sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Os filhos que o Governo não tem.

Manuel Molinos

Por estes dias, os portugueses que trabalham no sector privado não só têm de se preocupar em manter os seus postos de trabalho, como também serão forçados a procurar um local para deixar os filhos nos dias de tolerância de ponto para a Administração Pública.
Depois de devidamente esclarecidos, porque até ontem de manhã alguns centros de Actividades de Tempos Livres (ATL) da Segurança Social ainda admitiam a abertura em função das necessidades das famílias, os pais não terão outra solução que não seja a mesma de sempre: a casa dos avós. Veremos o resultado daqui a 15 dias.
Diz o Governo que pretendeu dar um sinal.
Nas palavras da ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social. Um sinal para que os trabalhadores fiquem resguardados. Leia-se os da Função Pública.
Antes do sinal da ministra Ana Mendes Godinho, tivemos o conselho da ministra Mariana Vieira da Silva. Se não tiver onde deixar os filhos, pode gozar um dia de férias ou recorrer ao teletrabalho. "Esta crise tem de ser partilhada entre todos e terá custos para todos", justificou.
Pois o verdadeiro sinal que o Governo dá, mais uma vez, é que, mesmo em tempos de crise e pandemia, há portugueses de primeira e de segunda. O sinal que dá é que continua a olhar para os funcionários públicos como eleitores de primeira.
Esquece-se que uma grande parte dos portugueses não pode deixar de trabalhar por um dia para cuidar dos filhos. Esquece-se que, segundo o INE, quase metade nem sequer consegue alterar a hora de entrada ou saída do emprego para levar as crianças ao médico.
Já em 2018, o mesmo Governo distinguiu trabalhadores dos sectores privado e público quando lançou o programa "3 em Linha". O projecto previa, na primeira fase, uma dispensa de três horas para acompanhamento dos filhos menores, até 12 anos, no primeiro dia escola, sem perda de rendimentos.
Só para funcionários públicos.
Por isso, na verdade, não há nada de novo nesta medida discriminatória.
É tudo como sempre foi.

Director-adjunto do JN

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