Todos os média nacionais noticiaram, sem os achaques sintomáticos do costumeiro preconceito ideológico, os elogios que Trump fez, em telefonema para Marcelo, à forma como Portugal lidou com a Covid-19
Algum dia tinha de acontecer. Mais cedo, ou mais tarde, a comunicação social portuguesa teria de reconhecer mérito em alguma coisa que Donald Trump fizesse. E assim foi. Todos os média nacionais noticiaram, sem os achaques sintomáticos do costumeiro preconceito ideológico, os elogios que Trump fez, em telefonema para Marcelo Rebelo de Sousa, à forma como Portugal lidou com a Covid-19. Por mera coincidência, a nossa imprensa não considerou esta declaração do presidente norte-americano merecedora de qualquer reparo. “Finalmente, o fascista cor-de-laranja diz uma coisa acertada!”, ecoou por essas redacções fora.
O que foi pena, pois teria sido uma estupenda oportunidade para salientar o despropósito de Trump felicitar os líderes políticos de um país que, entre 212 territórios, é o 19º com mais mortes por habitante. Mas não. Por azar, esta parvoíce do presidente dos EUA escapou ao, em qualquer outra circunstância agudíssimo, espírito crítico dos jornalistas lusos. Imagino as reacções se, em vez de congratular o governo português, Trump tivesse parabenizado o executivo do Bolsonaro pelo estupendo desempenho no combate ao vírus, ainda que no Brasil a mortalidade por habitante seja um terço da portuguesa.
No que às opiniões de Donald Trump diz respeito, tomo a liberdade de sugerir aos nossos periodistas o Manual de Crítica a Trump para Totós. É um volume sucinto, composto por duas meras dicas. Quando as declarações de Trump são parvas, explicar, com factos, o porquê de serem parvas. Quando as declarações de Trump não são parvas, apertar com firmeza os coletes-de-forças àqueles camaradas cujo sonho era trabalhar na redacção do Pravda, meter dois Kompensans no bucho e tentar não manipular essas declarações ao ponto de ser pateticamente óbvio o esforço de fazê-las parecerem parvas.
Mas este 1º de Maio também ficou marcado pela manifestação da CGTP em Lisboa. Isto enquanto quase todos os portugueses estavam confinados nos seus lares. A iniciativa foi muito criticada, mas penso que especialmente os sindicatos da função pública tiveram fortíssimos motivos para o protesto. Afinal, somos, ou não, todos nós, contribuintes, os patrões destes funcionários? Somos. E temos, ou não, praticamente todos, estado ausentes dos nossos locais de trabalho? Temos. Pois é, os funcionários públicos que se reuniram na Alameda limitaram-se a protestar contra o clássico e censurável absentismo dos patrões exploradores do povo trabalhador!
Enquanto isso, uma sondagem realizada para o Jornal de Notícias e para a TSF mostra que a percentagem de portugueses que aprovam a forma de governar de António Costa tem vindo a subir, com novo máximo em Abril de 74%. Estive a fazer umas contas e cheguei à seguinte conclusão. Admitindo que o coronavírus andará por aí até Outubro de 2023, está em perigo o recorde mundial de Saddam Hussein, obtido no referendo de 2002, no Iraque, quando recebeu 100% dos votos. Estimo que, se a juntar a tudo isto, Rui Rio ainda for líder do PSD nessa altura, o PS de Costa vá ganhar as próximas legislativas com 117% dos votos. Ou 118%.
Este resultado não espanta porque, de facto, o governo está soberbo. E, tudo indica, em breve veremos mais resultados desta mestria sob a forma de nova intervenção na TAP. Agora que parece em aberto a possibilidade do Estado reforçar a posição na estrutura accionista, o ministro Pedro Nuno Santos está mortinho por deitar as mãos à empresa. Não admira. Apesar da crise actual, há indicadores muito positivos. Por exemplo, se é verdade que há um ano a Bloomberg noticiava que a TAP era a companhia aérea menos pontual do mundo, a verdade é que, nos últimos dois meses, o número de voos que sofreram atrasos diminuiu drasticamente.
Tiago Dores
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