terça-feira, 10 de novembro de 2020

O PALHAÇO RICO!


Por

Dias Ferreira


É por demais sabido que o dinheiro não dá educação, nem dá instrução só por si, como também sabemos que apenas ler e escrever não significa que não se seja analfabeto.

Salazar era professor na Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra mas pensava mal da democracia, como alguns que apenas têm a quarta classe! Odiava-a e achava as eleições uma palhaçada, como acharia palhaço alguém que emitisse uma opinião contrária à sua. Tinha, no entanto, e ao contrário de outros, o decoro de não usar a propósito tais expressões. Criou mesmo uma polícia política e a censura para melhor controlar as opiniões divergentes, nem que para isso fosse necessário dar um safanão, de vez em quando! Salazar, numa entrevista que deu, entre outras, a António Ferro e para o Diário de Notícias, quando questionado sobre os métodos de tortura da polícia política, disse tratarem-se de «meia dúzia de safanões a tempo nessas criaturas sinistras». Não sei porquê mas lembrei-me daquela palhaçada de um pequeno apertão no pescoço de um associado durante uma Assembleia Geral que manifestava uma opinião contrária ao presidente de uma conhecida instituição nacional.

Palhaçada eram realmente as eleições na outra senhora e não as que se realizam num regime democrático, em que se podem debater livremente as ideias entre aqueles que as têm. Compreendo que quem não tem ideias para debater, considere um debate uma palhaçada! Não é fácil o debate, quando não impossível, para quem está habituado a ler o que os outros escrevem ou a fazer eco das apalhaçadas cartilhas!

Aliás, há mesmo especialistas em palhaçadas! Quem não se lembra de um circo que era para ser montado no Estoril, mas foi transferido para o Algarve para poder ser maior a palhaçada! E quem não gosta das palhaçadas dos vouchers, dos emails, das toupeiras e sobretudo dos palhaços que, em sentido figurado, enchem os bolsos a uns tantos palhaços, no verdadeiro sentido?

E o que se dirá de quem consente, com o seu silêncio ruidoso, palhaçadas que consistem em imitar os sons de very-lights que causaram a morte a adeptos de futebol? E como se qualifica uma conversa gravada entre Caturno e Zé Gago, em que este disse que Vieira lhe prometera que na época seguinte não haveria polícia na zona da claque, que autorizaria o uso de tochas, que iria devolver a sede à claque, com obras custeadas pelo clube, e que iria «tratar da polícia em três tempos» e «correr com Paulo Dias» -  chefe de segurança que auxiliou a PSP a identificar vários dos 31 alegados criminosos detidos pela Divisão de Investigação Criminal da PSP de Lisboa!

E pergunto agora o que se dirá de uma jura que Jesus não voltaria ao Benfica, de uma acção que foi proposta contra este de 12 milhões de euros e o seu regresso triunfal! Há sempre os que gostam e os que não gostam de palhaçadas, porque os palhaços não são todos iguais e não são sempre os mesmos, como há maus e há bons. Há quem goste e houve quem não tenha gostado daquela palhaçada a propósito de uma Comissão de Honra de alguém que foi sócio durante muitos anos de clubes rivais, o que, de resto, só por si, pode ser considerado uma palhaçada!

Há em todos estes factos uma figura que emerge pelo seu papel destacado. Alguém que não se deve olhar ao espelho, que não respeita a democracia na sua própria casa e que trata as regras desta com um analfabetismo primário. É alguém que repete ter a consciência tranquila e chora nos momentos mais convenientes. É alguém que nos diverte, que diz e faz disparates ou coisas engraçadas, que muda constantemente de opinião e que por isso não merece consideração nem é levada a sério por outras. É este alguém que sente autoridade moral para qualificar as últimas eleições do Sporting Clube de Portugal como uma palhaçada.

Quando ouvi aquela grosseira afirmação, lembrei-me das manifestações dos lesados à porta do BES e comentei para comigo: neste circo que, por vezes, é Portugal, há sempre um palhaço rico para troçar dos pobres!

jornal A Bola

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