et auctoritate apostólica confirmamus.

Ut autem ad devotionem et obsequium beati Petri apostolorum principis et sacrosancte Romane Ecclesie vehementius accendaris, hec ipsa prefatis heredibus tuis duximus concedendi eosque super his que concessa sunt, Deo propitio, pro iniuncti nobis appostolatus officio defendemus. Tua itaque intererit, fili karissime, ita circa honorem et obsequium matris tue sacrosancte Romane Ecclesie humilem et adevotum existeres et sic te ipsum in eius oportunitatibus et dilatandis christiane fidei finibus exercere ut de tam devoto et glorioso filio Sedes Apostolica gratuletur et in eius amore quiescat. Ad indicium autem quod prscriptum regnum beati Petri iuris existat pro amplioris reverentie argumento statuisti duas marcas auri annis singulis nobis nostrisque successoribus persolvendas. Quem utique censum ad utilitatem nostram et successorum nostrorum Bracarensi archiespiscopo, qui pro tempore fuerit, tu et sucessores tui curabitis assignare.

Decernimus ergout nulli omnino hominum liceat personam tuam aut heredum tuorum vel etiam prefatum regnum temere partubare aut eius possessiones auferre vel ablatas retinere, minuere aut aliquibus vexationibus fatigare.

Si qua igitur in futurum ecclesiastica secularisve persona hanc nostre Constitutionis paginam sciens contra eam temere venire temptaverit, secundo terciove commonita nisi reatum suum digna satisfactione correxerit, potestatis honorisque sui dignitate careat reamque se divino iudicio existere de perpetrata iniquitate cognoscatet a sacratissimo Corpore ac Sanguine Dei et Domini Redemptoris nostri Ihesu Christi aliena fiat atque in extremo examine districte ultioni subiaceat.

Cunctis autem eidem regno et regi sua iura servantibus, sit pax Domini Ihesu Christi quatinus et hic fructum bone actionis percipiant et apud districtum iudicem premia eterne pacis eiveniant. AMEN. AMEN.

Petrus + Paulus

Alexander PP. III. BENE VALETE

Vias tuas, Domine,

demonstra mihi.

Ego Alexander catholice Ecclesie episcopus SS

+ Ego Hubaldus Hostiensis episcopus SS

+ Ego Theodinus Portuensis et Sancte Rufine episcopus SS

+ Ego Petrus Tusculanus episcopus SS

+ Ego Henricus Albanensis episcopus SS

+ Ego Bernerus Prenestinus episcopus SS

+ Ego Johannes presbiter Cardinalis sanctorum Joannis et Pauli tituli Pamachii SS

+ Ego Johannes presbiter Cardinalis tituli Sanctae Anastasie SS

+ Ego Johannes presbiter Cardinalis tituli Sancti Marci SS

+ Ego Petrus presbiter Cardinalis tituli Sancti Susane SS

+ Ego Vivianus presbiter Cardinalis tituli Sancti Stephani in Celio Monte SS

+ Ego Cinathyus presbiter Cardinalis tituli Sancte Cecilie SS

+ Ego Hugo presbiter Cardinalis tituli Sancti Clementis SS

+ Ego Arduinus presbiter Cardinalis tituli Sancte Crucis in Jerusalem SS

+ Ego Matheus presbiter Cardinalis tituli Sancte Marcelli SS

+ Ego Iacinctus diaconus Carduinalis Sancte Marie in Cosmydyn SS

+ Ego Ardicio diaconus Cardinalis Sancti Theodori SS

+ Ego Laborans diaconus Cardinalis Sancte Marie in Porticu SS

+ Ego Rainerius diaconus Cardinalis Sancti Geiargii ad Velum Aureum SS

+ Ego Gratianus diaconus Cardinalis Sanctorum Cosme et Damiani SS

+ Ego Joannes diaconus Cardinalis Sancti Angeli SS

+ Ego Rainerius diaconus Cardinalis Sancti Adriani SS

+ Ego Matheus Sancte Marie Nove diaconus Cardinalis SS

+ Ego Bernardus Sancti Nicholai in Carcere Tulliano diaconus Cardinalis SS

Datum Laterani per manum Alberti Sancte Romane Ecclesie Presbiteri Cardinalis et Cancellarii, X kalendas Iunii, indictione XI, Incarnationis Dominice anno Mº Cº LXXº VIIIIº, pontificatus vero domini ALEXANDRI pape III anno XX.

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TRADUÇÃO para a língua Portuguesa

ALEXANDRE, BISPO, SERVO DOS SERVOS DE DEUS, AO CARÍSSIMO FILHO EM CRISTO, AFONSO, ILUSTRE REI DOS PORTUGUESES, E A SEUS HERDEIROS, in perpetuum.

Está claramente demonstrado que, como bom filho e príncipe católico, prestaste inumeráveis serviços a tua mãe, a Santa Igreja, exterminando intrepidamente em porfiados trabalhos e proezas militares os inimigos do nome cristão e propagando diligentemente a fé cristã, assim deixaste aos vindouros nome digno de memória e exemplo merecedor de imitação. Deve a Sé Apostólica amar com sincero afecto e procurar atender eficazmente, em suas justas súplicas, os que a Providência divina escolheu para governo e salvação do povo.

Por isso, Nós, atendendo às qualidades de prudência, justiça e idoneidade de governo que ilustram a tua pessoa, tomamo-la sob a protecção de São Pedro e nossa, e concedemos e confirmamos por autoridade apostólica ao teu excelso domínio o reino de Portugal com inteiras honras de reino e a dignidade que aos reis pertence, bem como todos os lugares que com o auxílio da graça celeste conquistaste das mãos dos sarracenos e nos quais não podem reivindicar direitos os vizinhos príncipes cristãos.

E para que mais te afervores em devoção em devoção e serviço ao príncipe dos apóstolos S. Pedro e à Santa Igreja de Roma, decidimos fazer a mesma concessão a teus herdeiros e, com a ajuda de Deus, prometemos defender-lha, quanto caiba em nosso apostólico ministério. Continua, pois, a mostrar-te, filho caríssimo, tão humilde e devotado à honra e serviço de tua mãe, a Santa Igreja Romana, e a ocupar-te em defender os seus interesses e dilatar a fé cristã de tal modo que esta Sé Apostólica possa alegrar-se de tão devoto e glorioso filho e não duvide da sua afeição. Para significar que o referido reino pertence a São Pedro, determinaste como testemunho de maior reverência pagar anualmente dois marcos de oiro a Nós e aos nossos sucessores. Cuidarás, por isso, de entregar, tu e os teus sucessores, ao Arcebispo de Braga «pro tempore», o censo que a Nós e a nossos sucessores pertence.

Determinamos, portanto, que a nenhum homem seja lícito perturbar temerariamente a tua pessoa ou as dos teus herdeiros e bem assim o referido reino, nem tirar o que a este pertence ou, tirado, retê-lo, diminuí-lo ou fazer-lhe quaisquer imposições.

Se de futuro qualquer pessoa eclesiástica ou secular intentar cientemente contra o que dispomos nesta nossa Constituição, e não apresentar satisfação condigna depois de segunda ou terceira advertência, seja privada da dignidade da sua honra e poder, saiba que tem de prestar contas a Deus por ter cometido uma iniquidade, não comungue do Santíssimo Corpo e sangue de Jesus Cristo nosso divino Senhor e Redentor, e nem na hora da morte se lhe levante a pena.

Com todos, porém, que respeitarem os direitos do mesmo reino e do seu rei, seja a paz de Nosso Senhor Jesus Cristo, para que neste mundo recolham o fruto das boas obras e junto do soberano juiz encontrem o prémio da eterna paz. Amen. Amen.

Pedro + Paulo

Alexandre Papa III BENE VALETE

Senhor, ensina-me os

teus caminhos.

Eu Alexandre Bispo da Igreja Católica, subscrevi

+ Eu Ubaldo Bispo de Óstia SS

+ Eu Teodino Bispo de Porto e Santa Rufina SS

+ Eu Pedro Bispo de Frascati SS

+ Eu Henrique Bispo de Albano SS

+ Eu Bernardo Bispo de Palestrina SS

+ Eu João Cardeal presbítero dos Santos João e Paulo, do título de Pamáquio SS

+ Eu João Cardeal presbítero do título de Santa Anastásia SS

+ Eu João Cardeal presbítero do título de S. Marcos SS

+ Eu Pedro Cardeal presbítero do título de Santa Susana SS

+ Eu Viviano Cardeal presbítero do título de Santo Estêvão no Monte Celio SS

+ Eu Cíntio Cardeal presbítero do título de Santa Cecília SS

+ Eu Hugo Cardeal presbítero do título de S. Clemente SS

+Eu Arduino Cardeal presbítero do título de Santa Cruz em Jerusalém SS

+ Eu Mateus Cardeal presbítero do título de S. Marcelo SS

+ Eu Jacinto Cardeal diácono do título de Santa Maria em Cosmedin SS

+ Eu Ardício Cardeal diácono do título de S. Teodoro SS

+ Eu Laborans Cardeal diácono do título de Santa Maria em Porticu SS

+ Eu Rainério Cardeal diácono do título de S. Jorge em Velabro SS

+ Eu Graciano Cardeal diácono do título de Santos Cosme e Damião SS

+ Eu João Cardeal diácono do título de Santo Ângelo SS

+ Eu Rainério Cardeal diácono do título de Santo Adriano SS

+ Eu Mateus Cardeal diácono do título de Santa Maria-a-Nova SS

+ Eu Bernardo Cardeal diácono do título de S. Nicolau in Cárcere

Tulliano SS

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Dada em Latrão, por mão de Alberto, Cardeal presbítero e Chanceler da Santa Igreja Romana, a 10 das kalendas de Junho (23 de Maio), indicção XI, ano M.C.LXX.VIIII da Encarnação do Senhor e XX do Pontificado do Papa Alexandre III [1].

É interessante notar o 5º e penúltimo parágrafo da versão dactilografada da bula papal.

O Papa ameaça com a excomunhão (incluindo a proibição de um funeral católico) todo e qualquer Rei que ameace a integridade física e/ou inicie alguma guerra contra o nosso Rei ou algum dos futuros Reis de Portugal. Os Reis de Portugal estavam – enquanto se ‘portassem bem’ – sob a sua protecção!

Sabendo quão católica era a Europa Ocidental daqueles tempos, era de facto uma ameaça muito pior que a da ‘bomba atómica’!

Igualmente é interessante referir que o título de Bispo era – no século XII – parecia ser hierarquicamente mais importante que o de Cardeal.

Repare-se nas assinaturas das 24 personalidades da Igreja Católica que subscrevem a bula (e que se encontram agrupadas): a do Papa (ele próprio, o Bispo de Roma e da Igreja Católica), as de 5 Bispos, as de 9 Cardeais presbíteros e as de 9 Cardeais diáconos.


[1] Esta tradução não é minha; é da autoria do Professor Doutor Rebelo Gonçalves e é datada de 1940. Os dois ‘SS’ que se mantém à frente das assinaturas dos Bispos e dos Cardeais significam: Subscrevi.

sexta-feira, 19 de maio de 2023

CCDR: o que muda na gestão da “empresa” chamada Estado? Perguntas e respostas

As empresas fazem reestruturações e o Estado também. Em curso está uma mudança de competências, que vão passar das direcções regionais para as CCDR.

É comum ouvir falar de reorganizações empresariais – tarefas que passam de um departamento para outro ou departamentos que absorvem competências que estavam disseminadas. Mas o Estado também pode alterar a forma como se organiza. É o que está a acontecer.

As Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional​ (CCDR) vão ter um papel reforçado com a decisão do Governo de integrar nestas entidades os serviços desconcentrados do Estado central que estavam a cargo das diferentes direcções regionais. Esta passagem de competências comporta muitas dúvidas e confusões, desde logo a ideia de que se trata de um processo de descentralização, quando, na verdade, consiste em integrar serviços já descentralizados nas direcções regionais nas CCDR. O PÚBLICO tenta responder a algumas das perguntas sobre o assunto.

O que são as CCDR?

As CCDR são serviços que pertencem à administração directa do Estado, mas que estão situados de forma periférica no território. Ou seja, não estão em Lisboa (com excepção da CCDR de Lisboa e Vale do Tejo), mas sim junto da região que representam. Funcionam como uma espécie de pólos do Estado nas regiões. Existem cinco CCDR: a do Norte, com sede no Porto, a do centro, com sede em Coimbra, a de Lisboa e Vale do Tejo, que tem sede em Lisboa, a do Alentejo, que se situa em Évora, e a do Algarve, que fica em Faro.

Estes serviços têm autonomia administrativa e financeira e cabe-lhes coordenar e articular várias políticas sectoriais, como as de ambiente, ordenamento do território e cidades, prestam apoio técnico às autarquias e têm um papel activo na gestão de fundos europeus.

Quem vai liderar as CCDR e como serão escolhidos?

A ministra da Coesão Territorial tutela as CCDR. Actualmente, cada uma tem um presidente e dois vice-presidentes. Tanto o presidente como um dos "vices" são eleitos de forma indirecta. Ou seja, o presidente da CCDR é eleito por um conjunto alargado de eleitos locais da respectiva área de incidência da CCDR. Um dos vice-presidentes é eleito pelos presidentes das câmaras municipais da área geográfica da CCDR. O outro é indicado pelo Governo, depois de consultados o presidente e o vice-presidente eleitos das CCDR.

Quando foram as últimas eleições para as CCDR?

As primeiras eleições, e até agora únicas, para as CCDR aconteceram a 13 de Outubro de 2020. A eleição, embora indirecta, é uma novidade recente, já que antes os responsáveis máximos das CCDR eram nomeados directamente pelo Governo. A regra é que os mandatos sejam de quatro anos, mas na primeira eleição ficou estabelecido que o mandato inaugural seria de cinco anos para que os responsáveis acompanhassem as negociações dos fundos de Bruxelas.

Qual é o calendário da transferência de competências?

Até ao final deste mês de Janeiro, está previsto que sejam alteradas as leis orgânicas das CCDR para que possam receber de forma total ou partilhada as atribuições que até agora estavam concentradas nos serviços desconcentrados da administração pública. Depois, até ao final de Março deste ano, devem ser reestruturados os serviços desconcentrados que vão perder ou partilhar com as CCDR essas atribuições. A última fase prevista no calendário decorre até ao final do primeiro trimestre de 2024. Esta etapa serve para concluir todos os processos anteriores.

Qual é a diferença entre este processo e o da transferência de competências para as autarquias?

São processos diferentes e que vão passar a acontecer em paralelo. A descentralização de competências para as autarquias permite à administração central passar para as câmaras municipais uma responsabilidade que era sua até agora. Por exemplo: na educação, as autarquias passaram a assumir a responsabilidade pelas refeições escolares. No caso da transferência de competências para as CCDR, a passagem é feita dos serviços regionais das várias direcções para as CCDR. O que dará mais responsabilidades a estas, que passam a agrupar competências em várias áreas relativamente ao espaço geográfico em que actuam.

Ou seja, ganham escala e uma visão de conjunto do território. Voltando ao exemplo da educação. Uma das atribuições actualmente assumidas pelas cinco direcções regionais da Direcção-Geral dos Estabelecimentos Escolares e que passarão para as CCDR é a de identificar as intervenções nos edifícios escolares.

Vão ter um orçamento?

Sim. Está previsto que juntamente com as novas atribuições sigam para as CCDR os recursos humanos, patrimoniais e financeiros necessários à nova missão. Actualmente – e ainda antes desta alteração – as CCDR já têm um orçamento. Por exemplo, a CCDR Norte tinha 302 trabalhadores em 2021 com os quais gastava mais de 11 milhões de euros.

Porque é que este processo surgiu agora?

Este processo surge na sequência de outro – o da descentralização. Em 2018, o Governo e o PSD assinaram um acordo para a descentralização de competências para as autarquias. Depois, o Governo incluiu no seu programa a transferência de competências das direcções regionais da administração central para as CCDR. A lógica é promover a unidade do território nacional concentrando num único serviço de cada região serviços que estavam separados de forma sectorial.

O que são as direcções regionais?

São serviços periféricos da administração directa do Estado, com uma competência territorialmente limitada e que respondem directamente ao respectivo ministério. Na prática, são um braço da tutela (Cultura ou Agricultura e Pescas, por exemplo) numa dada região.

Quais os serviços periféricos da administração directa e indirecta do Estado que vão passar para as CCDR?

De acordo com a resolução do Conselho de Ministros de Dezembro, são nove as áreas que serão "objecto de transferência e de partilha com as CCDR": Economia; Cultura; Educação; Formação Profissional; Saúde; Conservação da Natureza e das Florestas; Infra-estruturas; Ordenamento do Território; Agricultura e Pescas.

Poderá haver despedimentos devido a eventuais duplicações entre serviços?

Não, pelo menos é essa a garantia dada pelo Governo e em particular pela ministra da Coesão Territorial. Ana Abrunhosa explicou ao PÚBLICO que "os serviços das antigas direcções regionais não desaparecem" e que os trabalhadores das diferentes direcções regionais não serão despedidos e irão continuar a exercer as suas funções, com uma diferença: passam a trabalhar sob a coordenação das respectivas CCDR e deixam de responder a Lisboa.

E os trabalhadores poderão ter de mudar de local/cidade?

Outra das garantias dadas pelo Governo é a de que ninguém terá de mudar de local de trabalho. "Os serviços e postos de trabalho mantêm-se, as pessoas não vão mudar de local de trabalho. Há uma garantia que eu posso dar, não vamos tirar as pessoas do sítio onde estão, se estão em Mirandela continuarão a trabalhar em Mirandela", assegurou a ministra Ana Abrunhosa.

Como será feita a transferência para as CCDR na área da saúde?

A resolução do Conselho de Ministros prevê um conjunto de atribuições actualmente exercidas pelas administrações regionais de saúde e que passam para as CCDR. São três, uma delas a atribuição será partilhada e duas delas passam para as CCDR. "Assegurar o planeamento regional dos recursos humanos, financeiros e materiais, a execução e acompanhamento dos necessários projectos de investimento das instituições e serviços prestadores de cuidados de saúde, em articulação com a direcção executiva do Serviço Nacional da Saúde" é uma das missões que passa para a esfera das CCDR. No entanto, a resolução determina que o director Fernando Araújos ainda terá uma palavra a dizer. Ao PÚBLICO, a ministra da Coesão, Ana Abrunhosa, admitiu que tanto o calendário geral deste processo como as próprias atribuições podem ser revistos pela direcção executiva do SNS.

A contratação dos professores passa a ser feita pelas CCDR?

Não. A resolução do Conselho de Ministros, publicada no final do ano, é clara e o ministro da Educação, João Costa, sublinhou-o na última ida ao Parlamento, marcada já pelas greves dos docentes. A transferência de competências em curso “não comporta nenhuma atribuição na área do recrutamento de professores”, disse o governante.

Em matéria de recursos humanos, a única transferência de competências diz respeito ao pessoal não docente (assistentes operacionais e assistentes técnicos) que já eram da responsabilidade das câmaras municipais.

As 13 competências a transferir para as CCDR estavam, até agora, todas entregues à Direcção-Geral dos Estabelecimentos Escolares. Este organismo já funciona descentralizadamente, tendo herdado parte das equipas das antigas direcções regionais de Educação no Norte, centro, Lisboa e Vale do Tejo, Alentejo e Algarve.

As comissões regionais ficam com responsabilidades, por exemplo, pela definição e acompanhamento da requalificação e conservação da rede de escolas. No entanto, as obras continuam a ser feitas pelos municípios. A definição da rede escolar mantém-se centralizada no Ministério da Educação.

Muda alguma coisa na gestão dos fundos europeus?

No imediato, não. As actuais CCDR já participam nas autoridades de gestão dos fundos europeus e assim continuará a ser, como o confirma o decreto-lei publicado esta semana e que estabelece o modelo de governação do PT 2030. Por inerência, os presidentes das cinco CCDR do continente presidem à comissão directiva dessas autoridades. Porém, acredita-se que a partilha ou transferência de novos poderes para as CCDR pode dar um novo enquadramento à gestão dos fundos europeus, sejam os de âmbito regional, sejam os temáticos.

Que diagnóstico faz o relatório da Comissão Independente para a descentralização?

Em termos de fundos europeus, conclui que o modelo vigente era muitas vezes “cego” às especificidades regionais.

No relatório final, a Comissão presidida por João Cravinho propôs que “na primeira fase, de arranque e transição”, as CCDR devem ver “reforçadas capacidades de intervenção”, designadamente “em termos de decisão e de coordenação”, em domínios como desenvolvimento regional, ordenamento do território e cidades, ambiente e cooperação regional transfronteiriça.

Mas isto tem de ser acompanhado por “maior intervenção dos poderes regionais na concepção dos programas regionais e dos programas temáticos, com particular incidência na região que beneficia de Fundos Europeus Estruturais e de Investimento” – ou seja, Norte, centro e Alentejo.

Os programas já estão definidos e aprovados, pelo que qualquer ganho a partir daqui pode vir a acontecer na gestão, acompanhamento e aprovação de projectos. Ou seja, na execução.

O relatório recorda que a OCDE considera Portugal “um dos países mais centralizados da UE e da OCDE”. E lembra que isso pode ser combatido através das CCDR, que ganharam nas últimas décadas “uma influência e um reconhecimento crescentes à medida que foram ocupando uma posição relevante na gestão de programas e fundos comunitários”.

Além disso, a administração central do Estado encontra-se “fortemente sectorializada (reforçada por uma gestão igualmente sectorializada dos fundos europeus), pouco articulada entre si (favorecendo a fragmentação de políticas) e, em alguns domínios, com uma tradição de formulação de políticas nacionais territorialmente cegas, isto é, não regionalmente diferenciadas”.

As CCDR vão agilizar a execução de fundos europeus?

As CCDR já têm experiência e competência na execução de fundos e são, no quadro actual, parte importante do modelo de governação. Conseguiriam ser mais eficazes e rápidas na resposta e na gestão desses fundos se receberem outros poderes que hoje em dia estão delegados na tal administração pública “fortemente sectorializada”? Nesta fase de arranque, é difícil dizer que sim. Embora essa seja a expectativa. Mesmo que, por agora, não se passe de uma transferência ou partilha de tarefas administrativas, pode-se ganhar dias, semanas, meses na tramitação dos processos.

Mas vai ser preciso esperar para ver como é que a partilha ou transferência de competências se concretiza, e com que meios. É apenas aliviar trabalho burocrático das direcções regionais ou há uma efectiva cedência de meios e poder? Essa é a pergunta a que ainda ninguém responde, mas há sinais.

Na Agricultura e Pescas, as direcções regionais deverão ceder às CCDR o poder de “executar, de acordo com as normas funcionais definidas pelos serviços e organismos centrais, as acções necessárias à recepção, análise, aprovação, acompanhamento e validação dos projectos de investimento apoiados por fundos nacionais e europeus, bem como promover a tramitação relativa à recepção, análise e validação conducente ao pagamento dos respectivos apoios".

Museus e monumentos vão passar para as CCDR?

Ninguém sabe ainda o que acontecerá ao importante conjunto de museus, monumentos e áreas arqueológicas tutelados pelas Direcções Regionais de Cultura – do visitadíssimo Paço dos Duques de Bragança, em Guimarães, às principais sés do país – quando estas forem extintas e as respectivas competências integradas nas CCDR. O Ministério da Cultura esclarece que a resposta dependerá da reestruturação em curso da Direcção-Geral do Património (DGPC), que por sua vez justifica que a Cultura tenha sido “excepcionada do calendário previsto para outras áreas governativas”.

E adianta apenas que “não está prevista a transferência de monumentos e museus para as CCDR”, reconhecendo que esta é uma “questão particularmente relevante no quadro da reorganização da DGPC e do processo de descentralização também a decorrer”. Uma frase compatível com muitos cenários. Por exemplo este: vincular alguns museus mais relevantes à DGPC, num movimento que seria, aliás, inequivocamente recentralizador, passando o resto para os municípios, no âmbito do citado “processo de descentralização”.

https://www.publico.pt/2023/01/27/politica/noticia/ccdr-muda-gestao-empresa-chamada-estado-perguntas-respostas-2036364