domingo, 11 de agosto de 2019

Submarinos - Factos e argumentos

No dia em que o “Tridente” chega a Portugal, um argumentário para colocar a questão dos submarinos no seu devido lugar

1. A história dos submarinos

 A capacidade submarina de Portugal não começou em 2004. Faz, em 2010, cem anos que Portugal

tem submarinos. A capacidade submarina de Portugal foi confirmada pela Monarquia, pela I

República, pelo Estado Novo e pelo regime saído do 25 de Abril;

 A última frota submarina portuguesa foi adquirida em 1962. À época, no Estado Novo, Portugal

comprou 4 submarinos da classe Albacora, que foram entregues em 1968.

 A duração média de uma frota de submarinos oscila entre os 30 e 40 anos; quando, em 2002, o CDS

ocupou a pasta da Defesa Nacional, já só estava em condições operacionais 1 dos 4 submarinos, e

mesmo esse já tinha feito a sua 6.ª revisão operacional.

 A esquadra que começa agora a chegar é, portanto, a 5.ª, em cem anos. Os atrasos na decisão entre

1993 e 2004 podiam ter colocado em risco a existência da escola submarinista em Portugal (o treino e

o conhecimento de uma tripulação submarina, se não operar, perde-se).


2. Quem e como lançou o concurso dos submarinos?

 A primeira declaração de intenção para aquisição de novos submarinos é de 1993;

 O concurso para renovação da capacidade submarina foi lançado em 1998, era Primeiro-Ministro

António Guterres;

 O concurso lançado pelo governo socialista em 1998 previa a aquisição de 3 a 4 submarinos (número

idêntico à esquadra anterior);

 O valor estimado, no concurso lançado em 1998, para a aquisição de 3 submarinos aproximava-se dos

2.000 milhões de euros;

 A Lei de Programação Militar previa recurso ao leasing em cerca de 70% dos valores das várias

aquisições;

 O Governo PSD/CDS herdou o concurso já na sua fase final (2002);

 A decisão tomada foi a de reduzir a aquisição para 2 submarinos, baixando o custo de 2.000 M€ para

1.000M€; foi também tomada a decisão de reduzir para 50% o valor da Lei de Programação Militar

previsto em leasing, de modo a evitar maiores custos financeiros;

 Quando, em 2004, a decisão final é tomada, a dívida pública portuguesa era de 58% do PIB, ou seja,

dentro dos limites do Tratado; hoje, depois de 5 anos de governo socialista, essa dívida pública

aproxima-se dos 90% do PIB, muito acima do aceitável.

 Todos os ministros da Defesa socialistas - Veiga Simão, Jaime Gama, Castro Caldas, Rui Pena, Luís

Amado e Severiano Teixeira foram favoráveis à aquisição de submarinos, e inscreveram-na em

sucessivas Leis de Programação Militar.

 O consenso em torno desta capacidade sempre foi estendido ao PS, PSD e CDS (os partidos próatlantistas)

 Na Assembleia da República, a decisão de reduzir para 2 os submarinos a adquirir, foi criticada pelo

PS, argumentando que isso colocaria a capacidade submarina de Portugal ao nível da Argélia;


3. Pode Portugal ser um país oceânico e deixar de ter submarinos?

 Portugal é um país oceânico e marítimo. Ora, os países oceânicos e de tradição marítima na Europa

têm, mantém e renovam a sua capacidade submarina. Por alguma razão será…

 Vejamos os principais exemplos:

 A Espanha terá uma capacidade de 12 submarinos (4 actuais; 8 em construção);

 A França terá uma capacidade de 17 submarinos (10 actuais; 7 em construção);

 A Itália terá uma capacidade de 9 submarinos (7 actuais; 2 em construção);

 A Holanda tem 4 submarinos;

 Os países escandinavos têm submarinos: Noruega 6, Suécia 7;

 A Grécia terá uma capacidade de 12 submarinos (8 actuais; 4 em construção);

 O Reino Unido terá uma capacidade de 16 submarinos (12 actuais; 4 em construção);

 A Alemanha terá uma capacidade de 16 submarinos (12 actuais; 4 em construção);

 Os países de Leste que aderiram à UE têm capacidade submarina (exemplo: Polónia com 5; Bulgária

com 1) ; até a Albânia – país modelo do Bloco de Esquerda… - teve capacidade submarina (2);

 Obviamente as grandes potências têm capacidade submarina (EUA 82; Rússia 73; China 67);

 Se Portugal abandonasse a capacidade submarina, seria o único país oceânico da Europa a demitir-se

da soberania marítima;

 Se Portugal o fizesse, todas as responsabilidades marítimas de Portugal seriam imediatamente

ocupadas por países vizinhos, nomeadamente Espanha (cujo plano de renovação da esquadra entrava

em linha de conta com a possibilidade de Portugal perder essa capacidade);


4. Razões militares e estratégicas para Portugal ter capacidade submarina

 É uma componente vital da Marinha para a defesa naval, para a vigilância, reconhecimento e

interdição dos nossos mares.

 Por ser um meio silencioso, furtivo e flexível na utilização, dissimulando a sua presença, garante os

requisitos de dissuasão nas missões de recolha de informações.

 Nas missões de interesse público os submarinos desempenham um papel muito relevante na luta

contra o tráfico de droga, pirataria, imigração ilegal, pesca ilegal, terrorismo, crimes ambientais e

outros actos ilícitos.

 A incerteza quanto à sua presença permite ser um excelente meio de dissuasão.

 É também um excelente e fundamental meio militar no controlo dos espaços marítimos (e em caso de

guerra).

 É praticamente impensável ter fragatas se não houver um meio de as proteger, ou seja, capacidade

submarina. E deixar de ter fragatas seria o mesmo que deixar de ter Marinha (sublinha-se que

Portugal tem 5 fragatas cuja protecção depende dos submarinos);

 Se Portugal abandonasse a capacidade submarina, seríamos o único país europeu com mar territorial

e ZEE a deixar de ter essa capacidade.


5. Razões económicas para ter capacidade submarina

 Portugal tem uma superfície territorial de 92 mil km² e uma Zona Económica Exclusiva (ZEE) de

1milhão 658 mil km², tornando o nosso pais no 11º ao nível mundial;

 Este espaço vai, provavelmente, crescer: Portugal apresentou à Comissão dos Limites da Plataforma

Continental das Nações Unidas a sua proposta de extensão dos limites da plataforma continental.

Prevê-se o aumento dos actuais 1,66 milhões de km² para 3,6 milhões de km², uma das maiores do

mundo;

 Com todos os continentes descobertos e pesquisados, a ciência diz-nos que é nos oceanos e no fundo

dos mares que se encontram as riquezas e os bens por descobrir;

 O valor real do mar português é por isso notável e o seu potencial enorme. Basta pensar nas pescas,

no turismo, do transporte e comércio marítimo. Neste momento mais de 80% dos bens

transaccionados, 90% do comércio intercontinental e cerca de 70% do petróleo são transportados por

mar. Na União Europeia 53% do comércio passa em espaços marítimos sob nossa responsabilidade.

 Todo este património nacional necessita de uma capacidade de o proteger, reclamar e salvaguardar. É

impossível o exercício dessa soberania sem a capacidade submarina.

Com a extensão da plataforma territorial, acrescenta-se mais 240.000 quilómetros quadrados .Com este acréscimo Portugal passará a ter um área total de 3.027.408 km2, o que fará saltar de 11.ª maior ZEE do mundo para 10.ª, imediatamente atrás do Brasil com 3.660.955 km2.


6. A questão dos valores em causa

 Trata-se de uma defesa de soberania, ou, como costuma dizer o Prof. Adriano Moreira, um

investimento em soberania;

 Desde 1998 que se sabe que Portugal irá adquirir capacidade submarina; os custos foram, aliás,

substancialmente reduzidos em 2002;

 Pelas regras do Eurostat, cada bem militar é imputado no défice apenas uma vez, no ano da sua

recepção definitiva (ao contrário do que sucede com as SCUT, PPPs, grandes obras, etc.)

 Se a dívida pública está , em termos reais, em mais de 100% do PIB, acima dos 170 Milhões de euros,

o valor de que estamos a falar é 0,6% do problema.

António Campos, Histórico do PS Arrasa Regionalização.

“Claro que António Campos tem toda a razão! Quem ainda não percebeu que esta história, aliás mal contada, da regionalização outra coisa não é senão uma forma de satisfação de clientelas partidárias, sempre à espera de um assento na nomenclatura do estado?  Ou para ser mais prosaico, uma fonte de tachos.

Quem não entendeu ainda que este país, que se atravessa com uma mijadela (desculpem lá a grosseria), não precisa da regionalização para nada?  O que este país, embora pequeno mas com assimetrias de estarrecer, precisa é que os governos dêem mais atenção ao interior, que não centralize tudo e mais alguma coisa no Terreiro do Paço, i.é., que desconcentre, que descentralize. Ou seja, que crie condições de fixação das populações nas suas zonas de origem, a falta das quais (condições) leva sobretudo os jovens a acudir à cidade, quando não a atravessar as fronteiras. Isso sim, é que deve acontecer, ou por outra, já devia ter acontecido. Por que cargas d''água todos os ministérios, todas as secretarias de estado, todas as directorias hão de estar sediados na capital?

Será que há alguém que pense que se a Regionalizão avançar, se acabarão as assimetrias, i.é., todas atingirão a igualdade? Não, não, haverá sempre regiões mais desenvolvidas que outras, até pela simples razão relacionada com as diversas potencialidades e especificidades de cada zona. E claro, com as capacidades de gestão e criatividade de cada órgão directivo regional.

Portanto, arquivem lá essa coisa da regionalização e passem a ter um olhar mais abrangente na hora das decisões. porque o país não é só Lisboa e o resto é paisagem.

C.F.”

Histórico do PS arrasa regionalização: https://sol.sapo.pt/artigo/667710/historico-do-ps-arrasa-regionalizacao

Frase motivacional da semana…

Não esmoreças nem desistas!!!!!

Trabalha duro! Milhares de pessoas que vivem do Rendimento Mínimo, sem trabalhar, dependem de ti!

O Caso Paradigmático da Família Socialista Portuguesa na Família Socialista Europeia.

Por esse mundo fora, os socialistas orgulhosos de o ser há muito que deixaram discretamente cair a palavra “socialista” dos títulos com que pomposamente batizam os seus partidos. Nos países da Cortina de Ferro os motivos são óbvios. De Estetino no Báltico, a Trieste no Adriático, os partidos socialistas não aglomeram mais que uns quantos saudosistas das senhas de racionamento e das prisões arbitrárias. Socialistas italianos e gregos, outrora orgulhosos dos seus partidos, literalmente votaram os respectivos partidos socialistas à extinção, à medida que se apercebiam que esses supostos baluartes ideológicos não passavam de agências de nepotismo e corrupção (rings a bell?).

Apesar de não terem conseguido escapar ao socialismo em si, gregos e italianos foram pelo menos capazes de implementar o salutar hábito de mudar as moscas. Em França o PS agoniza enquanto os seus eleitores se dividem entre o socialismo aparentemente tecnocrata de Macron e o socialismo disfarçadamente ecológico de Mélenchon. Na zona de influência do protestantismo, do qual pouco ou nada resta, a palavra Socialismo nunca vingou. Os anglo-saxónicos fugiram dela a sete-pés, enquanto que o resto dos godos normalmente preferem o eufemismo “social-democrata”, mesmo quando esse fosse o nome do partido que, na Rússia imperial, albergou um grupo de psicopatas sanguinários mais conhecidos como bolcheviques. Que em Portugal o Partido Social Democrata seja considerado “de direita” é uma triste manifestação das preferências eleitorais do eleitor medio nacional. Se para Churchill em Inglaterra uma conversa de cinco minutos com o tal eleitor era o melhor argumento contra a Democracia, em Portugal ao estadista inglês bastaria um olhar furtivo para declarar-se absolutista.

Assim pois, temos aqui na Península Ibérica a duvidosa honra de ser os únicos países democráticos (ia dizer civilizados) do mundo onde os partidos socialistas não só ainda atendem pelo nome como, pasme-se, governam. Não que não tenham sofrido reveses eleitorais. Tanto em Portugal como em Espanha, os partidos socialistas chegaram ao poder com os piores resultados eleitorais da sua história, montados à cabeça de uma coligação de socialistas e socialismos surtidos, cujos líderes não perceberam o que Mário Soares e Felipe González tinham percebido há já quatro décadas – que o seu inimigo eram os outros socialistas. É que a política ibérica é como o Highlander. Só pode existir um. O presidente do governo, seja ele quem for, é o dador da vida, como os faraós do Egipto, e toda a estrutura burocrática do partido e do estado se curva voluntariamente perante ele. E o que dizer do eleitorado, essa minoria que ainda se resigna em ir às urnas cumprir o seu “dever cívico”?

Obviamente que calamidades localizadas, como pontes que caem pelo peso de autocarros cheios de pessoas, ou incêndios que matam por incúria do aparelho do estado, por exemplo, não contam porque, como o SIDA ou ganhar o Totobola, só acontecem aos outros. Enquanto não houver uma calamidade generalizada, seja a caída pronunciada do preço da habitação, o alto desemprego, uma crise do petróleo, uma intervenção do FMI por deficit excessivo ou uma inflação galopante, o chefe do governo aguentará ileso e todo-poderoso. Só num destes casos é que políticos, burocratas e empresários, outrora amigos do grande líder, discretamente se colocarão de perfil enquanto os votantes lhe retiram o tapete. Só um acontecimento deste tipo é que tem o condão de acordar o eleitorado do estupor em que permanentemente vive. De outro modo, este manifesta inequivocamente a sua preferência “pelo que já lá está”, seja ele quem for. Fazendo jus à velha máxima, de que é melhor o mal conhecido que o bem por conhecer. Foi isto que Costa e Sanchéz perceberam. Os seus parceiros de assalto ao poder acharam que não, ou que desta vez ia ser diferente, ou que a recompensa era suficiente, porque o apoio não foi grátis, em política nunca é.

No fundo é compreensível a atitude dos eleitores, tanto dos que vão votar como dos que não. Se nos duzentos anos em que tiveram essa possibilidade nunca conseguiram eleger um governo decente, porque é que na próxima eleição iriam acertar? Pensam, se calhar com razão, que concurso está amanhado. É que o concurso está amanhado, mas são os próprios eleitores quem o amanha, porque querem viver num socialismo qualquer. Exigem do estado aquilo que ele não pode dar: que todos possam viver felizes à custa dele. E como não podem todos todos viver felizes à custa dele, alguns vão vivendo felizes à custa de todos. No entanto, e enquanto esta lição não for aprendida (e temo que não será aprendida nunca) convinha, pelo menos, ir distinguindo os maus socialistas dos piores. Por exemplo, é certo que Portugal e Espanha são ambos governadas por partidos socialistas, mas não é certo que esses partidos socialistas sejam iguais. O Partido Socialista português pode comparar-se em vileza, quanto muito, ao PSOE da Andaluzia, não coincidentemente a região mais pobre (e corrupta) de Espanha. É certo que a mulher de Pedro Sanchéz, Begoña Gómez, também viu recentemente melhorada a sua condição laboral ao ser contratada por uma fundação privada com projectos sociais para África, e que o próprio Pedro voa, ao supermercado se for preciso, no Falcon presidencial para se recordar constantemente de quão bom e especial é (ou julga ser). Pedro Sanchéz é claramente um homem feliz por se ter conhecido.

Mas a diferença é que, em geral, os familiares mais chegados aos socialistas espanhóis, pelo menos a nível nacional, normalmente ainda fazem carreira naquela iniciativa privada que está mais além do mero enriquecimento através do Diário da República. Aliás, não deixa de ser com ironia que observo que muitos dos filhos de socialistas anti-capitalistas espanhóis estudaram nos Estados Unidos e trabalham em empresas de Private Equity ou Hedge Funds com um credo tão manifestamente capitalista que faria o Karl Marx corar de vergonha. Algo que não sucedeu nem sequer quando este contou à mulher que tinha engravidado a criada. Também é certo que a segunda medida de Sanchéz quando chegou ao governo, depois de ter mandado mudar o colchão na Moncloa (como confessou num livro escrito por uma jornalista que, como recompensa, foi nomeada secretária de estado), foi colocar os amigos que o ajudaram a medrar no PSOE em cargos de confiança em empresas públicas. Mas isso é o normal em política em qualquer lado. Qualquer socialista, de esquerda ou de direita, de cima ou de baixo, de trás ou da frente, vai apoiando e apoiando-se noutros socialistas para chegar a esses lugares.

O que é extraordinário é que, à mofa com que as notícias sobre os familiares do PS no governo português são divulgadas pelos jornais ditos de direita em Espanha, junta-se com sorna o El País, jornal independente da manhã (mas dependente do PSOE) que explica aos seus leitores como, “a endogamia política de um país pequeno, com uma classe dirigente escassa, chegou ao extremo em que se sentem, no mesmo conselho de ministros, um matrimónio, um pai e uma filha”.

Mesmo para um país socialista, governado por um plagiador vaidoso e inane, como é a Espanha actual, a política portuguesa tem requintes terceiro-mundistas que eles julgam estar bastante abaixo do que é possível num país civilizado. E eu confesso que também.



Ricardo Dias de Sousa
Professor em Madrid

sábado, 10 de agosto de 2019

O Alentejo no fio da navalha

As autoridades estimam que vivam no concelho de Odemira cerca de 8 mil imigrantes, oriundos de 68 nacionalidades, maioritariamente da Ásia, mas, na verdade, ninguém sabe muito bem quantos são.

O litoral alentejano é hoje a mais problemática fronteira migratória que enfrentamos. As autoridades estimam que vivam no concelho de Odemira cerca de 8 mil imigrantes, oriundos de 68 nacionalidades, maioritariamente da Ásia, mas, na verdade, ninguém sabe muito bem quantos são. O surto migratório, que começou há quase 10 anos, teve por base a contratação de mão de obra pelas empresas que produzem frutos vermelhos em estufa. Esta realidade, porém, há muito que está ultrapassada. Se é certo que se verifica, no essencial, uma convivência pacífica entre imigrantes e portugueses, e que têm vindo a crescer sinais de confiança recíproca, através da contratação de mão de obra fora do universo das ditas empresas, as notícias dos últimos tempos não são as melhores.

08-08-2019 por Eduardo Dâmaso

https://www.sabado.pt/opiniao/cronistas/eduardo-damaso/detalhe/o-alentejo-no-fio-da-navalha?ref=DET_Ultimas_Eduardo%20Dâmaso

quarta-feira, 7 de agosto de 2019

Um questionário enviado a 500 mil funcionários públicos pergunta-lhes se estão satisfeitos com o Governo e se foram afectados durante a troika.

    Um questionário enviado a 500 mil funcionários públicos pergunta-lhes se estão satisfeitos com o Governo e se foram afectados durante a troika. "Em campanha, vale tudo", critica a presidente da UGT.

    O questionário foi enviado pela Direcção-Geral da Administração e Emprego Público a mais de 500 mil trabalhadores da administração central do Estado e tem um objectivo: perceber o que motiva e desmotiva os funcionários públicos. É apresentado pelos serviços como uma “segunda edição” de um questionário feito em 2015, mas este tem perguntas novas que estão a indignar alguns funcionários. Isto porque são “convidados” a responder se o período da troika (que coincide com a governação de Passos Coelho) os desmotivou ou se políticas marcantes da “geringonça” — como a “reposição dos salários” ou “descongelamento progressivo das carreiras” — os deixaram mais motivados.

    Assim, o governo fica com acesso a uma espécie de “focus group” em larga escala à administração pública sobre a sua governação em ano eleitoral. Já a DGAEP, em resposta ao Observador, justifica que foram os trabalhadores que pediram estas perguntas nas “sugestões” de um anterior questionário. A presidente da UGT (e dirigente dos TSD, Trabalhadores Sociais Democratas), Lucinda Dâmaso, diz que as “perguntas eram obviamente de evitar“, mas que “em campanha eleitoral, vale tudo“.

    O questionário chegou por email aos trabalhadores e terá de ser respondido até 30 de setembro. Em concreto, as perguntas polémicas surgem numa secção dedicada a “Fatores de motivação/satisfação no trabalho na Administração Pública”. São estas:

    • “O período da Troika influenciou negativamente a minha motivação no trabalho”

    • “A reposição dos salários afetou positivamente a minha motivação no trabalho”

    • “O descongelamento progressivo das carreiras é motivador“

    • “Sinto-me hoje mais motivado no trabalho do que há 5 anos?“

      • Há, para as questões, quatro respostas possíveis: “Totalmente em desacordo”; “Em desacordo”; “De acordo”; e “Totalmente de acordo”.

        Excerto do questionário que está a ser feito pela DGAEP a mais de meio milhão de funcionários públicos

        A DGAEP, em resposta às questões do Observador, diz que este questionário “constitui um follow up do questionário realizado em 2015 sobre a motivação dos trabalhadores em funções públicas”. No entanto, o questionário de 2015, apenas tinha perguntas do tipo: “O meu superior hierárquico reconhece a qualidade do meu desempenho?”; “Sinto-me realizado(a) profissionalmente?”; ou “As minhas potencialidades profissionais estão plenamente aproveitadas?”. Desta vez, além destas questões (e de outras como a condição económica ou a relação com a chefia), os funcionários públicos são questionados sobre atos concretos da governação socialista.

        Estas perguntas destacam-se também por fugirem à lógica das restantes. Não só no conteúdo, mas também na forma. As perguntas são formuladas de forma positiva na parte referente a medidas adotadas por este Governo (“afetou positivamente”, “motivador” ou “mais motivado” são as expressões escolhidas) enquanto outra sugestiona o “período da troika” como negativo (“afetou negativamente”).

        Sobre o teor das perguntas, a DGAEP diz apenas ter respondido à “‘taxa de resposta e sugestões recolhidas’ dos resultados do inquérito de 2015 em que se identificaram precisamente algumas das questões colocadas nesta versão de 2019″.

        Excerto em que o relatório do inquérito anterior refere as sugestões dos trabalhadores

        Ora, em 2015 havia três sugestões mais proeminentes: a primeira era sobre o aumento das 35 para as 40 horas (que o governo reverteu em vários setores, mas deixou de fora deste questionário de 2019), outra sobre o congelamento das remunerações (que é, de facto, uma das questões) e outra sobre o congelamento das carreiras (que é aqui referido aos trabalhadores como “descongelamento progressivo”, a forma de descongelamento proposta pelo governo).

        Ainda assim, não há nada que aponte diretamente para uma questão sobre a influência negativa do período da troika, tendo em conta que o programa de assistência terminou em maio de 2014. E essa questão é feita. Além disso, o questionário dista quatro anos do anterior, mas a pergunta é feita sobre se está mais motivado do que “há cinco anos atrás [sic]”. Esta referência temporal (cinco anos) está a ser entendida por alguns trabalhadores como uma forma de deixar claro que se trata do tempo do passismo (quatro anos daria 2015, o que podia criar confusão na análise, já que o governo Costa toma posse em novembro desse ano).

        A DGAEP desvaloriza esta questão, dizendo que “foi preparado um novo questionário pela equipa de investigadores (e docentes universitários) que concebeu e analisou o instrumento anterior, sendo suportado na literatura científica especializada”.

        Na mesma resposta ao Observador, a DGAEP destaca que na sequência do questionário de 2015 pretende-se “atualizar a informação recolhida, de forma a aferir a tendência evolutiva nos diferentes parâmetros analíticos”. Porém, em algumas destas questões, isso não se coloca: não se pode avaliar a evolução quando há perguntas que não foram feitas há quatro anos. O mesmo organismo explica ainda que em 2015 o “questionário esteve aberto em abril e maio e o relatório respetivo foi apresentado em outubro”. Já na presente edição “o prazo de preenchimento termina a 30 de setembro, sendo os dados tratados subsequentemente e o relatório apresentado até final do ano”.

        Um dos emails recebidos num dos organismos da Administração Central do Estado

        O polémico processo de liderança da DGAEP

        A Direção-Geral da Administração e Emprego Público é liderada por Vasco Hilário, que tem um vasto currículo na administração pública e foi adjunto, assessor e chefe de gabinete de vários governantes socialistas. A escolha do atual diretor-geral está envolta em polémica e levou mesmo a presidente da CRESAP, Júlia Ladeira, a ter de se explicar na Comissão de Orçamento e Finanças do Parlamento em julho.

        Tudo começou quando a 19 de dezembro um despacho da secretária-geral da Administração Pública recusou os três nomes indicados pela CRESAP para diretor-geral da DGAEP. Justificação: foi idenficado no período de seleção “um candidato com um perfil mais compatível com as orientações estratégicas definidas” face às propostas da CRESAP (que incluíam diretor-geral e subdiretores adjuntos). Depois disto a presidente da CRESAP foi chamada (pelo PSD) ao Parlamento em fevereiro.

        Entretanto, em dezembro foi nomeado em regime de substituição Vasco Hilário, que se mantém no cargo. Em maio a Lusa noticiou que o próprio ministério estava há mais de cinco meses à espera de um nome da CRESAP. No entanto, em julho, no Parlamento a presidente da CRESAP explicou porque é que a entidade que lidera não indicou nomes: porque o próprio Ministério das Finanças não indicou um perito. Assim, Vasco Hilário continua a liderar a DGAEP.

        TSD. “Perguntas eram de evitar. Mas em ano eleitoral, vale tudo”

        A presidente da UGT e da mesa do Congresso dos TSD (Trabalhadores Sociais Democratas), Lucinda Dâmaso, considera que em “período de campanha eleitoral não se fazem estas perguntas em questionários aos funcionários públicos” e que “obviamente eram de evitar”. Lucinda Dâmaso não se surpreende, já que “em ano eleitoral acaba por valer tudo”. E acrescenta: “Não tenho memória de um questionário deste tipo alguma vez ter sido feito, que assim acaba por ser uma espécie de uma sondagem”.

        Apesar disso, a presidente da UGT diz que antes de ser social-democrata é sindicalista e que não tem problemas em dizer que “o período da troika influenciou muito negativamente os trabalhadores da administração pública”, já que foi “um período muito difícil, que exigiu mais a todos os trabalhadores”. No entanto, destaca que “esses cortes já vinham do tempo de José Sócrates, da parte final do mandato, com o congelamento de carreiras e a redução dos salários. Os trabalhadores já estavam num acumular de sofrimento quando chegou a troika e ainda sofreram mais”.

        Lucinda Dâmaso antevê que as respostas possam não agradar muito ao executivo. “Digo-lhe já que não estão muito satisfeitos. Há trabalhadores que foram tendo cada vez mais trabalho. No caso da educação, por exemplo, houve situações de professores que tinham menos tempo de serviço à frente na carreira de professores com mais tempo. Portanto, está longe de haver uma paz e uma motivação geral na Administração Pública.

        Já o secretário-geral do Sindicato dos Trabalhadores da Administração Pública (SINTAP, também afeto à UGT), José Abraão, não vê problema em que as perguntas sejam feitas. “Podem ser feitas, até porque os tempos da troika levaram a um efeito de desmotivação em toda a administração pública“, justificou. E prontamente se disponibilizou a responder às quatro (não numa escala de totalmente de acordo a totalmente em desacordo) mas de forma qualitativa. As respostas são bastante críticas para o Governo:

        O período da Troika influenciou negativamente a minha motivação no trabalho?

        José Abraão: É verdade. Influenciou negativamente de forma muito significativa. Houve aumento de impostos, aumento das horas de trabalho, redução dos salários e do pessoal, o que influenciou muito negativamente o trabalho na Administração Pública.

        A reposição dos salários afetou positivamente a motivação no trabalho?

        José Abraão: Não foi motivadora porque a reposição dos salários não foi imediatamente acompanhada pela reposição do número de trabalhadores que saíram para a aposentação, não melhorando em nada a motivação dos trabalhadores que em áreas como a Justiça, Segurança Social ou Educação acabaram por ter mais cargas horárias, face embora a redução para as 35 horas. Por isso, a motivação mantém-se baixa. Depois os aumentos salariais nem chegaram para repor os valores de 2009, por isso não motivou de forma significativa. O que cresceu foi a confiança, porque já não houve mais cortes. Mas havia expectativas que não foram correspondidas.

        O descongelamento progressivo das carreiras é motivador?

        José Abraão: Foi desde logo desmotivador, porque foi de forma faseada, muito devagarinho, e na esmagadora maioria dos casos mal foi sentida. Os que receberam mais 20 euros receberam cinco euros em quatro fases, o que quase não se sente. Havia uma expectativa maior no que diz respeito ao descongelamento, é verdade que foi tudo descongelado e que já não houve cortes, que foi mais ou menos reposta a normalidade.

        Sente-se hoje mais motivado do que há cinco anos?

        José Abraão: A motivação não cresceu assim tão suficientemente que se possa dizer que há hoje uma maior motivação da Administração Pública, porque há muitos problemas para ultrapassar, como a política dos baixos salários. Depois há concursos a que não concorrem pessoas. E, o que vou dizer parece contraditário, mas foi agora aberto um concurso para reserva de recrutamento com 1000 vagas para técnicos superiores para os próximos dois anos e concorreram 18 mil trabalhadores  Isto parecem pequenos sinais de motivação, mas são jovens licenciados que vão ganhar 870/880 euros líquidos, por isso a motivação não deve perdurar.

        O questionário termina a 30 de setembro, 6 dias antes das eleições legislativas, mas a Direção-Geral da Administração e Emprego Público, tutelada pelo Ministério das Finanças de Mário Centeno, já começou a receber as primeiras respostas.


        Nota: este questionário passou em 07 Ago 2019!


      domingo, 4 de agosto de 2019

      O absurdo à la carte

      Eu já, em artigo anterior, me insurgi sobre o despudoramento de Augusto Santos Silva e o PS, e a sua interpretação das leis do país, algumas que eles mesmo fizeram aprovar. Este artigo está mais esclarecedor do que o meu e revejo-me totalmente nele.


      Nuno da Costa Nata

      Não discutimos o óbvio. Não discutimos a ética. Não discutimos a lei. Discutimos opiniões. Discutimos as nossas crenças, as nossas paixões. É de génio, há que reconhecer.

      Inauguraram-se novos tempos na política portuguesa. Augusto Santos Silva será o pai da autopoiese política. O termo conhecia, até então, definições nas áreas da biologia, da sociologia e da filosofia. Nunca na política. Teria que ser um português. Só um português seria capaz de redefinir o seu esqueleto, colando a coluna vertebral aos pés e o cérebro à anca para garantir a sua subsistência no meio, quando as condições exógenas lhe são adversas. A autopoiese mais não é do que um sistema isolado construído pelos componentes que o próprio cria, num processo de auto-preservação e numa rede de interacção circular e recursiva.

      Confuso? Passemos a explicar:

      Se até hoje todos pensávamos que as leis eram para cumprir, fruto da sua generalidade e abstracção, estávamos todos errados. A lei é como o absurdo, é à la carte. Só se cumpre quando dá jeito…

      Sócrates, que não o filósofo, testou: “Pagar a dívida é ideia de criança”; Ferro, que não o central, validou: “Tou-me cagando para o segredo de justiça” e Santos Silva, que não o antifascista, postulou: “Seria um absurdo uma interpretação literal da lei”.

      Candidato ao Guiness pelo contorcionismo ideológico, estribou o argumentário na falta de clareza do diploma legal, o que não deixa de ser estranho já que a redacção actual (proposta pelo BE), foi aprovada em plenário sem qualquer voto contra. Mais estranho ainda quando, à data, era Ministro dos Assuntos Parlamentares. Não achou, nem ele nem ninguém, que a lei fosse pouco clara. E é fácil perceber porquê. Estão em causa apenas dois artigos da lei: o 8º, que define o regime das incompatibilidades entre os titulares de um cargo político ou de soberania, que detenham (eles, o cônjuge, ascendentes, descendentes ou colaterais até ao 2º grau) percentagem superior a 10% de uma sociedade e a realização de negócios entre essas sociedades e o Estado; e o 10º, que prevê a demissão do titular do cargo, nesses casos.

      Mais: os lentes em direito constitucional já vieram a terreiro dizer que tais contractos são nulos e podem implicar a restituição das verbas comunitárias.

      Clarinho e transparente como a água…

      Surge, porém, um problema: fazer cumprir a lei implicaria que Artur Neves se demitisse (e não que pusesse o lugar à disposição), mas também levantaria o véu sobre as relações entre o pai do ministro Pedro Nuno Santos, o marido da ministra Francisca Van Dunem e os pais e irmão da ministra Graça Fonseca. Começa a ser muita gente. Começa a ser preocupante. Começa a ser um problema.

      Há um elefante na sala!

      Para lá da solução óbvia – fechar a porta e esconder o elefante dos olhares, haveria uma outra, bem mais criativa: chamava-se a Joana Vasconcelos, ela cunharia o elefante de instalação e o povo seguiria a sua vidinha, feliz e contente, ainda pagando ingresso para ver o gigante mamífero. Augusto Santos Silva vê mais longe — deixa o elefante na sala e pergunta: “Será que isto é mesmo um elefante? Não é claro que seja! O melhor é chamar especialistas para se pronunciarem quanto à filologia do animal em questão”. O povo delira, faz filas, alvitra elefantes, mamutes, mastodontes, mutantes e até transgéneros mammalius e segue a sua vidinha, feliz e contente, pagando ingresso. Poupou-se a alvissara da artista e a crítica à arte em causa. A cada um o seu juízo. A cada um o seu palpite, como se fossem parte integrante do espectáculo.

      Não discutimos o óbvio. Não discutimos a ética. Não discutimos a lei. Discutimos opiniões. Discutimos as nossas crenças, as nossas paixões. É de génio, há que reconhecer.

      Agora experimentem fazer o mesmo quando a polícia vos mandar parar por excesso de velocidade ou quando for necessário pagar um imposto: “Ah e tal… a lei não é clara! Vou pedir um parecer e depois decido se pago”.

      Querias, não querias?

      É que quando o elefante é teu, é sempre um elefante…

      As demissões mais polémicas do Governo de Costa

      O SOL reuniu as demissões mais polémicas do Executivo de António Costa.

      Licenciaturas (ou a falta delas)

      Em Outubro de 2016, dois adjuntos do Governo demitiram-se por problemas relacionados com as suas licenciaturas. O primeiro caso envolveu o adjunto do primeiro-ministro para os Assuntos Regionais, Rui Roque, que acabou por se demitir após se ter descoberto que tinha uma licenciatura falsa em Engenharia Electrotécnica. No mesmo mês, Nuno Félix, chefe de gabinete do secretário de Estado da Juventude e do Desporto, também se demitiu depois de ter sido revelado que o responsável não tinha completado duas licenciaturas, como estava descrito no despacho da sua nomeação publicado em Diário da República.

      Raríssimas

      Após uma investigação conduzida pela TVI, o  secretário de Estado da Saúde, Manuel Delgado, demitiu-se, em Dezembro de 2017, pela sua ligação à polémica ex-presidente da instituição Raríssimas, Paula Brito e Costa. Na altura, a reportagem trouxe a público detalhes sobre a gestão da associação que apontavam para o uso indevido de fundos da Raríssimas para despesas pessoais de Paula Brito e Costa. Manuel Delgado abandonou funções depois de ter sido confrontado com o facto de ter feito viagens com a presidente alegadamente pagas com dinheiro da associação.

      Galpgate

      Em Junho de 2017, três secretários de Estado pediram a demissão devido ao caso conhecido por Galpgate. Rocha Andrade, responsável pelos Assuntos Fiscais, João Vasconcelos (falecido em Março deste ano), da pasta da Indústria, e Jorge Costa Oliveira, da Internacionalização, abandonaram o Governo, na sequência da informação de que tinham aceite viagens pagas pela petrolífera Galp para irem assistir ao Europeu de futebol de 2016, em França. O Ministério Público acusou de corrupção 16 dos 26 arguidos do caso.

      Incêndios de 2017

      Depois dos trágicos incêndios de 2017 que provocaram 115 mortes, Constança Urbano de Sousa, ministra da Administração Interna pediu a demissão a António Costa. Segundo a antiga executiva, «logo a seguir à tragédia de Pedrógão» tinha «insistentemente» pedido ao primeiro-ministro que a libertasse das funções. Contudo, a demissão só foi oficializada a 18 de Outubro, depois de o Presidente da República ter dito publicamente que o país precisava de iniciar um novo ciclo e que o Governo deveria analisar «quem» poderia servir melhor esse recomeço.

      O caso de Tancos

      O polémico desaparecimento de material militar dos paióis de Tancos levou à demissão do ministro da Defesa, Azeredo Lopes, em Outubro de 2018. Um após ter estalado o ‘escândalo’ que levou à abertura de uma comissão parlamentar de inquérito, Azeredo acabou por não resistir. Em causa estava se o ministro sabia da encenação ou se tinha comunicado a António Costa a forma ilegal como a Polícia Judiciária Militar tinha reavido o material roubado. Azeredo Lopes acabou por ser constituído arguido em Julho.

      ‘Familygate’

      Antes da polémica das golas infamáveis, o ‘Familygate’ tinha sido o último escândalo a pôr o Governo em cheque. Em Abril, Carlos Martins,  secretário de Estado do Ambiente, e o seu primo e adjunto Armindo Alves demitiram-se, após terem sido reveladas as relações familiares entre os políticos. Dias depois, na mesma lógica, João Ruivo, marido da secretária de Estado da Cultura e técnico especialista do Gabinete da Secretária de Estado do Desenvolvimento Regional, também abandonou as funções que tinha assumido há 13 dias.

      Perfil de um governo que nada sabe

      Seria um absurdo uma interpretação literal deste texto como se fosse um artigo de opinião. Ele apenas recorda factos. Lista acontecimentos. Relaciona comportamentos. As conclusões ficam para o leitor.

      Falhas no combate a incêndios? O Governo nada sabia.

      Falhas nos apoios a quem perdeu todos os seus haveres nos fogos? O Governo nada sabia.

      Encobrimento de Tancos? O Governo ignorava.

      Operação stop do fisco? O Governo desconhecia.

      Estradas em risco e derrocadas com vítimas mortais? O Governo nada sabia.

      Jantar da websummit no Panteão Nacional? O Governo não sabia.

      Auditoria à CGD? O Governo nunca tinha ouvido falar.

      Prémios muito polémicos na TAP? O Governo foi o último a saber.

      Acções prepotentes de fiscalização da Autoridade Tributária em casamentos e festivais? O Governo só ficou a saber pelos telejornais.

      Um Secretário de Estado nomeia um primo para adjunto no seu gabinete? O Governo não sabia.

      Um ministro acumula estas funções com a gerência de empresas? O Governo não sabia.

      Três governantes viajam à final do campeonato europeu de futebol a convite de uma empresa em litígio com o Estado? Eles não sabiam que não convinha proceder assim.

      Obras de arte? “Não estão desaparecidas, estão por localizar”. Tradução deste eufemismo: não sabem.

      O Governo decidiu não contabilizar a contagem integral do tempo de serviço dos professores depois de o PS ter votado na Assembleia da República uma recomendação ao Governo para a «contagem de todo o tempo de serviço para efeitos de progressão na carreira e da correspondente valorização remuneratória»? Claro que Governo não sabia. Ou, se soubesse, já não se recordava. Ninguém pode exigir-lhe que se lembre de tudo.

      Organismos do Estado não apresentam planos e relatórios de actividades? O Governo nada sabe.

      “Golas inflamáveis”? O Governo não sabia, a culpa só pode ser da Protecção Civil (tutelada pelo Governo). Ah, afinal nem ardem. As capas dos microfones é que são inflamáveis. A culpa, se calhar, é dos jornalistas.

      As tais golas foram produzidas por uma empresa criada há 18 meses e pertencente ao marido de uma autarca do PS. O Governo, obviamente, desconhecia tudo isto.

      Voltaram os incêndios, já com mais de 23 mil hectares ardidos, depois de o Governo ter garantido que este seria um dos anos com menos fogos. A culpa é dos autarcas, que não prepararam as coisas. Como é que o Governo havia de saber?

      Mais de metade da área ardida (54%) é de povoamento florestal. Como é que o Governo, ocupado a fazer “a maior reforma da floresta desde D. Dinis”, podia adivinhar?

      Afinal há mais empresas de familiares de membros do Governo – incluindo três ministros – que mantêm ligações comerciais com o Governo. Obviamente, o Governo desconhecia. Só sabia que “seria um absurdo uma interpretação literal da lei”. Faltando especificar se todas as outras leis vigentes no País devem permanecer igualmente ao abrigo de “interpretações literais”.

      Uma deputada menciona uma residência falsa para receber subsídio de deslocação? Claro que o primeiro-ministro António Costa não podia saber disto. Mas o secretário-geral do PS, António Costa, sabia. E reconduziu a deputada como cabeça de lista às próximas legislativas.

      Nota do autor: seria um absurdo uma interpretação literal deste texto como se fosse um artigo de opinião.

      Rodrigo Saraiva - Fundador e membro da Comissão Executiva da Iniciativa Liberal

      sábado, 3 de agosto de 2019

      Mais de 1800 inscritos no IEFP

      Emigrantes já podem fazer registo para procurar emprego. 42 já se candidataram a apoio financeiro para regressar.

      Mais de 1800 cidadãos portugueses residentes em 72 países inscreveram-se no site do Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP) nos últimos três meses, desde que foi criada a possibilidade de os emigrantes se registarem para procurarem ofertas de trabalho antes do seu regresso.

      A medida insere-se no “Programa Regressar”, criado pelo Governo com o objectivo de apoiar o retorno de trabalhadores que tenham deixado o país até 31 de Dezembro de 2015. O programa inclui um apoio financeiro pago pelo IEFP aos emigrantes e lusodescendentes que comecem a trabalhar por conta de outrem em Portugal continental em 2019 ou 2020, com um contracto de trabalho sem termo (ver caixa). Segundo dados do Ministério do Trabalho, desde que as inscrições arrancaram há duas semanas, o IEFP já recebeu 42 candidaturas e 500 pedidos de esclarecimento. Só na declaração de IRS relativa aos rendimentos de 2019 será possível conhecer o impacto da redução de 50% do IRS dado aos emigrantes que regressam este ano ou no próximo.

      Além das medidas incluídas neste programa, há 2055 portugueses a beneficiar do Regime Fiscal dos Residentes Não Habituais, dirigido a cidadãos nacionais ou estrangeiros que tenham tido morada fiscal fora de território nacional nos cinco anos anteriores à sua entrada em Portugal. São uma minoria (7%) no total de 29.901 beneficiários do regime, embora não se saiba quantos são trabalhadores ou pensionistas.

      O Instituto Nacional de Estatística (INE) estima que 20 mil portugueses tenham regressado em 2017 (últimos dados disponíveis), num total de cerca de 50 mil desde 2015. Mas ainda não existem dados relativos ao ano passado e só os Censos de 2021 irão permitir fazer um retracto pormenorizado destes regressos. O que se sabe é que 90% dos emigrantes que voltam ao país se fixam nas freguesias de onde partiram, o que justifica a aposta na criação de mais gabinetes de apoio ao emigrante nas autarquias. Segundo o Portal das Comunidades Portuguesas, dos 157 gabinetes existentes em câmaras e juntas de freguesia, 142 estão a funcionar e os restantes estão em fase de instalação.

      R.A.

      De volta à casa de partida.

      Regresso Há uma vaga inédita de portugueses a deixar a Suíça. Milhares estão a voltar. É já considerado um “caso excepcional” na história da emigração portuguesa.

      O calendário da rulote para este mês de Agosto já está cheio: por cada fim de semana, uma festa. De aldeia em aldeia no Marco de Canaveses e noutras redondezas do Porto, a rulote amarela do senhor João ganha quilómetros e clientes. Com apenas dois meses de vida, está ainda a adaptar-se às estradas, tal como João Babo do Carmo está a ambientar-se à nova etapa, agora que pôs fim à vida de emigrante. Trinta e dois anos depois de ter partido para a Suíça, levado pela onda de portugueses que para lá fugiram à procura de trabalho, o cozinheiro de 61 anos juntou-se agora à crescente vaga de regressos. Voltou em Janeiro deste ano e com vontade de se agarrar, de vez, à terra onde nasceu.

      “Quando fui para a Suíça, por cada 20 portugueses que iam, um regressava. Agora, por cada um que vai, há 20 que voltam”, conta. O número de portugueses a deixar aquele país europeu, durante décadas um dos principais destinos da emigração nacional, está a aumentar há seis anos e disparou nos últimos dois. Só em 2018, foram mais de 10 mil, o dobro de 2013. E pelo segundo ano consecutivo houve mais portugueses a sair da Suíça do que a entrar (ver gráfico). “Chegámos a um ponto em que a comunidade está a diminuir. Isso só aconteceu em destinos não europeus, como os Estados Unidos ou o Canadá”, diz Rui Pena Pires, coordenador do Observatório da Emigração.

      Só da cidade de Chaux-de-Fonds, na fronteira com a França, saíram 400 famílias portuguesas no ano passado. E há regiões como Friburgo onde vários prédios quase exclusivamente habitados por portugueses estão agora a ficar sem ninguém.

      Os dados da Secretaria de Estado das Migrações da Suíça, enviados ao Expresso, mostram que metade dos portugueses que saíram daquele país no ano passado tinham autorização de residência permanente (ou seja, viviam no país há mais de cinco anos). Cerca de 40% tinham entre 40 e 64 anos, mas tem aumentado a proporção dos que têm mais de 65. E embora não seja certo que todos regressem a Portugal, os investigadores admitem que a maioria está a voltar à terra natal.

      Só para o Marco de Canaveses regressaram no último ano 21 emigrantes portugueses na Suíça. João é um deles. Outros 60 já manifestaram vontade de voltar, segundo o Gabinete de Apoio ao Emigrante da autarquia.

      “A primeira geração de portugueses a emigrar para a Suíça, no final dos anos 70 e início dos 80, está a chegar à reforma. Muitas pessoas entre os 60 e os 65 anos, que nem pensavam regressar a Portugal porque é na Suíça que têm os filhos e os netos, fizeram as contas e perceberam que a reforma é demasiado baixa para lá viverem sem terem de recorrer às poupanças”, afirma Liliana Azevedo, que tem uma bolsa de doutoramento no CIES — Instituto Universitário de Lisboa para estudar os percursos dos reformados portugueses naquele país europeu. “As rendas são altíssimas e cada pessoa é obrigada a pagar um seguro de saúde mensal entre 500 e 600 euros. Com reformas pouco acima dos mil euros é impossível viverem. Por isso, uns já regressaram e outros estão para regressar.” A realidade não deixa dúvidas a Rui Pena Pires: “A Suíça já é um caso excecional na história da emigração portuguesa na Europa.”

      O pânico gerado pelo Fisco

      Mas há outras razões para o regresso, como o desemprego ou o facto de os salários não terem acompanhado o aumento do custo de vida. “Alguns portugueses deixaram de esconder a miséria em que viviam. Há quem tenha dívidas porque o salário não chega para as despesas ou porque está desempregado”, alerta Nuno Santos, presidente da Associação de Apoio à Comunidade Portuguesa na Suíça.

      A troca automática de informação financeira entre países da OCDE, que permitiu ao Fisco suíço saber se os estrangeiros estão a declarar todo o seu património, é outro fator. “Quase todos os portugueses têm bens em Portugal. A maioria nunca os declarou na Suíça e agora foi obrigada a fazê-lo”, diz Liliana Azevedo. “Alguns cantões exigiram acertos nos impostos e gerou-se um pânico que levou muitas pessoas a antecipar o regresso.”

      A decisão de Teolindo e da mulher está quase tomada: regressar a Portugal no próximo ano. Ele está menos entusiasmado do que ela com a ideia de voltar a Castro Verde, concelho alentejano no distrito de Beja de onde os dois saíram para a Suíça a 1 de março de 1978. “É lá que tenho os meus amigos e estou muito ligado às associações de portugueses. É difícil deixar lá os filhos e os netos”, conta Teolindo Florinda, 69 anos, na moradia que começaram a construir em 1989, a pensar nos meses de agosto e não num regresso definitivo.

      O que os faz vir não é a tributação suíça, que já conseguiram resolver, mas a baixa reforma, explica. “Pagar renda, despesas, mais cerca de mil euros por mês para os dois seguros de saúde é duro. Viver na Suíça assim é difícil. Aqui em Portugal vive-se melhor com o mesmo dinheiro, ainda que lá consiga rapidamente marcar um exame médico se precisar e cá não seja bem assim.” Quando partiram, recorda Teolindo, foram sem conhecer nada e só a falar português. Começou na agricultura com contratos de nove meses, depois foi para uma empresa de fundição onde esteve 26 anos e, por fim, trabalhou nos serviços de manutenção de um hotel, de onde se reformou há quatro. “Passei estes 41 anos entre trabalho e casa. Amealhávamos dinheiro e vínhamos a Portugal uma vez por ano. Era isto.”

      Vaga de retornos sem paralelo

      Agora, vêm para ficar. “Em alguns casos, é quase como se estas pessoas estivessem a emigrar novamente”, realça Rui Pena Pires. “Voltam para as aldeias de onde partiram há 40 anos, mas já não é o mundo de onde saíram. Agora não há lá ninguém. Alguns portugueses que emigraram para França também voltaram na reforma, mas nunca houve uma vaga de retornos com esta dimensão.” O caso excecional da Suíça exige respostas, defende. “É preciso dar apoio e informação”, por exemplo mediando o contacto com a Segurança Social ou as Finanças.

      João Babo do Carmo chegou ao Marco de Canaveses em janeiro, lançou-se na compra da rulote em junho, mas ainda recorre ao Gabinete de Apoio ao Emigrante para esclarecer dúvidas. Para trás, ficam três décadas de uma vida saltitante: depois de ter deixado a terra em 1987 e ter chegado à Suíça sem emprego nem planos, trabalhou alguns anos como ajudante de cozinha. Chegou a vir para Portugal na década de 90 já com algum dinheiro no bolso e viveu com contratos de trabalho sazonais em Espanha, França e Alemanha. Em 2005 regressou à Suíça e casou-se com Joneide, uma emigrante brasileira a viver naquele país desde a década de 80. Foi quando perdeu o emprego no final do ano passado e o dinheiro começou a faltar que ambos decidiram vir para Portugal.

      Quando o mês de agosto acabar, Teolindo e a mulher ainda regressam à Suíça. Mas João e Joneide já não. Terminadas as festas de verão, vão estacionar a rulote ao pé do estádio do Paços de Ferreira. No menu estarão finos, sumos, bifanas, cachorros e ‘esquisitas’, a receita que inventou com carnes e pimentos empurrados por uma fatia de pão. “Sou capaz de me virar para o futebol o resto do ano. Arranjo ainda outro clube e passo a ter onde estacionar todos os domingos. É desta vida assim que eu gosto.”

      INCENTIVOS AO REGRESSO

      Redução de 50% no IRS

      A medida faz parte do ‘Programa Regressar’, criado pelo Governo. O desconto aplica-se a quem tenha emigrado até 31 de dezembro de 2015, regresse em 2019 ou 2020, não tenha residido em Portugal nos três anos anteriores, não tenha dívidas ao Fisco e à Segurança Social, nem tenha solicitado a inscrição como residente não habitual. Já será possível obter esta redução nos rendimentos de 2019, bastando assinalar essa opção na próxima declaração de IRS.

      Apoio financeiro através do IEFP

      O ‘Programa Regressar’ também prevê a atribuição de um apoio pago pelo IEFP aos emigrantes ou lusodescendentes que comecem a trabalhar por conta de outrem em Portugal continental, em 2019 ou 2020 e com contrato sem termo. Aplica-se a quem tenha emigrado até dezembro de 2015. O apoio pode ir até €6536, abrangendo viagem de regresso, transporte de bens e reconhecimento de diplomas. As candidaturas podem ser apresentadas no site do IEFP.

      Isenção de impostos

      O Regime Fiscal para o Residente Não Habitual, dirigido a portugueses e estrangeiros, prevê que as pensões e rendimentos de trabalho de fonte estrangeira sejam isentos de imposto durante dez anos para quem passe pelo menos 183 dias por ano em Portugal. É obrigatório ter tido a morada fiscal registada noutro país nos cinco anos anteriores ao regresso.

      Redução de 20% no IRS

      O regime fiscal para os residentes não habituais também prevê uma redução de 20% do IRS para quem venha trabalhar para Portugal numa das profissões de alto valor acrescentado definidas pelas Finanças. A diferença em relação ao desconto de 50% no IRS do ‘Programa Regressar’ é que esta redução de 20% dura 10 anos e não exige que os candidatos tenham emigrado até 2015 (só precisam de não ter vivido cá nos cinco anos anteriores).

      Vagas no Ensino Superior

      O Ensino Superior tem um contingente reservado a filhos de emigrantes, com um total de 7% das vagas, rondando as 3600. O Governo quer incentivar mais jovens emigrantes a candidatarem-se às universidades nacionais e lançou umas jornadas de sensibilização junto de várias comunidades portuguesas.

      portugueses na Suíça

      Saídas e entradas
      De 2008 a 2018

      Entradas

      saldo em 2018

      -1550

      Evolução das saídas por grupo etário
      Em percentagem

      menos de 20

      entre 20 e 40 anos

      mais de 40 anos

      Saídas por tipo de autorização de residência
      Em 2018

      ‘PERMIS L’ – AUTORIZAÇÃO ANUAL

      ‘PERMIS B’ – AUTORIZAÇÃO DE 5 ANOS

      ‘PERMIS C’ – AUTORIZAÇÃO PERMANENTE

      total em 2018

      10.254

      fonte: Secretaria de Estado das Migrações da Suíça


      Raquel Albuquerque

      Uma análise às contas consolidadas do Grupo Montepio

      José António Moreira

      O Observatório de Economia e Gestão de Fraude (OBEGEF) promove neste espaço semanal uma reflexão sobre as temáticas da fraude, da corrupção, da economia não-registada, da ética, da integridade e da transparência, contribuindo deste modo para a formação de uma opinião pública mais esclarecida e mais participativa.

      Cerca de três meses depois, volto, neste espaço de opinião, a tomar como objecto de análise a Montepio Geral Associação Mutualista (MGAM). Justifica-se este revisita pela preocupação pessoal, enquanto cidadão, com a respectiva situação económica e financeira e pelo facto de, entretanto, terem sido disponibilizadas as suas contas consolidadas.

      A análise das contas individuais da MGAM mostrou uma evolução muito problemática, em que o registo de impostos diferidos activos veio criar a ilusão (temporária) de uma saúde económica e financeira que a associação não possui. Nessa altura ficou-me a dúvida sobre se o grupo, no seu conjunto, apresentaria evolução mais propícia, por via de um melhor desempenho das restantes empresas a ele pertencentes. Infelizmente, para os associados em particular, para o país como um todo, não foi isso que constatei.

      Num contexto macroeconómico relativamente favorável, o ano de 2018 mostra uma quebra acentuada da actividade do grupo, com reflexo nos resultados obtidos e na deterioração da situação financeira, espelhada esta na redução dos capitais próprios.

      A tabela seguinte sintetiza a evolução com base em três indicadores:

      Se esta evolução económica e financeira é, por si só, suficientemente preocupante, a leitura do relatório permite recolher alguns indícios tão ou mais preocupantes, de que destaco:

      1. A menção à venda de uma “carteira de crédito em mora” pelo banco do Grupo, que originou uma menos-valia de alguns milhões de euros, deixa antever que o volume de imparidades registado na instituição possa não reflectir, integralmente, os riscos de incobrabilidade subjacentes aos activos;

      2. O parecer de revisão de contas do auditor KPMG, onde ênfases sobre o pressuposto da continuidade do Grupo e a recuperabilidade dos activos por impostos diferidos – dois aspectos fulcrais – remetem o utilizador da informação para projeções económicas e financeiras efectuadas pela administração do Grupo. Sonega o auditor a sua opinião sobre a razoabilidade de tais projeções, e com isso sobre a efectiva situação da instituição. Tendo presente que as projeções mostram sempre o que se pretende, bastando escolher pressupostos que sustentem o resultado desejado, trata-se de uma situação clara de alijamento de responsabilidades por parte do auditor, que se afigura dever ser lida pelos utilizadores da informação como um “sinal de perigo”;

      3. O recurso a medidas contabilísticas potencialmente questionáveis – revalorização de imóveis, lucros de uma participada de repatriamento mais do que duvidoso, etc. – , com o intuito de mostrar resultado líquido positivo de 542 mil €.

      Em suma, as contas consolidadas corroboram o que se havia constatado na análise das individuais, contribuindo para a sustentação das preocupações por estas suscitadas. Não fora o volumoso registo de activos por impostos diferidos na MGAM no ano de 2017 e a situação económica e financeira da Associação, do grupo como um todo, já teria feito soar as campainhas de alarme no regulador e no ministério da tutela. Portanto, se outras responsabilidades não lhe vierem a ser assacadas, espera-se que a administração da MGAM seja responsabilizada por ter “escondido” a gravidade da situação, de forma criativa, com isso protelando a tomada de medidas que pudessem atempadamente contribuir para debelar a situação.

      As contas foram aprovadas por uma maioria de 95,6% de “uma massa associativa representativa dos cerca de 600 mil associados” (sic). Se essa massa foi da dimensão da que aprovou as contas individuais em Março, ascendeu a cerca de 500 associados, menos de 1% do total!

      Esta reduzida afluência à reunião ilustra um completo desinteresse dos associados pelos destinos da Associação, e desleixo relativamente à segurança dos fundos que colocaram à respectiva guarda. Se a esta reduzida presença se juntar o voto de braço no ar no decurso da reunião; que parte substancial dos presentes seria composta por funcionários da mesma (dificilmente arriscando um voto de recusa das contas) e que a generalidade dos presentes não se sentiria minimamente confortável a discutir a tecnicidade do relatório em análise, estavam reunidas as condições, à partida, para tão generosa e positiva votação.

      Num tal contexto, a administração instalada consegue, sem esforço, no decurso de cada mandato, controlar a organização, com poucas centenas de votos. Consegue, inclusive, torná-la responsável por sanções pecuniárias da responsabilidade, pessoal, dos seus dirigentes. Tudo de forma democrática.

      Infelizmente, tal situação não é específica da MGAM. Verifica-se em muitas outras organizações congéneres. Por isso, sugere-se que o poder político, enquanto espera – aparentemente alheio à grave situação da instituição – que o processo em curso de avaliação da idoneidade da administração produza efeitos e venha a ser a luz que brilha ao fundo do túnel, estude forma de impor nos estatutos deste tipo de organizações a inclusão de uma cláusula limitadora do número de mandatos dos órgãos dirigentes. Acredito que seria uma ajuda preciosa para se terem organizações mais saudáveis, em todos os aspectos.

      A CP

      A CP assegura um quarto das receitas da empresa do seu novo presidente. 26%, para sermos mais concretos. É um negócio em que o grupo Comboios de Portugal está entre os três maiores clientes da empresa do novo gestor, Nuno Freitas. Incompatível? O Governo assegura que não.

      Para este governo, desde que seja nomeação socialista, pode ser o que se quiser. Como é normal para o PS, o Estado é o seu habitat natural, e, portanto faz dele o que bem entende. Lamentavelmente os restantes poderes públicos deixam que isso aconteça; agora a razão porque o faz, deixa-nos a pensar e não pelas melhores razões.