quarta-feira, 26 de junho de 2019

Reflexões de um jovem médico dentista

77% dos Médicos Dentistas formados há menos de 2 anos têm uma remuneração inferior a 1500 euros brutos mensais. É grande a situação de precariedade e incerteza com que a profissão actualmente se depara.

“As novas gerações estão a deparar-se com uma nova realidade profissional.” Começa assim o artigo sobre o Diagnóstico à Empregabilidade 2018 publicado na Revista da Ordem dos Médicos Dentistas (OMD) do passado mês de Abril.

De um modo geral, penso que todos nós, Médicos Dentistas, já tínhamos percebido que enfrentamos uma realidade profissional muito diferente da que outrora existira. Os dados deste estudo indicam que 77% dos Médicos Dentistas formados há menos de 2 anos têm uma remuneração inferior a 1500 euros brutos mensais. Ao ler isto, decidi abordar este tema junto de alguns colegas que terminaram o curso comigo e se encontram no mercado de trabalho. Sem poucas surpresas, as respostas que obtive foram bastante desanimadoras. Consegui perceber que tenho colegas a receber percentagens de 13% e de 20% e, que muitos, não conseguem auferir 500€ mensais. A minha grande pergunta é: se os relatos que tive de alguns colegas foram estes, como estarão os restantes recém-formados pelo resto do país?

Segundo o bastonário da OMD, estes resultados confirmam a situação de precariedade e incerteza com que a profissão actualmente se depara. Acrescenta que, embora se entre rapidamente no mercado de trabalho, a curto e médio prazo há uma dificuldade em encontrar um equilíbrio entre as horas trabalhadas e a remuneração. Se, por um lado, fico contente que comece a haver consciência de que as coisas estão mal, por outro questiono-me se nada poderia ter sido feito para tentar minimizar ou mesmo alterar esta situação.

Imediatamente após terminar o Mestrado Integrado em Medicina Dentária, rumei a Madrid para prosseguir com a minha formação pós-graduada. De um certo modo, um dos principais motivos que me levou e leva a investir numa formação especializada numa determinada área, independentemente de tudo o resto, é o facto de acreditar que este esforço e investimento no futuro me poderão conduzir a melhores condições de trabalho, quer a nível de remuneração quer a nível de localização. Sim, menciono a localização, pois grande parte dos colegas recém-formados não encontra trabalho perto da sua área de residência.

Os últimos números da Ordem (2018) estimam que em 2021 o número de Médicos Dentistas activos seja de aproximadamente 11922, com uma taxa de crescimento anual de 4,6%. Em média, estima-se que, por ano, haja um aumento de cerca de 500 Médicos Dentistas no activo. Ainda que a taxa de membros inactivos também esteja a aumentar, a verdade é que se prevê que para 2021 a projecção do rácio de população por Médico Dentista activo seja de 860, diminuindo todos os anos. Considerando estes números, não será possível actuar de alguma forma? Não será possível elaborar uma estratégia para combater estes dados alarmantes? Embora tenha muito pouco conhecimento sobre a legislação, pergunto-me se, entre outras medidas, não seria possível limitar o número de vagas de acesso às Universidades, por exemplo.

Resta-me apenas esperar que os ventos mudem e que a Medicina Dentária seja cada vez mais uma profissão respeitada, valorizada e reconhecida. E, citando uma frase que li recentemente que dizia que “nenhum dirigente o deveria ser por mais de 10 anos”, concluo que talvez seja necessária uma lufada de ar fresco na Medicina Dentária portuguesa. Quero acreditar, sinceramente, que escolhi a profissão certa.

Médico Dentista; Mestrado Integrado em Medicina Dentária – Universidade Católica Portuguesa; Pós-graduado em Prótese sobre Implantes – Universidad Complutense de Madrid; Master em Ciências Odontológicas – Universidad Complutense de Madrid

Luís Pereira Azevedo

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