Decisões que não respeitam a lei ou a jurisprudência e que impedem o Ministério Público de investigar. É assim que a Relação tem visto o magistrado que tem o destino de José Sócrates nas mãos.
O número de decisões do juiz Ivo Rosa que são revogadas pelo Tribunal da Relação de Lisboa — algumas das quais com uma adjetivação forte — tem surpreendido. Até pelo padrão na censura à ação do magistrado do Tribunal Centra de Instrução Criminal.
Por um lado, o juiz de instrução costuma ser criticado por aquele tribunal superior de exorbitar as suas funções, invadindo o campo de competências exclusivas do Ministério Público (MP). Por outro lado, é censurado por avaliar a prova indireta de forma particularmente conservadora e não fundamentada — o que já levou um juiz desembargador a escrever, num acórdão que anulou uma sentença de absolvição decidida por um coletivo de juízes liderado por Ivo Rosa, que se trata de uma “incompreensível forma de julgar”.
Além de ter um elevado grau de exigência sobre os indícios que fundamentam os pedidos de buscas ou escutas telefónicas por parte do MP, Rosa é particularmente sensível aos direitos constitucionais que protegem a “intimidade da vida privada”. Foi com esse argumento que indeferiu buscas à casa de Manuel Pinho antes de o Observador revelar a avença mensal de cerca de 15 mil euros que recebeu do Grupo Espírito Santo enquanto foi ministro da Economia de José Sócrates, que proibiu escutas aos suspeitos do assalto a Tancos cerca de 20 dias antes do assalto propriamente dito e também impediu o acesso aos dados telefónicos que veio a permitir recolher prova da conspiração da Polícia Judiciária Militar para recuperar as armas roubadas de Tancos.
Por estar a liderar a fase de instrução da Operação Marquês — que envolve o ex-primeiro-ministro José Sócrates, que será ouvido em tribunal esta segunda-feira — é importante perceber o que está em causa. É normal um juiz de primeira instância ter tantas decisões revogadas? Será que Ivo Rosa tenta mesmo impedir o Ministério Público de investigar durante a fase de inquérito? A forma como o magistrado olha para a prova indireta faz sentido, particularmente em crimes económico-financeiros, como a corrupção?
A tentativa (falhada) de restringir a pesquisa nos emails de Mexia e de Manso Neto
Se há processo em que as derrotas de Ivo Rosa são mais visíveis é no chamado caso EDP, no qual o MP investiga suspeitas de corrupção e outros crimes nos alegados benefícios concedidos pelo ex-ministro Manuel Pinho à principal elétrica nacional. Desde que o juiz Ivo Rosa chegou ao Tribunal Central de Investigação Criminal que passou a existir uma guerra aberta com os procuradores que investigam o caso — com o Tribunal da Relação de Lisboa a servir de árbitro e a dar vantagem aos procuradores Carlos Casimiro e Hugo Neto.
Olhando para os números, vemos que o MP ganhou quatro recursos que interpôs contra decisões de Ivo Rosa e perdeu três, o que dá uma taxa de vitória de 57%. Não é habitual que um juiz de primeira instância seja derrotado tantas vezes no mesmo processo. Mas também é relevante que as interpretações jurídicas de Rosa tenham sido rejeitadas consecutivamente por desembargadores diferentes. Mais: as matérias em questão nos recursos do MP são pacíficas na comunidade jurídica há largos anos, logo a jurisprudência aponta no sentido contrário das decisões do juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal.
Luís Rosa
https://observador.pt/especiais/por-que-razao-ivo-rosa-perde-tanto/
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