quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Portugal é um País estranho onde nem tudo o que parece é. €18.000.000.000 - eis quanto já nos custaram os bancos falidos (só nos últimos dez anos)


Opinião de Henrique Neto


€18.000.000.000

Dos cofres do Estado, durante uma década, saíram para a banca falida 4 milhões e meio de euros por dia. Por junto, o suficiente para construir vinte Pontes Vasco da Gama ou pagar todas as pensões de velhice, invalidez ou sobrevivência durante um ano.

Os números são coisas abstractas. É por isso que se torna difícil ter uma consciência exacta de um valor tão extraordinário: dezoito mil milhões de euros. Mas digamos de outra maneira: desde 2008 e até agora, cada português já pagou do seu bolso 1.800 euros para cobrir as falências do bPN, do bES e do baNiF. Dos cofres do Estado, durante uma década, saíram para a banca falida 4 milhões e meio de euros por dia. Por junto, o suficiente para construir vinte Pontes Vasco da Gama ou pagar todas as pensões de velhice, invalidez ou sobrevivência durante um ano.

As analogias ajudam a entender materialmente a grandeza do número. O ‘buraco’ nas contas da banca portuguesa falida entre 2008 e 2018, ‘buraco’ que o Estado cobriu com o dinheiro dos contribuintes, dava para construir 20 pontes com a grandeza e a extensão quilométrica da Vasco da Gama.

Ou para construir 666 pontes como aquela que Rui Moreira vai construir sobre o Douro, entre Campanhã e Gaia (incluindo engenharia, suportes, tabuleiro e acessos).

Dava para construir 45 hospitais gigantes como o de Lisboa Oriental, que estará pronto dentro de três anos e terá 900 camas.

Ou para construir 120 grandes hospitais como o novo Hospital Central do Alentejo, em Évora, que servirá 200 mil pessoas.

Dava para construir 50 Centros Culturais monumentais, como o de Belém.

Ou para fazer 160 Casas da Música como a do Porto.

Dava para financiar 25 vezes a projectada expansão do porto de Lisboa (incluindo outros tantos Terminais do Barreiro).

Dava para pagar 18 vezes a brutal divida do Parque Escolar.

Dava para cobrir durante um ano inteiro os gastos da Segurança Social com todas as pensões de velhice, invalidez ou sobrevivência que são pagas em Portugal.

Dava para cobrir três vezes o total das compras feitas pelos portugueses através da internet em 2018.

Dava, até, para financiar a vida de nababo que José Sócrates levou entre 2005 e 2014, à razão de um milhão e meio de euros por ano saídos da conta do Sr. Santos Silva – durante doze mil anos! 1.538 milhões  só em 2018 E agora, que o calote do sector financeiro português coberto pelo dinheiro do contribuinte português pôde ser devidamente avaliado com exemplos da vida real, mergulhemos no parecer sobre a mais recente Conta Geral do Estado divulgada há dias pelo Tribunal de Contas. O parecer deu entrada, na sexta-feira passada, na Assembleia da República.

O Tribunal de Contas estima que o encargo, para o Estado, do apoio ao sistema financeiro entre 2008 e 2018 ascendeu a 18.292 milhões de euros. As despesas, ao longo daqueles dez anos, foram de 25.485 milhões de euros e as receitas de 7.193 milhões de euros (estas, decorrentes dos juros que os bancos pagaram ao Estado).

Este valor, que corresponde a uma média de 1.663 milhões de euros por ano (ou 4 milhões e meio de euros por dia!), deve-se à aquisição, pelo Estado, de participações em bancos, concessão de empréstimos, prestação de garantias, entre outras formas de apoio, relacionando-se com a intervenção pública em casos perdidos como BPN, BES/Novo Banco e Banif.

Se considerarmos apenas o último ano da década, 2018, conclui-se que o esforço financeiro do Estado foi de 1.538 milhões de euros, em termos líquidos (o que inclui a injecção de capital no Novo Banco pelo Fundo de Resolução e o processo de nacionalização e reprivatização do BPN), compensados por reembolsos de uns míseros 174 milhões de euros. Balanço: 1.364 milhões de euros que ‘voaram’ dos cofres do Estado sem qualquer proveito. Factura do BPN pode ultrapassar  6 mil milhões Um dos casos mais gritantes de injecção de capital público na banca privada (oficialmente, para a “salvar”) é o do Banco Português de Negócios (BPN). O processo de nacionalização e reprivatização do BPN custou ao Estado cerca de 5 mil milhões de euros (mais precisamente, 4.924.000.000,00€) entre 2011 e 2018, segundo parecer do Tribunal de Contas á conta Geral do Estado em 2018.

No documento, o TdC refere que só no ano passado o saldo das receitas e despesas orçamentais decorrentes da nacionalização e reprivatização do BPN e da constituição das sociedades-veículo públicas Parups, Parvalorem e Parparticipadas (que ficaram com activos do Ex-BPN) foi negativo em 829 milhões de euros – mais 75% do que em 2017.

Mas a factura pode não ficar por aqui, avisa o TdC. É que as três sociedades-veículo apresentaram no final de 2018 capitais próprios negativos de 1.028 milhões de euros, encargos que, segundo o Tribunal, “poderão vir a ser suportados pelo Estado no futuro”. Segundo a análise do semanário ‘Expresso’, “a soma dos custos que o Tesouro já registou e daqueles que se antecipa no futuro ascende a 5,95 mil milhões de euros. E ainda há a possibilidade de acrescerem os resultados negativos dos próximos anos das sociedades, que ainda não estão contabilizados nesses capitais próprios”.

Em suma: é muito provável que a factura do BPN totalize, ao longo do ano que vai começar, mais de 6 mil milhões de euros. À cautela, o Governo prevê na sua proposta de Orçamento do Estado para 2020 que terá de colocar

mais 55 milhões de euros numa das empresas herdeiras do BPN, a Parvalorem. 1.377 milhões/ ano em garantias Recorde-se que estas sociedades-veículo foram criadas para “gerir e maximizar” as vendas dos activos problemáticos do banco: a Parvalorem na gestão dos créditos, a Parups no sector imobiliário, obras de arte e outros activos, e a Parparticipadas nas participações do BPN noutras empresas e fundos.

No final de 2018, as garantias prestadas pelo Estado às três empresas que ficaram com activos do Ex-BPN atingiram 1.377 milhões de euros, ainda assim menos 898 milhões de euros “por efeito dos reembolsos de empréstimo da Caixa Geral de Depósitos garantidos pelo Estado”. Fraca consolação.

O processo do BPN teve origem na decisão do Governo de José Sócrates, tomada em Novembro de 2008, de avançar para a nacionalização do BPN, na altura presidido por Miguel Cadilhe, através da sua incorporação na Caixa Geral de Depósitos (CGD). O Executivo tentou vender o banco em 2010, com as avaliações a apontarem para um encaixe de 180 milhões de euros. Porém, sem interessados na altura, a “parte boa” do BPN acabaria por vendida só em 2011, por apenas 40 milhões, ao Banco BIC Português, hoje EuroBic, de capitais luso-angolanos. A culpa é do ‘subprime’ Teixeira dos Santos, o ministro das Finanças do Governo de Sócrates que então dirigiu as operações de nacionalização (e que dentro de dias, no início do novo ano, se reforma com uma pensão mensal de 6.247,06 euros), atribui a culpa à “crise do subprime”. Para o ‘Expresso’, o Ex-ministro comentou: “O BPN não era propriamente um daqueles bancos ‘too big to fail’. Mas no ambiente que se vivia após a falência do Lehman Brothers, podia ser uma fagulha que, num ambiente carregado de combustível, podia provocar um incêndio de proporções maiores”. Daí a nacionalização do banco, concluiu.

Marcelo Rebelo de Sousa também tem uma opinião sobre o assunto. O Presidente da República afirmou há dias que o apoio estatal à banca “não foi boa solução”, mas evitou “o colapso da economia”. “As consequências teriam sido ainda mais dramáticas” sem injecção de dinheiros públicos, disse.

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