quarta-feira, 31 de julho de 2019

30 anos em 2400 carateres

As empresas tiraram-nos da crise mostrando que o papão da perda da política cambial e monetária em consequência do euro não só não as prejudicou como as beneficiou.

A revista “Exame” nasceu em 1989 (parabéns) e pediu-me para sintetizar esse percurso da economia portuguesa na sua conferência. Aqui está ele.

1989 foi o ano do lançamento dos filmes “Indiana Jones”, “Batman” e “O Clube dos Poetas Mortos”. Mas também o do nascimento da minha primeira filha, a Catarina. Por isso um dos três anos especiais dos vários vintage da minha vida.

Se compararmos a repartição do PIB de 1989 com a de 2019 está lá a essência da nossa evolução económica: 1º) o consumo privado e público mantiveram-se (com este a subir nos eufóricos anos de Sócrates e a descer no espartano controlo da troika); 2º) o investimento caiu 13 pontos percentuais (p.p.); 3º) em contrapartida, as exportações aumentaram 13 p.p.; 4º) E a balança comercial passou a ser (sistematicamente) positiva.

Então o que concluir?

1º) As empresas tiraram-nos da crise mostrando que o papão da perda da política cambial e monetária em consequência do euro não só não as prejudicou como as beneficiou.

2º) Os governos, quando se concentraram no controlo do défice, atuaram bem, quando o deixaram descontrolado, mal. Quanto à forma como escolhemos a fonte dos impostos ou como gastamos o dinheiro público, tem sido, para a Europa e para os mercados, indiferente. O que é que nós temos feito ultimamente? Baseámos as receitas públicas em consumo e gastámos os dinheiros públicos em benefício dos dependentes públicos e dos que ganham menos. Descuidámos a geração dos rendimentos futuros e o estímulo aos que mais o podem fazer.

Por isso, os indicadores que dependeram da Europa evoluíram bem: a taxa de inflação média caiu dos 7,19% de 1989 a 1998 para 1,06% de 2009 a 2018; a taxa de juro de curto prazo caiu dos 8,9% de 1991 a 1998 para 0,25% de 2009 a 2018. Quando controlámos o défice, e a Europa ajudou, os resultados foram ainda melhores: a taxa de juro de longo prazo da dívida pública caiu dos 10,7% de 1989 para 1,0% em 2019!

Como o financiamento à economia dependeu muito de nós, correu mal. Como adoramos o consumo e que o Governo o estimule, o endividamento provocado pelo sistemático desequilíbrio da balança comercial foi externo. A taxa de poupança das famílias é agora a mais baixa de sempre: 4,1% do rendimento disponível, quando era 12% na média de 1989-1998.

A Catarina vai fazer 30 anos. O país está muito envelhecido. Mas eu mantenho a esperança neste velho Portugal de 875 anos, até porque vou ser avô.

João Duque – Expresso

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