quinta-feira, 25 de novembro de 2021

Eléctricos. São ou não os veículos mais amigos do ambiente? Para já, não!

A Volvo chegou à conclusão que produzir um eléctrico gera 70% mais emissões do que produzir um carro a combustão, ainda que a longo prazo os VE possam ser mais ecológicos.

O debate não é novo e muitos estudos já vieram classificar a premissa como mito, mas coloquemos novamente a questão: a pegada de carbono de um carro eléctrico é ou não maior que a de um carro a diesel ou a gasolina?

Recentemente, a fabricante de automóveis sueca Volvo Cars divulgou um estudo, levado a cabo pelo centro de sustentabilidade da própria marca, que dá conta que o processo de produção do seu novo modelo 100% eléctrico, o C40 Recharge, gera 70% mais de emissões do que a produção do modelo semelhante com motor a combustão interna, o XC40.

O estudo que teve em consideração toda a pegada de carbono ao longo do ciclo de vida de cada modelo, incluindo a extracção das matérias-primas, processos de produção, abastecimento e, ainda, a condução ao longo de 200 mil quilómetros, antes do abate do veículo, retira uma conclusão muito clara: produzir um veículo eléctrico (VE) é significativamente mais poluente do que produzir um veículo a combustão.

Contudo, a marca sueca deixa uma ressalva: é possível chegar a um ponto de equilíbrio na pegada carbónica de um veículo eléctrico ao longo do ciclo de vida do veículo. Tudo depende da forma como é produzida a electricidade que é usada tanto no processo de fabricação do carro, bem como nos carregamentos da bateria.

Para esse efeito, a Volvo aponta três cenários: um com base no fornecimento médio de electricidade à escala global; outro fundamentado nas estatísticas da UE28 em termos de produção de energia, que considera o mix de fontes tradicionais a combustíveis fósseis e de renováveis; e, ainda, um outro alicerçado num panorama utópico em que toda a produção de electricidade seria gerada a partir de fontes 100% renováveis.

Partindo do primeiro cenário, um Volvo C40 Recharge necessitará de percorrer exactamente 109 918 quilómetros para se tornar menos poluente que um XC40. O que na realidade se traduz, praticamente, em cumprir metade da vida útil do veículo, sendo que, uma vez terminada essa mesma vida útil, o C40 terá produzido, de uma forma geral, apenas menos 15% de emissões que o XC40.

Já utilizando o mix energético patente na União Europeia, o Volvo C40 reduz em dobro as emissões para 30%, sendo que o ponto de equilíbrio é atingido mais cedo, aos 77 248 quilómetros.

No caso da electricidade ser produzida por fontes totalmente limpas, a pegada de carbono deste VE passa a metade da do modelo com motor de combustão, fixando o ponto de equilíbrio aos 48 280 quilómetros.

Embora admitindo que os carros eléctricos não são, até ao momento da saída da linha de montagem, menos poluentes do que os veículos a combustão, a Volvo salienta que podem efectivamente tornar-se mais ecológicos a longo prazo. Assim, a pegada de carbono pode ser realmente atenuada, de forma a conseguirem rivalizar com os veículos a combustão, desde que se caminhe cada vez mais para uma realidade energética mais verde.

Baterias pesam Em declarações ao i, o Automóvel Club de Portugal (ACP) explica que o factor determinante para que a produção de um eléctrico gere mais emissões está relacionado com o facto de os processos de extracção do lítio e consequente produção das baterias com esta matéria-prima, uma vez que toda essa cadeia depende ainda maioritariamente de electricidade gerada a partir dos combustíveis fósseis.

Analisando apenas a fase de fabricação de um VE, só as baterias são responsáveis por quase um terço da totalidade das emissões.

A posição assumida neste estudo pela Volvo Cars – marca que, note-se, no âmbito da Conferência do Clima COP26, assumiu o compromisso de tornar-se uma empresa de impacto ambiental neutro até 2040, assinando a Declaração de Glasgow para as Zero Emissões de automóveis – surpreendeu o ACP: “Parece-nos um pouco ambígua. Mas não é a primeira marca a fazê-lo”.

A Toyota, que se autoproclama “líder comprovado na electrificação”, também tinha levantado a mesma questão sobre a pegada carbónica dos veículos eléctricos o ano passado.

Na altura o CEO da Toyota, Akio Toyoda, defendeu que os VE iriam fazer aumentar as emissões de carbono no Japão. “Quanto mais veículos eléctricos construímos, pior são os níveis de dióxido de carbono”, declarou.

E a verdade é que a problemática levantada tanto pela marca sueca como pela japonesa pode ser transposta a todos os fabricantes de carros eléctricos, “atendendo a que a tecnologia é muito semelhante entre as marcas que produzem VE”, esclarece o ACP. “É efectivamente um problema com que se depara toda a produção de carros eléctricos”, frisa.

Questionado se, ao saber que, no caso concreto deste modelo da Volvo, a pegada carbónica só é atenuada ao final de metade da vida útil do carro, não poderá o consumidor indagar se o carro eléctrico é efectivamente mais amigo do ambiente, o ACP defende que este pode e deve.

E mais: “O consumidor deve comprar o que realmente necessita e não de acordo com uma moda ou tendência. A escolha da viatura deve ter em conta os quilómetros a efectuar, a possibilidade de carregar o veículo eléctrico em condições mais vantajosas, o tempo previsto para a sua utilização, entre outras variáveis”, acrescenta.

Ainda assim, apesar do nível elevado das emissões durante o seu processo de produção, os eléctricos continuam a ser uma solução mais amiga do ambiente em algumas circunstâncias.

Um VE é mais amigo do ambiente em utilização urbana. Por exemplo, na distribuição de bens e serviços onde as rotas estão definidas e as viaturas tem efectivamente uma utilização diária e intensiva, como no caso dos TVDE (Transporte Individual e Remunerado de Passageiros em Veículos Descaracterizados a partir de Plataforma Electrónica) ou plataformas de carsharing” aponta o clube português.


JOANA MOURÃO CARVALHO

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