quarta-feira, 27 de outubro de 2021

O TRIBUNAL ARBITRAL ‘AD HOC’

Em Portugal existem três espécies de tribunais arbitrais em que o Estado aceita ser julgado: o Centro de Arbitragem Administrativa (CAAD); a arbitragem institucional, como a do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (CCIP); ou a arbitragem ad hoc, aquela em que o tribunal arbitral é constituído específica e exclusivamente para litígios que surjam em determinado contracto. Para que haja arbitragem ad hoc basta que um contracto entre o Estado e um privado inclua uma cláusula ou compromisso arbitral. A cláusula é simples, limitando-se a dizer que qualquer conflito ou litígio emergente do contracto será dirimido com recurso a arbitragem, devendo a parte que pretende convocar o tribunal arbitral comunicar o facto à outra parte, designando de imediato o seu árbitro. A outra parte designará o respectivo árbitro e os dois em conjunto escolherão o árbitro-presidente e definirão o regulamento da arbitragem — muitas vezes, apesar da arbitragem ser ad hoc, o tribunal opta por ficar sediado num Centro de Arbitragem, utilizando os seus serviços e por vezes adoptando mesmo o seu regulamento. O processo é rápido: dura entre seis meses e o máximo de um ano e meio, dependendo da complexidade e da necessidade de peritagens e outros actos que podem demorar. A decisão dos árbitros tem o mesmo valor de uma sentença judicial, pode ser executada judicialmente e só há pouco tempo, desde 2020, passou a ter possibilidade de recurso, para condenações acima de €500 mil.

No início, os árbitros decidem o regulamento e os custos da arbitragem — muitas vezes por remissão para a tabela do regulamento do Centro de Arbitragem da Câmara de Comércio e Indústria Portuguesa (CCI).

Segundo essa tabela, os honorários dos árbitros e os encargos da própria arbitragem variam de acordo com o valor da causa. Foi o que aconteceu no caso do TGV, em que o consórcio liderado pela Brisa pedia ao Estado uma indemnização de cerca de €168 milhões. Os custos administrativos da arbitragem seriam €52 mil.

Já os honorários de cada árbitro seriam cerca de €270 mil (€138.900,00 acrescidos de 0,04% do valor da indemnização que excedesse €120 milhões). Porém, neste caso, por acordo entre o tribunal arbitral e as partes, os árbitros aceitaram reduzir os seus honorários em 21,94%. Assim, Paula Costa e Silva, Manuel Carneiro da Frada e Paulo Otero, que votou vencido, deverão ter

recebido cada um cerca de €210 mil — ou quatro anos de salário como professores universitários. O Centro de Arbitragem aceitou a mesma redução e terá recebido €40.591. Os advogados ganham muito mais. O montante depende do valor da causa, da prática de cada sociedade e do estilo do próprio advogado. Do total de custos, 16% a 18% são para remunerar os árbitros, 3% a 4% para a secretaria e os restantes 80%… para os advogados. O caso do TGV ainda não terminou: estão pendentes em simultâneo uma acção executiva do consórcio ELOS, liderado pela Brisa, contra o Estado (no valor de €202 milhões), e uma acção de anulação da sentença arbitral interposta pelo Estado junto dos tribunais administrativos. Só Deus e a Autoridade Tributária saberão qual o valor recebido pelos advogados em cada caso concreto. Uma coisa é certa: mesmo desconhecendo quem são as partes; qual é o litígio; quem são os advogados e quais são os árbitros; serão os seus impostos que vão pagar a parte pública..

Inês Serra Lopes

Expresso

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