segunda-feira, 19 de dezembro de 2022

A história de um herói socialista que foi traído pelo seu próprio partido

A história de um herói socialista que foi traído pelo seu próprio partido1.

Morreu Maximino Serra que eu não conheci por culpa própria.

Um dia o Edmundo Pedro, que tive o privilégio de ser meu amigo, falou-me da hipótese de nos juntarmos, queria que eu ouvisse da sua boca histórias que me podiam servir para a vida, histórias de resistência, de coragem, de gente que arriscou a vida em nome do país, da liberdade e contra a opressão do Estado Novo.

Histórias como a dele, Edmundo Pedro - que foi preso pela primeira vez aos 14 anos e aos 16 já estava no Tarrafal onde aguentou mais do que qualquer outro na "frigideira" onde os presos sofriam e morriam desidratados.

2.

Maximino Serra, irmão do célebre Manuel Serra que disputou com Mário Soares a liderança do PS no I Congresso, morreu a semana passada.

Poucos sabiam da sua história.

É provável que também não saiba que este homem era o último verdadeiro "antifascista" do PS.

Um tipo de antes quebrar que torcer.

Um tipo que esteve no Golpe de Beja, na passagem do ano de 1961 para 62.

Um tipo que já participara na Revolta da Sé, mesmo antes do golpe falhado em Beja. Isto para lá da tentativa de desviar um avião para fugir para Argel.

Era um profissional do combate, detestava falinhas mansas, estava disposto a tudo.

3.

Maximino entrou para o PS ainda em 1973, poucas semanas após a fundação na Alemanha.

Ele e o irmão entraram após a dissolução do seu Movimento Socialista Popular.

Para ele, tudo era mesmo tudo.

O combate por um país livre merecia bem o sacrifício dos seus melhores anos.

O melhor da sua vida.

Maximino tornou-se funcionário do PS.

E ao contrário do seu irmão decidiu ficar socialista. Tornou-se um militante de base que trabalhou discretamente nos lugares para onde foi indo.

Setúbal.

Leiria.

Santarém.

4.

Adorava falar com os mais novos.

De participar em tertúlias.

Foi apoiando o PS e os seus vários líderes. Nas campanhas eleitorais fazia por estar, o abraço ao Maximino era prato principal de algumas arruadas eleitorais nas cidades em que foi morando.

E para seu espanto e tristeza, a comissão nacional de jurisdição do PS expulsou-o do partido depois das últimas eleições autárquicas.

E sabes qual foi o motivo?

Por ter ocupado o último lugar de suplente numa lista de independentes por Alcobaça. Fê-lo segundo disse por amizade com o candidato.

Foi esse o motivo para ser expulso do PS por uma comissão presidida por Telma Correia de quem eu, confesso a minha ignorância, nunca ouvira falar.

Repito: uma comissão do PS expulsou Maximino por ter aceitado pertencer como último suplente de uma lista por Alcobaça.

O homem tinha 87 anos.

Maximino que desviou aviões.

Que deu o corpo às balas em Beja e na Sé.

Que foi militante do PS desde 1973 e cujo irmão disputou com Soares a liderança no I Congresso.

Um tipo que decidiu ficar.

Que esteve sempre com o partido.

Que era, depois da morte de Edmundo, o único militante vivo com provas de bravura física contra o fascismo.

Este homem foi expulso por uma merda daquelas.

Como é possível que tenha morrido sem que isso tenha sido reparado?

5.

António Costa pode e deve reparar o equívoco.

Pode e deve perceber de que forma Maximino poderá ser recordado, homenageado, reintegrado como membro do PS, como herói de um tempo que ajudou a moldar uma identidade.

Os partidos não podem ficar sem memória.

Não podem matá-la desta forma tão ignorante, tão mesquinha.

António Costa que tenha a palavra.

Maximino nas únicas declarações que fez confessou que António Costa não fazia a mais pequena ideia, não podia saber.

Quero acreditar nisso, caro Maximino.

Acredito mesmo que não soubesse.

Mas vamos lá a ver, se não sabia que alguma coisa agora se faça.

TSF

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