"Os Cães Ladram Facas", de Charles Bukowski (1920-1994) editado pela Alfaguara, o poeta maldito, bêbado, misógino, malcriado, violento, com uma poesia violentamente autobiográfica, cínica e cruel: "vimos os mexicanos ilegais a saltar o muro./ Kraft limpou o primeiro com uma bola de chamas/ eu acertei no segundo com a minha velha pistola luger".
A péssima relação com o autoritarismo do pai é omnipresente: "Henry, Henry, não / entres… ele mata-te, ele leu os teus contos". Os poemas desta antologia estão cheios de referências a este trauma que marcou mais Bukowski do os buracos na cara deixados pelo acne. O pai, que emigrou da Alemanha para os Estados Unidos em 1923 e que poucos anos depois havia de sofrer na pele os efeitos da Grande Depressão, esteve desempregado mas saía de casa de manhã e voltava à tarde só para manter as aparências. Essa hipocrisia revoltava o jovem, que depois havia de ridicularizar esse quotidiano entediante da classe média: "a minha mãe tinha dentadura/ o meu pai tinha dentadura/ e todos os sábados das suas vidas/removiam todos os tapetes de cada/enceravam o chão de madeira/e voltavam a colocar os tapetes".
Na sua poesia híper realista e decadente, Bukowski revela-se a cada passo para transpor a degradação daquela vida: "Não há nada a fazer/ senão beber/ apostar nos cavalos/ arriscar no poema/ enquanto as raparigas se tornam mulheres." Ou então amar muito romanticamente, como o poeta explica nesta definição de amor pouco aconselhável para citar em cartas apaixonadas: "o amor é um gato esmagado". Vítor Matos
Editor de política
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