No tempo em que a Troika governou o país e limitando-se a cumprir o acordado com o governo de José Sócrates, Passos Coelho que lhe sucedeu, tinha razões objectivas, mas agora…
A venda ao exterior de activos valiosos da economia portuguesa continua animada. Só este mês a Altice desfez-se de metade da sua rede de fibra óptica, vendida à Morgan Stanley Infraestructures Partners, o grupo Vasco de Mello e o seu parceiro Arcus vão alienar 80% dos direitos de voto na Brisa, a EDP fechou negócio com um consórcio de empresas francesas liderado pela Engie que lhes permitirá controlar seis barragens e, outra vez a Altice,
transferiu para um grupo do Bahrein 85% da gestora dos fundos de pensões da TLP, Marconi e TDP. Quem julgava que o fim das restrições da troika, o crescimento económico dos últimos anos, o regresso da confiança ou o alívio da dívida das empresas iriam permitir uma nova vaga de ambição ao capitalismo português desengane-se: o país continua à venda. Haverá quem, munindo-se da cartilha dos mercados abertos e da livre circulação de capitais, considere esta situação normal. Poder-se-á dizer que, entre o controlo francês ou americano da fibra óptica, ou entre o controlo chinês ou francês das barragens não há diferença de maior. Não é descaso afirmar-se também que as teorias dos centros de decisão que, em tempos, faziam parte do
léxico corrente do empresariado serviam apenas para proteger a gula predatória ou a ineficiência de uma certa estirpe de negociantes da corte. Mas depois da terrível destruição de riqueza nacional na era da troika e dos exemplos de incúria e dos abusos que destruíram a PT, que expurgaram a EDP de capital nacional ou entregaram a banca nacional ao capital espanhol ou angolano seria de esperar uma leve pausa para se respirar. Não é isso que acontece. Por muito que todos os Estados europeus façam a apologia da liberdade de negócios, na penumbra todos se esforçam por proteger os seus activos mais estratégicos e valiosos. O Estado português deve estar atento a essa sangria de recursos e olhar para a Espanha ou para a
França como exemplo. Não se trata de impor barreiras proteccionistas em favor de tecido económico já de si demasiado submisso ao patrocínio do Estado. Nem de criar novas clientelas de protegidos que um dia darão origem a novos donos disto tudo. Trata-se, sim, de exigir contrapartidas duras. Que a exploração de recursos nacionais pague impostos nacionais. Que os quadros e demais trabalhadores que gerem os negócios se instalem em Portugal. Que haja abertura para que empresários portugueses tenham acesso a esses negócios. Medidas que afinal têm uma única finalidade: evitar que Portugal se torne ainda mais uma banal plataforma de negócios gerida e mantida a partir do exterior. Manuel Caralho – Publico
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