É a inventora da ecocatálise, processo que usa plantas para recuperar solos afectados por actividades de mineração ou industriais, e que permite aproveitar os metais extraídos na indústria farmacêutica ou da cosmética. A investigadora venceu o prémio Inventor Europeu.
Claude Grison é a inventora da ecocatálise, o processo que permite usar substâncias acumuladas por plantas que limpam solos e águas contaminados em indústrias como a farmacêutica e a cosmética. A invenção valeu-lhe o prémio Inventor Europeu na categoria de Investigação, atribuído pelo Instituto Europeu de Patentes. As plantas não só recuperam solos danificados pela actividade mineira e águas afectadas por poluição de fábricas, como os metais que acumulam podem ser reaproveitados para uso humano.
Vinda da química, como é que começou a trabalhar com ecologia?
Interessei-me pela primeira vez pela interface ecologia-química depois de falar com quatro jovens estudantes do liceu Joffre em 2008. Foi para ajudá-los numa competição que decidi mudar os assuntos que estudava e criar um novo tema, nesta interface entre a química e ecologia. Dois destes alunos tornaram-se engenheiros agrónomos, outro é veterinário e o último é químico.
A sua invenção limpa os solos e a água ao mesmo tempo que fornece metais e moléculas a muitas indústrias. Como funciona?
O primeiro passo foca-se na reabilitação ecológica de locais alvo de exploração mineira através da fitoextração [extração de substâncias através das raízes das plantas], tratamento de efluentes industriais através de fitotecnologias curativas, chamados rizofiltração e bioabsorção. Para conseguir criar uma saída económica viável para estes programas de restauro ecológico, transformei biomassa rica em metais em ferramentas úteis para uma nova química sustentável. Ao aproveitar a vantagem da capacidade notável de certas plantas em concentrar metais nos rebentos ou raízes, explorei o uso direto de metais derivados de resíduos de plantas contaminadas como catalisadores [substâncias que aumentam a velocidade das reações químicas]. Chamam-se ecocatalisadores. Podem ser usados em fármacos, biocosméticos e agentes de biocontrolo.
Que metais podem ser extraídos através de ecocatalisadores?
Estas fitotecnologias flexíveis e robustas podem ser aplicadas em diferentes contextos: na captação de metais estratégicos como paládio e ródio, que são raros e cujos preços estão a explodir; na recuperação de metais primários como zinco, manganésio, níquel, cobre e cobalto, cujo esgotamento global é preocupante ou na acumulação em plantas de elementos tóxicos (arsénio, cádmio ou chumbo).
E como são reaproveitados estes elementos?
As partes aéreas de plantas hiperacumuladoras [que se adaptam ao stress causado pela concentração de metais no seu próprio ambiente] e de pó de plantas que absorveram metal foram consideradas fontes naturais destes catalisadores metálicos. As folhas, as raízes e o pó de plantas enriquecido com elementos metálicos são transformados em catalisadores metálicos, chamados ecocatalisadores, para uso na química orgânica.
Em Portugal, a prospeção de lítio originou protestos das populações que seriam afetadas pelas minas. Estes ecocatalisadores podem proporcionar uma mineração "limpa"?
Um ecocatalisador rico em lítio seria interessante em química verde. Porém, o primeiro passo é o desenvolvimento de uma biotecnologia capaz de concentrar lítio. Estamos agora a estudar esta possibilidade. É um grande desafio.
Que plantas são usadas para recuperar solos contaminados pela mineração?
A recuperação baseia-se na capacidade das plantas hiperacumuladoras, que são específicas. Estudei e desenvolvi mais de 50 plantas para a recuperação de solos degradados ou contaminados, que são capazes de absorver zinco, manganésio, níquel e cobre.
E para recuperar ecossistemas aquáticos?
Eu usei duas tecnologias: rizofiltração e bioabsorção. A primeira baseou-se no uso de plantas aquáticas abundantes e específicas que têm uma capacidade excecional para concentrar poluentes nas raízes. Como exemplos, posso dar a hortelã-da-água (M. aquatica), a tábua-larga (T. latifolia), a pistia (P. stratiotes) e o nenúfar-branco (Nymphaea alba L.). As suas raízes exibem uma estrutura química ideal naturalmente rica em carboxilatos, que são elementos metálicos complexos. Tal deve-se a uma acumulação passiva, não ativa. Por isso, desenvolvi um método para usar raízes em pó em vez das plantas vivas para a bioabsorção de poluentes metálicos. O pó de raízes foi usado como um filtro de plantas para limpar águas poluídas por indústrias ou atividades de exploração mineira, agrícola ou de pedreiras. A bioabsorção e a rizofiltração apresentaram uma eficácia semelhante, sendo que a primeira tem a vantagem de usar um biomaterial não-vivo, armazenável e disponível.
As plantas usadas para limpar os solos onde foi feita mineração têm uma esperança de vida mais pequena?
Os fenómenos de adaptação natural de certas plantas e micro-organismos associados são comuns. As poucas plantas que se desenvolvem nestes solos adaptaram-se à poluição de metais. A fitoextração ajuda a estabilizar e a descontaminar gradualmente o solo através do sistema de raízes, a limitar o impacto dos depósitos de partículas de metal ao formar uma cobertura natural no solo e a proteger a sua camada superficial. Sete locais no sul de França e na Nova Caledónia foram lugares de teste únicos. São exemplos para outros que incluem Cuba, Grécia, Espanha, Portugal, República Democrática do Congo, Gabão, Estados Unidos e por aí além. A recuperação de locais degradados e/ou contaminados por atividades de mineração é para ser levada a cabo a longo termo. O estado dos locais, o planeamento sustentável e sábio das operações, o crescimento das plantas em solos afetados, o respeito pela biodiversidade local, a monitorização dos transplantes, a taxa de acumulação devem ser considerados. Neste contexto, é claro que a recuperação económica dos solos é essencial para apoiar esses esforços ao longo do tempo. Tal envolve uma garantia de sustentabilidade e assim sendo, o sucesso.
É verdade que foi extraída uma substância que é usada para tratar o cancro?
Diferentes ecocatalisadores foram utilizados como novos catalisadores na reação de Biginelli, que cria dihidropirimidinonas e tem uma importância crescente na química medicinal. As dihidropirimidinonas têm sido objeto de interesse porque exibem traços biológicos entusiasmantes como a modulação de canais de cálcio, ao inibir seletivamente o adrenoreceptor α1a e ao atingir a maquinaria da mitose (fase de divisão das células).
Tem duas start-ups operacionais. O que faz cada uma?
A Bioinspir produz ingredientes através da ecocatálise e vende os seus produtos em diferentes empresas francesas da área dos cosméticos e química fina (aplicada à farmacêutica, biofarmacêutica e agroquímica). Os Bioprotection Laboratories são os criadores de um repelente de mosquitos eficaz e 100% natural.
Quantas patentes já foram registadas?
A patente inicial da ecocatálise já levou ao registo de mais de 30 patentes nos últimos anos.
E quais são os seus próximos objetivos e projetos?
Esta invenção é só um passo: a sua transferência para a esfera sócio-económica continua por conseguir. Trata-se de um projeto gigante!
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