Por: António Franco Preto
A evolução de qualquer meio de locomoção pode servir para escrever um artigo (tudo depende do detalhe que se quiser utilizar) mas – eventualmente – nenhum tem mais direito a ser o tema principal dum texto que a bicicleta. O seu preço acessível, a capacidade de oferecer um meio de deslocação sempre disponível a uma velocidade apreciável, o custo mínimo da sua manutenção e a revolução social que provocou são características inexistentes em qualquer outro meio de locomoção.
Só quem nunca fez passeios de bicicleta em grupo, numa qualquer zona rústica do nosso país, é que não se lembra da alegria despreocupada vivida pelos adolescentes participantes (com a minha idade, já assumo com total à vontade que quase nada me fica mal, muito menos ser saudosista).
Relembro que Yves Montand (que foi um extraordinário intérprete da música francesa e que possuía uma voz melodiosa única) tinha uma canção sobre a bicicleta (La Bicyclette) que só tinha qualidades: era melancólicamente alegre, pequena, simples e linda. Isso mesmo: alegre, pequena, simples e linda. Como a ‘Paulette’, que todos amávamos! Ah, a ‘Paulette’!?! O que é que a vida terá feito dela?
Para aqueles que a quiserem recordar (ou conhecer a canção – e não a ‘Paulette’) aqui vai um ‘link’(espero que alguns gostem):
https://www.youtube.com/watch?v=eoHjQs6C4UY
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Mas vamos então começar pelo ‘princípio’ (ou mesmo um pouco antes).
Tudo começou com o aparecimento na Alemanha da ‘draisine’(1817) ... e foi preciso alguém inventar ‘o que faltava’ (roda pedaleira, corrente, pedais,...) para chegarmos à bicicleta! E isso não aconteceu dum dia para o outro (e não vou indicar o nome dum inventor para a bicicleta, tantos são os nomes daqueles que aparecem como intervenientes nessa evolução).
1817 2017
No entanto, a tal ‘draisine’ continua a ser muito útil à miudagem dos nossos dias!
Após o aparecimento do sistema de locomoção apropriado (basicamente, pedais com movimento circular, roda traseira pedaleira e corrente) a bicicleta começou a evoluir e a ser uma solução extremamente útil para curtas, médias e longas deslocações.
E foi um nunca acabar de variantes:
Uma das variantes até contemplava a eventual falta de equilíbrio (para isso tinha 4 rodas) e a possibilidade do ‘ciclista’ levar com ele um elemento feminino.
Quadriciclo - 1886
A revolução social provocada pela bicicleta
As mulheres no século XIX tinham muito pouca (ou nenhuma) liberdade de movimentos. Só saiam de casa com o marido ou com um/a ‘chaperon/ne’. A bicicleta deu-lhes a possibilidade de se deslocarem – sózinhas – a kms de distância (muito para além da rua onde viviam e/ou das lojas locais onde faziam as compras).
Quando as bicicletas começaram a ter um ‘design’ próprio para mulheres: ausência da união horizontal do chamado ‘quadro’ da bicicleta, guiadores mais altos que o selim (explicaremos porquê) e protecção da corrente para evitar que as saias se sujassem e/ou prendessem nela) a revolução social estava em marcha e seria imparável não obstante uma área de objecções que iria – embora acabasse por ser derrotada – atrasar sobremaneira o ritmo desta revolução.
1895
Estamos a referirmo-nos a uma zona biológica feminina que não era considerado aceitável (e/ou minimamente ‘decente’) estar em contacto com algo que pudesse de qualquer maneira representar/provocar estímulos de natureza sexual.
Esta situação já vinha de longe e basta recordarmos a limitação que as mulheres tinham para ‘andar a cavalo’, tendo que usar ‘selas femininas’ que só tinham esse objectivo.
A ‘guerra’ movida pela sociedade masculina contra a emancipação da mulher tomou vários aspectos, desde anedotas a dar a entender que o lugar da mulher era junto a uma máquina de costura e não a ‘andar de bicicleta’ dum lado para o outro, sem qualquer controle (que ‘horror’!) a anúncios a apresentar os selins ‘Duplex’ de bicicleta, que todas as mulheres deviam usar, para conseguirem o objectivo atrás referido (e que seriam os únicos que deviam ser usados por aquelas que queriam ser consideradas minimamente ‘decentes’ pela sociedade ...não obstante já ‘andarem de bicicleta’).
- Minha querida, porque vens vestida com um traje próprio para ‘andar de bicicleta’?
Não achas próprio?
- Tu não tens uma bicicleta!
Mas tenho uma máquina de costura!
Por este mesmo motivo (precisamente com o mesmo objectivo) as bicicletas femininas eram todas apresentadas com o guiador bastante mais alto que o selim – e com as suas extremidades viradas para dentro (porque a mulher tem braços mais curtos) – levando a mulher a estar na bicicleta com o corpo erecto (e sentada) e nunca como o homem ‘anda de bicicleta’ (normalmente com o corpo inclinado para a frente e com o selim entre as pernas).
Nota: Existem actualmente à venda ‘selins duplos’ para serem instalados em todo o tipo de bicicletas (para aqueles/as que querem – ou necessitam – passear de bicicleta, cómodamente sentados).
A bicicleta foi pois uma ajuda determinante na emancipação da mulher, permitindo-lhe uma liberdade de movimentos ‘para além da rua onde vivia’ (e não só para toda e qualquer mulher casada, mas igualmente para mulheres com profissões com necessidade de liberdade de deslocação, nomeadamente – e como exemplo da progressiva emancipação feminina – as médicas dos finais do século XIX, que precisavam de se deslocar para os hospitais e/ou ir visitar os seus doentes).
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Qual será a próxima fase da evolução da bicicleta? Talvez a ‘NuBike’ (o seu inventor é o americano Rodger Parker e teremos de aguardar para ver se a sua invenção vai aparecer em massa no mercado ou não).
‘NuBike’
As suas vantagens são visíveis:
A energia produzida pelo ciclista é muito melhor aproveitada (o movimento vertical das pernas nos pedais – para cima e para baixo – desperdiça muito menos energia que o movimento circular das pernas actualmente necessário).
A não existência no exterior da bicicleta da ‘corrente e da actual roda pedaleira’ evita paragens forçadas devido à corrente ter ‘saltado ou ter-se partido’ e protege o vestuário do óleo sempre presente e de ser deteriorado pelos eventuais ‘saltos da corrente’ no mecanismo actual.
O movimento vertical das pernas nos pedais (vertical para cima e para baixo) é muito menos agressivo para as articulações dos joelhos e dos tornozelos.
Veremos o que o futuro e o desenvolvimento tecnológico reservam para a bicicleta.
Nota Final:
O que é que a vida terá feito da ‘Paulette’? Possivelmente nunca mais andou de bicicleta...
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