quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Trump esbraceja contra o mundo

Henrique Monteiro pergunta por que motivo, depois de quatro anos de fanfarronada e falta de sentido, tanta gente vota Trump

Henrique Monteiro

HENRIQUE MONTEIRO


Trump ganhou as presidenciais dos EUA. Mas só na opinião muito peculiar dele próprio. Aqueles que seguem a realidade já perceberam outra coisa. E a primeira delas é que não se sabe ainda quem ganha, embora neste momento em que escrevo (sete e meia da manhã) Biden vá com vantagem de sete grandes eleitores. Ou seja, tem 220 contra 213, mas são necessários 270 para ganhar.

Nunca – e este nunca é mesmo nunca – alguém antes de Trump se declarara publicamente vencedor sem disso poder ter a certeza e o facto ser evidente para todos. Mas Trump está a ser Tump e não deixará de ser Trump, pelo menos nos próximos tempos. Enquanto puder esbracejar fa-lo-á, de modo a salpicar toda a América, todo o mundo, com as suas enormidades e falta de sentido de responsabilidade.

De qualquer modo, todos sabíamos que o candidato democrata precisava de um resultado demolidor para calar o atual presidente. E Biden não é também esse candidato. Vejamos: no estado em que estão as coisas a esta hora, Estados em que se podia esperar uma vitória democrática, como Pensilvânia, Michigan ou Wisconsin, estão a cair para o lado de Trump.

Não quer dizer nada, porque há ainda, na difícil caraterização de umas eleições nos EUA, Estados solidamente democratas - e nesses Biden ganhou (no Maine pode ainda haver surpresas) - e estados que podiam mudar de orientação. Mas só a Geórgia e a Carolina do Norte ainda podem transitar dos Republicanos para os Democratas, já que o Texas e a Flórida parecem ter caído mesmo para Trump, que confirmadamente, por todos menos por ele, até pela Fox News, perdeu o Arizona e ainda pode perder Nevada, o Estado que tem em Las Vegas a sua cidade iconográfica.

Sendo assim, ficamos como? À espera do voto por correspondência, que aquele que Trump sempre contestou e acusou de fraudulento. E se como o senhor Trump continua com essa demanda até ao Supremo, segundo avisou temos especulação para durar.

Aliás, num parêntesis, direi que a esta hora, os votos que contam para o Senado e para o Congresso revelam que nem Democratas nem Republicanos perderam um lugar que fosse. Ou seja, todos os círculos ou Estados até agora escrutinados deram resultados iguais aos da última vez. Os Republicanos lideram para o Senado, com 47 eleitos, contra 46 (precisam de mais de 50 e faltam, obviamente, escrutinar Estados); os Democratas lideram para a Câmara dos Representantes com 176 contra 168 (precisam de 219 para a maioria) e faltam fechar diversos círculos.

Resta uma questão importante: por que motivo, depois de quatro anos de fanfarronada e falta de sentido tanta gente vota Trump? Pode parecer um mistério (e confesso que do meu ponto de vista o é um pouco), mas explica-se pelas sondagens à boca da urna. Quando se pergunta quais os assuntos que determinam as escolhas dos eleitores, a economia fica largamente à frente, com 35%. O estado da economia nos EUA, antes da pandemia, era claramente favorável e por pouco que Trump tivesse a ver com isso, beneficiava desse estado de coisas. A segunda preocupação, mas só para 20% é a desigualdade racial, campo fértil para se votar Biden; depois a pandemia (17%) cuja interpretação não é clara. E por fim, dois temas com 11% que se dividem pelos dois candidatos: crime e segurança, que joga para Trump e Saúde e Segurança Social, que beneficia Biden.

E assim, ainda que convicto que Biden ganhará, embora a Flórida costume ditar o vencedor (com duas exceções nos últimos 100 anos, e nesse Estado Trump tenha ganho), temos de esperar. Não sei até quando; não sei quando se cansará Trump da sua obsessiva narrativa segundo a qual foi roubado e o vencedor foi ele.

Mas já era o que se esperava.

Expresso

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