quarta-feira, 18 de dezembro de 2019

Mário Soares e as mulheres, no livro de Joaquim Vieira

Era um homem bem resolvido. E as mulheres?

Sim, sempre atrás de mulheres, toda a vida. Um homme a femme, é o que o define. Não perdoava uma. Ele próprio fazia gala disso nas conversas com os homens. Contava-me isso: "Estava com aquela, mas queria escrever… Mas escrever?… Eu queria era estar com ela… Mas não ponha isto no livro. Não é por causa da minha mulher, é por causa da minha filha…"

Com a mulher isso já não era um problema?

A partir de certa altura a relação já era mais de conveniência.

Há cartas de Maria Barroso nos anos 60 muito sofridas…

São muito curiosas. Ele não queria saber. Estava lá fora, a gozar a sua vida. Estava-se um pouco nas tintas. Era um homem à antiga portuguesa. Tinha a mulher e as amantes. Mas a mulher era sagrada, não se ia separar nem fazer nada contra a família. Era um bocado a lógica das profissões liberais da Baixa: arquitectos, advogados e médicos. Conheciam-se todos e as amantes uns dos outros. Era o velho macho ibérico, latino. Fazia gala de contar as suas proezas sexuais. Ele chateou-se muito comigo por ter contado tudo isto. Mas acho que ele tinha um prazer secreto em se saber. Durante os almoços em São Bento, quando estavam só homens, acabava sempre com histórias de mulheres e ele contava as suas aventuras. Classificava as mulheres: as de que tinha gostado, as de que não tinha gostado.

Soares ficou zangado com as histórias da biografia?

Uma hora depois de eu ter comentado com um antigo colaborador dele que o livro falava de mulheres e de Macau, telefonou-me furioso. "Então você anda aí a dizer nos cafés que escreveu sobre as minhas relações… Olhe que vou processá-lo! Não sabe que sou um homem casado?" Não foi possível ter uma conversa calma. Ao fim do dia, depois de ter recebido o livro, telefonou-me e disse: "Fui lá procurar ao índice remissivo e não encontrei nomes nenhuns." A preocupação dele era que aparecessem os nomes. Isso é que era terrível. Quebrava o código de honra do macho latino. O cavalheiro não ia revelar o nome das senhoras. Ainda estava zangado, mas mais calmo.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Os comentários são livres e só responsabilizam quem os faz. Não censuro ninguém, por princípio. Só não aceito linguagem imprópria.