Não recruta ministros na sociedade civil pela mais simples das razões – porque não quer. Porque acha que é uma má ideia. Porque considera um risco desnecessário.
Existe a ideia de que António Costa já não consegue recrutar ministros na sociedade civil, fora dos círculos políticos do Partido Socialista. Essa ideia parece-me totalmente errada. Num país dominado pelo Estado, em que a administração pública gasta anualmente cerca de 50% do PIB português, ser ministro da República pode ser um mau investimento durante um intervalo limitado de tempo – infelizmente, ganha-se mal a servir a pátria –, mas costuma ser um excelente investimento para o futuro. Basta comparar as carreiras profissionais dos ministros antes e depois de passarem pelo governo.
António Costa não recruta ministros na sociedade civil pela mais simples das razões – porque não quer. Porque acha que é uma má ideia. Porque considera um risco desnecessário. É uma escolha totalmente deliberada; não é por falta de opções – é por estratégia política. Aliás, quando na conferência de imprensa desta segunda-feira ele foi confrontado com o facto de os novos ministros saírem de dentro do seu Governo, António Costa respondeu que a anterior secretária de Estado (Alexandra Reis) “não estava no Governo e não tinha experiência governativa”. Que é como quem diz: vejam no que deu ir recrutar gente nova à sociedade civil, sem qualquer tarimba política.
Costa justificou a escolha de João Galamba e de Marina Gonçalves salientando três características fundamentais, que ambos partilham. Reparem bem nelas, porque acredito que está mesmo a falar a sério: “São duas pessoas com experiência governativa” e “que (1) conhecem os meandros da administração, que (2) não se embaraçam com as exigências da transparência e da burocracia necessárias à boa contratação pública, e que (3) dão garantias de que não haverá descontinuidade na execução das políticas”.
Este é o retracto do ministro socialista perfeito. 1) Alguém que domine a administração pública; 2) alguém que domine a burocracia do pilim europeu; 3) alguém que resista à tentação de pensar pela própria cabeça, ao ponto de alterar o rumo político definido. E tudo isto, claro, sem se deixar “embaraçar” com as “exigências de transparência” – uma estranhíssima expressão, na qual a transparência surge mais como um obstáculo que é preciso saber ultrapassar do que como uma necessidade elementar dos sistemas democráticos.
Eis o resumo da tese de António Costa sobre os novos nomeados: dois excelentes burocratas socialistas que fazem o que ele manda. E que, claro, asseguram a “boa execução dos fundos europeus”. Num Governo sem ideias e num Estado sem dinheiro, o bom ministro é o bom funcionário que sabe distribuir com competência o dinheiro de Bruxelas. Entre escolher ministros para melhorar a vida do país ou escolher ministros para melhorar a sua vida, António Costa não hesita.
E, no entanto, há um certo gosto em brincar com o fogo; um estranho prazer em arriscar mortais em cima do arame. A não ser que tenha acontecido a João Galamba na Secretaria de Estado da Energia o mesmo que a São Paulo na estrada de Damasco – uma epifania que o transformou em homem novo –, o novo ministro das Infra-estruturas tem fama (e proveito) de ser um barril de pólvora de pavio curto. Ventura já veio aquecer o ambiente com a história das investigações ao negócio do lítio, que surgiram há dois anos, desapareceram, e ninguém sabe em que ponto se encontram. António Costa, pelos vistos, mete as mãos no fogo por Galamba. Rezem por ele, porque basta um fósforo no Correio da Manhã – e bum.
Publico
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