segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

Rainha Jinga Mbandi.

“Para a deputada Joacine Katar Moreira, que aprecia fazer-se fotografar defronte de quadros que ilustram a escravatura na História portuguesa, recomendo uma célebre gravura de Cavazzi. Pode ser ampliada para o tamanho desejado e afixada numa qualquer parede do Palácio de S. Bento para o tempo da sessão fotográfica.
A gravura retracta uma célebre sessão de negociações de paz entre o governador português João Correia de Sousa e a celebérrima Rainha Jinga Mbandi. Esta foi acolhida pelos portugueses, em Luanda, com grande pompa e solenidade.
Mas, no momento da reunião, Jinga verifica rapidamente que, na sala, havia poucas cadeiras e que o governador ficaria sentado, enquanto ela teria de ficar de pé. Aí, chama uma das suas escravas e ordena-lhe que se ajoelhe por forma a sentar-se nas suas costas.
A gravura representa esse quadro: a rainha Jinga, sentada em cima da sua escrava prostrada, negociando de igual para igual com o governador português, sentado na sua cadeira.
Destas negociações, que foram muito bem sucedidas, reza a história do encontro que, no final, Jinga levantou-se para os cumprimentos de despedida. Como a escrava continuava acocorada na posição para servir de assento, o governador perguntou por que não a mandava levantar. Ao que a guerreira angolana respondeu de forma altiva: “Já não preciso dela, nunca me sento duas vezes na mesma cadeira!” E deixou a escrava para trás.
É um quadro de dominação e subjugação muito adequado às preocupações retardatárias da deputada Joacine Katar Moreira.
Devo sublinhar que, ao citar este episódio, não pretendo diminuir minimamente o perfil da Rainha Jinga Mbandi, grande figura da História de Angola, que manteve com os portugueses relações intermitentes, ora de conflito, ora de grande proximidade.
Jinga, apesar de não só ter tido muitos escravos e escravas, como haver sido uma grande senhora do tráfico esclavagista, foi uma personagem notável, que merece ser conhecida e admirada.
É um grande sinal de estupidez e de desvario querer avaliar as pessoas e os povos fora do tempo e dos lugares em que viveram e em que ocorreram os factos que relatamos.”
José Ribeiro e Castro

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