Para a líder do Bloco, ou melhor, para a Fulana do Castelo o problema da escassez de água potável em Portugal resolvia-se de forma muito simples: era só terraplenar tudo o que é barragens.
Os debates televisivos que antecedem as próximas eleições legislativas deram a conhecer uma nova figura de referência ao nível do comentário político-económico. Depois do Gajo de Alfama, que acreditava ser possível acabar com o terrorismo através de bombas que iam lá pelo cheiro a caril, é agora a vez da Fulana do Castelo – o bairro popular lisboeta que serve de lar ao célebre Chapitô –, Catarina Martins. Para a líder do Bloco de Esquerda, ou melhor, para a Fulana do Castelo o problema da escassez de água potável em Portugal resolvia-se de forma muito simples: era só terraplenar tudo o que é barragens, porque as barragens provocam ali uma acumulação de águas que vinham pelo rio abaixo, águas que tinham inclusive coisas combinadas noutros sítios mais a jusante e que por isso ficam danadas por estarem retidas na albufeira. Vai daí toca de se evaporarem só para fazer pirraça ao pessoal da hidroeléctrica. Portanto, na perspectiva da Fulana do Castelo qual a melhor forma de termos mais água boa para beber? Nem mais. É rebentando com as infra-estruturas que constituem a forma mais eficaz de termos mais água boa para beber.
Para fundamentar esta posição, Catarina Martins assegurou que é preciso “proteger os recursos hídricos e renaturalizá-los”. Eu aviso já que comigo não contam para “renaturalizar” coisa nenhuma. Acho que é sempre prudente partir do princípio que se alguma coisa foi “desnaturalizada” foi muito provavelmente porque em determinado momento histórico os nossos antepassados, ligeiramente fartos de — por exemplo — falecer aos 35 anos à conta de um abcesso num molar, tiveram arte e engenho para dominar o estado “natural” do planeta. E assim a espécie humana evoluiu até termos hoje uma qualidade de vida inédita em toda a história da humanidade. Mesmo apesar dos esforços do Bloco de Esquerda. Enfim, chamem-me esquisito, mas eu só desejo estar em harmonia com a natureza quando a natureza não pretende matar-me. Se a natureza não quer que eu a aborreça, é não se meter comigo.
O que é indiscutível é que desde 2015 o Bloco de Esquerda anda a trabalhar arduamente numa nova estratégia para a gestão da água, alternativa às démodés barragens. Não esqueçamos que os bloquistas votaram favoravelmente os quatro orçamentos do PS desta legislatura, graças aos quais o investimento público desceu para um nível inferior ao da pluviosidade no Atacama. Uma das áreas em que a falta de investimento se faz sentir é a manutenção das estradas, que estão todas esburacadas. Ora, o que em dias secos parecem meros buracos extremamente incómodos, em dias de chuva revelam-se estupendos recursos hídricos naturais, logo muito superiores a qualquer barragem: são autênticos charcos onde os portugueses podem ir matar a sede qual manada de hipopótamos em plena savana africana.
Politiquices à parte, sejamos sinceros. Justifica-se que o Bloco de Esquerda não queira que o país tenha barragens. Efectivamente são uma coisa horrível. No fundo ter uma barragem é como viver paredes meias com um vizinho que não há maneira de mandar arranjar aquele cano da água que rebentou vai para mais de 5 anos e que ainda assim insiste em tomar 27 banhos de imersão por dia. Uma pessoa está sempre com infiltrações na parede da barragem e de cada vez que é preciso estucar e dar mais uma demão fica uma fortuna porque o pé direito é muito alto.
No meio disto tudo, o grande mérito de Catarina Martins foi levantar esta questão das barragens na altura em que o líder do PS é António Costa. É que o anterior primeiro-ministro do partido, José Sócrates, adorava barragens. O que significa que António Costa odeia barragens. Aliás, António Costa nunca ouviu sequer falar em barragens. Tampouco alguma vez desconfiou que pudesse existir tal coisa.
Não queremos ser todos iguais, pois não?
Tiago Dores – Observador
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