segunda-feira, 7 de junho de 2021

Jovem, queres ser ambientalista? Então, usa aquela camisola com borboto.

A pressão social das redes sociais leva a que os jovens sintam uma necessidade outrora sentida apenas pelas rainhas e estrelas de cinema: não podem ser vistos com a mesma roupa em duas fotos diferentes nas redes. Até daria vontade de rir se esta moda não tivesse efeitos drásticos no tal ambiente que os jovens alegadamente querem defender.

Ouve-se vezes sem conta a seguinte ideia: os mais novos têm sérias preocupações ambientais; os mais novos têm no ambiente a sua principal preocupação política. Não digo que não. O problema, como sempre, está na diferença entre o discurso e a acção; o problema está nos enormes buracos na coerência. Por exemplo, quem se considera 'ambientalista' não pode trocar de guarda-roupa a cada semestre, não pode ver numa camisola o prazo de validade do iogurte.

Na ‘Atlantic’ de Março, Rachel Monroe publicou uma peça que retira qualquer esperança em relação aos alegados efeitos benéficos da pandemia nos hábitos ‘verdes’ das pessoas. Pior ainda, retira qualquer coerência ao alegado ambientalismo dos mais novos, a geração Greta/Instagram. É que entre a vaidade mostrada nas redes e a coerência ecologista e austera exigida pela Greta, os jovens escolhem a primeira via, que exige, entre outras coisas, um conjunto enorme de peças de roupa novas. Chamam-lhe a "ultra-fast fashion", roupa ultra barata que se usa uma ou duas vezes. Para terem uma ideia: a Zara, no início do século, revolucionou a moda popular ao oferecer centenas de novas peças a cada semana; agora, estas novas marcas acrescentam sete mil peças a cada semana que passa. 7 mil! As pessoas estão a comprar camisas como se fossem artigos comestíveis. São obviamente peças de algodão ou poliéster (um problema ambiental) produzidas a baixíssimo custo num país do terceiro mundo (um problema ambiental, mas também social e humano) e não permanecem nem um ano no guarda-roupa (outro problema ambiental).

Como é que isto acontece? A pressão social das redes sociais leva a que os jovens sintam uma necessidade outrora sentida apenas pelas rainhas e estrelas de cinema: não podem ser vistos com a mesma roupa em duas fotos diferentes nas redes. Até daria vontade de rir se esta moda não tivesse efeitos drásticos no tal ambiente que os jovens alegadamente querem defender. Das duas, uma: ou esta geração aprende a usar camisolas com borboto ou será uma enorme farsa. Ser ambientalista implica um modo de vista austero. Como diz Monroe na peça, nada disto mudou com a pandemia. Até o #ficaremcasa não conseguiu mudar este hábito terrível: as pessoas compram roupa que não precisam. Uma das principais reações, aliás, foi comprar roupa "para ficar em casa", correspondendo de imediato a mais uma tendência de moda. Não, a sociedade obcecada com o ambiente não pode consumir roupa desta forma.

Henrique Raposo

Expresso

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