sábado, 28 de maio de 2022

Uma morte pouco natural…

Estou a “aproveitar-me” da infeliz morte de um rapaz para atacar a “tauromaquia”? Estou, porque o rapaz foi morto por um touro, num espectáculo público de responsabilidade da autarquia, inseguro, violento, com animais que são selvagens pela sua natureza, empurrados por uma multidão que os assusta e os ameaça. Como é que querem que não se faça essa ligação?

…mas pelos vistos demasiado natural. A responsável pelo espaço público onde ela se deu, pelo jogo da morte que a provocou, chamou-lhe um "incidente" como se fosse um "acidente". O comunicado do município da Moita é uma obra-prima de hipocrisia. Houve um "trágico incidente". Sim, onde, como, de que forma? Nada. Não há a mais pequena referência à largada de touros no programa das festas. Ao rapaz caiu-lhe um meteorito em cima. A câmara "lamenta o sucedido e apresenta as mais sentidas condolências à família". Esta é a fórmula habitual nos EUA sempre que alguém entra num supermercado ou numa escola e começa a disparar indiscriminadamente. Os políticos americanos, em particular os republicanos que querem tudo menos discutir o controlo das armas, "oferecem as suas orações" e dizem mais ou menos o mesmo. Depois, o final - sim, não há mais nada no comunicado - conclui:

A autarquia, em estreita colaboração com as autoridades competentes, está a acompanhar as averiguações às causas deste incidente.


Eu gostava de saber o que é que há mais para saber sobre o "incidente", com o testemunho de centenas de pessoas, que viram o rapaz morrer. Se calhar a culpa é do touro.


A esquerda taurina
A câmara é de maioria PS, com um primeiro secretário do BE. A composição inclui 12 socialistas, 9 membros da CDU, 1 do PSD, 1 do CDS, 1 do BE, e 2 independentes, ou seja, é uma câmara de esquerda, mais de esquerda é impossível. Pelos vistos, a "tauromaquia", a combinação da violência contra os animais, do machismo, da ocupação de espaço público por jogos da morte, com gladiadores espontâneos e turbas ululantes, ali muda de valores e de cor política.


O "aproveitamento" de uma morte
Estou a "aproveitar-me" da infeliz morte de um rapaz para atacar a "tauromaquia"? Estou, porque o rapaz foi morto por um touro, num espectáculo público de responsabilidade da autarquia, inseguro, violento, com animais que são selvagens pela sua natureza, empurrados por uma multidão que os assusta e os ameaça. Como é que querem que não se faça essa ligação?


Críticas de "Bruxelas" ao Orçamento do Estado português de 2022
"Bruxelas" é uma entidade obscura de burocratas, muitos deles Ex-políticos nos seus países, quase sempre de partidos da direita, e que manda em nós, em particular nas nossas políticas orçamentais. A Assembleia da República perdeu esse poder, sem os portugueses terem sido alguma vez consultados directa e explicitamente sobre esta castração do parlamento português numa das suas funções essenciais de soberania. Mais uma vez, "Bruxelas" veio criticar o Orçamento proposto para 2022 e, como também é habitual, Mário Centeno duplicou as críticas com o eco do mesmo pensamento.
Todas as críticas são politicamente relevantes, não são uma observação "técnica". Embora já com mais moderação - porque o original da troika resultou mal -, o sentido é o mesmo: corte das despesas em salários e subsídios como principal mecanismo do controlo do défice. "Bruxelas" torce o nariz aos aumentos da função pública, aos apoios ao preço da electricidade, e mesmo ao "apoio social único de 60 euros concedido em Abril de 2022 para as famílias de baixos rendimentos mais vulneráveis ao aumento dos preços".
Um dos rastos da troika e dos governos do PSD, PS e CDS, "troikianos", com uma considerável interiorização na comunicação social e numa espécie de "pensamento único", foi a ideia de que "quem não tem dinheiro não tem vícios" e como nós não temos dinheiro, os salários, subsídios aos mais pobres e o combate público à pobreza são os "vícios".
Sim, é necessário equilibrar o orçamento, a questão não está na austeridade em si, está no alvo dessa austeridade e isso "Bruxelas" não deixa discutir porque atingiria interesses intangíveis como os da banca.
Uma exposição com intenção "cívica" não pode ser paga
Com grande surpresa verifiquei que a primeira exposição organizada no âmbito das comemorações do 50º aniversário do 25 de Abril sobre o movimento estudantil no Museu da História Natural e da Ciência tem entradas pagas. Uma coisa é pagar o Museu, que tem excelentes exposições e cuja melhoria considerável nessa área mais que justifica o bilhete, mas a exposição sobre o movimento estudantil é de outra natureza e não tem qualquer sentido ser paga. Se o problema é o trajecto interior, com alguma programação e esforço seria possível isolá-la do resto das exposições. A exposição foi realizada com dinheiros públicos, numa actividade comemorativa de uma data com significado cívico, e o que "expõe" é em grande parte a história da resistência estudantil constitutiva do 25 de Abril. Não devia ser paga, devia ser oferecida.
Texto escrito segundo o anterior acordo ortográfico

José Pacheco Pereira

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